Homenagem ao Clássico Desconhecido

Homenagem ao Clássico Desconhecido

Não, não pensei muito. Peguei a escada e procurei, a partir da letra A, os livros de que gosto muito e sobre os quais o mundo silencia. Encontrei vários. A “santa” tarefa de resgate de minhas obras-primas pessoais não me tomou muito tempo e é uma lista arbitrária que só vai de A a M, pois me apavorei com o número de livros sobre a mesa quando retirei da estante as folhas de papel A4 que formam a 19ª obra. Os de M a Z virão depois, sei lá quando. Meu critério é o descritério. Por exemplo, deixei de fora Hamsun, por considerá-lo “famoso demais” e incluí George Eliot. Vá entender. Alguns dos insuficientes textos explicativos que acompanham cada obra foram retirados de orelhas dos livros; outros, de obras sobre literatura; porém a maioria saiu perigosamente de minha cabeça.

Norberto Martini (10)

1. O Homem Amoroso, de Luiz Antonio Assis Brasil. Mercado Aberto, 1986, 118 p.: O elegante Assis Brasil, ex-violoncelista da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre, sai do sério ao compor de forma irônica e naturalista esta novela que descreve as vivências de um músico erudito gaúcho, durante o “milagre brasileiro” dos anos 70 e seu neo-ufanismo. Para encontrar, só em sebos.

2. Extinção, de Thomas Bernhard. Companhia das Letras, 2000, 476 p.: Bernhard talvez venha a tornar-se inevitavelmente um clássico, se já não o é. É um enorme romancista e dramaturgo austríaco que costuma despejar seu ódio contra a pequena burguesia e os intelectuais de seu país. Destaco a notável descrição de sua família, realizada em duzentas paginas, enquanto o narrador observa uma (apenas uma) foto que retrata, se não me engano, apenas duas ou três pessoas. Livro novo, fácil de achar.

3. Noturno do Chile, de Roberto Bolaño. Companhia das Letras, 2004, 118 p.: O narrador, testemunha do tempo que precede o assalto ao poder pelo general Pinochet e seus sequazes, repassa a sua vida num monólogo febril, reconstruindo dois momentos especiais da vida chilena – antes e depois do golpe. Este narrador, Lacroix, é um religioso ainda aferrado aos dogmas da Igreja, que não dispensa a sua batina surrada, usando-a como se fosse uma bandeira. Fácil de achar, assim como Os Detetives Selvagens.

4. Opiniones de un Payaso, de Heinrich Böll. Barral Editores, 1974, 244 p.: Hans Scheiner é um palhaço de circo que perde todos os seus bens durante o pós-guerra. Trata-se de um ateu muito propenso à melancolia e à monogamia. Mas seus problemas não terminam aí: sua mulher Maria o abandona por outro homem, um católico, com o qual se identifica. Por trás desta catástrofe emocional e material, pode-se ver um homem íntegro, que suporta sua queda com sarcasmo.Um grande livro. À venda na Internet por 16 Euros.

5. Fique Quieta, Por Favor, de Raymond Carver. Rocco, 1988, 240 p.: Grande contista americano homenageado por Robert Altman em Short Cuts . Este livro, assim como a coletânea Short Cuts, também da Rocco, é mais uma prova da boa influência de Tchékhov sobre a literatura atual. Vá ao sebo.

6. A História Maravilhosa de Peter Schlemihl, de Adelbert von Chamisso. Estação Liberdade, 1989, 111 p.: A história curiosíssima do homem que se vê marginalizado e perseguido após vender sua sombra ao Diabo. Até hoje a obra sofre todo o tipo de interpretações, mas o próprio autor nega a alegoria e critica aqueles que preocupam-se em saber o que significa a sombra. Este genial livrinho foi há pouco reeditado.

7. Uma Vida em Segredo, de Autran Dourado. Difel, 1977, 181 p.: Acanhada e deixando-se sempre levar pelas circunstâncias, a prima Biela é boazinha e vive conscientemente uma vida de renúncias. A comparação entre a prima Biela e a Felicité de Un Coeur Simple de Flaubert não obscurece a força da linguagem barroca do Autran Dourado em plena forma de 1964. Milhares de reedições.

8. Middlemarch, de George Eliot. Record, 1998, 877 p.: Desde Shakespeare e Jane Austen, ninguém criara personagens tão inesquecivelmente vivos. É o romance da vida frustrada de Dorothea, que casa-se com o pseudo-intelectual Causabon por um ideal de cultura e tenta desfazer seu casamento e refazer sua vida. O romance é um espetacular panorama das atividades e da moral de uma pequena cidade inglesa de 1830. Canta a tua aldeia e serás universal… George Eliot é o pseudônimo masculino de Mary Ann Evans. Só encontrável em sebos, parece-me.

9. Contos Completos, de Sergio Faraco. L&PM, 1995, 304 p.: Faraco é, disparado, o melhor contista vivo brasileiro e isto não é pouco. O livro foi reeditado no ano passado. Trata-se de um artesão tão econômico quanto rigoroso com as palavras. Sua capacidade de apresentar personagens com um grau de densidade psicológica inversamente proporcional à secura do ambiente, assim como sua maestria na invenção de enredos o tornam obrigatório. Recém relançado.

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Meus dez livros preferidos

Novamente me pedem para fazer uma lista de meus dez melhores livros. Já fiz várias dessas e acho até que outra(s) por aí no blog. Mas vamos lá, vou escrever a listinha de um jato, em um minuto, e vocês prometem não lê-la, certo?

  • Dom Quixote, Cervantes.
  • Moby Dick, Melville.
  • Doutor Fausto, Thomas Mann.
  • Uma Confraria de Tolos, John Kennedy Toole.
  • Grande Sertão: Veredas, Guimarães Rosa.
  • Entre Heróis e Tumbas, Ernesto Sabato.
  • Berlim Alexanderplatz, Alfred Döblin.
  • Ulysses, James Joyce.
  • Middlemarch, George Eliot.
  • Os Irmãos Karamázov, Dostoiévski.
  • Ana Karênina, Tolstói.
  • A Vida e as Opiniões de Tristram Shandy, Laurence Sterne.
  • A História Maravilhosa de Peter Schlemihl, Adelbert Von Chamisso.

Cheguei aos 10? Tem 13? Kafka e Machado de Assis fora? E Virginia Woolf? E meu amado Jonathan Swift? Putz. Não, é sem revisão. Deixa assim. Quem quiser que retire três deles.