O melhor de 2008 segundo este blogueiro

O Digestivo Cultural resolveu publicar meus pitacos sobre o melhor que tivemos no ano passado. O foco é a literatura e o cinema. Leiam aqui.

Abaixo, o texto completo:

Raramente nos aproximaremos de um grupo de pessoas e estas, sejam elas quais forem, estarão discutindo literatura. Ou, se estiverem, dificilmente o livro discutido é recente. A cultura comum, a cultura como assunto de conversa é o cinema ― e olhe lá ―, não a literatura. Digo isso porque 2008 foi o ano em que finalmente pudemos discutir um livro que muitos tinham lido, ou que muitos tinham ouvido falar e sabiam do que se tratava e que era escrito por um escritor, não por uma Bruna Surfistinha. 2008 foi o ano de um livro escrito em 2007: O filho eterno, de Cristovão Tezza. Só isso já bastaria para que escondêssemos nossas previsões apocalípticas na gaveta à esquerda.

Espécie de relato autobiográfico disfarçado de romance, o livro de Tezza narra a dilacerante relação entre um pai escritor e seu filho, vítima da Síndrome de Down. É um livro que impressiona tanto pela franqueza e coragem da exposição quanto por seu texto. Tezza faz um livro de frases longas e que não deseja comprar o leitor com facilidades. Mereceu a chuva de prêmios que caiu-lhe sobre a cabeça: o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte no ano passado, o Portugal Telecom, o Jabuti de melhor romance, o Prêmio Bravo de Literatura e a primeira edição do recém criado Prêmio São Paulo de Literatura ― o certame que mais pagou a um autor no Brasil: R$ 200 mil.

No terreno das estréias, Pó de parede, de Carol Bensimon, foi o melhor de 2008. Formado de três novelas de boas histórias e esplendidamente escritas, o volume não é o tradicional livro de estréia autobiográfico e íntimo; é antes uma música de câmara elegante, leve e tranquila, que evoca realidades externas com algum desencanto. A voz da autora é incomum, mas a linguagem não é exagerada ou cansativa. Nenhuma das três histórias é esquecível, mas minha preferência vai para “Falta céu”, onde, a partir de poucas informações, uma situação bastante complexa é construída. Bensimon deixa lacunas a serem preenchidas pela experiência do leitor e consegue direcionar e surpreender nossa fantasia. É autora para se acompanhar de perto.

No plano internacional, o melhor romance que li foi El común olvido, de Sylvia Molloy. O livro é de 2002! Incompreensível que nunca tenha sido traduzido no Brasil. Narrado na primeira pessoa, inicia-se com a chegada de Daniel ao Aeroporto de Ezeiza, em Buenos Aires, com as cinzas de sua mãe. Ele emigrara para os Estados Unidos ainda criança, logo após a separação dos pais, acompanhado da mãe. Poucas vezes tinha retornado à Argentina e o pai já morrera há anos. Daniel fala de si, de sua profissão de tradutor, da tese que escreve, mas o foco logo se altera. Este “Em busca da mãe perdida” torna-se uma arrebatadora demonstração dos enganos de nossa memória, levada com virtuosismo pela autora. Cada item que é acrescentado ou retificado em sua memória, cada acontecimento ― a sexualidade da mãe, o acidente de carro, as brigas com o pai, a apresentação da amante da mãe ―, torna impossível o retorno à vida anterior. As retificações e questionamentos são apresentados pela autora com a mesma lentidão e tranqüilidade com que Kafka comprazia-se ― ou parecia comprazer-se ― em mostrar coisas que nos parecem verdadeiros horrores não por si, mas pelo deslocamento a que sua aceitação nos obriga. É importante dizer que Molloy tem de Kafka apenas a característica de ser imperturbável, pois seu humor e elegantes anedotas são tipicamente platinas.

Acho que nunca vi tantos filmes regulares como em 2008. Pouca coisa era agressivamente ruim e quase nada era indiscutivelmente bom. Mas acho que dá para salvar 4,5 filmes. Podemos começar por O Segredo do Grão, de Abdel Kechiche, um filme de visceral realismo que tem como tema a singela inauguração de um restaurante dentro de um barco numa cidade portuária da França. Trata do choque cultural entre a comunidade árabe e a francesa, mas é universal ao descrever detalhadamente conflitos familiares. A câmara móvel de Kechiche é apenas aparentada dos filmes do Dogma 95, pois ela não serve para demonstrar movimento ou despojamento, estando mais a serviço da busca de ângulos originais, muitas vezes aproximando-se dos atores como se quisesse penetrá-los ou acariciá-los.

Outro grande filme foi o romeno 4 meses, 3 semanas e 2 dias, de Cristian Mungiu, Palma de Ouro de 2007. Ele conta a história de duas colegas de quarto obrigadas a uma verdadeira odisséia para que uma delas pudesse realizar um aborto ilegal na Romênia de Ceaucescu. É um filme sem a menor preocupação moral ou religiosa. Descreve como as duas fizeram para livrar-se de um incômodo. Gabita, a grávida, deixa a operacionalização do aborto para Otilia, sua amiga. Gabita parece indiferente enquanto Otilia faz contatos com aborteiros, porteiros ― todos pequenos ditadores cheios de mistérios ― e depois trata de livrar-se do corpo do inquilino da amiga. Estes dois filmes têm algo em comum: ambos têm longas cenas que causam enorme angústia ao espectador.

E sim, os dois filmes dos irmãos Coen foram excelentes. Em No country for old men (Este país não é para velhos em Portugal e um título qualquer no Brasil), a acidez dos Coen cai adequadamente para narrar com frieza uma história amalucada e violenta. Meio western, meio thriller, quase sem trilha sonora e com cenas antológicas, é um grande filme. Já Burn after reading (surpreendentemente Queime depois de ler no Brasil) tem a paranóia americana como alvo. É um filme que conta muita coisa em círculos, não chega a lugar algum e nem deseja, mas nos arranca boas risadas. A cena de George Clooney em pânico por motivos que o espectador sabe serem falsos vai para minha galeria pessoal de momentos inesquecíveis.

Disse 4,5 filmes? Pois é, o 0,5 é do excelente Vicky Cristina Barcelona de Woody Allen.

E o Prêmio de Maior Mico de 2008 vai para o discursivo homem de cuecas: Batman: O Cavaleiro das Trevas.

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

A secretária Mônica Leal não deixa você em paz nem na praia: olha o Verão Sociocultural aí, gente!

O leitor Jorge Wagner — que certamente não é o meiocampista do São Paulo — nos mostra o motivo pelo qual a Secretária de Cultura de nosso estado, Mônica Leal, anda tão fora do noticiário. Ela está ATRÁS DE VOTOS nas praias:

A farsa chamada Verão Sociocultural

Um verdadeiro circo montado pela Secretaria da Cultura do Estado está sendo montado nas praias gaúchas. É o Verão Sociocultural, evento com shows populares de gosto duvidoso, com uma principal razão: promover a secretária Mônica Leal.

Funciona assim: em cada final de semana o palco é levantado em uma praia diferente. Todos artistas são devidamente treinados para promover pessoalmente a secretária, citando repetidamente seu nome no palco. A maioria dos artistas, como o funkeiro MC Jean Paul, é escancaramente apoiada pela SEDAC. Não é culpa deles. Sentem-se obrigados a retribuir o “apoio” e a “oportunidade”.

Jean Paul agradece publicamente, por exemplo, a secretária por tê-lo levado até o Japão para se apresentar no ano passado. Sexta-feira (09/01) a abertura aconteceu em Santo Antônio da Patrulha para um pequeno público, majoritamente formado por crianças e adolescentes. Apesar da boa presença da Brigada Militar e de politicos locais, incluindo o prefeito, ninguém se importava com a quantidade de menores comprando e consumindo bebidas alcóolicas.

O evento têm muitos patrocinadores. Todos de órgãos e empresas do Estado. Duas empresas privadas patrocinam também, mas não querem aparecer para não ligar sua imagem a shows popularescos. Apesar de gratuito e na praia, o Verão Sociocultural (cultural?) ainda não emplacou. São Pedro tem ajudado!

Com efeito, o site do Governo do Estado (em maiúsculas apenas para efeito dramático) nos dá detalhes sobre a interessante promoção “cultural” de moniqueta. Desta forma, descobrimos que a SEDAC dá chance a artistas importantes como o MC Jean Paul, Vinny Lacerda, Família Seguidores, Grupo Matizes, e o grupo de hip hop Pesadelos do Sistema que talvez traga como atração a própria Mônica Leal.

Neste ano, TAIS HORRORES assombrarão 17 cidades — entre praias do Litoral Norte, Sul e Costa Doce — sempre pelo Verão Sociocultural. As apresentações terminarão rigorosamente às 24h, conforme determinação da lei de silêncio dos municípios. Ah, bom.

A TURMA DA MÔNICA é patrocinada pelo Banrisul, Caixa RS, CEEE, Sulgás e Corsan. A secretária pontifica: “Oportunizar para veranistas, moradores e turistas shows de músicos do Rio Grande do Sul é divulgar a cultura da nossa terra e da nossa gente”. Que maravilha, eu sempre quis assistir à Família Seguidores!

Como é que eu vou perder essa? Não é uma tremenda curtição? Uhu! Eu gostaria de levar o Pedro Américo Leal para um hip hopezinho! Uhu!

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

José Saramago, Gabriel García Márquez e Ela

Dois escritores de línguas latinas, dois velhos, um com 83 anos, outro com 77, os dois ganhadores do Prêmio Nobel, ambos mestres reconhecidos mundialmente e homens de esquerda, publicaram livros em 2005. Como se não bastasse, o tema de As Intermitências de Morte e de Memória de Minhas Putas Tristes é o mesmo: a morte. E são, apesar de se utilizarem de abordagens inteiramente diferentes, excelentes romances, vivos, belos e otimistas, apesar do realismo de ambos impedir quaisquer frases menos claras do que esta de García Márquez: “Faça o que você fizer, neste ano ou em cem, você estará morto para sempre e jamais”.

E aqui cessam as semelhanças, pois talvez a intenção e a expectativa dos dois sejam diversas. Se Saramago escreveu um de seus melhores livros, uma obra muito ambiciosa e original, García Márquez criou um delicado divertimento, uma obra menor – o que não é demérito nenhum -, que fica no terreno do onírico e do poético. Porém, paradoxalmente, o livro de Saramago, aquele que não é um “divertimento”, é engraçadíssimo e posso dizer que há anos não ria tanto lendo um livro.

(Gostaria de acalmar meus 7 leitores dizendo-lhes que não contarei as histórias dos livros. Na verdade, duvido que alguém NÃO tenha comparado estes dois livros ainda. Mas pesquisei no Google e não encontrei nada… Adiante!)

As Intermitências de Morte pode ser dividido em duas partes; a primeira é a mais cômica e descreve o momento em que a morte desiste de matar os habitantes de um pequeno país. Este passa a crer-se como protegido por Deus, há euforia e atmosfera de orgulho no ar, porém a governo e a Igreja incomodam-se muitíssimo. Depois a morte volta a atuar, mas de outra forma, e acaba tendo sérios problemas com um habitante, o qual não consegue absolutamente matar. O caráter da Morte de Saramago é bem diferente do que vemos usualmente em obras artísticas. Trata-se apenas de uma burocrata com, digamos, excessivo poder e que organiza seu trabalho em fichas. Às vezes, ela se atrapalha, estando bem distante daquela Morte imaginada por Bergman em O Sétimo Selo e que aceita jogar xadrez com sua vítima, demonstrando ser uma jogadora suja e implácavel. A segunda parte dá notável e justo destaque à 6ª Suíte para Violoncelo Solo de J. S. Bach, que é eleita pelo autor como uma espécie de símbolo da imortalidade , o qual é respeitado e admirado até pela Morte. Aqui o romance torna-se mais reflexivo e lento, estamos dentro do terreno do destino inexorável e o senso de estilo de Saramago dobra-se e adapta-se perfeitamente a este clima, levando-nos a um final literária e literalmente arrepiante.

García Márquez optou por ser bem mais modesto. Se Saramago apresenta-nos a Morte “viva”, movendo-se e dialogando como Thomas Mann fez com o Demônio num dos capítulos mais gloriosos de toda a literatura, García Márquez dá a uma prostituta de 14 anos a representação da morte. O personagem principal e narrador, um jornalista de 89 anos ainda em atividade e que manteve-se solteiro por toda sua vida, pede uma menina ainda virgem a sua velha amiga cafetina, no dia em que completará 90 anos. Esta menina chama-se Delgadina, provavelmente uma ironia para com a figura da morte, sempre delgada e elegante em sua existência de puro-osso. Delgadina – sempre cansada do trabalho – costuma permanecer dormindo nas “noites de amor” com o velho, que parece descobrir pouco a pouco a vantagem de nunca acordá-la e de deixar-lhe apenas mimos, enquanto a jovem prostituta reclama para a cafetina o fato de nunca ser acordada e de ainda ser virgem… Porém, nem sempre ele conseguirá que seja assim.

Trata-se de um livro mais leve, poético e “fácil”, mas, se tivesse que sugerir leituras de férias a meus 7 leitores, sugeriria os dois livros; mas, se fosse obrigado a escolher apenas um, os mandaria direto ao assunto, direto a Saramago.

Para terminar, gostaria de destacar mais uma curiosíssima coincidência entre os livros:

García Márquez: Às quatro horas tentei me apaziguar com as seis suítes para cello solo de Johann Sebastian Bach, na versão definitiva de dom Pablo Casals. Acho que é o que de mais sábio existe em toda a música, mas em vez de me apaziguar como de costume me deixaram num estado da pior prostração.

José Saramago (utilizo a mesma grafia do romance): Por um instante a morte soltou-se a si mesma, expandindo-se até as paredes, encheu o quarto todo e alongou-se como um fluido até a sala contígua, aí uma parte de si deteve-se a olhar o caderno que estava aberto sobre uma cadeira, era a suite número seis opus mil e doze em ré maior para violoncelo de johann sebastian bach composta em cöthen e não precisou ter aprendido música para saber que havia sido escrita, como a nona sinfonia de beethoven, na tonalidade da alegria, da unidade entre os homens, da amizade e do amor. Então aconteceu algo nunca visto, algo não imaginável, a morte deixou-se cair de joelhos, era toda ela, agora, um corpo refeito, por isso é que tinha joelhos, e pernas, e pés, e braços, e mãos, e uma cara que entre as mãos se escondia, e uns ombros que tremiam não se sabe porquê, chorar não será, não se pode pedir tanto a quem sempre deixa um rasto de lágrimas por onde passa, mas nenhuma delas que seja sua.

Sim, Bach, sempre ele, o homem de obras elas quase tantas como foram as da criação (ainda Saramago), Bach e suas suítes para violoncelo solo, aquelas mesmas que dou a tantos amigos, que falam como os homens, que trazem a humanidade em si e que podem tornar a morte humana, ao menos na arte.

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Um semana, um texto: O Manifesto de Gandhi sobre a questão judaico-palestina

Um comentarista autodenominado Exigente, do blog de música erudita P.Q.P. Bach, publicou um Manifesto de Mahatma Gandhi (1869-1948) sobre a questão judaico-palestina. Foi escrito em 1938 porém seu conteúdo, feitas as reservas à linguagem e à religiosidade é absolutamente claro e compreensível, apesar de referir-se aos anos 30 do século passado. Foi publicado em My Non-Violence, editado por Sailesh K. Bandopadhaya, Navajivan Publishing House, Ahmedabad, 1960.

Harijan, em 26 de novembro de 1938.

“Recebi muitas cartas solicitando a minha opinião sobre a questão judaico-palestina e sobre a perseguição aos judeus na Alemanha. Não é sem hesitação que ouso expor o meu ponto-de-vista.

Na Alemanha as minhas simpatias estão todas com os judeus. Eu os conheci intimamente na África do Sul. Alguns deles se tornaram grandes amigos. Através destes amigos aprendi muito sobre as perseguições que sofreram. Eles têm sido os “intocáveis” do cristianismo; há um paralelo entre eles, e os “intocáveis” dos hindus. Sanções religiosas foram invocadas nos dois casos para justificar o tratamento dispensado a eles. Afora as amizades, há a mais universal razão para a minha simpatia pelos judeus. No entanto, a minha simpatia não me cega para a necessidade de Justiça.

O pedido por um lar nacional para os judeus não me convence.

Por quê eles não fazem, como qualquer outro dos povos do planeta, que vivem no país onde nasceram e fizeram dele o seu lar?

A Palestina pertence aos palestinos, da mesma forma que a Inglaterra pertence aos ingleses, ou a França aos franceses.

É errado e desumano impor os judeus aos árabes. O que está acontecendo na Palestina não é justificável por nenhuma moralidade ou código de ética. Os mandatos não têm valor. Certamente, seria um crime contra a humanidade reduzir o orgulho árabe para que a Palestina fosse entregue aos judeus parcialmente ou totalmente como o lar nacional judaico.

O caminho mais nobre seria insistir num tratamento justo para os judeus em qualquer parte do mundo em que eles nascessem ou vivessem. Os judeus nascidos na França são franceses, da mesma forma que os cristãos nascidos na França são franceses.

Se os judeus não têm um lar senão a Palestina, eles apreciariam a idéia de serem forçados a deixar as outras partes do mundo onde estão assentados? Ou eles querem um lar duplo onde possam ficar à vontade?

Este pedido por um lar nacional oferece várias justificativas para a expulsão dos judeus da Alemanha. Mas a perseguição dos alemães aos judeus parece não ter paralelo na História. Os antigos tiranos nunca foram tão loucos quanto Hitler parece ser.

E ele está fazendo isso com zelo religioso. Ele está propondo uma nova religião de exclusivo e militante nacionalismo em nome do qual, qualquer atrocidade se transforma em um ato de humanidade a ser recompensado aqui e no futuro. Os crimes de um homem desorientado e intrépido, estão sendo observados sob o olhar da sua raça, com uma ferocidade inacreditável.

Se houver sempre uma guerra justificável em nome da humanidade, a guerra contra a Alemanha para prevenir a perseguição desumana contra uma raça inteira seria totalmente justificável. Mas eu não acredito em guerra nenhuma. A discussão sobre a conveniência ou inconveniência de uma guerra está, portanto, fora do meu horizonte. Mas se não pode haver guerra contra a Alemanha, mesmo por crimes que estão sendo cometidos contra os judeus, certamente não pode haver aliança com a Alemanha. Como pode haver aliança entre duas nações que clamam por justiça e democracia e uma se declara inimiga da outra? Ou a Inglaterra está se inclinando para uma ditadura armada, e o que isso significa?

A Alemanha está mostrando ao mundo como a violência pode ser eficientemente trabalhada quando não é dissimulada por nenhuma hipocrisia ou fraqueza mascarada de humanitarismo; está mostrando como é hediondo, terrível e assustador quando isso aparece às claras, sem disfarces. Os judeus podem resistir a esta organizada e desavergonhada perseguição? Existe uma maneira de preservar a sua auto-estima e não se sentirem indefesos, abandonados e infelizes? Eu acredito que sim. Ninguém que tenha fé em Deus precisa se sentir indefeso, ou infeliz. O Jeová dos judeus é um Deus mais pessoal que o Deus dos cristãos, muçulmanos ou hindus, embora realmente, em sua essência, Ele seja comum a todos. Mas como os judeus atribuem personalidade a Deus e acreditam que Ele regula cada ação deles, estes não se sentiriam desamparados.

Se eu fosse judeu e tivesse nascido na Alemanha e merecido a minha subsistência lá, eu reivindicaria a Alemanha como o meu lar, do mesmo modo que um “genuíno” alemão o faria, e desafiaria qualquer um a me jogar na masmorra; eu me recusaria a ser expulso ou a sofrer discriminação. E fazendo isso, não deveria esperar por outros judeus me seguindo em uma resistência civil, mas teria confiança que no final estariam compelidos a seguir o meu exemplo.

E agora uma palavra aos judeus na Palestina:

Não tenho dúvidas de que os judeus estão indo pelo caminho errado. A Palestina, na concepção bíblica, não é um tratado geográfico. Ela está em seus corações. Mas se eles devem olhar a Palestina pela geografia como sua pátria mãe, está errado aceitá-la sob a sombra do belicismo britânico. Um ato religioso não pode acontecer com a ajuda da baioneta ou da bomba. Eles poderiam estabelecer-se na Palestina somente pela boa vontade dos palestinos. Eles deveriam procurar convencer o coração palestino. O mesmo Deus que rege o coração árabe, rege o coração judeu. Só assim eles teriam a opinião mundial favorável às suas aspirações religiosas. Há centenas de caminhos para uma solução com os árabes, se descartarem a ajuda da baioneta britânica.

Como está acontecendo, os judeus são responsáveis e cúmplices com outros países, em arruinar um povo que não fez nada de errado com eles.

Eu não estou defendendo as reações dos palestinos. Eu desejaria que tivessem escolhido o caminho da não-violência a resistir ao que eles, corretamente, consideraram como invasão de seu país por estrangeiros. Porém, de acordo com os cânones aceitos de certo e errado, nada pode ser dito contra a resistência árabe face aos esmagadores acontecimentos.

Deixemos os judeus, que clamam serem os Escolhidos por Deus, provar o seu título escolhendo o caminho da não-violência para reclamar a sua posição na Terra. Todos os países são o lar deles, incluindo a Palestina, não por agressão mas por culto ao amor.

Um amigo judeu me mandou um livro chamado A contribuição judaica para a civilização, de Cecil Roth. O livro nos dá uma idéia do que os judeus fizeram para enriquecer a literatura, a arte, a música, o drama, a ciência, a medicina, a agricultura etc., no mundo. Determinada a vontade, os judeus podem se recusar a serem tratados como os párias do Ocidente, de serem desprezados ou tratados com condescendência.

Eles podiam chamar a atenção e o respeito do mundo por serem a criação escolhida de Deus, em vez de se afundarem naquela brutalidade sem limites. Eles podiam somar às suas várias contribuições, a contribuição da ação da não-violência.”

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Porque hoje é sábado, Natalie Portman

Natalie Portman (do hebreu: נטלי פורטמן) é o nome artístico de Natalie Hershlag, …

… atriz americana nascida em Jerusalém, em 9 de junho de 1981.

Ignoro o que a bela e vegetariana Natalie pensa sobre a carnificina.

Se está triste como a maioria de nós, …

… se está feliz com as mortes ou …

… se, muito antes pelo contrário, não está nem aí.

Se está vendo apenas os noticiários das TVs americanas (já que não entenderia a Globo), …

… ou se, como alguns de nós, pasma-se com a cobertura …

… sensacional e horripilante da Al Jazeera em inglês.

Se quer que todos – seu país de origem, seu país atual , palestinos, árabes, russos, …

… turcos, esquimós, chineses, brasileiros, indianos, sudaneses, franceses e todo o resto do mundo…

… que vê 1,5 milhão de palestinos passarem por fome e bombas em seu estreito campo de concentração – …

… conversem por horas, dias, semanas, meses ou anos, até que seja fechado um acordo …

… que possa ser obedecido por seu “rebelde” país de nascimento, …

… ou se quer que tudo mais vá para o inferno. Ou para Gaza, que é muito pior, pois é aqui e é real.

Eu não sei sua opinião, Natalie. Sinceramente, até receio em perguntar e, …

… antes de ouvir qualquer coisa, fixamente olharei para teu estonteante rosto e me esforçarei para dizer lentamente: …

… Auschwitz I, Auschwitz II, Auschwitz III, Bełżec, Chelmno, Majdanek, Sobibór, Treblinka.

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

O Monólogo Amoroso (XIII)

Após uma noite de paranoia e preocupação, em que temeu algumas maquinações dos médicos e de sua filha, Nina recebeu os calmantes prescritos e continuou o monólogo.

O retorno à vida normal não foi nada fácil. Era como ter saído de uma piscina num dia quentíssimo para enfrentar uma longa caminhada. Porto Alegre é uma cidade insuportável no verão e neste período deveria alterar seu nome para Forno Alegre. Minha paciência encurtava na medida em que considerava os dias de convivência amorosa, pacífica e interessante que tivera e vislumbrava como seriam os seguintes. Em nossa despedida não houve promessa alguma; a vida deveria correr livremente então. E havia outro modo? Certamente não, mas ficava incomodada com a indeterminação, sei lá. Estava decidida a cumprir o que tinha planejado fazer e, antes que o verdugo da rotina me hipnotizasse, disse para minha mãe, em voz um tanto histérica, que desejava deixar as coisas claras para mim e para todos – parentes e amigos. Queria a separação. De enfiada, pedi para continuar morando em meu quarto contigo. Ela me pediu calma, o que significava “Olha, filha, vamos varrer esta sujeira para baixo do tapete e aguardar”. Era óbvio que o paradoxo da mãe solteira porém casada lhe agradava. Meu pai, sempre ausente e ao sabor dos ventos, desta vez entrou na discussão: insistiu para que eu desse uma chance para o rapaz; afinal, Raul era um bom menino. A mim, os dois pareciam doidos varridos; ainda contavam que acabaríamos formando uma harmoniosa família a três… Resolvi então falar com Raul.

Anunciei-lhe que queria me separar oficialmente. E logo. Mas uma separação não é simples. Ou melhor, acho que até poderia ser se eu fosse direto a um advogado, sem muita conversa. Porém, alguns casais primeiro tentam enfiar seu inferno pessoal um na cabeça do outro, precisam tornar impossível o entendimento para então poder encher a boca e declarar: não dá mais, é insustentável! Ele ouviu, deu meia volta e sumiu. Dias depois, voltou, disse que me amava mas que eu nunca lhe dera uma chance real, que tínhamos uma filha e que eu deveria ser responsável e pensar no teu futuro. Quando ouvi aquilo, parecia que ia ter uma convulsão, tal o ódio de que fui tomada. Passei a gritar, será que o menininho despreparado e silencioso, que morava na casa da mãe após minha negativa de ir para um apartamento com ele, o surdo-mudo que evitava falava sobre a relação paupérrima que tínhamos, que evitava inclusive a relação, agora estava pronto a mudar de vida? Éramos uns namoradinhos que tinham gerado uma criança e ele se escondera na hora de resolver o problema e mais ainda quando tu nascente, quando passou a ser um objeto figurativo enquanto eu cuidava de ti e estudava. Estava transtornada e disse, claro, verdades e injustiças. Acusei-o de não fazer absolutamente nada, de nunca me ajudar e de passar o tempo maquinando coisas com sua mãe. Ele respondia no mesmo tom: ele sustentava uma prostituta que tinha sua filha como refém, eu o ignorava, eu o expulsava da casa em que sua filha morava, ele estava trabalhando ao passo que eu ficava em casa fazendo coisa nenhuma, indo para a rua procurar homens, eu usava os serviços de uma babá inútil e explorava a ele e a minha família fazendo um curso para mulheres desocupadas, uma faculdade de espera-marido, etc.

Enfim, quase conseguimos. Tanto fizemos que quase tornamos impossível qualquer diálogo. Eu não sei, não sei mesmo quem tinha razão e nem se interessava saber. Não sei o dia nem a hora em que deixamos de conversar para viver cada um sua vida com uma criança entre nós. Ele entrava em nossa casa, brincava contigo – tu adoravas o papai – e ia embora. É, acho que nunca dei-lhe uma chance, mas ele também nunca se impôs, sempre foi omisso e obediente. E cometi mais um erro. Propus dar um tempo… Pouco depois, voltei ao assunto.

E tudo recomeçou. Raul passou a falar comigo duas ou três vezes por dia, fazendo os mais incríveis pedidos e promessas. Eram súplicas que me deixavam acabrunhada. Eu era ora má, ora a mulher com que ele sempre sonhou, ora excelente mãe, ou péssima, era linda e inteligente, mas também burra e pretensiosa, um martírio. Eu nunca sabia que versão de Raul encontraria, ele mais parecia uma fila inteira de suplicantes e… Procurei mais um adiamento, cuidando para que tu ficasses fora da discussão. Mas agora ele tomava as iniciativas. Eu encarnava ao mesmo tempo tudo o que havia de bom e ruim, tudo o que ele precisava e o que ele conhecia de mais nauseabundo. Era adorável e repugnante, uma boa e desejável mãe e, ao mesmo tempo, uma megera aproveitadora e calculista que estava destruindo sua vida e planos. Como as discussões eram na minha casa, meus pais opinavam: ele dizendo nem tão veladamente que eu era uma inconseqüente, ela me aconselhando a deixar a coisa como estava. Não foi nada divertido, passei três meses no pior dos ambientes, já era março e nada tinha acontecido, pois eu estava aguardando que Raul parasse com as brigas. Mas um belo dia brigamos tanto que efetivamente conseguimos. Era impossível a menor conversa. Deves estar rindo de toda essa bagunça, Ana. Afinal, ainda hoje, deitada nesta cama de hospital, sou oficial e inutilmente casada com teu pai. Nunca nos separamos, apenas permanecemos alguns anos falando mal um do outro pelas costas e depois nem isso.

As aulas recomeçaram e, quando entrou na sala o professor de Literatura Brasileira Roberto Simões, pensei: este homem, apesar daquela aliança, me atrai. Nunca houve nada entre nós, nunca nos tocamos, mas ele me ajudou muito. Comecei a me arrumar melhor para assistir suas aulas. Fazia-lhe perguntas tentando mostrar-me inteligente. Como não estava alcançando meu intento, passei a estudar a matéria antes que fosse ensinada para poder fazer perguntas ainda mais inteligentes. Trazia as perguntas prontas e passamos a conversar depois das aulas; ele me emprestou um livro e lembrei de Ricardo; vi que ele almoçava no bar da Filosofia e resolvi que iria almoçar ali quando, coisa rara, tivesse algum dinheiro ou tempo sobrando. Nunca consegui almoçar com ele, mas passei a sentir-me observada. Dias depois, em plena aula, ele me usou como exemplo de beleza para caracterizar a bela Virgília, de Memórias Póstumas de Brás Cubas, personagem de quem não gostava muito, mas que, naquele momento, me servia; só não gostei quando ele disse que Virgília tornara-se amante de Brás aos 28 anos e concluiu que eu ainda precisaria esperar alguns anos. (Procurei esta idade no livro e não encontrei). Um dia, ele, o professor Roberto Simões, chefe do Departamento de Letras, ofereceu-me carona para casa.

O percurso foi uma comédia. Ele mostrou-se engraçado descrevendo a vida de um professor sob a censura e me contando que tinham sido excluídos todos os autores contemporâneos do currículo do curso de Letras por absoluta falta de distanciamento histórico… Não valia a pena estudar autores que ainda estavam produzindo suas obras, ora. Depois, discorreu sobre o incrível número de alunas desinteressadas das letras, da literatura, da cultura. Chamou-me de avis rara e eu respondi mentalmente avis rara, avis cara. Sim, minha filha, se antes dos militares não tivessem retirado também o latim do currículo dos colégios, saberias que este ditado faz referência a uma visita rara, porém bem-vinda. Ele brincava comigo: enquanto eu flertava, ele satisfazia sua vaidade com uma aluna, mas não queria problemas. Despediu-se como um agente secreto, revelou que seu carro era um Skoda, fabricado na Tchecoslováquia, e que, portanto, eu tinha sido transportada num carro comunista. Aquela carona era a antítese do que estava vivendo em casa. E repetiu-se nos dias seguintes, repetiu-se na verdade por anos. Tudo indicava que eu ficaria célebre como a promíscua do bairro.

Ainda agitada, mas agora sorridente, ela desliga o gravador.

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Quem é a Globo que cobre os ataques à Faixa de Gaza?

É Renata Malkes, 28 anos, jornalista. Ela deletou seu blog, é claro, mas ele pode ser lido aqui. Basta clicar nos meses.

Eis algo que ela publicou em 2002-03-15:

Em algum momento do futuro

Pai e filho caminham pelas ruas de Nova York quando o pai, desolado, pára em frente a um terreno vazio, suspira e diz para o filho:
– E pensar que aqui neste lugar, um dia, estavam as torres gêmeas – diz em tom de desabafo.
O filho olha espantado para o pai e dispara:
– Papai, o que são as torres gêmeas?
– Meu filho querido, as torres gêmeas eram dois prédios extremamente altos, lotados de escritórios, que eram considerados o coração dos Estados Unidos. Mas, há muitos anos os árabes destruíram os prédios.
Curioso, o garoto pergunta:
– Papai, o que são árabes?!
HAHAHAHAHA! Você não achou graça? EU ACHEI! Foi mandada, em inglês, pelo meu amigo Moshe. Eu tomei a liberdade de traduzir e fazer pequenas modificações.

Simply Renatinha at 3:24 PM

Há mais, há mais. E melhor. Como ela poderia realizar a cobertura se… Bem, encontrei esta pérola no dia 17 de setembro de 2002, sob o título Time to decide a respeito de seu desejo de entrar nas forças armadas israelenses:

In December, I must leave the Ulpan where I live, find an apartment to rent, get a regular job and so on… Before that, I must decide about something that is making me very unconfortable: going (or not) to serve the Israeli Army. This is something I really wanted to do. REALLY! If you know me, know about my cultural background and my passion for military issues, guns, information and other related stuff. It would be great for my Hebrew skills, for understanding Israel, for knowing people and for introducing myself into the society here. In fact, I don’t have to serve anymore, I am just considering being drafted as a volunteer.

Seu blog parece um diarinho virtual de pequenas crueldades e piadinhas anti-árabes. Parece uma adolescente maluquinha. Mas é a Globo em Israel. É REPUGNANTE.

Comecei a vasculhar o blog da menininha da Globo a partir deste post.

Da Cloaca News: Aqui, Renata Malkes exulta por ter seu blog reconhecido pelo jornal israelense Yediot Aharonot como um “warblog”, ou seja, de divulgação de propaganda sionista.

E agora há um blog novo, equlibrado, imparcial, feito com exclusividade só para você, meu amigo da Rede Globo.

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Pró-Palestina, Kanouté marca um golaço em Sevilla 2 x 1 Deportivo La Coruña

Kanouté e o brasileiro Luís Fabiano, autor do outro gol do Sevilla

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

A paz não passa pelo massacre, por Milton Hatoum

O texto abaixo é o melhor e mais claro que li desde o início dos ataques. Como é cada vez mais raro um escritor brasileiro preocupar-se com seu tempo, saúdo o grande Milton Hatoum — do qual me orgulho ter sido aluno — que parece não alimentar-se apenas de sopas de letrinhas.

Retirado daqui.

I

O veterano jornalista israelense Uri Avneri afirmou várias vezes que o governo de Israel deve negociar com o Hamas, com a Síria e com a Autoridade Palestina a fim de obter um amplo acordo de paz na região. Mas Israel prefere agir militarmente a sentar à mesa de negociação. Isso porque, para Avneri, Israel tornou-se um Estado militarista, dotado de uma arrogância típica de uma potência ocupante.

De fato, a ocupação militar da Cisjordânia é a mais longa da história moderna. A ocupação, o muro que usurpou dez por cento de terras palestinas, a construção ininterrupta de assentamentos de colonos ortodoxos na Cisjordânia e na parte árabe de Jerusalém, tudo isso causa desespero à população palestina e impossibilita qualquer perspectiva de paz.

Quanto à Gaza, ninguém concorda com o lançamento de mísseis (mesmo de baixa potência) contra cidades israelenses, mas o bloqueio de toda a região de Gaza é muito mais do que uma provocação. Trata-se de um deliberado exercício de crueldade aplicado a 1,5 milhão de pessoas. Não menos cruel é o recente bombardeio, iniciado no dia 27 de dezembro de 2008 e que já matou mais de 500 pessoas, sendo mais de cem civis, entre mulheres e crianças. Se esse for o preço a pagar para que os partidos do atual governo israelense ganhem as eleições de fevereiro próximo, então mais uma vez Israel mostra que sua “democracia”, a única no Oriente Médio, é uma aberração. Não há democracia com ocupação militar, muito menos com massacres sistemáticos, prisões arbitrárias e tortura. Isto serve também ao governo “democrático” de George W. Bush, o pior presidente dos Estados Unidos, segundo o escritor Philip Roth.

II

Algo de errado está acontecendo com Israel e seus cidadãos. Durante a Segunda Guerra, quando milhões de judeus já tinham sido assassinados pelos nazistas, o que fez a “comunidade internacional” para deter o Holocausto? Nada. Essa mesma comunidade – países ricos e poderosos, Estados Unidos à frente, mas também países árabes – continua a ser cúmplice de genocídios na África, no Oriente Médio e em todos os países onde os mais fracos são humilhados e massacrados. Não deixa de ser assustador que a maioria da população israelense aceite e até aprove a matança de civis palestinos e a destruição de escolas, hospitais, mesquitas, universidades e de toda a infraestrutura de Gaza.

Sem dúvida há milhares de judeus no mundo todo que condenam essas ações bárbaras das Forças de Defesa de Israel. Mencionei Avneri, mas há vários historiadores e intelectuais judeus que criticam com veemência a política belicosa e expansionista de Israel. Gostaria de citar dois. O primeiro é Richard Falk, relator especial do “Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas para os Territórios Palestinos Ocupados” e professor emérito de Direito Internacional na Universidade de Princeton. No ano passado, bem antes do atual massacre contra o povo palestino, Falk assim relatou o cerco israelense de Gaza:

“Será um exagero irresponsável associar o tratamento dos palestinos às práticas de atrocidades coletivas dos nazistas? Não creio. Os recentes desenvolvimentos em Gaza são particularmente inquietantes porque exprimem de modo evidente uma intenção deliberada da parte de Israel e dos seus aliados de submeter toda uma comunidade humana a condições da maior crueldade que põem em perigo a sua vida. A sugestão de que este esquema de conduta é um holocausto em vias de ser feito representa um apelo bastante desesperado aos governos do mundo e à opinião pública internacional para que ajam com urgência a fim de impedir que estas tendências atuais ao genocídio não conduzam a uma tragédia coletiva”.

III

No artigo Israel e suas bombas nunca quiseram a paz, Haim Bresheeth, professor-titular de Estudos sobre Mídia na University of East London, escreveu:

“O exército de Israel é suficientemente poderoso para destruir todo o Oriente Médio (e, de fato, também para destruir parte importante do ocidente). O único problema é que, até hoje, jamais conseguiu mandar, sequer, no território em que lhe caberia mandar. O mais poderoso exército do mundo está detido, ainda, pela resistência palestina. Como entender essa contradição?

Bem, para começar, Israel jamais trabalhou para construir qualquer paz com os palestinos; jamais usou outro meio que não fossem os meios do extermínio, da limpeza étnica, do holocausto, para matar as populações nativas e residentes históricas na Palestina, desde a fundação do Estado de Israel, em maio de 1948.

Israel expulsou 750 mil palestinos, converteu-os em refugiados e, em seguida, passou a impedir sistematicamente o retorno deles e de seus filhos (hoje, também, já, dos netos deles), apesar das Resoluções da ONU, ao mesmo tempo em que continuou a destruir cidades e vilas, ou – o que é o mesmo – passou a construir colônias de ocupação sobre as ruínas das cidades e vilas palestinas.

Desde 1967, Israel fez tudo que algum Estado poderia fazer para tornar impossível qualquer solução política: colonizou por vias ilegais territórios ocupados por via ilegal e recusou-se a acatar os limites de antes das invasões de 1967; construiu um muro de apartheid; e tornou a vida impossível para a maioria dos palestinos. Nada, aí, faz pensar em esforço de paz. Antes, é operação continuada e sistemática para a limpeza étnica dos territórios palestinos ocupados ilegalmente.

Assim sendo, se a paz implicar – como implica necessariamente – o fim do mini-império construído por Israel, Israel continuará a fazer o que estiver ao seu alcance para que não haja paz, mesmo que a paz lhe seja oferecida numa bandeja, como a Iniciativa de Paz dos sauditas, recentemente, por exemplo. Outra vez, não se entende: se os israelenses só tinham a esperar esse tipo de oferta, se desejassem alguma paz, porque a rejeitaram, praticamente sem nem a considerar?

Faz tanto tempo que Israel rejeita toda e qualquer possibilidade de paz, que a maioria dos israelenses já nem são capazes de ver que rejeitar a paz converteu-se, para Israel, numa espécie de segunda natureza.

Mas o motivo mais aterrorizante pelo qual nenhuma iniciativa de paz jamais teve qualquer chance de prosperar tem a ver, de fato, conosco, com o ocidente.

Israel continua a ser apoiada pelas democracias ocidentais como uma espécie de força delegada, como batalhão ocidental avançado, implantado na entrada do mundo árabe, mais indispensável, tanto quanto mais dependente do ocidente, que regimes-clientes, como os sauditas e como o Iraque de Saddam até 1990.

Como uma espécie de ‘encarnação’ da tese do “choque de civilizações” de Huntington, Israel é, como sempre foi, mais exposta ou mais veladamente, um bastião do mundo judeu-cristão, contra os árabes e o Islam.

Isso já era verdade há décadas, mas jamais foi mais verdade do que na última década, quando a Ordem do Novo Mundo entrou em crise terminal, e começou-se a ouvir falar da “Doutrina do Choque”, de “Choque e Horror”, de várias ‘operações’ tempestade contra os desertos da Ásia e sempre contra os islâmicos.

Israel, não o Iran, possui armas nucleares e é capaz de usá-las – e várias vezes já ameaçou usá-las. Mas fala-se como se o perigo viesse do Iran, não se Israel. Os que propõem a destruição do Iran são os mesmos mercadores de tragédias que impingiram aos EUA e à Inglaterra o custo altíssimo da guerra do Iraque”.(1)

Esse texto do professor Haim Bresheeth resume o que muitos intelectuais pensam sobre o atual massacre. A essas vozes críticas, somam-se o protesto de escritores israelenses como David Grosmann e ativistas do movimento Paz Agora. Todos eles exigem a desocupação dos territórios palestinos, o fim do cerco à Faixa de Gaza e uma imediata abertura de negociações com as partes envolvidas no conflito. Reivindicam também – e com justa razão – o fim do lançamento de mísseis contra a população civil no sul de Israel. Mesmo assim, David Grossman pediu uma trégua imediata e incondicional dos bombardeios israelenses. Claro que não foi atendido, como tampouco foi atendido seu clamor pelo fim do ataque israelense contra o Líbano em agosto de 2006. Ele perdeu um filho nessa outra guerra insana, que matou 150 israelenses e mais de mil libaneses, e destruiu milhares de casas e toda a infra-estrutura do Líbano.

IV

Por fim, um artigo recente Robert Fisk, o mais respeitado correspondente europeu no Oriente Médio, contextualiza a atual agressão israelense aos palestinos de Gaza. O artigo de Fisk – Porque bombardear Asklan é a mais trágica ironia – foi publicado no jornal londrino The Independent (30-12-2008). Vale a pena ler o texto de Fisk, pois assim o leitor saberá quem são os miseráveis moradores de Gaza.

“Como é fácil desconectar o presente da história palestina, apagar a narrativa de sua tragédia e evitar a ironia grotesca de Gaza que, em qualquer outro conflito, os jornalistas estariam descrevendo desde suas primeiras reportagens: qual seja, que os habitantes originais e legais da terra israelense almejada pelos foguetes do Hamas, hoje vivem em Gaza.

Por isso existe Gaza: porque os Palestinos que vivem em Ashkelon e campos ao seu redor – Asklan em árabe- foram destituídos de suas terras em 1948, quando foi criado o Estado de Israel e empurrados para onde residem hoje, na Faixa de Gaza. Eles -ou seus filhos, netos e bisnetos- estão entre um milhão e meio de Palestinos espremidos na fossa séptica de Gaza. 80% dessas famílias viviam no que é hoje o Estado de Israel.

Assistindo os noticiários, tem-se a impressão de que a história começou apenas ontem, que um bando de lunáticos islâmicos barbudos antissemitas apareceu de repente nas favelas de Gaza -um lixão povoado por pessoas destituídas de origem- e começou a atirar mísseis contra o democrático e pacífico Israel, apenas para dar de encontro com a indignada vingança da força aérea israelense. Nessa história simplesmente não consta o fato de que as cinco meninas mortas no campo de Jabalya tinham avós oriundos da mesmíssima terra de onde os atuais habitantes as bombardearam até a morte.

Percebe-se porque tanto Yitzhak Rabin como Shimon Peres declararam, ainda na década de 1990, que desejavam que Gaza simplesmente desaparecesse, ou que sumisse no fundo do mar. A existência de Gaza é um indício permanente das centenas de milhares de Palestinos que perderam suas casas para o Estado de Israel, que fugiram apavorados ou foram expulsos por temor à limpeza étnica executada por Israel há 60 anos, momento em que uma imensa onda de refugiados varria a Europa no pós Segunda Guerra Mundial, e um punhado de árabes expulsos de suas propriedades não importava ao mundo.

Mas agora o mundo deveria se preocupar. Espremido nos poucos quilômetros quadrados mais densamente povoados do mundo, há um povo destituído, vivendo no isolamento, no esgoto, e, durante os últimos seis meses, na fome e no escuro, sancionados pelo Ocidente. Gaza sempre foi insurrecional. A “pacificação” sangrenta de Ariel Sharon, começando em 1971, levou dois anos para ser completada e não vai ser agora que conseguirão dobrar Gaza. Infelizmente para os palestinos, perderam sua mais poderosa voz política – refiro-me a Edward Said e não ao corrupto Yasser Arafat (e como os Israelenses devem sentir sua falta)-, ficando a sua sorte, em grande medida, sem explicação, no que depender dos seus atuais porta-vozes ineptos. “É o lugar mais deplorável que já vi”, disse Said, certa vez, sobre Gaza. “É um lugar terrivelmente triste devido ao desespero e à miséria em que vivem as pessoas. Não estava preparado para encontrar campos que são piores do que qualquer coisa que eu tivesse visto na África do Sul”.

Claro que ficou a cargo da Ministra de Relações Externas, Tzipi Livni, admitir que “às vezes os civis também pagam o preço”, um argumento que ela não usaria se a estatística de mortes fosse invertida. Foi certamente educativo ouvir ontem um membro do Instituto Empresarial Americano -repetindo fielmente os argumentos israelenses- defender o indefensável número de mortos palestinos, dizendo que “não faz sentido entrar no mérito dos números”. No entanto, se mais de 300 israelenses tivessem sido mortos, contra dois palestinos, pode ter certeza que se entraria “no mérito dos números”, e a violência desproporcional seria absolutamente relevante. O simples fato é que as mortes palestinas importam muito menos que as mortes israelenses. É verdade que 180 dos mortos eram membros do Hamas, mas e o restante? Se a estatística conservadora da ONU de 57 civis mortos for verdade, ainda assim seria uma desgraça.

Não é de surpreender que nem os EUA nem a Grã-Bretanha condenem o ataque israelense e ponham a culpa no Hamas. A política norte-americana para o Oriente Médio é indistinguível da israelense, sendo que Gordon Brown está assumindo a mesma devoção de cão à administração Bush, já demonstrada pelo seu antecessor.

Como sempre, os Estados árabes clientes – pagos e armadas pelo Ocidente – permanecem absurdamente em silêncio, convocando uma cúpula árabe para discutir e (se chegar a isso) apontar um “comitê de ação” que redigiria um relatório que jamais será escrito. É assim que funcionam o mundo árabe e seus líderes corruptos. Quanto ao Hamas, este terá, é claro, que suportar a desmoralização dos Estados árabes enquanto cinicamente esperam que Israel fale com eles. É o que farão. De fato, dentro de alguns meses, chegará a notícia de que Israel e Hamas mantêm ‘diálogos secretos’ – assim como outrora ouvimos falar em relação a Israel e a ainda mais corrupta OLP. Mas, até lá, os mortos estarão enterrados e estaremos ingressando na próxima crise do Oriente Médio”. (2)

(1) tradução de Caia Fitipaldi
(2) tradução de Arlene Clemesha

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

A ilusão da vitória na Faixa de Gaza, por Daniel Barenboim

Por Daniel Barenboim*, (publicado no THE GUARDIAN)

O regente e pianista Daniel Barenboim é judeu, cidadão israelense e cidadão de honra da Palestina.

Tenho apenas três desejos para o ano-novo. O primeiro é que o governo de Israel se conscientize, de uma vez por todas, que o conflito no Oriente Médio não pode ser resolvido por meios militares. O segundo é que o Hamas se conscientize que não defenderá seus interesses pela violência, e que Israel está aqui para ficar. O terceiro é que o mundo reconheça que esse conflito não é igual a nenhum outro em toda a história.

É um conflito intricado e sensível, um conflito humano entre dois povos profundamente convencidos de seu direito de viver no mesmo pedaço de terra. É por isso que não poderá ser resolvido nem pela diplomacia nem pelas armas.

Os acontecimentos dos últimos dias são extremamente preocupantes para mim por várias razões de caráter humano e político.

Embora seja óbvio que Israel tem o direito de se defender, que não pode e não deve tolerar os constantes ataques contra seus cidadãos, os bombardeios brutais sobre Gaza suscitam profundas indagações na minha mente.

Mortes

A primeira é se o governo de Israel tem o direito de considerar todo o povo palestino culpado pelas ações do Hamas. Será que toda a população de Gaza deve ser responsabilizada pelos pecados de uma organização terrorista?

Nós, o povo judeu, deveríamos saber e sentir mais profundamente do que qualquer outro povo que o assassinato de civis inocentes é desumano e inaceitável. Os militares israelenses argumentam, de maneira muito frágil, que a Faixa de Gaza é tão densamente povoada que é impossível evitar a morte de civis.

A debilidade desse argumento me leva a formular outras perguntas. Se as mortes de civis são inevitáveis, qual é a finalidade dos bombardeios? Qual é a lógica, se é que existe alguma, por trás da violência, e o que Israel espera conseguir por meio dela? Se o objetivo da operação é destruir o Hamas, a pergunta mais importante a ser feita é se esse objetivo é viável. Se não é, todo o ataque não só é cruel, bárbaro e repreensível, como também é insensato.

Por outro lado, se for realmente possível destruir o Hamas por meio de operações militares, que reação Israel espera que haja em Gaza depois que isso se concluir? Em Gaza vivem 1,5 milhão de palestinos, que seguramente não cairão de joelhos de repente para reverenciar o poderio do Exército israelense.

Não devemos esquecer que o Hamas, antes de ser eleito, foi encorajado por Israel como tática para enfraquecer o então líder palestino Yasser Arafat. A história recente de Israel me faz acreditar que, se o Hamas for eliminado por meio de bombardeios, outro grupo certamente tomará o seu lugar, um grupo que talvez seja mais radical e mais violento.

Vingança

Israel não pode se permitir uma derrota militar porque teme desaparecer do mapa. No entanto, a história demonstrou que toda vitória militar sempre deixou Israel em uma posição política mais fraca do que a anterior por causa do surgimento de grupos radicais.

Não pretendo subestimar a dificuldade das decisões que o governo israelense precisa tomar a cada dia, nem subestimo a importância da segurança de Israel. Entretanto, continuo convencido de que o único plano viável para a segurança em Israel, no longo prazo, é obter a aceitação de todos os nossos vizinhos.

Desejo para o ano de 2009 a volta da famosa inteligência que foi sempre atribuída aos judeus. Desejo a volta da sabedoria do Rei Salomão para os estrategistas israelenses, a fim de que a usem para compreender que palestinos e israelenses gozam de idênticos direitos humanos.

A violência palestina atormenta os israelenses e não contribui para a causa palestina. A retaliação militar israelense é desumana, imoral e não garante a segurança de Israel. Como disse antes, os destinos dos dois povos estão inextricavelmente ligados e os obriga a viver lado a lado. Eles terão de decidir se querem que isso se torne uma bênção ou uma maldição.

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Porque é hoje é sábado, Liv Ullmann

Ontem, vi o último filme do homem que afaga Liv Ullmann e abraça Julia Dufvenius

Queria evitá-lo, como o condenado à morte evita terminar seu derradeiro prato

Mexendo o garfo de um lado para outro, debaixo do olhar indiferente do algoz.

Acho abomináveis os passadistas, saudosistas, decorridos, danificados, apodrecidos senhores

que não prezam a contemporaneidade e o presente, porém…

Porém o ano começava e resolvi finalmente conhecer Sarabanda, de Ingmar Bergman.

Fui à locadora e vim com o ponto final de meu mestre preferido sob o braço

E constatei que o homem de 85 anos, alguém que nascera quando os filmes

Eram em preto e branco

E sem som

Sabia e fazia mais do que o batalhão tecnológico de dólares e entretenimento de hoje.

Será que nossa época — minha geração – só serve para apanhar

a humanidade em vídeo-locadoras?

Será que só serve para vê-la — àquela que Bergman chamava de “meu Stradivarius”

— em antigos filmes?

Pergunto à Liv onde a fórmula das pequenas grandiosidades perdeu-se;

e quando e se voltarão.

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Sobre Gaza: por "El Roto", do El Pais

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Cai apoio ao ataque em Israel

A humanidade começa a brotar… Espero que ela vote em fevereiro.

Guardian, UK, 1/1/2009 (em http://www.guardian.co.uk/world/2009/jan/01/israel-gaza) :

Pesquisa publicada hoje no jornal Haaretz mostra que baixou de 82 para 52% o número de israelenses favoráveis à continuação dos ataques contra Gaza (ao mesmo tempo, 20% apóiam o cessar-fogo; e 19% são favoráveis à invasão por terra ao território da Palestina). O líder do Hamás, Ismail Haniyeh, exige que cessem os ataques, que o bloqueio econômico seja levantado e que se abram os postos de passagem, como condição para qualquer negociação.

Na primeira indicação de que há divisões entre as autoridades israelenses, o primeiro-ministro Ehud Olmert defendeu pessoalmente que os ataques prossigam, depois de o ministro da Defesa, Ehud Barak – o mais condecorado soldado israelense e ex-comandante do exército – ter dado sinais de aceitar um cessar-fogo de 48 horas.

[…] Olmert reuniu-se com Barak, com a ministra dos Negócios Estrangeiros e com os comandantes militares, para um visivelmente muito tenso encontro de 4 horas, na 4ª-feira à noite. Em reunião do gabinete de segurança, decidiu-se que o bombardeio continuará.

Aparentemente, o governo de Israel está tentando não deixar transparecer qquer divisão interna, para evitar que se repita o que aconteceu na Guerra do Líbano, em 2006, quando divisões internas no governo, sobre o rumo da guerra, provocaram muitas críticas ao governo, até que a opinião pública passou, de uma posição em que a maioria apoiava a guerra, à declarada oposição ao governo e aos comandantes militares.

A maioria dos analistas militares diz que é pouco provável que Israel decida-se a favor da reocupação de Gaza, ocupação considerada impossível, ou excessivamente custosa. E não há tropas posicionadas em terra em quantidade suficiente. Para a maioria, a ameaça é operação de propaganda, que visa a manter sob pânico a população civil local.

Em todo o Oriente Médio, a tentativa de invasão por terra é considerada “situação favorável aos combatentes que lutam nos grupos armados”. Muitos analistas lembram que Israel jamais venceu guerra em situação de guerrilha urbana.

O mais provável é que prossigam os ataques aéreos. Contudo, a situação hoje já não é tão favorável a Israel, como no momento dos primeiros ataques, nem no cenário interno, nem no cenário internacional, e crescem as pressões para pôr fim à violência, tanto pelos governos ocidentais quanto pela ONU e agências de socorro humanitário.

[…] Já há mais de um ano, Israel impede a entrada em Gaza de quaisquer produtos importados (em Gaza, TUDO é importado de Israel). Nos últimos tempos, impede também a entrada de qualquer tipo de ajuda humanitária. Além disso, dada a proibição de que saiam de Gaza quaisquer produtos de exportação, Israel já destruiu toda a estrutura comercial e de negócios na região.

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Feliz 2009 e Filmes de 2008

Copiado de um e-mail recebido em 31 de dezembro de 2005, destas pessoas aqui.

Pessoas!

Quase qualquer coisa que se diga ou deseje nessa época corre o risco de soar lugar comum, de ser óbvio, de parecer pouco ou meramente protocolar. Corra-se o risco.

Existe uma quantidade expressiva de pessoas para quem o Natal é desprovido de sentido religioso e, portanto, está muito mais associado aos propósitos da sociedade consumista na qual estamos inevitavelmente mergulhados: movimentação do mercado. Não pensem nesse comentário apenas como uma crítica ácida. A movimentação do mercado pode ser bem utilizada como festividade e como meio para distribuir, na forma de presentes – grandes e caros ou simples, não importa – afeto às pessoas queridas (mas vale frisar que o gasto não basta; há o tempo!).

Não deveria ser assim? Este não é o ideal? Certamente cada um tem o seu próprio conceito de ideal. E para quê toda essa lenga-lenga? É apenas porque eu não enviei mensagem de natal a ninguém e não estou me desculpando, apenas embasando. Foi deliberado e planejado porque prefiro imensamente o significado e efeito da comemoração do Ano Novo.

Sim, todos sabemos que o primeiro dia do ano que começa não difere em absolutamente nada do dia 31 de dezembro. Mas dentro de nós pode ser totalmente outra coisa. O ser humano precisa de símbolos e ritos – isso é fato – e eles podem cumprir um papel importante na nossa saúde emocional e ser um bom motor para mudar o mundo à nossa volta! Enfim: gosto do ano novo! E comemoro-o a rigor desejando com veemência que todas as pessoas de quem gosto possam usufruir de uma bela sensação nessa data.

De mensagem fica mesmo a máxima sempre válida do Walter Franco: “Tudo é uma questão de manter / a mente quieta / a espinha ereta / e o coração tranquilo”. Meta nada simples de se atingir, mas válida como base para qualquer outra coisa que se queira na vida. E que venha 2006(9) e nos encontre fortes e contentes, para que sejamos inteiros e maiores a cada passo.

Laura Paz

Assino embaixo e por todos os lados (como diria o Inagaki).

-=-=-=-=-=-=-=-=-=-=-

Assisti poucos filmes em 2009, mas foram até demais.

Acho que nunca vi tantos filmes regulares como em 2008. Pouca coisa era agressivamente ruim e quase nada era indiscutivelmente bom. Mas acho que dá para salvar 4,5 filmes. Podemos começar por O Segredo do Grão, de Abdel Kechiche, um filme de visceral realismo que tem como tema a singela inauguração de um restaurante dentro de um barco numa cidade portuária da França. Trata do choque cultural entre a comunidade árabe e a francesa, mas é universal ao descrever detalhadamente conflitos familiares. A câmara móvel de Kechiche é apenas aparentada dos filmes do Dogma 95, pois ela não serve para demonstrar movimento ou despojamento, estando mais a serviço da busca de ângulos oiginais, muitas vezes aproximando-se dos atores como se quisesse penetrá-los ou acariciá-los. Outro grande filme foi o romeno 4 meses, 3 semanas e 2 dias, de Cristian Mungiu, Palma de Ouro de 2007. Ele conta a história de duas colegas de quarto obrigadas a uma verdadeira odisséia para que uma delas pudesse realizar um aborto ilegal na Romênia de Ceaucescu. É um filme sem a menor preocupação moral ou religiosa. Descreve como as duas fizeram para livrar-se de uma incomodação. Gabita, a grávida, deixa a operacionalização do aborto para Otilia, sua amiga. Gabita parece indiferente enquanto Otilia faz contatos com aborteiros, porteiros — todos pequenos ditadores cheios de mistérios — e depois trata de livrar-se do corpo do inquilino da amiga. Estes dois filmes têm algo em comum: ambos têm longas cenas que causam enorme angústia ao espectador.

E sim, os dois filmes dos irmãos Coen foram excelentes. Em No Country for old men (Este país não é para velhos em Portugal e um título qualquer no Brasil), a acidez dos Coen cai adequadamente para narrar com frieza uma história amalucada e violenta. Meio western, meio thriller, quase sem trilha sonora e com cenas antológicas, é um grande filme. Já Burn after reading (surpreendentemente Queime depois de ler no Brasil) tem a paranóia americana como alvo. É um filme que conta muita coisa em círculos, não chega a lugar algum e nem quer, mas nos arranca boas risadas. A cena de George Clooney em pânico por motivos que o espectador sabe serem falsos vai para minha galeria pessoal de momentos inesquecíveis.

Disse 4,5 filmes? Pois é, o 0,5 é do excelente Vicky Cristina Barcelona de Woody Allen.

E o Prêmio de MAIOR MICO DE 2009 vai para o discursivo homem de cuecas: Batman – O Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight).

Abaixo, a lista completa:

2008/56 – Ainda Orangotangos – Ainda Orangotangos – 2007 – Brasil – Gustavo Spolidoro – 2
2008/55 – O Segredo do Grão – La Graine et le Mulet – 2007 – França – Abdel Kechiche – 5
2008/54 – Luz Silenciosa – Sellet Licht – 2007 – México / França / Alemanha / Holanda – Carlos Reygadas – 3
2008/53 – 007 – Quantum of solace – Quantum of solace – 2008 – EUA / Inglaterra – Marc Forster – 2
2008/52 – Queime depois de ler – Burn After Reading – 2008 – EUA – Ethan e Joel Cohen – 5
2008/51 – Lemon Tree – Etz Limon – 2008 – Israel / Alemanha / França – Eran Riklis – 4
2008/50 – Caos calmo – Caos Calmo – 2008 – Inglaterra / Itália – Antonio Luigi Grimaldi – 3
2008/49 – Vicky Cristina Barcelona – Vicky Cristina Barcelona – 2008 – Espanha / EUA – Woody Allen – 5
2008/48 – Estômago – Estômago – 2007 – Brasil / Itália – Marcos Jorge – 3
2008/47 – Fatal – Elegy – 2008 – Estados Unidos – Isabel Coixet – 5
2008/46 – O pequeno tenente – Le petit lieutenant – 2005 – França – Xavier Beauvois – 3
2008/45 – Ensaio sobre a cegueira – Blindness – 2008 – Canadá / Brasil / Japão – Fernando Meirelles – 3
2008/44 – Reflexos da Inocência – Flashbacks of a fool – 2008 – Inglaterra – Baille Walsh – 4
2008/43 – No Such Thing – No Such Thing – 2001 – EUA – Hal Hartley – 5
2008/42 – Quem disse que é fácil? – ¿Quién dice que es fácil? – 2007 – Argentina / Espanha – Juan Taratuto – 3
2008/41 – Ao Entardecer – Evening – 2007 – EUA / Alemanha – Lajos Koltai – 4
2008/40 – Quando estou amando – Quand j`étais chanteur – 2006 – França – Xavier Giannoli – 3
2008/39 – A Questão Humana – La Question Humaine – 2007 – França – Nicolas Klotz – 2
2008/38 – O Balão Vermelho / O Cavalo Branco – Le Balon Rouge / Crin Blanc: Le Cheval Sauvage – 1956 / 1953 – França – Albert Lamorisse – 4
2008/37 – Meu irmão é filho único – Mio fratello è figlio único – 2007 – Itália – Daniele Luchetti – 4
2008/36 – Amar… Não tem preço – Hors de prix – 2008 – França – Pierre Salvadori – 1
2008/35 – Batman – O Cavaleiro das Trevas – The Dark Knight – 2008 – EUA – Christopher Nolan – 1
2008/34 – Do Outro Lado – Auf der anderen Seite – 2006 – Alemanha / Turquia – Faith Akin – 5
2008/33 – Antes que o diabo saiba que você está morto – Before the devil knows you´re dead – 2007 – EUA – Sydney Lumet – 4
2008/32 – O Banheiro do Papa – El Baño del Papa – 2007 – Uruguai / Brasil / França – Enrique Fernández e César Charlone – 4
2008/31 – O Labirinto do Fauno – El Laberinto del Fauno – 2006 – Espanha / EUA / México – Guillermo del Toro – 3
2008/30 – Jornada da Alma – Prendimi L`Anima – 2003 – França / Itália – Roberto Faenza – 3
2008/29 – Bella – Bella – 2006 – México / EUA – Alejandro Gomez Monteverde – 3
2008/28 – Control – Control – 2007 – Inglaterra – Anton Corbijn – 4
2008/27 – Longe dela – Away from her – 2006 – Canadá – Sarah Polley – 3
2008/26 – A Outra – The Other Boleyn Girl – 2008 – Grã-Bretanha – Justin Chadwick – 2
2008/25 – Sex and the City – Sex and the City – 2008 – EUA – Michael Patrick King – 3
2008/24 – Bloom – Bloom – 2003 – Irlanda – Sean Walsh – 3
2008/23 – Confiança – Trust – 1990 – EUA / Inglaterra – Hal Hartley – 4
2008/22 – A Vida é um Milagre – Zivot je cudo – 2004 – Bósnia / França – Emir Kusturica – 5
2008/21 – A Casa de Alice – A Casa de Alice – 2007 – Brasil – Chico Teixeira – 3
2008/20 – Uma Canção de Amor para Bobby Long – A Love Song for Bobby Long – 2004 – EUA – Shainee Gabel – 3
2008/19 – Margot e o casamento – Margot at the Wedding – 2007 – EUA – Noah Baumbach – 2
2008/18 – Os Amantes – Les Amants – 1958 – França – Louis Malle – 5
2008/17 – 4 meses, 3 semanas e 2 dias – 4 Luni, 3 Saptamani si 2 Zile – 2007 – Romênia – Cristian Mungiu – 5
2008/16 – Tomates Verdes Fritos – Fried Green Tomatoes – 1991 – EUA / Inglaterra – Jon Avnet – 3
2008/15 – Em Paris – Dans Paris – 2006 – França – Christophe Honoré – 4
2008/14 – A Era da Inocência – L`Âge de Ténèbres – 2007 – Canadá – Denys Arcand – 5
2008/13 – O Sonho de Cassandra – Cassandra`s Dream – 2007 – EUA / Inglaterra / França – Woody Allen – 3
2008/12 – Um Beijo Roubado – My Blueberry Nignts – 2007 – China / França / EUA – Kar Wai Wong – 2
2008/11 – Desejo e Reparação – Atonement – 2007 – Inglaterra – Joe Wright – 4
2008/10 – Três Mulheres – Three Women – 1977 – EUA – Robert Altman – 4
2008/9 – M.A.S.H. – M.A.S.H. – 1970 – EUA – Robert Altman – 4
2008/8 – O Caçador de Pipas – The Kite Runner – 2007 – EUA – Marc Forster – 1
2008/7 – Mutum – Mutum – 2007 – Brasil – Sandra Kogut – 5
2008/6 – Maria – Maria – 2005 – EUA / França / Itália – Abel Ferrara – 2
2008/5 – Onde os fracos não têm vez – No Country for Old Men – 2007 – EUA – Ethan e Joel Cohen – 5
2008/4 – Juno – Juno – 2007 – EUA – Jason Reitman – 3
2008/3 – Meu nome não é Johnny – Meu nome não é Johnny – 2008 – Brasil – Mauro Lima – 2
2008/2 – A Desconhecida – La Sconosciuta – 2006 – França – Giuseppe Tornatore – 2
2008/1 – Coisas que perdemos pelo caminho – Things we lost in the fire – 2007 – EUA / Grã-Bretanha – Susanne Blier – 3

Legenda para as notas:
5 – Não deixe de ver
4 – Muito bom
3 – Vale a tentativa
2 – Medíocre
1 – Uma bomba
0 – Além de bomba, mal-intencionado

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Latuff: O Gueto de Gaza

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Por que Israel bombardeia uma universidade?

Pelo Dr. Akram Habeeb, da Faixa de Gaza ocupada, da Palestina, 29/12/2008
(em http://electronicintifada.net/v2/article10069.shtml)

Sou bolsista da Fundação Fulbright e professor de literatura norte-americana na Universidade Islâmica de Gaza. Nessa condição, sempre preferi manter-me afastado do conflito Israel-Palestina. Sempre entendi que meu dever é ensinar os valores da paz e da convivência pacífica.

Mas o ataque massivo de Israel contra a Faixa de Gaza obriga-me a manifestar-me.

Ontem à noite, durante a segunda noite de ataques de Israel a Gaza, os mais violentos de que há notícia por aqui, fui acordado pelo ruído ensurdecedor de bombardeio continuado, cerrado. Quando me dei conta de que Israel bombardeava a minha universidade, com F-16s fabricados nos EUA, vi que os “ataques seletivos” já nada tinham de seletivos.

Políticos e generais israelenses têm dito que a Universidade Islâmica de Gaza seria ‘aparelho’ do Hamás e que forma terroristas. É mentira.

Como professor independente, não filiado a partido político, afirmo que a Universidade Islâmica de Gaza – como as Universidades Católicas e as Universidades Pontifícias, que há no Brasil e em todo o mundo – é instituição acadêmica que abarca um larguíssimo espectro de tendências políticas. Conheço-a bem, como universidade de prestígio em todo o mundo, que estimula o liberalismo e a livre exposição e circulação de idéias.

Se meu depoimento parecer excessivamente pessoal e comprometido, convido todos a visitarem a página da UIG, na Internet (ing. Islamic University of Gaza website, em http://www.iugaza.edu.ps/eng/), e pesquisarem sua história, seus departamentos, os estudos que se desenvolvem ali.

Lá se informarão sobre a participação da Universidade Islâmica de Gaza em inúmeras instituições acadêmicas em todo o mundo, o trabalho de pesquisa de seus professores, prêmios e bolsas de estudo e pesquisa que recebem de instituições de todo o mundo.

Por que Israel bombardearia uma universidade? Não sei.

Mas Israel ontem não bombardeou apenas minha universidade: bombardeou mesquitas, farmácias e casas de família. No campo de refugiados em Jabaliya, o bombardeio matou quatro meninas pequenas, todas da família Balousha. Em Rafah, mataram três irmãos, de 6, 12 e 14 anos. Também mataram mãe e filho, um menino de um ano, da família Kishko, na cidade de Gaza.

São atos que nada justifica, em nenhum caso. Penso no que Deus ordenou ao Povo Eleito: Não matarás. Não invadirás a casa de teu vizinho. Deus não elegeria seu povo, nem povo algum, para matar os vizinhos e roubar a terra em que todos plantam o que todos comem. As escolhas que Israel está fazendo são escolhas do governo de Israel. O governo de Israel escolheu matar palestinenses. Pratica aqui genocídio semelhante ao que outros impérios invasores e ocupantes praticaram em outras partes do mundo, contra populações autóctones. Nenhum genocídio é admissível.

O Dr. Akram Habeeb é professor assistente de Literatura Norte-americana na Universidade Islâmica em Gaza.

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Gaza

Por José Saramago

A sigla ONU, toda a gente o sabe, significa Organização das Nações Unidas, isto é, à luz da realidade, nada ou muito pouco. Que o digam os palestinos de Gaza a quem se lhes estão esgotando os alimentos, ou que se esgotaram já, porque assim o impôs o bloqueio israelita, decidido, pelos vistos, a condenar à fome as 750 mil pessoas ali registadas como refugiados. Nem pão têm já, a farinha acabou, e o azeite, as lentilhas e o açúcar vão pelo mesmo caminho.

Desde o dia 9 de Dezembro os camiões da agência das Nações Unidas, carregados de alimentos, aguardam que o exército israelita lhes permita a entrada na faixa de Gaza, uma autorização uma vez mais negada ou que será retardada até ao último desespero e à última exasperação dos palestinos famintos. Nações Unidas? Unidas? Contando com a cumplicidade ou a cobardia internacional, Israel ri-se de recomendações, decisões e protestos, faz o que entende, quando o entende e como o entende.

Vai ao ponto de impedir a entrada de livros e instrumentos musicais como se se tratasse de produtos que iriam pôr em risco a segurança de Israel. Se o ridículo matasse não restaria de pé um único político ou um único soldado israelita, esses especialistas em crueldade, esses doutorados em desprezo que olham o mundo do alto da insolência que é a base da sua educação. Compreendemos melhor o deus bíblico quando conhecemos os seus seguidores. Jeová, ou Javé, ou como se lhe chame, é um deus rancoroso e feroz que os israelitas mantêm permanentemente actualizado.

Reproduzido de : http://www.iela.ufsc.br/?page=noticia&id=744

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Gaza é assim

À esquerda, o Mar Mediterrâneo, no meio a Faixa de Gaza com 5000 habitantes por Km², depois um enorme muro e, à direita, a bucólica agricultura. Só entra e só sai o que Israel permite. Veja no Google Earth detalhes sobre o maior campo de concentração da humanidade. E, com menos detalhes, aqui.

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Genocídio, sim + Carta aberta de Uri Avnery a Barack Obama

A Faixa de Gaza é um território situado no Oriente Médio limitado a norte e a leste por Israel e a sul pelo Egito. É um dos territórios mais densamente povoados do planeta, com 1,5 milhão de palestinos para uma área de 300 Km², ou seja, sua densidade demográfica é de estupefacientes 5000 habitantes por Km². Atualmente a Faixa de Gaza não é reconhecida internacionalmente como pertencente a um país soberano. O espaço aéreo e o acesso marítimo a ela são controlados pelo estado de Israel.

5000 habitantes por quilômetro quadrado. Isto significa dizer que, se Israel jogar bombas a esmo, matará. Também significa dizer que os “alvos militares” estão certamente misturados a residências de civis.

Israel, antes dos ataques, já mantinha os habitantes de Gaza sob constante fome. É claro que tudo o que é consumido em Gaza é produzido fora. O “país” são alguns bairros lotados de gente. Gaza é uma prisão a céu aberto vista com indulgência por nós, ocidentais. Os israelenses decidiam o que poderia entrar no “país”. Só que há o Hamas, que conseguia trazer foguetes de pequeno porte para dentro de Gaza e os lança. É natural, meus amigos. No Brasil, quem tenta fugir da cadeia não tem sua pena aumentada, pois é considerado normal que o oprimido — e não importa seu crime — procure libertar-se.

Então, Israel passou a racionar drasticamente os víveres que entravam em Gaza. Tudo para criar um conflito que justificasse o atual genocídio. Sim, é um genocídio. Perguntei a dois amigos judeus se eles se ofenderiam se eu dissesse que as atitudes de Israel são comparáveis com o holocausto judeu promovido por Hitler. Não, acham normal que eu diga isso. Aquilo e isto são genocídios. Um deles apenas pediu para que eu não dissesse que aquilo era feito por judeus, pediu que eu acusasse Israel e seu atual governo.

Estou muito tranquilo para dizer que esses ataques são matança pura e simples, digo serenamente que Israel quis os foguetes do Hamas para justificar ao mundo seu Auschwitz particular. E o mundo ocidental, ainda culpado por fatos ocorridos há mais de 60 anos e adubados por filmes americanos que retratam um holocausto real e indiscutível, vê a reedição de fatos que nunca deveriam se repetir sob seus narizes. É uma vergonha sem fim para toda a humanidade.

Porém, um dia, provavelmente quando eu já estiver morto, haverá uma enorme guerra contra Israel. Há 1 bilhão de árabes quase desarmados e 7 milhões de israelenses competentíssimos e preparados para guerra. Um dia isso muda. Eu não quero ver como será a vingança, mas que ela virá, tenho certeza.

-=-=-=-

O Diário Gauche publicou um post que demonstra a perda de território a que os palestinos foram submetidos por Israel e os EUA. Vejam abaixo a consequência das repetidas guerras. Mas acho melhor vocês verem o mapa lá no post do Diário Gauche, pois meu blog está tão estranho que não aceita imagens maiores do que 35-40K.

-=-=-=-=-

Carta aberta de Uri Avnery a Barack Obama

(esta é uma carta aberta escrita por Uri Avnery, 85 anos, ex-deputado do Knesset, soldado que ajudou a fundar Israel em 1948 e que há décadas milita pela paz. A tradução ao português é de Idelber Avelar. O pedido de divulgação vai a todos os que desejam uma paz duradoura, nos termos já reconhecidos pela comunidade internacional).

As humildes sugestões que se seguem são baseadas nos meus 70 anos de experiência como combatente de trincheiras, soldado das forças especiais na guerra de 1948, editor-em-chefe de uma revista de notícias, membro do parlamento israelense e um dos fundadores do movimento pela paz:

1)No que se refere à paz israelense-árabe, o Sr. deve agir a partir do primeiro dia.

2)As eleições em Israel acontecerão em fevereiro de 2009. O Sr. pode ter um impacto indireto, mas importante e construtivo já no começo, anunciando sua determinação inequívoca de conseguir paz israelo-palestina, israelo-síria e israelo-pan-árabe em 2009.

3)Infelizmente, todos os seus predecessores desde 1967 jogaram duplamente. Apesar de que falaram sobre paz da boca para fora, e às vezes realizaram gestos de algum esforço pela paz, na prática eles apoiavam nosso governo em seu movimento contrário a esse esforço.

Particularmente, deram aprovação tácita à construção e ao crescimento dos assentamentos colonizadores de Israel nos territórios ocupados da Palestina e da Síria, cada um dos quais é uma mina subterrânea na estrada da paz.

4)Todos os assentamentos colonizadores são ilegais segundo a lei internacional. A distinção, às vezes feita, entre postos “ilegais” e os outros assentamentos colonizadores é pura propaganda feita para mascarar essa simples verdade.

5)Todos os assentamentos colonizadores desde 1967 foram construídos com o objetivo expresso de tornar um estado palestino – e portanto a paz – impossível, ao picotar em faixas o possível projetado Estado Palestino. Praticamente todos os departamentos de governo e o exército têm ajudado, aberta ou secretamente, a construir, consolidar e aumentar os assentamentos, como confirma o relatório preparado para o governo pela advogada Talia Sasson.

6)A estas alturas, o número de colonos na Cisjordânia já chegou a uns 250.000 (além dos 200.000 colonos da Grande Jerusalém, cujo estatuto é um pouco diferente). Eles estão politicamente isolados e são às vezes detestados pela maioria do público israelense, mas desfrutam de apoio significativo nos ministérios de governo e no exército.

7)Nenhum governo israelense ousaria confrontar a força material e política concentrada dos colonos. Esse confronto exigiria uma liderança muito forte e o apoio generoso do Presidente dos Estados Unidos para que tivesse qualquer chance de sucesso.

8)Na ausência de tudo isso, todas as “negociações de paz” são uma farsa. O governo israelense e seus apoiadores nos Estados Unidos já fizeram tudo o que é possível para impedir que as negociações com os palestinos ou com os sírios cheguem a qualquer conclusão, por causa do medo de enfrentar os colonos e seus apoiadores. As atuais negociações de “Annapolis” são tão vazias como as precedentes, com cada lado mantendo o fingimento por interesses politicos próprios.

9)A administração Clinton, e ainda mais a administração Bush, permitiram que o governo israelense mantivesse o fingimento. É, portanto, imperativo que se impeça que os membros dessas administrações desviem a política que terá o Sr. para o Oriente Médio na direção dos velhos canais.

10)É importante que o Sr. comece de novo e diga-o publicamente. Idéias desacreditadas e iniciativas falidas – como a “visão” de Bush, o “mapa do caminho”, Anápolis e coisas do tipo – devem ser lançadas à lata de lixo da história.

11)Para começar de novo, o alvo da política americana deve ser dito clara e sucintamente: atingir uma paz baseada numa solução biestatal dentro de um prazo de tempo (digamos, o fim de 2009).

12)Deve-se assinalar que este objetivo se baseia numa reavaliação do interesse nacional americano, de remover o veneno das relações muçulmano-americanas e árabe-americanas, fortalecer os regimes dedicados à paz, derrotar o terrorismo da Al-Qaeda, terminar as guerras do Iraque e do Afeganistão e atingir uma acomodação viável com o Irã.

13)Os termos da paz israelo-palestina são claros. Já foram cristalizados em milhares de horas de negociações, colóquios, encontros e conversas. São eles:

a) estabelecer-se-á um Estado da Palestina soberano e viável lado a lado com o Estado de Israel.
b) A fronteira entre os dois estados se baseará na linha de armistício de 1967 (a “Linha verde”). Alterações não substanciais poderão ser feitas por concordância mútua numa troca de territórios em base 1: 1.
c) Jerusalém Oriental, incluindo-se o Haram-al-Sharif (o “Monte do Templo”) e todos os bairros árabes servirão como Capital da Palestina. Jerusalém Ocidental, incluindo-se o Muro Ocidental e todos os bairros judeus, servirão como Capital de Israel. Uma autoridade municipal conjunta, baseada na igualdade, poderia se estabelecer por aceitação mútua, para administrar a cidade como uma unidade territorial.
d) Todos os assentamentos colonizadores de Israel – exceto aqueles que possam ser anexados no marco de uma troca consensual – serão esvaziados (veja-se o 15 abaixo)
e) Israel reconhecerá o princípio do direito de retorno dos refugiados. Uma Comissão Conjunta de Verdade e Reconciliação, composta por palestinos, israelesnses e historiadores internacionais estudará os fatos de 1948 e 1967 e determinará quem foi responsável por cada coisa. O refugiado, individualmente, terá a escolha de 1) repatriação para o Estado da Palestina; 2) permanência onde estiver agora, com compensação generosa; 3) retorno e reassentamento em Israel; 4) migração a outro país, com compensação generosa. O número de refugiados que retornarão ao território de Israel será fixado por acordo mútuo, entendendo-se que não se fará nada para materialmente alterar a composição demográfica da população de Israel. As polpuldas verbas necessárias para a implementação desta solução devem ser fornecidas pela comunidade internacional, no interesse da paz planetária. Isto economizaria muito do dinheiro gasto hoje militarmente e a partir de presentes dos EUA.
f) A Cisjordânia, Jerusalém Oriental e a Faixa de Gaza constituirão uma unidade nacional. Um vínculo extra-territorial (estrada, trilho, túnel ou ponte) ligará a Cisjordânia e a Faixa de Gaza.
g) Israel e Síria assinarão um acordo de paz. Israel recuará até a linha de 1967 e todos os assentamentos colonizadores das Colinas de Golã serão desmantelados. A Síria interromperá todas as atividades anti-Israel, conduzidas direta ou vicariamente. Os dois lados estabelecerão relações normais.
h) De acordo com a Iniciativa Saudita de Paz, todos os membros da Liga Árabe reconhecerão Israel, e terão com Israel relações normais. Poder-se-á considerar conversações sobre uma futura União do Oriente Médio, no modelo da União Européia, possivelmente incluindo a Turquia e o Irã.

14)A unidade palestina é essencial. A paz feita só com um naco da população de nada vale. Os Estados Unidos facilitarão a reconciliação palestina e a unificação das estruturas palestinas. Para isso, os EUA terminarão com o seu boicote ao Hamas (que ganhou as últimas eleições), começarão um diálogo político com o movimento e sugerirão que Israel faça o mesmo. Os EUA respeitarão quaisquer resultados de eleições palestinas.

15)O governo dos EUA ajudará o governo de Israel a enfrentar-se com o problema dos assentamentos colonizadores. A partir de agora, os colonos terão um ano para deixar os territórios ocupados e voluntariamente voltar em troca de compensação que lhes permitirá construir seus lares dentro de Israel. Depois disso, todos os assentamentos serão esvaziados, exceto aqueles em quaisquer áreas anexadas a Israel sob o acordo de paz.

16)Eu sugiro ao Sr., como Presidente dos Estados Unidos, que venha a Israel e se dirija ao povo israelense pessoalmente, não só no pódio do parlamento, mas também num comício de massas na Praça Rabin em Tel-Aviv. O Presidente Anwar Sadat, do Egito, veio a Israel em 1977 e, ao se dirigir ao povo de Israel diretamente, mudou em tudo a atitude deles em relação à paz com o Egito. No momento, a maioria dos israelenses se sente insegura, incerta e temerosa de qualquer iniciativa ousada de paz, em parte graças a uma desconfiança de qualquer coisa que venha do lado árabe. A intervenção do Sr., neste momento crítico, poderia, literalmente, fazer milagres, ao criar a base psicológica para a paz.

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!

Chico Buarque

Tinha 9 anos quando meu pai trouxe para casa o recém-lançado vinil “Chico Buarque de Hollanda”. Na capa, duas fotos de Chico – uma sorridente e outra sério – sobre fundo azul contínuo. Ali havia “A Banda”, “Olê Olá”, “Pedro Pedreiro”, “Você Não Ouviu”, “Tem Mais Samba”, “A Rita”, “Juca” e mais 5 músicas. Tal como os discos dos Beatles que ouvia com minha irmã, era um vinil de que se podia ouvir todas as canções. Não havia nada de segunda linha. Depois, continuamos a acompanhar a carreira de Chico comprando cada um de seus discos, até os italianos. Como muitos brasileiros, posso cantar muitíssimas músicas dele; faz parte da vida e da memória de nosso país e, quando meu pai faleceu, uma das poucas coisas que fiz questão de pegar foi este vinil.

Dia desses, vi numa comunidade do orkut pessoas escolhendo suas letras preferidas de Chico. É complicado — a audição ou leitura da obra de Chico mais parece antologia de grande autor do que obras completas –, são muitas letras notáveis e cada um só podia escolher três. A escolha passa necessariamente por nossas preferências pessoais e pelas idiossincrasias de cada um… Bem, eu meti a colher escolhendo “Eu te amo”, “Flor da Idade” e “Moto-contínuo”.

Depois, deitado em busca de sono, decidi que gostava mais da letra de “Moto-contínuo”. Em primeiro lugar por causa da perfeita combinação com a música de Edu Lobo, em segundo lugar por ser uma música sobre um assunto raro: a fé do homem e a fé no homem. Quem chamou minha atenção para esta letra foi meu amigo Alejandro Borche Casalas, pois, quando a ouvi pela primeira vez no vinil “Almanaque”, fiquei tão hipnotizado pela música de Edu que deixei de lado a letra, que pareceu-me confusamente dedicada a alguma musa de Chico… Engano crasso. Alejandro, num final de noite de 1982, perguntou-nos: sobre o que fala esta música? Não lembro de minha resposta nem das dos amigos. Lembro que ninguém disse que era sobre a fé. Como Alejandro é uruguaio, esclareceu-nos: é sobre a fê; disse assim mesmo: fê.

“Eu te amo” é uma escolha lírica e “Flor da Idade” é sua antítese; talvez seja a música mais sacana de Chico. Sacana no sentido de sacanagem mesmo.

Abaixo, transcrevo as letras de minhas preferidas para meus 7 leitores. Vocês concordam? Discordam?

Moto-Contínuo

Um homem pode ir ao fundo do fundo do fundo se for por você
Um homem pode tapar os buracos do mundo se for por você
Pode inventar qualquer mundo, como um vagabundo se for por você
Basta sonhar com você

Homem também pode amar e abraçar e afagar seu ofício
Porque vai habitar o edifício que fez pra você
E no aconchego da pele na pele, da carne na carne
Entender que o homem foi feito direito
Do jeito que é feito o prazer

Homem constrói sete usinas usando a energia
Que vem de você
Homem conduz a alegria que sai das turbinas
De volta a você
E cria o moto-contínuo da noite pro dia se for por você

E quando o homem já está de partida
Da curva da vida ele vê
Que o seu caminho não foi um caminho sozinho porque

Sabe que o homem vai fundo e vai fundo e vai fundo
se for por você.

Eu te amo

Ah, se já perdemos a noção da hora,
Se juntos já jogamos tudo fora,
Me conta agora como hei de partir?

Se, ao te conhecer, dei pra sonhar, fiz tantos desvarios,
Rompi com o mundo, queimei meus navios,
Me diz pra onde é que inda posso ir…

Se nós, nas travessuras das noites eternas,
Já confundimos tanto as nossas pernas,
Diz com que pernas eu devo seguir…

Se entornaste a nossa sorte pelo chão,
Se na bagunça do teu coração
Meu sangue errou de veia e se perdeu…

Como, se na desordem do armário embutido
Meu paletó enlaça o teu vestido
E o meu sapato inda pisa no teu…

Como, se nos amamos feito dois pagãos,
Teus seios inda estão nas minhas mãos,
Me explica com que cara eu vou sair?

Não, acho que estás te fazendo de tonta,
Te dei meus olhos pra tomares conta,
Agora conta como hei de partir…

Flor da Idade

A gente faz hora, faz fila na vila do meio dia
Pra ver Maria
A gente almoça e só se coça e se roça e só se vicia
A porta dela não tem tramela
A janela é sem gelosia
Nem desconfia
Ai, a primeira festa, a primeira fresta, o primeiro amor
Na hora certa, a casa aberta, o pijama aberto, a família
A armadilha
A mesa posta de peixe, deixa um cheirinho da sua filha
Ela vive parada no sucesso do rádio de pilha
Que maravilha
Ai, o primeiro copo, o primeiro corpo, o primeiro amor
Vê passar ela, como dança, balança, avança e recua
A gente sua
A roupa suja da cuja se lava no meio da rua
Despudorada, dada, à danada agrada andar seminua
E continua
Ai, a primeira dama, o primeiro drama, o primeiro amor
Carlos amava Dora que amava Lia que amava Léa que amava Paulo
Que amava Juca que amava Dora que amava Carlos que amava Dora
Que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava Dito que amava Rita que amava
Carlos amava Dora que amava Pedro que amava tanto que amava
a filha que amava Carlos que amava Dora que amava toda a quadrilha

Gostou deste texto? Então ajude a divulgar!