Ontem, um pequeno grupo pedia “Eleições Indiretas” no Parcão

Ontem, um pequeno grupo pedia “Eleições Indiretas” no Parcão

Eu passei ontem por esses caras quando vinha a pé do Restaurante Baalbek para casa. Eles estavam em duas esquinas do Parcão. Uma era dos “Livres17” (foto) e outra esquina do “Novo”. (Aqui, uma foto clara).

Foto do perfil do Facebook de Fernanda Santos
Foto do perfil do Facebook de Fernanda Santos

O foco deles não era protestar contra a corrupção, mas pedir a renúncia de Temer e eleições… indiretas. Ou seja, têm medo de diretas. Assim, o novo governo ficaria com a mesma turma de hoje. Eram poucos e apoiados, dentre outros, por um grupo do Facebook chamado simplesmente ELEITORES DE BOLSONARO.

Então, para eles não importa o quão imoral seja o Congresso Nacional. O importante é evitar a participação popular e manter as Reformas propostas pelo atual governo e já sinalizadas como aprovadas por um Congresso mais do que espúrio, cuja boa parte — falam em 60% — responde a processos criminais por crimes que variam de evasão fiscal a tentativa de assassinato. O interesse coletivo que se dane, eles ficam com seus criminosos.

Uma viagem de ônibus

Uma viagem de ônibus
Foto: Joana Berwanger / Sul21
Foto: Joana Berwanger / Sul21

Apesar do absurdo preço da passagem, eu tenho uma excelente relação com os ônibus. No passado, fazia diariamente um longo percurso e eles me davam a oportunidade de ler tranquilamente uma hora por dia. Gostava do transporte público, tinha a sorte de pegar o ônibus lá longe e sentado. Bem, pois hoje de manhã vinha sentado, lendo o monólogo altamente erótico de Molly Bloom. Ela estava naquela parte dos seios aparecendo na adolescência, das primeiras tentativas, tudo isso enquanto a camisola enrolava-se em suas pernas durante sua célebre insônia com o sono de Leopold a seu lado. Eu estava sentado ao lado de uma bela gremistinha toda orgulhosa com a camiseta, só que ela logo saiu do ônibus. Foi quando sentou-se o portento a meu lado.

Sim, sei, o politicamente correto, que saco. Pobres dos obesos, alguns são pessoas com problemas graves, guardo-lhes simpatia. Por alguma razão, a maioria deles é bem humorada. Evidentemente, o homem tinha o direito de estar ali. Afinal, se sem distúrbios eu tenho dificuldades para manter meu peso… Mas não posso deixar de me emputecer quando alguém me cola de encontro à parede do ônibus. Percorri vários quilômetros como uma lagartixa pressionada. Segui lendo meu Ulysses, com os braços grudadíssimos ao corpo e procurei me divertir com o efeito de minha respiração sobre ele. Quando enchia o pulmão, eu invadia o espaço territorial dele, fazendo com que suas carnes subissem (isso eu via pela visão periférica). Busquei encher os pulmões o mais que podia para ver a parte adiposa de seu braço e de parte de seu peito subirem no meu ritmo. Como meus amigos dizem, encontro aspectos lúdicos em quase tudo.

Talvez se dando conta de que minha respiração dominava o lado esquerdo de seu corpo, o gordo cruzou os braços. A situação piorou. Em resposta, dei um suspiro que não parecesse agressivo. Não adiantou nada. Quando cheguei ao Centro, fiz questão de guardar o livro na bolsa com o cara grudado em mim. Queria chacoalhar um pouco mais o sujeito. Mas não deu certo. Ele afastou educadamente o corpo e ainda disse bem simpático:

— Tá lendo a Bíblia, tchê?

Sorrindo, respondi que o que lia era muito mais divertido. Mostrei a capa do livro e enfiei:

— E tu? Gosta de ler a Bíblia?

— Ih, tá louco. Eu só leio policiais.

E abriu um sorriso.

— Agatha Christie? Simenon? Padura? Garcia-Roza? Ou os norte-americanos?

— Simenon e Padura.

Pronto, me conquistou. Saímos no fim da linha no maior papo sobre Maigret e Conde.

Eu e uma crente em um ônibus em Porto Alegre

Eu e uma crente em um ônibus em Porto Alegre
A mezzo-soprano sueca Anne Sofie von Otter
A mezzo-soprano sueca Anne Sofie von Otter

Na segunda à tarde, durante um intervalo, fui pegar algumas coisas na casa de um amigo. Entrei num ônibus, sentei e abri um Simenon enquanto Anne Sofie von Otter cantava Rheinlegendchen ou Wer hat dies Liedlein erdacht? de Gustav Mahler em meus fones. Logo passou um homem que nem vi o rosto e depositou um bilhete de tamanho mínimo na minha mão:

QUERIDOS IRMÃOS PRECISO DE VOCÊS PERDI MINHA MÃEZINHA SOFRO DO VÍRUS DO HIV ESTOU ME TRATANDO COM COQITEL E ESTOU DESEMPREGADO ESTA DIFÍCIL O EMPREGO TENHO UMA FILHA DE 2 ANOS QUE ESTA PASSANDO FOME PESSO SUA AJUDA OBRIGADO
MARCOS E VITÓRIA (nomes alterados)

Juntei uma nota de dinheiro ao bilhete e segui lendo o livro acompanhado de Anne. Quando senti que ele voltava, ergui a mão direita com a nota e o bilhete entre o indicador e o dedo médio um pouco acima de minha cabeça. Porém, o homem não me viu e saiu para tentar a sorte em outro ônibus.

Então, uma senhora falou em voz altíssima que era um absurdo dar R$ 10,00 a um vagabundo e que eu faria melhor doando meu dinheiro à igreja. Subitamente e ainda meio zonzo, caí de meu mundo e notei que aquilo era para mim. Fiquei surpreso. R$ 10,00? Nas vezes em que dou dinheiro para pedintes, meu máximo é R$ 2,00, o valor aproximado de um litro de leite — um critério absolutamente pessoal. Fora um engano. Sem tirar os olhos do livro, guardei a nota, o bilhete e levantei bem alto um solitário dedo médio para que a beata o visse claramente. Nem sempre sou um lord.

O ônibus achou graça e ela me chamou de mal-educado em pavoroso discurso de meio minuto, no mínimo. Lembrei do que um amigo um dia me disse:

É impressionante a quantidade de filhos-da-puta entre os crentes.

Desci na minha parada sem maiores incomodações. Mas como canta a Anne Sofie von Otter!

Armas… pela vida! Homens de Bem e Bons de Mira, Uni-vos!

Armas… pela vida! Homens de Bem e Bons de Mira, Uni-vos!

armas pela vida logo

No próximo domingo, 19 de março, no Parcão, haverá um ato em prol do direito de defesa em Porto Alegre. Ele se chama Armas pela Vida…

É claro que o movimento “Armas pela Vida” — em Porto Alegre capitaneado por um grupo luminar de vereadores — está cheio de razão. Como a sociedade gaúcha e porto-alegrense está tranquila, há pleno emprego, a temperatura está amena e a psicologia de todos está 100%, nada mais adequado do que armar todo mundo. Deste modo, os pequenos entraves da vida diária — brigas de trânsito, entre vizinhos e antipatias de um modo geral — poderão ser discutidas sem a presença do estado, esta coisa pesada e comedora de impostos. Pense, por exemplo, num casal em vias de separação e no profundo ódio que os une. A presença de armas em casa resolveria o problema imediatamente, evitando um enorme investimento de angústia e longos processos.

Os homens de bem receberiam uma carteirinha e treinariam tiro. Então, em vez de chamar uma polícia que quase não existe, a coisa poderia ser resolvida rápida e certeiramente com um disparo no coração do elemento, dado por um Homem de Bem e Bom de Mira (pode ser mulher, por que não?). Tais BO`s reduziriam o número de bandidos — os presídios se esvaziariam com a morte precoce das pessoas que cometem ilícitos — e o trabalho do Judiciário. Mais: se a população fosse bem treinada nas artes de tiro, não haveria a necessidade de tantos leitos hospitalares! O limpo e digno mercado funerário ficaria tão aquecido quanto nossos revólveres. Lembram de John Lennon cantando “Happiness is a warm gun”?

É óbvio que os roubos e assassinatos diminuiriam sobremaneira com uma população armada. Os bandidos se sentiriam intimidados com a possibilidade das vítimas tornarem-se seus algozes. Os estudantes iriam às aulas portando metralhadoras, impedindo o roubo de suas mochilas e tênis de marca. Eu iria adorar caminhar pela rua vendo os bolsos de todos cheios de armamento letal.

E não deixem que os idiotas digam que não se combate a barbárie com mais barbárie! Bala neles também! Afinal, uma rodinha de violão, um livro, um churrasco ou uma sala de concerto jamais resolveram o problema da segurança. O negócio é transformar Porto Alegre no Velho Oeste.

Chega de viver como gado e morrer como frangos!

Os vereadores Valter Nagelstein, Monica Leal, Comandante Nádia, Mendes Ribeiro, Wambert Di Lorenzo e Felipe Camozzato, junto com o representante do Armas Pela Vida Pedro Meneguzzi.
Os vereadores Valter Nagelstein, Monica Leal, Comandante Nádia, Mendes Ribeiro, Wambert Di Lorenzo e Felipe Camozzato, junto com o representante do Armas Pela Vida Pedro Meneguzzi | Foto da página do Facebook do movimento
Bem...
Bem…

Museu Iberê Camargo: mais um absurdo da provinciana e atrasada Porto Alegre

Museu Iberê Camargo: mais um absurdo da provinciana e atrasada Porto Alegre

Quando certa manhã Álvaro Siza acordou de sonhos intranquilos, encontrou-se pensando que aquilo que lhe passara pela cabeça seria uma maravilhosa realidade: um gigante pilotando uma enorme pá, enterrando fundo seu instrumento de trabalho na beira do Guaíba, para depois erguer do chão o Museu Iberê Camargo e perguntar para onde deveria levá-lo. A resposta seria óbvia: para uma cidade que desse um mínimo de atenção para a cultura.

Foto: Elvira Tomazoni Fortuna
Foto: Elvira Tomazoni Fortuna

Não sei como Álvaro Siza Vieira foi construir uma de suas mais belas obras em Porto Alegre, o que sei é que a cidade não a merece. Trata-se de um museu de arte, um lindo prédio branco e iluminado na mais bela região da cidade com estacionamento no subsolo… Mas vejam só — funciona apenas dois dias por semana, sexta e sábado. Talvez os ônibus nem parem mais na frente do Iberê. Não sei de vocês, mas eu sofro com isso. Como minha cidade pode descuidar tanto de seu patrimônio cultural?

A obra é um achado. Espaçoso, privilegia a entrada de luz e a visão das águas do Guaíba. Deveria estar sempre lotado, com escolas durante o dia, mais visitantes e turistas. Em quase todos os lugares do mundo, os museus abrem todos os dias, exceto às segundas-feiras. São importantes não apenas para arte e sua memória, mas para o turismo. Só que aqui, no provinciano e cada vez mais cu do mundo chamado Porto Alegre, não há empresas, mecenas ou governo que possam assumir o local.

Só o prédio de Siza já seria uma atração para o turismo cultural. Foi vencedor de vários prêmios internacionais. Aliás, Siza é o mais premiado dentre os arquitetos vivos. Mas, daqui alguns anos, sua obra porto-alegrense deverá ser uma ruína cheia de vazamentos e pintura gasta. Já estou até me imaginando, velhinho, olhando o pôr do sol sentado na frente do bar — talvez igualmente fechado –, contando como aquilo foi maravilhoso durante uns poucos anos.

Não gosto nem de passar na frente. Para piorar, tem um pardal que faz com que todos os carros reduzam a velocidade quando passam por ele, o que faz com a gente observe bem a obra. E não entre.

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Hoje, passando pelo Arroio Dilúvio na Av. Ipiranga, em Porto Alegre…

Hoje, passando pelo Arroio Dilúvio na Av. Ipiranga, em Porto Alegre…

… tirei esta foto das pessoas se refrescando e passeando. Ah, não é o Dilúvio? Todo mundo tem medo de sair na rua em Porto Alegre e o Dilúvio permanece poluído? Extremamente poluído? A foto é de Seul, capital da Coreia do Sul, e o Dilúvio de lá chama-se Cheonggyecheon? Ah, tá. Peço desculpas pelo sonho.

Arroio Diluvio

via Arroio Dilúvio

Uma aventura no ‘Tudo Fácil’ de Sartori

Uma aventura no ‘Tudo Fácil’ de Sartori

Ontem fui ao Tudo Fácil, onde fui fazer uma nova Carteira de Trabalho porque a minha está lotada de anotações. Já tinha revisado os documentos necessários e estava com tudo em dia e novinho. O atendente elogiou o estado de minha Carteira atual. “O Sr. é uma pessoa caprichosa”, disse. Então, o burocrata acordou nele e se pronunciou do modo que segue: “Mas antes o Sr. terá que fazer uma nova Carteira de Identidade porque essa foi feita sobre a sua Certidão de Nascimento e o Sr. é oficialmente divorciado”. Então, fiquei sabendo que um casamento é como nascer de novo, apesar de eu ter quase morrido no meu, aquela infelicidade toda. Depois de casar, a Certidão de Nascimento não vale mais porra nenhuma.

Já bastante puto, fui para a fila da Identidade. Mostrei todos os meus documentos e tudo ia bem até que a mocinha burocrata chamou uma colega que chamou mais uma que, por sua vez, chamou o chefe. Acontece que o sistema diagnosticava “Sorriso Detectado”, rejeitando minha foto. Sem exagero, tiraram 20 fotos minhas. “Ergue o queixo, não, não, abaixa um pouquinho”, essas coisas. Em todas eu estava sério, cada vez mais sério, mas a merda dizia que eu sorria. Olhavam para mim e diziam um pro outro, “deve ser a barba”. Já tinha umas 10 (dez) pessoas me atendendo. Então, eu falei que ia fazer cara de morto. Caprichei para imitar o olhar daqueles peixes da Semana Santa no Mercado. Deu certo. Obtive a foto mais horrorosa de todos os tempos. Parecia a Anna Kariênina depois do trem. Porém, finalmente o sistema deu OK. Agora são 15 dias para a nova Identidade e mais 15 para a Carteira de Trabalho. Entro em férias bem no meio deste período. Tudo fácil.

P.S.– Ah, e ainda tenho que pagar por estes documentos.

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Aureliano, Noel, Jacaré – um passeio na memória (por Rodrigo Balbueno)

Aureliano, Noel, Jacaré – um passeio na memória (por Rodrigo Balbueno)

Dia desses, recebi o e-mail abaixo. Impossível desconsiderá-lo. O texto que o segue é muito bonito e, se o autor escreveu que “adoraria publicá-lo no teu blog”, só me resta abrir o espaço.

Caro Milton,

É sempre curioso o esforço de dirigir-se a quem não se conhece pessoalmente mas com quem se priva de certa intimidade, como leitor habitual de teu espaço no Sul21. De certa forma é como dirigir-se a um velho amigo desconhecido, se é que isso é realmente possível.

Por isso hesitei muito em escrever-te, até que ao ler teu post de hoje me dei conta de algo mais em comum e que no máximo vou te incomodar por alguns minutos.

Além de uma convergência no trato da memória, ainda incluiria a relação com a OSPA, a quem acompanho desde o tempo do Eleazar de Carvalho, de quem fui vizinho no Bom Fim.

Há quase dez anos fora de Porto Alegre, tento programar minhas idas à cidade ajustadas à programação da orquestra querida. E sem querer ser muito enxerido, tendo acompanhado a saga dos músicos estrangeiros, como a Elena, que trouxeram à orquestra uma qualidade que a engrandece e os faz ainda mais admiráveis, sempre me pareceu extraordinária a coragem dessas pessoas que deixaram um mundo que se desfazia e vieram construir uma vida nova nestes trópicos e subtrópicos. O fato de minha mãe ter sido colega de hidroginástica da Elena na Hebraica é só um detalhe a mais nessa teia, assim como os queridos amigos Cátia e Norberto que de vez em quando aparecem em tuas fotos.

Enfim, é bem possível que mais cedo ou mais tarde nos venhamos a conhecer pessoalmente.

Lhe escrevo porque estive obcecado com uma série de coincidências que originaram o texto que vai em anexo. Como é um tanto personalista e tem um tamanho que é meio nada, muito grande pra imprensa, pequeno mesmo pra um livreto, pensei que talvez devesse dar-lhe um pouco mais de substância, e então lembrei de tua entrevista com o Airton Ortiz quando ele foi patrono da feira do livro e a quem gostaria de ouvir para enriquecê-lo um pouco e quem sabe me podes passar seu contato.

Te peço desde já desculpas pelo “aluguel” e lhe desincumbo de qualquer responsabilidade de responder a este.

Grande abraço,
Rodrigo Balbueno

.oOo.

Aureliano, Noel, Jacaré – um passeio na memória

Por Rodrigo Agra Balbueno
Agosto, 2016

Inicio pelo meu próprio começo, pelo tornar-se gente, que tem no nascimento seu ponto de partida, mas que demora uns bons anos pra engrenar. E, depois que começa, se tudo der certo nunca mais termina.

O tempo zero, neste caso, não é o começo absoluto. Falo de algo que se deu por volta dos vinte anos, lá por 1986 ou 1987, época em que um grupo de amigos, ainda estudantes ou recém egressos da universidade e portanto com uma vida econômica das mais restritivas, passaram a cultivar o hábito de reunir-se com alguma frequência no restaurante Copacabana, nas noites de domingo, sempre que a dureza permitia.

O Copacabana é um dos restaurantes mais antigos de Porto Alegre ainda em atividade, tendo sido fundado em 1939. O endereço diz Praça Garibaldi nº 2, mas olhando pra ele se vê que está na esquina das Avenidas Venâncio Aires e Aureliano de Figueiredo Pinto. A praça mesmo está do outro lado da rua.

Em algumas noites éramos dois ou três, noutras seis ou oito. Preferencialmente no salão principal, eventualmente no salão da direita, que anos depois virou o salão de não fumantes, antes do banimento completo do fumo de lugares fechados.

Em muitas dessas noites de domingo no Copa, tínhamos como vizinho de mesa um tipo meio sisudo, mais velho do que nós, de feições muito gaúchas, cabelos longos e cavanhaque, que às vezes jantava sozinho, às vezes com um ou dois amigos.

Alguém do nosso grupo já o conhecia e em algum momento comentou: esse é o Jacaré, ele é jornalista e compositor do Tambo do Bando. Já era um tempo em que a música regional começava a separar-se em duas vertentes diametralmente opostas, uma presa ao passado e manietada por um esdrúxulo conjunto de regras gerados por uma entidade ainda mais esdrúxula, e outra aberta à música urbana, mas sem tirar o olho da vastidão do Pampa que esperava ali do outro lado do lago. O Tambo do Bando foi uma das melhores respostas a essa tensão.

A convivência dominical trouxe certa proximidade, com cumprimentos gentis e uma eventual conversa. Não éramos exatamente amigos, mas sempre que nos encontrávamos fora do Copa trocávamos aquela saudação típica de pessoas que se conhecem de outros cenários.

Só fui saber seu nome quando morreu, ainda muito jovem, em 1996. Luiz Sérgio Metz. Sérgio Jacaré. Pra nós só Jacaré até aquele junho gelado.

metz-1Logo depois disso, a teia das relações me uniu a um grupo de estudantes de letras, ainda antes do ano 2000, e muito depois disso minha amiga Júlia, hoje doutoranda em letras, um dia me disse, eu já vivendo em Brasília, “tu precisas ler ‘O primeiro e o segundo homem’ do Luiz Sérgio Metz”. O primeiro livro do Jacaré, lançado em 1981, ainda antes de nossa vizinhança de mesa no Copacabana.

Em seguida comprei o livro, uma edição da “Artes e Ofícios” de 2001, que celebrava os 20 anos de seu lançamento. Li, adorei e fiquei lamentando não ter tido maior proximidade com aquela figura que tantas vezes esteve ali tão perto, quase dividindo uma mesa em noites de domingo.

Indo rumo a um tempo ainda mais remoto, final dos anos 70, começo dos 80, no ensino médio, em Taquari, quando inventava um mundo pra chamar de meu, fazendo algumas escolhas que mais tarde desembocaram naquela mesa do Copa e em tudo que dali adveio.

Era o tempo das descobertas, mas o que interessa agora é a música. Em uma casa onde se ouvia basicamente MPB, o auge do movimento nativista me pegou em um momento em que a figura do gaúcho era parte integrante da paisagem humana que via cotidianamente. Muitas pessoas da minha idade tinham um cavalo antes de ter uma moto.

Isso foi um pouco antes de deixar a vida no interior, literal e metaforicamente, e de descobrir a música urbana gaúcha, que experimentava um florescimento exatamente nessa época. Acho que meu marco particular é “Pra viajar no cosmos não precisa gasolina” do Nei Lisboa, seguido de perto pelo Musical Saracura.

noel-1Mas até então ouvia muito os LPs da Califórnia da Canção Nativa de Uruguaiana, especialmente os da nona (1979) e da décima (1980), Pedro Ortaça e principalmente Noel Guarany. O gaúcho da Bossoroca me tocava especialmente e o disco “Noel Guarany canta Aureliano de Figueiredo Pinto” figuraria ainda hoje entre os dez que levaria para uma ilha deserta.

Anos depois, esse disco ainda me traria uma alegria em extinção, que é aquela que sente quem encontra em CD um LP há muito perdido e que muito prazer lhe proporcionou. Hoje ouço no Ipod sempre que me vienen del sur los recuerdos (gracias, Borges).

Noel Borges do Canto Fabrício da Silva, guarani no sangue e pela arte, decidiu deixar de lado o sobrenome que remete à definição dos limites do Rio Grande do Sul como ele é hoje, pra ser Guarany somente, em tudo o que isso significa para este pedaço da América Latina que foi indígena, espanhola e portuguesa, mas para quem as fronteiras nada significam, na busca pela terra sem males.

Noel Guarany talvez seja o máximo expoente da música missioneira, se não é seu próprio inventor, nos termos em que hoje se conhece. No Estado onde tudo é Gre-Nal, pode-se perceber uma clara oposição entre a música missioneira e a música da fronteira sudoeste.

Grosso modo, enquanto a música da Campanha olha para a vida no latifúndio e vê no castelhano o inimigo, a missioneira tem um viés muito mais campesino e pan-gauchesco, empregando expressões em espanhol de forma natural, para quem a fronteira é o grande rio Uruguai, em cuja outra margem vive um outro que nos é igual.

aur-1Não é à toa que muitas vezes Noel canta “a Pampa” no feminino, como os castelhanos e, no extremo, a “Pachamama” quíchua. A terra como fêmea, mãe e companheira.

Saltamos mais uns anos, dez ou vinte, talvez, e encontro, em alguma livraria da Riachuelo, o livro “Romance de estância e querência – marcas do tempo”, único livro lançado em vida por Aureliano de Figueiredo Pinto, que entre outros tantos versos, traz aqueles musicados por Noel Guarany no LP de 1978. Muito gaúcho, muito lindo, muito lírico, descrevendo entre os anos 30 e 50 um mundo que já então deixava de existir.

Em uma hipotética genealogia da cultura riograndense se a Noel pode ser atribuída a paternidade da música missioneira, Aureliano seria responsável, uma geração acima, pela poesia regional gauchesca, numa obra que inicia em momento anterior à criação da figura do gaúcho de CTG, cópia carnavalesca de um tipo humano que a rigor nunca existiu da forma como foi cristalizada no imaginário popular.

A produção literária e musical do Jacaré também pode ser incluída nesse “tronco” da cultura gaúcha que abriga Aureliano e Noel. As obras desses três artistas, ligadas de uma forma ou de outra ao espaço físico missioneiro, são eivadas de um lirismo meio amargo, com um olhar para os que tudo perderam, sejam os guaranis e sua vida quase republicana quando da invenção do Rio Grande, sejam os gaúchos a pé perdendo seu lugar no mundo, para Aureliano pelo esvaziamento de uma forma de vida rural calcada na pecuária herdada dos jesuítas, para Noel e Jacaré já sob o domínio da soja no latifúndio mecanizado.

Se olharmos o mapa do estado, há um triângulo retângulo cujos vértices são as cidades onde nasceram esses três gaúchos. Aureliano de Santiago, Noel de São Luiz Gonzaga e Jacaré de Santo Ângelo. A hipotenusa ligando Santiago do Boqueirão, no extremo sul, a Santo Ângelo.

São três mil quilômetros quadrados ou 1% do Rio Grande, em cujos limites está contida a catedral de pedra de São Miguel das Missões, expressão máxima do passado colonial, de um tempo anterior à nossa brasilidade e à própria ideia de gaúcho.

Entre 1952, ano do nascimento do Jacaré e 1959, ano da morte de Aureliano os três dividiram os ares desse triângulo mágico missioneiro, embora seja virtualmente impossível que hajam se encontrado em algum momento. O Dr. Aureliano clinicando em Santiago, Noel alistando-se no 3º Regimento de Cavalaria de São Luiz Gonzaga, para logo desertar e “se bandear pro outro lado” e tornar-se Guarany de fato. E Jacaré, piá, aprendendo as primeiras letras.

Jacaré e Noel, no entanto, apostaria que se conheceram. Uma atuação política convergente deve tê-los unido durante a ditadura. Noel fez um célebre show na greve dos bancários de 1979, onde além do Jacaré seguramente também estaria seu conterrâneo da Bossoroca e futuro governador Olívio Dutra.

No conto “a noite da boiguaçu”, d’o primeiro e o segundo homem, o personagem Tatuim, descrito como “um bugre guarani que envelheceu por São Miguel” canta versos da canção “potro sem dono”, de Paulo Portela Nunes, gravada por Noel no LP “… sem fronteira” de 1975. E em 1980 Noel fez um célebre show no Teatro Glória de Santa Maria, em que desanca a repressão, ainda em plena ditadura. Esse show foi postumamente lançado no disco “Destino Missioneiro”, único registro ao vivo da obra de Noel. Santa Maria onde estudaram Aureliano e Jacaré e onde morreu Noel.

Damos mais um salto que nos traz para a segunda metade da segunda década do século XXI, com a internet já completamente integrada à vida de todos, e com ela o hábito de passar de um assunto a outro, quando uma curiosidade inicial conduz a descobertas insuspeitadas e nos permite vislumbrar mundos desconhecidos sem sair da frente de uma tela.

aur-metzNum desses passeios em que uma página leva a outra que leva a mais outra, numa sucessão que nem a imaginação mais desenfreada é capaz de conceber, em alguma dessas conexões vejo que há uma biografia do Aureliano de Figueiredo Pinto escrita… por Luiz Sérgio Metz.

Pela internet achei o livro num sebo aqui de Brasília mesmo e em poucos dias o recebi pelo correio. Ao abrir o pacote, foi como um reencontro com um velho conhecido. O livro é o volume 33 da “Coleção Esses Gaúchos”, lançada há trinta anos para celebrar o sesquicentenário da revolução farroupilha.

Uma ótima ideia, de fazer um retrato do Estado a partir do perfil de 40 gaúchos, de Gilda Marinho a Getúlio Vargas, do Barão de Itararé a Jacobina Maurer. No inventário das bibliotecas perdidas tive um punhado deles, alguns comprados no supermercado, outros na própria livraria tchê!, ali na Salgado Filho, quase embaixo do viaduto Loureiro da Silva.

São livros pequenos, embora não exatamente de bolso, em edições simples, mas ilustradas e com fotos, e com uma liberdade editorial que surpreende e intriga nesta era de padronização e uniformidade. A edição é da tchê! e da RBS, com patrocínio do “banco Europeu para a América Latina”, cuja existência me era desconhecida até este momento. Parece que ainda existe.

A biografia do Aureliano pelo Jacaré tem 82 páginas, na capa uma caricatura desenhada pelo Juska, fotos do arquivo da família e ilustrações do Pedro Alice, amigo querido, que muitas vezes dividia conosco a mesa do Copacabana nos domingos. É bem possível que tenha sido ele, lá no sexto parágrafo, quem tenha apresentado o Jacaré aos demais, pois agora vejo que andávamos por lá na época da gestação do livro. O exemplar que tenho nas mãos diz “impresso em junho de 1986” logo abaixo do copyright. Dez anos antes da morte do Jacaré, trinta anos antes deste inverno de 2016.

O exemplar traz na folha de rosto, escrito a caneta “Brasília jun 89” e uma assinatura ininteligível.

exemplar

Deduzo que o livro haja sido comprado por aqui mesmo, por algum gaúcho expatriado, três anos após o lançamento.

A letra manuscrita aparece novamente nas páginas do capítulo intitulado “Identificação e Roteiro”, que faz as vezes de nota biográfica. Na entrada relativa ao ano de 1926, são listados alguns nomes de companheiros de tertúlias de Aureliano quando morava na “rua da Olaria”, atual Lima e Silva, na Cidade Baixa, não muito longe do Copacabana. Depois de um “e tantos outros”, a mesma letra da folha de rosto registra um “entre os quais meu pai”.

A entrada relativa a 1938 trata do casamento de Aureliano com Zilah Lopes e lista seus três filhos: José Antônio, Laura Maria e Nuno Renan. O nome de Laura Maria está sublinhado em tinta laranja e se vê uma pequena estrela, quase um asterisco, que remete a uma nota ao pé da página, que se estende pela margem e diz: “fui seu par, no baile de debutantes, em 53 (!) De ‘recuerdo’ ganhei cuia/bomba de prata.”

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O antigo dono do livro foi par da filha de Aureliano em seu baile de debutantes, em 1953. Deveria ser um rapaz de 18 ou 20 anos, nascido no começo dos anos 30, quando Aureliano já estava de volta a Santiago e iniciava sua vida como médico. Já cinquentão, comprou a biografia do pai de seu par, muito longe de Santiago, na capital da república.

Há outros trechos destacados com a caneta laranja, até a página 20, onde o Jacaré destaca a relação de Aureliano com Getúlio Vargas, a quem nunca perdoou por haver traído os ideais daqueles que estiveram na linha de frente da Revolução de 30. Seria antigetulista, como Aureliano, o antigo dono do livro?

Depois disso quase não há mais textos destacados, apenas alguns versos mais ou menos no meio do volume, até que na página 56, na abertura do quinto capítulo do livro, está uma foto tomada no chalé da Praça XX, em que dois senhores estão diante de dois copos de chopp preto, olhando para o fotógrafo. E reaparece a caneta azul sob a foto, identificando os dois senhores: “Marçal de AB., meu pai. Aureliano”.

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A foto não tem data, mas as roupas de Marçal e Aureliano remetem a uma elegância dos anos quarenta; talvez seja do curto período que Aureliano passou em Porto Alegre em 1941, como sub-chefe da Casa Civil do interventor Cordeiro de Farias. Marçal veste um traje claro, com uma gravata borboleta, enquanto Aureliano leva um conjunto escuro, camisa branca, gravata de nó pequeno e lenço no bolso do paletó. Ambos de chapéu, os dois Fedora de aba reta, o de Aureliano de copa mais alta.

Não há dúvida de que o expatriado santiaguense que me legou a biografia de Aureliano era de uma família muito próxima dos Figueiredo Pinto. Não só foi par no baile de Laura Maria em seu baile de debutante, como seu pai Marçal participava das tertúlias na rua da Olaria e privava da intimidade de um chopp no chalé da Praça XV.

É possível que o filho do Marçal já não esteja mais entre nós e que seus herdeiros hajam passado sua biblioteca para o sebo que me vendeu o singelo livrinho com a biografia de Aureliano de Figueiredo Pinto escrita por Luiz Sérgio Metz. Talvez a família não tenha mais nenhum vínculo com Santiago ou com os Figueiredo Pinto.

Por mais curioso que tudo isso me haja deixado, neste momento não disponho de tempo nem de meios para tentar deixar as coisas mais claras. Gostaria de perguntar ao Airton Ortiz detalhes da criação da coleção “esses gaúchos”, de como se escolheu o Jacaré para escrever sobre o Aureliano, de como os editores viram a forma que ele escolheu para o texto, com dois capítulos dedicados a uma entrevista imaginária que pareceu não interessar muito ao filho de Marçal AB, pois neles não há sequer um pedaço de texto destacado.

Seus netos devem morar aqui em Brasília e talvez tenham algo a contar sobre a relação do avô e do pai com os Figueiredo Pinto. Se fosse até Santiago talvez descobrisse que foi o par de Laura Maria no baile de debutantes de 1953 cuja biografia de Aureliano percorreu esse longo caminho até chegar a mim.

Sei que essas coincidências não querem dizer nada. Essa busca por um sentido em todas as coisas é um dos traços que nos fazem mais humanos, mas são somente mistificações que nascem do espanto que nos causa a complexidade do mundo, apreendida pela máquina de pensar do nosso cérebro. Mas mesmo com sua extraordinária capacidade, há sempre algo que se nos escapa. E daí o espanto, e as religiões e a filosofia e a poesia.

E dele decorre a necessidade de querer explicar, de buscar alguma coisa oculta, de interpretar sinais onde nada há além do caos, de arranjos probabilísticos aleatórios que nada significam. Mas não cansamos de tentar ligar os pontos, de unir alguns fios soltos que pendem da colcha que nossa história tece, alheia às nossas agruras e preocupações.

Devolvo os livros à estante e configuro o ipod para o modo aleatório. Sempre que o misterioso algoritmo que o governa trouxer de volta Noel e Aureliano aos meus olvidos vou lembrar de tudo isso outra vez. E quando sentar no salão principal do Copa vou brindar à memória de Luiz Sérgio Jacaré Metz, que há vinte anos deixou aquelas mesas pra nunca mais voltar.

Luiz Sérgio Jacaré Metz
Luiz Sérgio Jacaré Metz

O imposto sotaque estrangeiro

O imposto sotaque estrangeiro

KGB-secretsNo Brasil — ou ao menos em Porto Alegre — existe o Imposto Sotaque Estrangeiro. A Elena fala um português perfeito, está no Brasil há 18 anos, mas guarda o sotaque de quem tem o russo como língua-mãe. Dia desses, pedi um serviço, ele custou mais ou menos R$ 30 por hora. Só que no dia anterior, a Elena tinha telefonado e a coisa custava R$ 300. Não estou brincando. Falamos com a mesma pessoa em dias consecutivos. Também se a Elena, que é bielorrussa, usa um táxi, tem que explicar direitinho o itinerário, mostrando que conhece a cidade. Se não faz isso, o cara vai de um bairro a outro da cidade pelo Canal do Panamá.

Aqui, quem tem sotaque tem de ser explorado, pois certamente é rico.

Todos os dias na Biblioteca Pública

Todos os dias na Biblioteca Pública

Mesmo que o porto-alegrense não seja educado, mesmo que alguns fiquem conversando continuamente em voz baixa, ir ao meio-dia até a Sala de Leitura na Biblioteca Pública da Rua Riachuelo é como se eu tivesse recebido férias de 30 minutos. Alivia. Tenho uma hora de almoço, me alimento rapidamente e subo a Ladeira para chegar até o velho prédio. Aviso o gentil senhor que cuida da sala que entrei com um livro, anoto seu nome e autor e descanso um pouco das más e péssimas notícias de todos os dias.

Hoje eu saí mais tarde e fiquei apenas 15 minutos. Deu para ler apenas dez páginas, mas é uma alegria poder descer a rua com a cabeça em outro contexto. É um conforto moral, um consolo, desafoga.

Ramiro Furquim / Sul21
Ramiro Furquim / Sul21

Há grande concentração de Pokémons na Redenção…

Há grande concentração de Pokémons na Redenção…

Na última sexta-feira, eu e Elena estávamos atravessando a Redenção em direção ao Guion Cinemas quando vimos um enorme grupo parado no jardim japonês. Havia grande silêncio, o que fazia com que parecessem zumbis. Perguntei que faziam e me disseram que o motivo era que ali havia uma grande concentração de Pokémons. Todos estavam de cabeça baixa, observando seus celulares, caçando os pobres bichinhos. Jamais imaginei ver isso e tirei umas fotos bem ruinzinhas com meu celular. Um amigo disse: “Pelo menos não estão rezando”. Olha, sei lá se não estão. Outro conhecido me disse que o mesmo ocorre no Campus da UFRGS, no Vale.

Redenção caçando Pokemon 1

Redenção caçando Pokemon 2

Redenção caçando Pokemon 4

Redenção caçando Pokemon 3

O Marabá está morto

O Marabá está morto

Não há quase mais cinemas de rua em Porto Alegre. Todos os cinemas se internaram em shoppings. À noite, não se vê mais placas luminosas com letras quase sempre tortas ou faltantes anunciando filmes. Além, disto, os cinemas reduziram seu tamanho. Já faz tempo que desapareceram aquelas imensas salas em que funcionários com lanterninhas nos indicavam os lugares livres depois de iniciar a sessão. O VHS, a televisão, o DVD, o Now, o Netflix, a pandemia e o streaming, aliados à falta de espaço, de tempo e de charme transformaram nossas salas em coisas diminutas.

Mas a época do Marabá era diferente. O Marabá era um cinema que ficava em um bairro contíguo ao centro da cidade. Ou no bairro mais próximo a ele, se considerarmos que nosso centro é, na verdade, uma ponta enfiada no rio-lagoa-estuário Guaíba. O Marabá não tinha nenhum charme, não era frequentado por mulheres elegantes que deixavam rastros não de ódio, mas de perfume, atrás de si. Essas iam a outros lugares. Nenhuma surpresa nisto, pois o Marabá, fora construído para passar reprises e porcarias. Os filmes mais artísticos que lá vi foram as obras-primas kitsch de Jack Arnold: O Monstro da Lagoa Negra, O incrível homem que encolheu e — como esquecer dos gritos da mocinha? — A Revanche do Monstro. O enorme cinema ficava na rua Cel. Genuíno, 210, próximo à Av. José do Patrocínio. Só que, um dia, cansado de tanto passar filmes ruins, alguém por lá enlouqueceu por lá e começou a passar somente grandes filmes em programas duplos. Eram apenas duas sessões — uma iniciava às 14h e outra às 20h — mas, meus amigos, que sessões! Um belo dia, estando eu na casa dos quinze anos, abri o jornal e li que o Marabá passava A Noite, de Antonioni, e Viridiana, de Buñuel, em seu programa duplo. Talvez a nova geração desconheça a expressão “programa duplo”. É o seguinte: semanalmente, eram apresentados dois filmes com um pequeno intervalo no meio para irmos ao banheiro e ao bar comprar balas, fumar, conversar, beber, namorar ou simplesmente esticar as pernas. Só que os programas duplos apresentavam normalmente filmes pornográficos ou de pancadaria. Nunca coisas daquele calibre.

Eu e um bando de loucos por cinema começamos a acorrer ao lúgubre Marabá. Aposentados e desocupados também pagavam o ingresso baratíssimo do cinema não muito limpo. Grupos de estudantes vinham ver e rever filmes enquanto matavam aulas. Minha sessão habitual era a das 14h. Formávamos uma peculiar fauna de jovens secundaristas, universitários, velhos e desempregados. Lembro de ter saído muitas vezes rapidamente de casa, batido a porta, lembro de pegar e pagar o ônibus, de parar nas imediações do centro e de correr como Catherine, Jules e Jim (ou Lola, para os mais jovens) em direção ao cinema. Comigo, chegavam outros esbaforidos. Trocávamos um cumprimento rápido e entrávamos. Comigo, muitas vezes veio Maria Cristina, minha primeira namorada. Quando víamos os filmes pela primeira vez, não protagonizávamos grandes cenas de amor nas poltronas desconfortáveis de encosto de madeira, deixávamos para fazer isto no corredor do edifício onde ela morava, na rua Santana. No máximo, trocávamos alguns beijos apaixonados no intervalo — afinal, estávamos ali pelo cinema. Porém, quando conseguíamos ir duas vezes na mesma semana, a segunda tarde era dedicada quase que inteiramente ao amor. Foi numa cadeira do Marabá — ou em duas, mais precisamente — que minhas mãos e boca tiveram seu primeiro contato com o seio feminino. Inesquecível. Não entrarei em detalhes sobre tudo o que fiz pela primeira vez no Marabá, mas não exagerem na imaginação, pois nossa primeira relação sexual, a minha e a dela, ocorreu numa noite, atrás do sofá da sala de sua casa… Voltemos ao cinema.

Depois vieram outros programas duplos. Houve Gritos e Sussurros (Bergman) e Amarcord (Fellini), Jules e Jim (Truffaut) e Ascensor para o Cadafalso (Malle), O Mensageiro (Losey) e Petúlia, um Demônio de Mulher (Lester), Janela Indiscreta e Um corpo que cai (ambos de Hitchcock), Cidadão Kane e A Marca da Maldade (ambos de Welles), Paixões que alucinam (Fuller) e O Sétimo Selo (Bergman), O Magnífico (de Broca) e A Malvada (All About Eve, de Mankewicz), West Side Story (Wise-Robbins) e O Criado (Losey), e, comprovando que a loucura tomara conta do programador, houve Andrei Rublev (Tarkovski) e Acossado (Godard), evento que deixou nossas bundas quadradas por longo tempo. Em 1975, após um programa duplo que apresentava Contos da Lua Vaga (Mizoguchi) e Morangos Silvestres (Bergman), comecei a ter aulas à tarde e a estudar para o exame vestibular. Planejava voltar ao Marabá quando entrasse na universidade, em 1976. Só que, neste ínterim, o Marabá morreu para virar garagem. Sim, após Dillinger está morto (Ferreri) fazer dupla com Um Caso de Amor ou O Drama da Funcionária dos Correios (Makavejev) começou a demolição. Ou seja, a glória do Marabá, um cinema de 1800 lugares fundado em 1947, foi sua agonia, a agonia de um querido dinossauro.

Não há mais cinemas de rua em Porto Alegre e também não há nenhuma cinemateca alucinada e radical como o Marabá. Quando as salas menores pareciam ter o poder de reabilitar para nós a gloriosa história do cinema, algo as trouxe para a isonômica mediocridade dos blockbusters. Resta-nos ver os filmes em nossa casa, às vezes na cama, podendo a sessão ser interrompida pelo telefone ou pela campainha da porta. Apesar das imagens perfeitas, não há o ritual de ir ao cinema, nem a sala escura onde somos ininterrompíveis, nem — perversão minha — o divino cheiro de mofo do Marabá, hoje substituído pela fuligem dos automóveis e pelos gritos dos manobristas.

A Cel. Genuíno hoje. Ela é a da direita.

A mesa ao lado pergunta: por que os pais dos alunos não reformam os colégios públicos do RS?

A mesa ao lado pergunta: por que os pais dos alunos não reformam os colégios públicos do RS?

Hoje, ao meio-dia, a mesa de direitistas do Tuim estava impossível. Primeiro. o quarteto afirmou que Temer estaria sendo boicotado pela mídia (?). Depois, decidiram que os pais dos alunos deveriam reformar as salas destroçadas dos colégios públicos gaúchos. Não chega a ser um absurdo, mas ninguém considerou que tais pais — da parcela mais pobre da população — têm enooooooorme tempo livre e, cada um deles, complicadas lutas de subsistência pela frente. Ah, ninguém explicou se o estado daria o material para as reformas… Possivelmente não, pois um deles, absolutamente encantado com a ideia, falou em colocar uma placa na entrada com o nome de todos os pais que reconstruíram o colégio. Também não falaram na segurança e na garantia de um serviço que não seria o mais profissional do planeta.

E depois querem que a gente volte do almoço tranquilo e bem humorado. Pergunto, pode-se dizer que isso seja um descanso? Melhor mergulhar numa leitura qualquer e esquecer do mundo ao redor. Ele pode ser horrível.

Abaixo, fotos de Carlos Latuff tiradas hoje pela manhã no Colégio Paula Soares, em pleno centro de Porto Alegre. Imagina como estão as da periferia.

Paula Soares 1

Paula Soares 2

Paula Soares 4

Paula Soares 3

Concerto da Ospa tem desnecessários insultos de cunho sexista

Concerto da Ospa tem desnecessários insultos de cunho sexista
Carla Cottini
Carla Cottini

É claro que Carla Cottini é bonita e eu estou longe de ser insensível à beleza das mulheres, só que há limites para as expressões de admiração, ainda mais dentro de um teatro. Quem chama de gostosa na rua ou assobia, na verdade está proferindo um insulto. Não tem graça, não aproxima, não nada, é pura ofensa, é dizer e sair correndo. Dia desses, uma colega reclamou que, toda vez que come um picolé na rua, ouve as óbvias grosserias associadas ao ato de lamber. Chamar de gostosa num momento íntimo é uma coisa, ser chamada de gostosa por desconhecidos é outra. É a falsa cantada que revela não somente descontrole e impaciência, mas também desinteresse real, agressividade, frustração e raiva por não poder meter a mão. E não pode mesmo, meu amigo. Acreditava que tudo isto estava claro, ainda mais para uma plateia que vai ver uma Cortina Lírica no Theatro São Pedro.

Pois ontem o soprano Carla Cottini apresentou-se no velho teatro com a Ospa. Linda, num raro vestido de bom gosto, ela ia mostrar sua arte e oferecer sua voz, não seu corpo. (Explico o “raro”: as divas costumam exagerar e ultrapassar por metros a linha da elegância. Ela não.) Mas recebeu assobios de significado inequívoco em sua primeira entrada e, depois, quando concentrava-se para soltar a voz, um espectador atroz largou um suspiro daqueles bem vulgares e inoportunos. Carla respondeu com um sorrisinho sem graça e tratou de ser profissional. Conseguiu.

Intermezzo: O público do Theatro São Pedro é de contumaz baixo nível. Aplaude entre os movimentos, faz comentários em voz audível, etc. É bem diferente do que acontece na Ufrgs. Fim do intermezzo.

Para mim, é um prazer ver uma bela mulher, ainda mais quando canta maravilhosamente como Carla. Também é um prazer ver qualquer um ou uma cantando maravilhosamente, mas confesso preferir o primeiro caso. Porém, quando um machinho imbecil assobia ou faz sons pseudo-sensuais em pleno teatro, não é engraçado e ainda faz com que todo fascínio caia escada abaixo. É bagaceiro, nada tem a ver com a arte. Agora, meu amigo, se tu precisas mesmo homenagear a moça, há bons banheiros no Theatro São Pedro e eles aceitariam silenciosamente tua masturbação. E seria menos escroto.

.oOo.

O clarinetista da Ospa Augusto Maurer, presente no concerto, já tinha escrito o mesmo em seu perfil do Facebook:

Sabem quando se sente vergonha alheia? Como ontem, no apupo à soprano por parte de um engraçadinho na cortina lírica da OSPA no Theatro São Pedro.

Só hoje li, ao arquivar o programa (pois presto pouca atenção a currículos artísticos, facilmente maquiáveis), que a moça, assídua solista nas raras casas de ópera nacionais, estudou canto na Espanha e também tem formação em artes cênicas, ballet clássico e jazz. Juro que não sabia onde me esconder. Orgulho de ser gaúcho.

Caminhando para o trabalho

Caminhando para o trabalho

Venho diariamente a pé para o trabalho. Saio em horários muito próximos. Às vezes às 7h10, outras às 7h20 e, se estiver muito atrasado, às 7h40. Quando se caminha numa cidade como Porto Alegre, a gente tem que estar atento a quem está próximo. Ainda não fui roubado, mas é somente questão de tempo, se depender de nosso governador. Ando com fones de ouvido, ouvindo um CD completo cada manhã, sempre de música erudita ou jazz. E vejo como os grupos de cada horário se repetem de forma diferente.

Ali do lado direito, eu poderia estar descendo a Rua da Praia | Imagem distorcida: Google Maps
Ali do lado direito, eu poderia estar descendo a Rua da Praia | Imagem distorcida: Google Maps

Se saio no primeiro horário, logo vejo o homem negro no café em frente ao Colégio Rosário. Ele sempre usa alguma coisa do Inter em sua roupa. Não o vi hoje, pois saí no terceiro horário, mas tenho certeza que ele estaria com um abrigo perfeitamente colorado, defendendo-se do frio. Ele come torrada e bebe de uma xícara grande. Acho que café com leite. Ainda no primeiro horário há a loira alta e desajeitada que agora passou a usar óculos para deter a luz de seu olhar azul. Ela é muito apressada, tem menos de 20 anos e, pela pressa, dorme muito ou demora para sair.

Saindo no segundo horário, os das 7h20, há o guri dos músculos. Ele sempre dá um jeito de mostrar seus bíceps ou outra coisa que julgue poderosa. Como faço este caminho há quase três anos, sei que suas tatuagens têm menos de um e mostram lutas terríveis entre pássaros e cobras. Tenho vontade de lhe perguntar porque ele desenhou no braço uma galinha comendo uma minhoca, mas é melhor não. Neste horário, temos também o grupo de estudantes que desce a Independência de skate pelo corredor de ônibus e lotações. Mas eles passam muito rápido e jamais os reconheceria.

No terceiro horário, temos a velha anoréxica e o velho das meias. A velha anoréxica é isso mesmo. Ela caminha e treme um pouco a cada passo. É como se fosse cair de tão magra. A coitada deve trabalhar demais e seu cabelo, repartido do lado, toma-lhe tempo, porque é visível e minuciosamente alisado, formando uma franja estilo Hitler que lhe cobre diagonalmente a testa. Lava roupas em casa, pois algumas vezes carrega uma trouxa branca. Já o velho das meias fica na frente de um edifício quase na Senhor dos Passos. Ele e mais dois amigos ficam conversando, creio que sobre futebol ou fazendo observações sobre as mulheres que passam. Ouvi alguma coisa rapidamente. Certamente tem problemas circulatórios, pois usa meias de compressão para ajudar na circulação de sangue nas pernas. No verão, usava bermudas e as tais meias. Eu sempre olhava para elas. Tem um grande queixo de prognata e olhos de gente que se irrita facilmente. Como saí tarde, hoje foi o dia em que os vi.

Mas há muito mais. Temos a perua da Praça Dom Feliciano que desce na direção da Pinto Bandeira, o barítono cego vendedor de bilhetes que grita olha a megasena premiada e minha preferida, a vendedora de jornais da esquina da Rua da Praia com a Borges. Quando compro alguma coisa dela, sempre pergunto o preço e ela me responde terminando a frase com amado. Tem ar de mãe de toda a Borges e sorri muito. Um dia, estava perigando chover e ela me mandou apressar o passo.

Quando subo a Travessa Acelino de Carvalho, que liga o calçadão da Rua da Praia à Rua Andrade Neves, sinto o cheiro do mijo de quem passou ali à noite e a moça da lancheria à direita que quase sempre me dá bom dia. E chego ao edifício onde trabalho. Nosso porteiro é um gremista meio de lua que raramente diz alguma coisa quando chego. Afinal, está concentrado no jogo de xadrez do computador.

Um comentário sobre o fracasso de Porto Alegre e do RS

Um comentário sobre o fracasso de Porto Alegre e do RS
Fortunati e Sartori, sem projeto para a cidade e o estado | Foto: Ivo Gonçalves / PMPA
Fortunati e Sartori, uma dueto de dois | Foto: Ivo Gonçalves / PMPA

Os métodos de Sartori e Fortunati para darem notícias impopulares estão cada vez mais parecidos. Assim como ambos escolheram passar suas férias em longínquos cruzeiros, a sexta-feira à tarde é o dia preferido da dupla. Na última sexta-feira, por exemplo, a prefeitura avisou que o aumento das passagens de ônibus seria anunciado no início da tarde. Já passava das 15h e nada. Uma colega dizia: “Quanto mais tarde pior”. Não deu outra. O que veio foi um valor abusivo, um verdadeiro disparate que, absurdo dos absurdos, entraria em vigor segunda-feira sem passar pelo Comtu (Conselho Municipal de Transportes Urbanos). Sabemos que o Comtu é inútil por estar na mão da prefeitura, mas ele jamais tinha recebido o escárnio de quem o ama. É que Fortunati aprendeu com Sartori que é seguro jogar a bomba e correr rapidamente para o esconderijo do fim de semana.

O comparativo do valor da tarifa porto-alegrense contra a inflação é uma coisa que vale a pena ser vista. Corrigido pela inflação, o valor da passagem bateria hoje em R$ 1,94, mas a gente paga R$ 3,75. Não creio que a categoria dos rodoviários tenha dobrado seu poder aquisitivo, nem que os insumos tenham aumentado quase 100% ou que o número das pessoas que não pagam passagem tenha aumentado tanto. Tudo indica para a proteção dos transportadores por parte da prefeitura. Sim, esses mesmos que estão aí há décadas, ganhando licitações. Licitações… Vejo poucos setores mais adequados à estatização do que o do transporte coletivo. Já imaginaram o que diriam os jornais de direita se a Carris aumentasse seu próprio valor? Já os donos das empresas deitam e rolam.

Clique no gráfico para aumentá-lo
Clique no gráfico para aumentá-lo | Fonte: https://www.facebook.com/MeuOnibusLotado/

Em Porto Alegre, somos governados há mais de uma década pelos lamentáveis Fogaça e Fortunati — eles são prefeitos desde o infeliz dia 1º de janeiro de 2005 com seus partidos PPS, PMDB e PDT — e, basta olhar, a cidade está uma merda, realmente abandonada, Porto Alegre fracassou. Ontem, por exemplo, fui até aquela pracinha que fica na esquina da Vasco da Gama com a Ramiro Barcellos. Zona nobre, cheia de eleitores do Fortunati. E havia ainda árvores do temporal de 29 de janeiro sobre os aparelhos de ginástica para idosos! Infelizmente, eu estava sem celular para fotografar. Também estava sem relógio e com pouco dinheiro. E por que saio assim? Ora, por causa da cidade. O pouco policiamento ocorre por culpa do governo estadual e tenho a sorte de ter passado até hoje ao largo dos ladrões, dos taxistas criminosos, dos tiroteios à luz do dia, das execuções sumárias.

Mas não passo ao largo do receio de que algo de violento aconteça e vejo o resto. O resto é a sujeira das ruas, os Centros Culturais fechando por falta de pagamentos ou agonizando, as notícias cada vez mais dantescas, a falta de resistência e de projetos para a cidade e o estado. Porto Alegre e o Rio Grande do Sul estão efetivamente muito burros e se fazem representar por pessoas de baixo calibre. E não adianta eu me consolar pensando que não votei em Sartori e Fortunati e muito menos em Lasier e Ana Amélia. Nem que aquele meu conhecido pseudo-popular não se elegeu. (Ele me disse que desejava ser deputado em função da aposentadoria).

Como escreveu meu amigo Leandro Gejfinbein no Facebook, a maioria de nossos atuais políticos — à direita e à esquerda — são bundões. O bundão (ou bunda mole) é aquela pessoa sem ação, incapaz de sair de qualquer situação que apresente alguma dificuldade. Se não há criatividade, se não há ideias novas, o que faz o político gaúcho chegar aos cargos de comando são apenas a vaidade, a proteção aos amigos e o direito — tanto pessoal quanto de seu partido — de arrancar uma beira de empreiteiras e outros que tais.

A mentira grassa. Peço desculpas, mas o vídeo da campanha do governador Sartori que mostro abaixo me provoca riso. Não temos humoristas tão bons quanto ele. Vejam o que nos prometeu em termos de segurança.

Enquanto isso, vamo-nos acadelando e engolindo tudo, desde o cais virando shopping, até a violência interna e as contas bloqueadas pela União. Já perdemos os anéis e os dedos.

O negócio é ir pra rua reclamar e, quem sabe, ficar lá por muito tempo.

Ontem, dia do aumento das passagens, Fortunati e Mello (vice) inauguraram lixeiras. Não sei o que ambos têm na cabeça. | Foto: Ricardo Giusti / PMPA
Ontem, dia do aumento das passagens, Fortunati e Mello (vice) inauguraram lixeiras. Não sei o que ambos têm na cabeça. | Foto: Ricardo Giusti / PMPA

O bem que Fortunati causou à Ponte dos Açorianos, hoje um criadouro de Aedes aegypt

O bem que Fortunati causou à Ponte dos Açorianos, hoje um criadouro de Aedes aegypt

Em poucos anos, nossa querida Ponte dos Açorianos foi de cartão postal a criadouro de Aedes aegypti. Vejam nas fotos baixo, a Ponte em 2008 e agora. José Fortunati é nosso prefeito deste a longínqua e triste data de 30 de março de 2010.

Segundo a Wikipedia, A Ponte de Pedra dos Açorianos é um monumento histórico da cidade de Porto Alegre. Está situada no chamado Largo dos Açorianos, que abriga também outro conhecido monumento da cidade, o Monumento aos Açorianos.

A ponte de pedra substituiu uma primitiva ponte de madeira erguida quase no mesmo local por volta de 1825. Várias vezes reconstruída em razão dos estragos causados pelas enchentes e pela deterioração natural da madeira, foi fechada ao trânsito em março de 1848, altura em que já estavam quase finalizadas as obras para uma nova ponte, mandada edificar já em 1843, antes do fim da Guerra dos Farrapos, pelo Duque de Caxias, então presidente da província.

A nova obra deveria ser mais durável e, por isso, foi construída de alvenaria de pedra. O construtor designado foi João Batista Soares da Silveira e Sousa, que utilizou escravos como mão de obra, num custo de 980 contos. A obra foi aberta ao público em 1848, ainda inacabada, e só foi concluída em 1854. A ponte cruzava um dos braços do arroio Dilúvio, que se bifurcava onde hoje está o Colégio Estadual Protásio Alves, e representava a única ligação entre o Arraial (pequeno vilarejo) do Menino Deus e o Centro Histórico de Porto Alegre.

Veja as fotos:

Ponte de Pedra dos Açorianos na década de 30
Ponte de Pedra dos Açorianos na década de 30
Em 2008 | Ricardo André Frantz
Em 2008 | Ricardo André Frantz
Em 9 de junho de 2015 - Lago sobre a Ponte dos Açorianos, também conhecida como Ponte de Pedra. Foto: Guilherme Santos/Sul21
Em 9 de junho de 2015 – Lago sobre a Ponte dos Açorianos, também conhecida como Ponte de Pedra. Foto: Guilherme Santos/Sul21
Ontem | Foto: Ladeira Livros
Ontem | Foto: Ladeira Livros
Ontem | Foto: Wladymir Ungaretti
Ontem | Foto: Wladymir Ungaretti

3 providências que caem de maduras para que a cidade não sofra tanto com os temporais

3 providências que caem de maduras para que a cidade não sofra tanto com os temporais

1. Geradores de emergência nas estações do Dmae.

Esse negócio de faltar água em razão da ausência da eletricidade é de última. É um problema conhecido há vários carnavais. Nenhuma estação de tratamento de água do Dmae tem gerador de emergência, dependendo inteiramente da eletricidade para bombear água. Assim, a falta de luz sempre antecede a de água. O problema é conhecido, ocorreu repetidas vezes e é urgente. Dizem que tais geradores são caríssimos, mas pensem no que deixa de faturar o Dmae no período de, por exemplo, dez anos, com todas as faltas d`água somadas. E, sobretudo, pensem na Santa Casa operando com carros pipa, no Hospital de Clínicas fechando o atendimento, no consumo de garrafões de água nos supermercados… E ontem alguns não tinham nem garrafões, nem velas, nem fósforos!

Todo mundo no Zaffari recarregando o celular. Eles têm geradores Dmae! | Foto: Lipsen Lipsen
Todo mundo no Zaffari recarregando seu celular. Dmae, é que eles têm geradores! | Foto: Lipsen Lipsen

2. SMAM de olho nas árvores.

Bem, querida Smam. Eu acho que é muito simples identificar as árvores mortas. Basta andar pelas ruas e observar as que não têm folhas. Então, quando uma dessas for encontrada — hoje corri pela Redenção e vi várias — basta cortá-la e substituí-la por uma muda novinha. Isto é constrangedoramente simples. Se quisermos maior sofisticação, podemos retirar os parasitas que via de regra envolvem os troncos das árvores velhas e podar algumas das mais “perigosas” em razão da proximidade com os fios de luz. E, por falar em fios de luz…

3. Rede elétrica subterrânea.

Viver sem luz já é complicado. Muita gente depende dela para fazer nebulizações ou para descer em elevadores. Ontem, uma senhora estava sozinha em seu apartamento no oitavo andar. Tinha o fêmur fraturado e só poderia descer de elevador… Ligava para as rádios pedindo ajuda… É perfeitamente possível a instalação de uma rede subterrânea em lugar desses postes cheios de fios. Só não é feito em razão do alto custo. Sim, deve ser caro. E não precisamos ir à Europa ou aos EUA para ver lugares onde os fios estão enterrados. Há cidades brasileiras assim. Boa parte do Rio de Janeiro já é assim. Em Gramado a fiação está sob o solo. Sim, em nossa querida Bavária de Plástico! E o custo do que ocorreu neste fim de semana em Porto Alegre? Além dos doentes, isto é, do custo humano, há o custo dos alimentos estragados nas geladeiras e mais uma lista de problemas. Imagina um dono de um restaurante vendo impotente sua comida apodrecer? O negócio, CEEE, é começar a rede elétrica subterrânea aos poucos. Quando se refizer o asfalto de uma rua, por exemplo, pode-se examinar a possibilidade de retirar os fios aéreos. Que tal?