Qual é a melhor cara do PSDB? A de Yeda, Aécio ou Serra?

Tudo começou quando Aécio e Serra foram os derrotados no Mineirazo de quarta-feira. Aécio deu um sorriso overtudo, sabendo que estava sendo mostrado pela Globo para todo o país no dia que um time de Minas seria campeão de Libertadores. Serra ergueu a cabecinha de tartaruga e procurou a câmera, só a encontrando quando observou para onde olhava Aécio, dono da imprensa mineira. Foi um prenúncio do que a dupla verón a seguir. Uma duplinha pé-frio, sem dúvida.

Mas a cara mais acabada — nos dois sentidos — do PSDB veio à tona na manhã seguinte em Porto Alegre. Houve uma inteligente manifestação em frente à casa da desgovernadora. Digo inteligente porque todos sabemos que a ogra gosta de um barraco, gosta de responder do modo mais grosseiro, gosta de demonstrar sua vulgaridade, parece gostar de confundir informalidade com baixo nível. As amigas Yeda Crusius e Lya Luft, aliás, estão cada vez mais parecidas: uma na área financeira, outra na literária, as duas na auto-ajuda.

Ao meio-dia de ontem, liguei o rádio para ouvir se alguém noticiaria as manchetes do Olé argentino, quando vi que havia coisa muito mais divertida. Fui direto ao Weissheimer, ao Feil e à Nova Corja a fim de rir. Se até os caras do esporte da RBS falavam com voz de riso, o trio citado devia ter material. Eles não me decepcionaram. As fotos são boas demais. A pitbull resolveu expor seus netos que, coitados, decerto nem queriam mais ir à aula; afinal, entre a perspectiva de assistir a uma pancadaria entre a Brigada Militar e um buliçoso grupo de professores, sentados na sacada da casa que a vovó roubou — talvez comendo pinhão, pipoca e ananás –, e ir à aula, o que você escolheria? Olha a cara de tristeza dos meninos. Não é de dar dó?

A cara de louca da Yeda é sensacional e a da filha Tarsila — cujo nome é uma homenagem ao Ministro da Justiça — idem. Ora, no dia em que hordas de Wierzchowskistas poloneses invadirem meu jardim, vocês acham que vou chamar meus filhos para me ajudarem no enfrentamento? Nunca! Vou é mandar a Juno e a Vicentina, minhas duas terríveis cachorras, uma doce pastor alemão e a uma meiga SRD (vira-lata) se alimentarem dos manifestantes pro-Sem Acento! Achei de última categoria expor dessa maneira os herdeiros da vovó, tão rica. A Tarsila deve ser barraqueira mesmo, mas os netos sempre poderão nascer diferentes, pois estão mais afastados de Yeda e Carlos. Podem até ficar rebeldes como a Luciana. A propósito, Carlos Crusius, ex-primeiro damo, anda em shows e concertos dando o ar de sua barba. Sempre escolhe uma posição estratégica para que todos vejam que não está nem será preso. Sempre ouço pessoas rosnarem quando o veem, mas o resultado é análogo ao que fariam a Juno e a Vicentina.

Nossa governadora, hoje, voltou a ser defendida por ZH. Segundo o pasquim, ela reagiu ao cerco, seus limites foram testados, o Centro dos Professores do Rio Grande do Sul inspirou-se — ui, que perigo — no MST. E tudo isso só porque a desgovernadora quer acabar com o plano de carreira dos professores?

E enquanto a governadora lançava aterradores olhares de inteligência para os manifestantes como na foto ao lado, o ex-marido Carlos Crusius discursava na Associação de Dirigentes “Cristãos” de Empresas (ADCE) sobre o tema “A construção de um Estado moderno e justo”. Esses empresários de Deus escolhem bem a quem ouvir, não? Quem fará parte deste moderno grupelho carola?

A gente sofre, sofre até demais, mas há sobre o que rir. Yeda, apareça mais. Tu és o máximo, és a cara acabada e acabada do PSDB. Já disse que não quero teu impeachment — já pensaram na RBS apoiando o vice num governo de salvação da moralidade? –, quero tudo aquilo que a maioria BURRA dos gaúchos pediu. Dê-nos.

Me gustan los Estudiantes

O Estudiantes de La Plata apenas perdeu a Copa Sul-Americana de 2008 na prorrogação, isso após ter sido derrotado no primeiro jogo. Recordando: ganhamos lá por 1 x 0, eles nos venceram aqui pelo mesmo placar e o gol de Nilmar, na prorrogação, deu o campeonato ao Inter. Os argentinos demonstraram incrível bravura no jogo final.

Foi esta memória futebolística que ligou minha luz de alerta vermelho. Nada estava decidido em favor do Cruzeiro. Quando o jogo começou, toda a minha simpatia foi para os argentinos. É um problema de formação, estou condicionado a torcer contra times que vestem azul. Detesto o Grêmio, o Cruzeiro, o Lazio, o Chelsea, o FC do Porto, a seleção da Argentina, a Celeste Olímpica, etc. Ainda mais se há do outro lado um time de listras vermelhas como o Estudiantes. Foi um jogão. Reclama-se que a torcida do Cruzeiro teria esfriado após o gol de empate, mas há poucas torcidas no país que carregam um time, o normal é o contrário.

Na minha opinião, o Cruzeiro preparou-se para outro gênero de partida. Decidiu fora de casa seus confrontos anteriores — contra São Paulo e Grêmio — utilizando-se de frieza e superioridade técnica. Foi o suficiente. Ontem, contra 109 argentinos loucos, a tal superioridade parecia um gênero de soberba vazia que logo transformou-se em desconcerto e desespero. É complicado entrar em campo com um plano que é desmentido imediatamente pela realidade. Os azuis queriam um futebol de aproximação e toques, porém a necessidade era de marcação e a correria. Não houve chances para os mineiros marcarem até que Henrique “encontrou” achou aquele gol casual no início do segundo tempo. Pois nem isso foi suficiente, o Estudiantes foi ainda mais heróico, apertou o torniquete e virou o jogo com certa facilidade. Creio que a chegada do Cruzeiro à final foi tão simples e natural que Adílson Batista apenas deixou o barco seguir. A impressão que ficou foi a de um time arrogante, tentando ganhar de outro que daria a vida. Foi muito, mas muito insuficiente.

Como primeiro prato, tivemos o Coritiba passeando em cima do Grêmio com o melhor centroavante ruim em atividade no Brasil, Ariel — gosto dele –, e o Inter jogando mal, mal e mal no mesmo horário de Cruzeiro x Estudiantes, mas vencendo o Fluminense.

A cabeça do futebol, vários autores

Ganhei de presente este livro de um de seus autores, o escritor Fernando Monteiro. Trata-se de uma coletânea de crônicas futebolísticas organizada por Gustavo de Castro, Samarone Lima e Carlos Magno Araújo. O time contratado é cheio de estrelas, algumas habituais na crônica esportiva, outras bem menos. Como em qualquer grupo de atletas, tivemos bons e maus desempenhos, porém o trio dirigente manteve o comando do vestiário e o time saiu amplamente vencedor, apesar de algumas derrotas que revoltaram a torcida, a qual pediu insistentemente a cabeça do técnico, pretendendo jogá-la no fundo do entulho. Porém, a Casa das Musas manteve-se firme, declarando que não pagaria multas rescisórias à preguiçosos. O treinador permaneceu e o time mudou sem mudar.

Livros assim são um perigo, pois não adianta só saber escrever, há que saber ver o futebol. Conheço torcedores apaixonados para os quais tanto faria estar dentro de um estádio ou num hipódromo. Eles querem é torcer, não se preocupam em entender o que acontece em campo; suas sugestões são tolas, equivocadas, “irritam ao erudito”… Amam absolutamente o futebol, mas eu sei que, para entendê-lo a ponto de penetrar na cabeça de alguns técnicos, para adivinhar-lhes as reações, posturas e substituições, há que ter um gênero de observação especial que, curiosamente, não grassa por aí.

O livro abre com um bom relato de um caso uruguaio a cargo do espanhol Enrique Vila-Matas. Depois, o time chega cansado de Barcelona, sofrendo uma fragorosa derrota em São Leopoldo, a cargo de Fabrício Carpinejar — um conhecedor de futebol que veio com uma poesia banal, obra do cansaço da viagem, certamente. Fabrício, inclusive, acabou expulso de campo pelo árbitro. Na Vila Belmiro, José Roberto Torero, cronista habitual da área, assinou o mais emocionante e talvez melhor texto de todos, passando a bola a Juca Kfouri que, direto dos porões paulistanos da ditadura militar, fez excelente lançamento a Samarone (com um nome desses, o que seria de se esperar?) Lima que venceu o Velez e o Boca com tranquilidade em Buenos Aires. Após algumas derrotas surpreendentes, como a de Xico Sá, que marcou até gol contra, o time retornou à senda de vitórias com a extraordinária Selma Oliveira, que nos recomprovou que o olhar feminino sobre o futebol veio para ficar. Ela deu um passe a Abel Menezes, que pisou na bola. Sorte que o rebote caiu nos pés de Juremir Machado da Silva, o qual redimiu os gaúchos com um belo gol. Bola no centro. Então, a redonda ficou com Fernando Monteiro que, com o auxílio de Camilo José Cela, obteve inédita vitória com o Íbis. Daniel Piza escreveu uma crônica cujo tamanho só pode ser explicado pelas longas concentrações. Parece que ele resolveu deitar num texto tudo o que sabe de futebol. Sabe bastante, OK, mas a maratona gerou tal série de lesões e cartões amarelos que causou uma queda de rendimento com muitos empates verdadeiramente letárgicos. O time voltou ao bom caminho nas mãos competentes de Carlos Magno Araújo (CEUB?), Hilário Franco Junior (talvez um tanto erudito demais), Sérgio Xavier Filho (bonito relato sobre o futebol praticado pelos cegos), José Castello (O Fluminense está com Amok!) e Moacy Cirne (que me enganou até o final). Surpreendente mesmo foi a goleada sofrida por Humberto Werneck, um craque fora das quatro linhas. Tal derrota fez com que nossos dirigentes deixassem seus cargos à disposição. Sorte que a Casa das Musas não aceitou e mandou-lhes voltar ao trabalho, após tacar-lhes uma multa de 60% de seus vencimentos.

Vale a pena ler!

Organizadores: Gustavo de Castro, Samarone Lima e Carlos Magno Araújo.

Com Fabrício Carpinejar, José Roberto Torero, Juca Kfouri, Raimundo Carrero, Juremir Machado da Silva, Fernando Monteiro, Daniel Piza, Vladir de Sá Lemos, Inácio França, Luiz Zanin Oricchio, Luiz Martins da Silva, Klecius Henrique, Selma Oliveira, Josmar Jozino, Hilário Franco Jr., Humberto Werneck, Sérgio Xavier Filho, Abel Menezes, Moacy Cirne, José Castello, Rubens Lemos Filho, Elianne Diz de Abreu, Edmundo Barreiros, Xico Sá e o espanhol Enrique Vila-Matas.

Spinoza: "Deus é o asilo da ignorância"

Ontem, Idelber Avelar publicou um rumoroso post MANDANDO os ateus saírem do armário. Como já estou aqui fora tomando sol e chuva faz uns 40 anos (sim, tenho 51 e uns 40 de ateísmo) e ouvi o chamado do Mestre Idelder, cá estou para dizer que, em minha opinião, Deus é uma criação humana, mais ou menos assim como, digamos, meu amado Dom Quixote. Um trecho do post diz o seguinte:

Uma pesquisa recente, da Fundação Perseu Abramo, mostra que os ateus representamos o grupo social mais discriminado socialmente. Mais que negros. mulheres, travestis, gays, lésbicas. Mais, até mesmo, que transsexuais. Eu não estou dizendo que a discriminação cotidiana que sofre, por exemplo, um ateu branco, é comparável à que sofre um negro de qualquer crença. Não é. Não é, em primeiro lugar, porque ser negro e, até certo ponto, ser gay, são coisas impossíveis de se esconder. Ser ateu, não. Mas se você perguntar a um brasileiro em qual membro de grupo social ele não aceitaria votar de jeito nenhum, os ateus estamos, disparados, em primeiro lugar. Vivemos ainda nesse estranho regime que associa a moralidade à crença religiosa, como se existisse alguma relação entre religiosidade e comportamento moral, como se não soubéssemos nada sobre a lambança feita pelos padres com as crianças e adolescentes – para não falar dos séculos de lambança obscurantista e anticientífica promovida pelas religiões.

Vou contar uma coisa para vocês. Entrei em três concursos literários até hoje: ganhei um, fui menção honrosa em outro e perdi o terceiro. Nada demais; eu estava quieto, no meu canto, só que um dia me contaram porque eu tinha perdido este concurso e me afirmaram que, se fosse possível entrar em contato comigo e se eu retirasse o trecho a seguir, teria vencido… O trecho também não é nada demais. Aqui está:

— Ó Pai, que estás nos céus, colocado lá pela fraqueza, medo, culpa e imaginação de alguns, feito à nossa imagem e portador de nossos defeitos, olha por nós, pobres pecadores, que não usamos teu nome para nada e que vivemos pelo mundo como cães sem dono. Permite que os cães com dono não nos mordam – aqui olhou para o amigo — e que as boas intenções e desespero enviados diariamente por eles a ti, retornem na forma de grandes chuvas de bênçãos e não como tens feito ultimamente. Que a beleza da tua figura, formada em cada poro e célula por nosso afeto a nós mesmos e nosso horror ao vazio, possa espalhar-se pelo mundo e transformar-se em vales de onde jorrarão o leite e o mel necessários a nutrir teu povo…

Era uma oração. Obviamente, eu não retiraria este trecho de meu conto. Por que o faria?

Mas voltemos ao post do Idelber. Vou ser um pouco imodesto ao dizer que a parte que mais me entusiasmou no post é aquela em que ele amplifica de forma mais inteligente coisas que este que vos escreve repete há anos:

1. Que a maior TOLICE é afirmar que os ateus, ao se organizarem, criam uma seita e, portanto, tornam-se tão religiosos quanto blá-blá-blá. Cada vez que ouço alguém sofismar desse modo — sempre com aquele ar professoral que os tolos são hábeis para fingir –, saio em procura de meu copo, do livro que estou lendo ou de alguém que me salve.

2. Que os cristãos não aceitam críticas, mas metem o nariz onde não são chamados, como, por exemplo, na homossexualidade e no útero das outras.

3. Que o fato de instituições religiosas não pagarem impostos é a maior sacanagem que há contra as instituições laicas como, por exemplo, o colégio de meus filhos. Há empresas que se tornaram as maiores em suas áreas pelo simples fato de não pagarem impostos. Tenho exemplos, mas a autocensura está me pegando forte depois da agressão que sofri (vocês sabem). É claro que há alguma benemerência aqui, ali e acolá — e que são importantes –, mas as vantagens empresariais herdadas de Cristo são o sonho de todo o neoliberal.

4. Que quem é ateu e declara tal “absurdo” não tem nenhuma chance política.

E (o Idelber não afirma o que escrevo a seguir):

5. Que respeitar a religião dos outros é aceitar uma opção íntima que, se for vendida, merece imediata reação da parte do ateu, que pode, sim, fazer proselitismo em sua defesa.

E vou trabalhar. E estou de péssimo humor.

(A citação acima foi retirada de um comentário de Maurício Santos, um dos 264 que o post do Idelber gerou).

Tema recorrente

Dia desses, estava eu na sala de espera do dentista de minha filha quando vi uma Veja antiga bem do meu lado. Como sou um ser de algumas manias, comecei a folheá-la da maneira mais inteligente e correta, ou seja, de trás para diante. Logo, dei de cara com um artigo de Isabela Boscov — normalmente discordo dela — e, bem, ela estava coberta de razão. Numa crítica ao filme Katyn, de Andrzej Wajda, ela estende seu elogio a toda a geração de cineastas a qual pertence o polonês de 83 anos. É uma bela crítica, tão boa que perguntei à secretária do consultório se podia roubar a revista de quatro meses de idade. Ela deixou.

Neste ínterim, o Marcos Nunes pediu para que eu assistisse o filme Jean Charles. Não entendi bem o motivo, mas ia vê-lo de qualquer maneira. Gostei do filme de Henrique Goldman. Mais: saí do cinema quase entusiasmado. Por quê? Ora, porque vejo cada coisa ruim por aí que é bom saudar um filme com ritmo, atuações dignas e que retrata honestamente seres humanos muito reais.

O que isso tem a ver com a crítica de Boscov? Ora, tudo. Ela, após elogiar o filme de Wajda, entrou em surto fazendo uma longa digressão sobre o que fora o cinema entre os anos 50-70 e o que é hoje. Fellini, Antonioni, Bertolucci, Visconti, Bergman, Kurosawa, Truffaut, Malle, Godard, Kubrick e outros viam o cinema não somente como espetáculo. Eles tinham consciência de que tinham na mão um meio de expressão de apelo sem precedentes e tratavam de utilizá-lo como difusor de ideias — explícitas ou subliminares –, de imagens que não fossem uma derivação da publicidade, como fórum, etc. E eles foram bem sucedidos em sua tentativa de criar uma cultura relevante, tanto que seus filmes — e deveríamos citar também Clint Eastwood, Emir Kusturica, Francis Ford Coppola, Andrei Tarkovski, Hal Hartley, Alexandr Sokurov, Martin Scorcese e Werner Herzog…, misturo conscientemente seus nomes — formam talvez o mais completo referencial do que foi o século XX.

Mas não foi só o cinema que apequenou-se, foi a cultura de forma geral. Kurosawa sabia como fazer, mesmo com atores japoneses, um Trono Manchado de Sangue perfeitamente shakespeariano por ter recebido uma educação clássica ou, no mínimo, por ter estudado cada detalhe da obra original. Hoje, é tudo mais fácil. Não há necessidade de continuidade, de debate e assim vamos ficando cada vez menores.

Jean Charles é muito bom. Faz um relato seguro, honesto e até delicado de uma vida banal interrompida de forma estúpida pela paranóia e medo de um agente da Scotland Yard. Nada demais, mas talvez o máximo a que possamos aspirar nestes dias de decadência consolidada.

Quinteto Villa-Lobos de graça em Porto Alegre

O Quinteto Villa-Lobos traz de volta seu amor, desata macumbaria, doenças mandadas e da carne. Traz seu emprego de volta — assim como o desejo –, cura doenças e faz com que ela chame seu nome mesmo que esteja junto de outro homem. Faz tudo ao contrário e vice-versa se você for mulher.

Não perca, imbecil!

Anúncio copiado de PQP Bach.

Loki e Stella estão em cartaz

Destaco dois bons filmes que recém entraram na minha lista de filmes vistos.

O documentário Loki – Arnaldo Baptista, de Paulo Henrique Fontenelle, me interessou tanto por suas antológicas imagens e filmes dos Mutantes, quanto pelo que tem de humano. Os Mutantes eram um trio acompanhado de baixo e bateria. Rita Lee cantava e fazia gracinhas — era fundamental ao grupo e a seu líder –, Sérgio Dias era um tremendo guitarrista e Arnaldo,  irmão de Sérgio, era o líder musical e principal compositor. A sinceridade dos entrevistados e a tentativa de Arnaldo “organizar-se” para o filme são comoventes, com destaque para a franqueza de Roberto Menescal, que diz, com todas as letras, que concordou em produzir Loki — o grande álbum solo de Arnaldo Baptista — por achar que estava participando de um momento histórico, ou seja, que colocaria seu nome na gravação do disco do drogado maluco do maior grupo de rock brasileiro.

Senti falta de algumas explicações no documentário, mas logo após recuei, pensando que o período LSD de Arnaldo deve ter sido tão insuportável para quem estava próximo que é natural seus silêncios. Rita Lee, sua demissionária mulher na época, não é entrevistada e Sérgio Dias passa ao largo de explicar as décadas (mesmo!) que passou sem ver seu irmão. Bem, se os deprimidos já são pessoas chatas para os não-deprimidos, o que dizer de um drogado que viaja à Florença a fim de avisar a um amigo que o estava nomeando para comandante de sua nave espacial… (sério!). Imagino o grau de loucura e, quem sabe, de violência que não terá ocorrido na separação de Arnaldo e Rita.

Cê tá pensando que eu sou loki, bicho?
Sou malandro velho
Não tenho nada com isso

A gente andou
A gente queimou
Muita coisa por aí

Arnaldo é um sobrevivente de bela biografia: atirou-se do quarto andar de uma clínica, passou um bom tempo em coma, foi abandonado pela família no hospital e salvo por uma fã que o visitava  diariamente e que á casada com ele até hoje. Baita história, deu um baita filme.

(Absolutamente imperdível é a apresentação dos Mutantes com Gilberto Gil no Festival da Record, com arranjo do maestro Rogério Duprat, cantando “Domingo no Parque”. O mesmo vale para Os Mutantes interpretando Panis e Circensis na TV.)

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Em minha opinião, Stella é bastante superior a Entre os Muros da Escola a começar pelo fato de que me interessa muito mais o ontológico do que  o sociológico. Entre os Muros pode ser contado em poucas palavras; Stella, nunca. O filme narra a história de uma menina cujos pais moram com ela num bar. Eles têm um apartamento no andar de cima e o bar fica embaixo. É um bar de bêbados… Muita música e baruho. Seus pais trabalham demais,  brigam demais, bebem sem parar e fumam como chaminés. Um dia, a menina recebe uma bolsa para entrar num famoso colégio de Paris e ali começa a observar a existência de seus colegas. Primeiro, rejeita a escola; depois, faz amizade com uma judia argentina perfeitamente adaptada ao  ambiente escolar (e é a melhor aluna da turma) e a amizade cresce. O confronto entre os dois mundos — um organizado, burguês e culto; outro caótico e violento, onde está onipresente certa pressão à pedofilia — é explorado até o fim pela diretora Sylvie Verheyde, que, sem ter de apelar para longos discursos, consegue sugerir nuances a partir de interpretações pré-adolescentes.

É um filme delicado e pesado, que não dramatiza excessivamente os problemas, mas também não os evita. E, junto com O Casamento de Raquel, forma a dupla de melhores filmes que vi no primeiro semestre de 2009.

Porque hoje é sábado, Claudia Lynx

No sábado passado, fui espinafrado pelo Eduardo Lunardelli. Ele reclamava do excesso de roupas.

Já tinha preparada uma resposta cheia de peitos e bundas.

Porém, de forma casual, deparei-me com o rosto da iraniana Shaghayegh Claudia Lynx.

E todos os peitos e bundas e púbis ficaram para outra oportunidade.

Nascida em Teerã em 1982, Claudia Lynx emigrou ainda bebê para a Noruega.

Aos três anos de idade fez seus primeiros comerciais: vendia fraldas na televisão européia.

É óbvio que é modelo, que tentou ser atriz e, como não devia ser das melhores, …

… acabou cantora — e modelo. As carreiras, sabemos, são previsíveis.

Na edição anterior do PHES, também fiquei contrariado com o comentário da Caminhante: …

… ela me acusava delicadamente de preferir as loiras.

Trata-se de uma blasfêmia que repudio veementemente.

A pele mais linda que conheço é aquela que os italianos chamam de olivastra.

É a pele que dá vontade de tocar, é aquele amorenado (natural, sem sol) de algumas mulheres …

… e que tende ao dourado. É olivastra. Não tem tradução, acho.

Bem, mas como é bonita esta iraniana, né? Nenhum aiatolá ousaria botar defeito.

Quantas dessas não haverá sob as burcas?

(*) Minha filha achou Claudia Lynx “plastificada” demais. Tudo bem, não interessa; vindo nesta ou naquela embalagem, tô fazendo negócio.

O Bailão do Mano

O Corinthians jogou mais e mereceu. Na verdade, nosso primeiro tempo foi de uma constrangedora produção e não ficou nada para o segundo. Acho que o Inter poderia ter feito muito mais e até pretendo dar uns pitacos, mas é claro que todas as nossas falhas foram catalisadas pela intervenção de um adversário superior. Uma excelente defesa, um toque de bola envolvente, efetividade na frente; enfim, tudo o que sobrou ao Corinthians faltou a nós.

O esquema do Corinthians é simples, convencional e bem treinado. Quatro bons zagueiros (André Silva e William são sensacionais), dois volantes defensivos, um volante mais solto (Elias), um centrovante fixo e dois caras de movimentação (Jorge Henrique e Dentinho). Tudo ajeitadinho; sem novidades, mas tudo perfeitinho. Como sou colorado, preocupo-me e comentarei mais o Inter, mas não considero que o Inter tenha apenas perdido (ou entregue) o campeonato, foi o Corinthians quem o ganhou. Se foi fácil, deveu-se a uma enorme diferença.

Já o Inter tentou passar ao árbitro a responsabilidade de vencer o Corinthians. Foi o erro nº 1 do segundo jogo. Não dá, né? Todos sabemos que o Corinthians e o Flamengo são os queridinhos da arbitragem, porém é mais adequado tentar jogar. Tite errou em muita coisa. Se tirou o lastimável Álvaro, deveria ter tirado também Índio, que passa por má fase. Ontem, a confirmação; Índio foi vencido muitas vezes. Não creio que seja um ex-jogador, é apenas um jogador em má fase. Outro fato que nos prejudicou foi a utilização de reservas no Brasileiro. Um time tem que jogar e jogar e jogar. Entrosamento se adquire e se mantém dentro de campo, não em treinamentos, ainda mais se quem treina é o Pastor Tite. E, para completar, uma ridícula atuação de D`Alessandro: voltando de lesão e fora de ritmo de jogo, preferiu o papel de machinho argentino e demitiu-se do jogo. Foi apenas espalhafatoso e retirou-se pateticamente da partida.

O falta de reação de Tite foi evidente. Quando o Corinthians fez o primeiro gol, ele deveria ter sido rápido, retirando Glaydson para colocar Andrezinho ou Alecsandro, pois estava na cara que D`Alessandro — um grande jogador, mas que só joga quando está em forma — seria insuficiente na armação de jogadas. Só que nosso treinador é pusilânime e parece ser incapaz de raciocinar que os volantes do Corinthians estavam sem diversão.

Bom, perdemos. Agora, Fernando Carvalho afirma que, a partir deste jogo, só jogam os titulares… Tá bom.

Como curiosidade, vejam o DVD do Fernando Carvalho… Mereceram vencer, mas viver assim é melhor! Infelizmente, não nasci flamengo nem corintiano.

Ou clique aqui.

Fiasco futebolístico familiar com final feliz (5F)

OK, hoje Inter x Corinthians fazem somente uma decisão de Copa do Brasil, não é uma Libertadores; mesmo assim, aguardo histórias como as geradas por aquele Inter x São Paulo de 2006. Às vezes, acho que somos uma família fadada ao fiasco (3F). Algumas histórias daquela última noite de grande decisão no Beira-Rio, o memorável 16 de agosto de 2006:

1

Eu e Bernando (juntos, chegaremos aos 1000 jogos!) no finalzinho do jogo.

— Dado, quantos minutos?

Ele consulta o relógio.

— 42.

Depois de meia hora e de uns duzentos ataques do São Paulo, pergunto novamente:

— Dado, quantos minutos?

Ele consulta o relógio.

— 43.

— Não pode, merda! Tu não sabe nem controlar o tempo, bosta!

(Existe um “tempo emocional”? É uma maneira de prolongar a existência, não?)

2

Meu sobrinho Filipe — na época um adulto de 22 anos — não suporta a tensão e resolve “ver” o final da partida fechado no banheiro. Entra no malcheiroso recinto com o rádio a todo volume. Como consequência, vê saírem das privadas e de todos os cantos pessoas gritando para ele desligar aquela porcaria. O banheiro estava lotado.

— Aqui ninguém ouve rádio, caralho! Se quiser ficar com a gente, desliga!

Filipe desligou. Todos ouviam o som do estádio, esperando os gritos da comemoração do título. Sim, é uma espécie de seita da qual ignoramos a existência. Enquanto isso, aspiravam à América e a inolvidável fragrância de um banheiro masculino de estádio de futebol.

3

Durante a madrugada, eu fui para casa dormir, claro. Enquanto isso, Filipe, Bernardo e o amigo Guilherme iam na casas dos gremistas mais nojentos que conheciam. Na frente de cada uma delas, gritavam como loucos, soltavam foguetes, buzinavam, sopravam cornetas e eram ameaçados pelas famílias e vizinhos. Então, partiam para a próxima. Fizeram isso ao longo de toda a noite.

4

Claudia, minha mulher, é gremista e estava trabalhando em São Paulo naqueles dias. Dormia no hotel quando ouviu o foguetório na cidade. Abriu os olhos, levantou-se e foi à janela do quarto. Como estava no 12º andar, teve o que pensou ser uma bela visão dos são-paulinos comemorando a vitória. Ligou a TV para curtir a tragédia colorada. Só viu colorados comemorando. Aqueles, os que soltavam foguetes e buzinavam por São Paulo, eram corintianos, palmeirenses, santistas e todo o resto. Ela reclama até hoje.

Tô nervoso, porra

Vocês sabem como é, né? Não, vocês não sabem. O fato é que eu estou aqui aguardando a audiência e deveria estar na concentração para o jogo contra o Corinthians. O professor Tite me olhou no olho e me liberou meio que no bom coração. Mas me mandou voltar logo. Já está na hora, passou das 14h e o juiz não chamou. Tudo por causa daquele maldito processo de reconhecimento de paternidade que o gordo ali quis fazer quando todos sabem que a Nanda é minha filha.

Indagorinha mesmo, um débil mental me reconheceu e veio falar comigo. Queria saber se eu ia jogar, o que estava fazendo no Fórum, etc. Me deu vontade de responder que tinha vindo comprar pão. As pessoas acham que mandam na vida da gente. Todos acham isso. Ele me disse que era advogado, sócio do Inter, e, depois de me perguntar e reperguntar se eu estava bem para o jogo, me contou que o nome Corinthians veio da tradução inglesa do título de uma das epístolas (ou algo parecido) do apóstolo Paulo, que assim chamava os habitantes da cidade de Corinto, na Grécia, onde joga o Rivaldo. Ele terminou falando que Corinthians era como Maicosuel ou Uélinton — essa parte eu não entendi. Eu — bah! — estava interessadíssimo, só pensando se o Ronaldinho sabia que o nome de seu time era meio grego e ridículo… Com a graça de Deus o advogado chato sumiu e pude observar meus adversários.

Caralho, por que a Lúcia era tão puta? O primeiro que apareceu depois de mim era um magrão que eu não conhecia. Tinha cara de bom moço endinheirado. Vinha do shopping saber se tinha uma filha ou não. Calça de brim novíssima, tênis de atleta olímpico de alto rendimento, um blusão branco com o nome da loja estampado enorme e uns óculos caros e ridículos. Não era muito másculo, mas impressionava pelo investimento no visual, muito parecido com o da maioria dos jogadores. Acho que só pegaria a Lúcia se a bolinha viesse picando. Ah, Lúcia, meu amor, tão vadia. Abri o processo para descobrir o nome da figura: Juliano Martins. Esse não queria a Nanda, dizia desde o começo que teve “sexo casual” com minha mulher. Ela confirmou, mas fiquei na dúvida quando uma mulher mais velha, certamente sua mãe, chegou ao lado dele olhou para todos os lados e falou meio alto:

– Ué, a Lúcia não veio?

Melhor deixar para lá. O problema é o gordo, chamado Luís Fernando Antunes. Ele diz que a Nandinha é a cara dele e quer a guarda compartilhada. Na boa, é um cara muito mal-humorado e está puto com a situação. Na ação, disse que pagou a prótese de silicone da Lúcia, uma lipoescultura e alguns acertos no nariz que me fazem pensar em acertar o dele. Parece que tem testemunhas. Eu queria era levantar o beiço dele e bater só na gengiva. Ele é tão parecido com a Nanda quanto o Michael Jackson de qualquer fase. Se financiou as loucuras de Lúcia, se a deixou mais tesuda ainda, que fique sabendo que quem come a mulher e cria a filha sou eu. Nosso advogado me explicou a coisa assim: o gordinho seria uma espécie de “corno duplo”. É um fodido mesmo.

E eu estou aqui, nervoso. Amo a Nanda tanto quanto a Lu, vocês não imaginam. Tudo o que eu faço é para elas. Quando vim para o Inter, só pensava no carro absurdo que ia comprar. A primeira coisa que me preocupou no clube foi aquela lombada que tinha lá na Av. Beira-Rio. Como é que eu ia sair de lá na minha nave a toda a velocidade com aquela porra logo ali na saída? Desisti do carro esporte e comprei uma caminhonete que nem a do Guiñazu e mandei um troco para a família. Não sabia ainda o que me rondava.

Vi a Lúcia numa praça de alimentação. Ela estava com uma amiga. Estava linda num vestido rosa decotado. Achei que tinha direito àquilo. A sacana me sorriu de longe e eu, olha, eu nem sorri, acho que gargalhei, tal era o monumento que me dava bola. Para chegar foi fácil, a amiga dela sumiu e ela ficou me esperando. Enrolei uns dois minutos e levantei. Ela logo foi me dando lugar. A primeira coisa que me deixou maluco era que a beldade loira sabia tudo de futebol e era colorada. Tudo a ver comigo. É simplesmente inacreditável que ela tenha dado trela praquele gordo. O magrão, tudo bem, anda na moda, é bonitinho, coisa e tal, mas aquele balofo não tem nada a ver. Deixa eu ver aqui no processo: É “empresário”, o magrão é “estudante”. Vão se foder!

Aí começaram as viagens e eu acho que virei titular só pensando no que estaria fazendo a Lúcia. Nunca paro de ter ciúmes dela. Depois que a conheci, passei a treinar como o Guiña, só de ódio, pensando no que a Lu não aprontaria enquanto eu estivesse quarando na concentração. Ela gosta muito da coisa; se um dia ela enfiasse a língua numa tomada lá de casa, estouraria a rede elétrica do condomínio inteiro; se põe os olhos em alguém, é pau duro na hora. Tem que ter preparo para ela. E me aparece aquela figura roliça para me encher o saco… Como é que ela não desmontou ele? Pois montar é com ela mesmo, e aí a gente fica olhando aquela coisa perfeita em cima da gente e é uma desgraça. E, nos outros momentos, tem a Nanda, a minha queridinha. Ela é quem faz questão de ir aos jogos me ver. Ela é que se apavora quando eu caio. Ela foi a homenageada quando fiz meu primeiro gol depois de mais de trinta partidas como titular. Minha função não é a de fazer gols, mas me pifaram, fiz um e apontei para ela nas cadeiras. Sei onde elas sentam.

Até o mês passado, tudo era maravilhoso. Ganhávamos de todo mundo, aí o professor inventou de “poupar” jogadores. Eu não quero nem saber, gosto e preciso de dinheiro e por mim jogava todas. Mas o negócio de treinar mais e jogar menos acabou desentrosando o time, que hoje perde para todo mundo. Ganhamos domingo, mas eu não estava jogando. Olha, nem sei se a Lu e a Nanda devem ir amanhã. O jogo tem tudo para ser arrastado, com os corintianos fazendo o tempo passar e com a merda do Ronaldinho só esperando uma chance. Tô nervoso com o jogo, claro, e tô nervoso com o processo. Aliás, já pensou se amanhã a Nanda fosse ao jogo com o roliço? Ah, eu dava um soco naquele Elias. E se o cara for gremista e ficasse se empanturrando com ela na frente da TV, dando risada da nossa cara? E a Nanda? Não vai ser ouvida só porque tem 3 anos, caralho? Ela me adora e eu adoro ela!

Putz, eu tenho que voltar para a concentração. O professor vai me matar. Ainda bem que ele viu que isso é importante e sabe como eu sou com a Nandinha. O que a Lu viu naquele saco de gordura? A conta bancária? E a Nanda, o que acharia dele? Criança é volúvel e ela é filha da Lúcia, que parece gostar de todo mundo. Naquele dia do shopping, ela deixou o carro dela no estacionamento e fomos na minha caminhonete para o motel. Ela é louca mesmo. Vi que tinha ficado impressionada com minha BMW preta. Foi uma tarde e tanto. Vi estrelas naquela cama e mais ainda na banheira de hidromassagem. Numa hora, Lúcia ficou em pé para sair e vi seu corpo perfeito e molhado, com todas as curvas aumentadas e refletidas pela luz do quarto. Uma corpo daqueles escraviza o homem. Será que não vão considerar que amo a Nanda e sou tão ciumento dela quanto da mãe? Daria tudo para que ela fosse filha do magrão babaca, o filhinho da mamãe.

Era o destino, já no primeiro dia enquanto a via sair da banheira de hidromassagem, notei uma pequena barriguinha. A Nandinha já estava ali, com os choros e risadas que conheci depois. Conheci as duas juntas no mesmo dia, entende? Ela simplesmente não tem nada a ver com aquele babaca gordo tipo Ronaldinho.

Mas estão nos chamando para dar o resultado do exame.

Vidas de Santos: São Pedro Claver de Cartagena das Índias

Para A.B.C. e adega de H.O.

São Pedro Claver (1580-1654), nascido na Catalunha, é um grande exemplo para a humanidade. Ele entrou na Companhia de Jesus aos 21 anos a partir da enorme influência que sofreu de Alfonso Rodriguez, porteiro do Colégio de Mallorca. Ordenado sacerdote em 1616, quando já em missão na Colômbia, exerceu até a morte um difícil apostolado entre os escravos negros de Cartagena, importante porto daquele país. Converteu e batizou mais de 300.000 escravos.

Quando os negros chegavam da África nos fétidos porões dos navios negreiros e eram loteados entre os compradores, sempre sobravam alguns que não serviam para nada, na opinião dos clientes. “Muito fraco!”, “Doente!”, “Maus dentes!”, “Gangrenado!”, “Mutilado!”, “Inútil!”, gritavam os senhores adquirentes para os pobres africanos que não os entendiam. Mas São Pedro Claver pensava diferente. Os doentes, os magérrimos e os enlouquecidos pelo sofrimento eram aqueles sobre quem o santo trabalharia para mostrar a grandeza do Deus romano àqueles bárbaros incultos. Eles eram recolhidos pelo dedicado Pedro pelas ruas úmidas de Cartagena. Outros, mesmo lazarentos e magros, eram comprados a baixo custo pelo olho clínico do santo, que lhes antevia um longo porvir.

Primeiramente, Pedro tentava recuperá-los para o trabalho. Muitos, apesar das novidades — alimentação, local seco para dormir e tratamento vip –, morriam e eram lamentados rapidamente em latim antes de irem para a vala comum. Outros, para a felicidade dos missionários e grandeza de Deus, recuperavam-se e podiam voltar a trabalhar. Porém, sobre todos ele, sem exceção, Pedro fazia seu trabalho de evangelização, ensinando-lhes latim e mostrando-lhes os ensinamentos e os caminhos de Cristo. Muitas vezes, ao observar o estranho rebanho de negros agradecidos — muitos seminovos em perfeito estado, alguns mancos e outros com seqüelas piores –, o coração de Pedro Claver confrangia-se.

Havia os que recuperavam inteiramente suas forças. A estes, era imediatamente concedida a graça do retorno ao mercado de trabalho. Ficavam ativos com a finalidade de demonstrar suas qualificações aos compradores potenciais. Orientados pelos padres, trabalhavam na construção de mais Casas do Senhor, pois, na inculta região onde estavam, não havia ainda igrejas belas e ricas através das quais podia-se sentir com maior plenitude a Glória do Deus de Roma. Aquilo funcionava como um grande show-room: os negociantes viam os negros na labuta, examinavam o resultado de seu trabalho conjunto, davam uma rezadinha básica e fechavam ou não a compra. Aquelas transações tinham o claro sentido de aumentar o capital da igreja para a Glória de Deus. Aos outros, mutilados, incapazes ou fracos, eram ministrados maiores latinórios e permaneciam com os missionários. Serviam para muitas tarefas. Alguns, de constituição delicada, serviam a Deus como faxineiros, trabalhavam nos jardins ou tornavam-se assessores pessoais dos padres.

Claro que as maledicências não tardaram. Um português dono de uma pequena frota de navios negreiros, chamado Beonardo Bofe, ficou muito enfurecido com a venda de material recondicionado (que considerava em parte seu) e quis acabar com aquilo denunciando as ações do santo. O único resultado que obteve foi o de ser silenciado pelo fogo santo dos representantes de Roma. Como ganho secundário, viu — aqui, o verbo ver é utilizado de forma severamente metaforica pelo autor destas linhas — o nome de seu opúsculo figurar no Index Librorum Prohibitorum.

Porém, as ruas quentes de Cartagena eram mais difíceis de controlar e irrefreáveis comentários passaram a dar conta de que São Pedro Claver costumava utilizar os negrinhos mais delicados e coleantes numa espécie de harém sem mulheres montado às margens do Caribe. Também as más línguas de Cartagena acusaram os padres de fazerem entrar no recinto “dominado pelo Diabo” — e certamente imaginário, pois gente inculta, ignorante, má e faladora encontra-se em todos os cantos desse mundo dominado por Deus -– os filhos mais bonitinhos dos escravos. Os comentários maldosos diziam que os negrinhos despiam-se para os padres, mas creio seja absolutamente natural o fato de que religiosos analisem detidamente a perfeição da maior criação divina, o homem, representada por seus mais belos espécimes. Estou aqui com toda a documentação necessária para rebater as acusações que se fizerem ao santo. Há registros fidedignos de aulas e mais aulas de religião e latim que os pequenos efebos recebiam. Tenho comprovações de que eles, quando cresciam e terminavam sua formação religiosa, diziam frases em latim, divertindo-se pelas ruas. Anotações autênticas daquele período demonstram que os meninos recitavam ladainhas como Vox Copuli e Pubis Pro Nobis e acabavam trabalhando em casas de reuniões noturnas freqüentadas por navegadores e negociantes daquele mar. Serviam, na verdade, como intérpretes da babel de línguas que aquelas casas recebiam. A apreciável técnica da tradução por chuchotagem principiou naquela época, em plena Colômbia caribenha. Tudo isto é atestado por farta documentação que não mostro aqui por falta de espaço.

A prova maior era que na Casa dos Negrinhos não entravam prostitutas. É óbvio que aqueles bem formados e torneados jovens africanos não tolerariam a presença do pecado morando ao lado.

É, portanto, notável a contribuição de São Pedro Claver no desenvolvimento da região de Cartagena, conforme podemos conferir a seguir através de suas principais realizações, que esquematizo para que nossas crianças possam abordar com maior facilidade a vida deste grande santo:

1. Recuperou milhares de negros doentes e mutilados.
2. Construiu grandes obras que aumentaram o patrimônio da Igreja Católica.
3. Aqueceu a economia local com negros recondicionados.
4. Salvou negros que morreriam por falta de um responsável.
5. Formou como tradutores-intérpretes os negros jovens mais agradáveis que chegavam machucados à Cartagena. Especialidade: a difícil arte da chuchotagem.
6. Converteu e batizou 300.000 escravos.
7. Inventou a sauna.

Porque hoje é sábado, Marianne Faithfull

Escolha da modelo e das fotos: Bernardo Ribeiro, filho deste que vos escreve.

Se há algo que Mick Jagger sempre deixou claro para o mundo é que, …

… em sua Pasárgada, pode ter a mulher que quiser, na cama que escolher.

E a primeira beldade com a qual teve longo relacionamento foi Marianne Faithfull.

Misto de cantora — uma voz comum no ano em que tirou estas fotos, o de 1964; incomum depois — …

… e atriz, Marianne foi para mim o rosto da swinging London. Achava-a e ainda a acho …

… maravilhosamente sexy. A transformação que ocorreu na voz de Marianne após …

… seu longo período de viciada, é algo que as campanhas antidrogas não deve mostrar às crianças.

Nossa, os dez anos de tratamento para se livrar das drogas melhoraram muito sua voz!

Seu LP Strange Weather (1989) merece status de obra de arte.

Marianne Faithfull envelheceu com vaidade e dignidade. Não fez grandes plásticas, …

… apresentando hoje rugas, barriguinha e orgulhosos peitos erguidos sabe-se lá como.

Gosto das pessoas que envelhecem mantendo o pique iconoclasta e rebelde.

Vejo mil exemplos de gente que, ao chegar aos 50, parece não preservar a inteligência, …

… curvando-se a vagos ressentimentos e ao politicamente correto, nossa nova ditadura.

Tenho um exemplo claríssimo, mas hoje é sábado… Vejam Marianne Faithfull abaixo, trovejando num vídeo relativamente recente. A canção é a multigravada Working Class Hero, de John Lennon.

Michael Jackson é um vírus / Semelhanças

Sim, e meu antivírus já ficou todo eriçado com a possibilidade de ele penetrar em meu notebook, mesmo ele sendo um Dell púbere de mais de três anos.

Michael Jackson era um gênero de ruína moderna que nunca conseguiu me interessar. Mesmo com toda a sedução que a palavra “decadência” possui para todos os leitores, Jackson parecia estar em outro mundo, só compreendido por Liz Taylor e seus fãs. Além do embranquecimento, do nariz de múmia, das bolhas (pois ele dormiu em bolhas de vidro numa época, não?), de balançar bebês em sacadas, de comprar e perder os direitos sobre a obra dos Beatles, das acusações de pedofilia, do casamento com a filha de Elvis Presley, do seu sítio Peter Pan-like, do casamento com sua enfermeira e de um monte de loucuras, pijamas, roupas, fantasias e excentricidades, o que havia nele? Ah, também tinha sua belíssima dança e, lá atrás, bem lá atrás, talvez alguma música.

Delas só consigo lembrar de Thriller e Black or White e mesmo assim só acho legal os videoclipes. Caetano Veloso costumava cantar Billy Jean, porém, francamente, nunca entendi direito a melodia, até porque nunca ouvi o original. Sou um ET que quase só ouve eruditos — agora mesmo estou ouvindo Fasch — e jazz. Além do mais, não compreendo um negro que fica branco, alegadamente em razão do vitiligo. Aliás, toda sua figura transformada por operações, mais a roupa, o rancho e a cobertura insistente da imprensa, sempre me mostraram que Michael era um jeca enlouquecido.

O fim de Michael Jackson e o de Farrah Fawcett, aos 50 e 62 anos, não me causam nenhuma comoção, mas fico encasquetado com uma coisa: são ídolos que explodiram quando eu já tinha idade para rejeitá-los. Ou seja, são pessoas para mim muito jovens e próximas de meus 51 anos.

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Ontem, estávamos vendo As Confissões de Henry Fool e meu filho apontou semelhanças entre:

O ator James Urbaniak (figura comum nos filmes de Hal Hartley) e Dmitri Shostakovich

De novo, como contraprova:

E, em linha menos artística, Mahmoud Ahmadinejad e eu:

Para que recontar os votos, porra?

Bloomsday

Sim, claro, eu sei que o Bloomsday já passou há exatamente uma semana. Eu tinha reservado as duas fotos abaixo para publicar no dia 16 de junho, mas me esqueci… Hoje, já que não consegui preparar um post devido às arrumações no blog, publico as duas fotos de Marilyn Monroe lendo Ulysses. Para minha pouca surpresa, vários blogs ingleses fizeram isto na última terça-feira. Até parece que as fotos de Eve Arnold são recentes…

O estranho é que muitos duvidam que Marilyn tenha lido Ulisses. Mais estranho ainda é que Ulisses permaneça com a aura de livro impenetrável, difícil. Há enigmas no romance? Sim, e como! Dizem que leva-se em média 100 anos para compreendê-lo inteiramente… Mas, como escreveu o Idelber:

Não se deixe levar pela fama de “difícil” do livro: poucas vezes escreveu-se coisa tão engraçada, escandalosa, divertida e sexual como Ulisses. Em cada diálogo, cada cena, cada capítulo, mil sentidos. O treco não acaba nunca.

Além do mais, a foto, de 1955, é do ano anterior em que ela casou com o dramaturgo Arthur Miller. Eles já estavam “dating”. Com ou sem Miller, Marilyn poderia ler Ulisses. Porém, como suponho que o casal falasse também de arte, fantasio que Miller tenha sugerido o livro a Marilyn. E depois sou eu o preconceituoso…