Ospa em noite de trocadilhos fáceis e de um flute hero

Ospa em noite de trocadilhos fáceis e de um flute hero
Após o concerto de ontem, a Ospa mereceria este sorriso e charuto do mestre.
Após o concerto de ontem, a Ospa mereceria este sorriso e charuto do mestre.

Não terei tempo para escrever com maiores cuidados a resenha do concerto de ontem à noite no Salão de Atos da UFRGS. Então, vou iniciar pelo final: foi muito bom. O maestro Carlos Prazeres entregou-se à música e o resultado foi bom para mim e para todos. Mas poderia ter sido ainda mais satisfatório… O público cometeu um grande erro. O excelente pianista georgiano Guigla Katsarava daria seu bis se voltasse pela terceira vez ao palco, puxado pelos aplausos. É a praxe, gente! E falamos com ele! Como o pessoal cessou de aplaudir logo após a segunda entrada, ficamos chupando o dedo. Ele tocou maravilhosamente o Concerto para piano nº 1, Op. 23, de Pyotr Ilyich Tchaikovsky.

Este concerto abriu a função. Foi composto entre novembro 1874 e fevereiro de 1875 e revisto no verão de 1879 e novamente em dezembro de 1888. É uma das mais populares composições de Tchaikovsky e está entre os mais conhecidos concertos para piano. Embora a estreia tivesse sido um sucesso de público, os críticos não ficaram nada felizes. Um deles escreveu que “não estava destinado a se tornar famoso”. Errou feio.

A execução da obra foi magnífica. Katsarava  trouxe um sotaque autenticamente russo a Tchaikovsky. A orquestra esteve muito bem e, logo após o segundo movimento, anotei apressadamente no programa: “Klaus Volkmann, que bonito, que delicadeza! Javier tb mto bem!”.

O feito de Klaus é digno de nota, ainda mais que eu soube depois, através de fontes ligadas à orquestra, que ele tinha deixado cair no chão o estojo de sua flauta, avariando o instrumento. Imaginem que ele tocou num INSTRUMENTO EMPRESTADO do segundo flautista! Com todos os solos que fez — era uma noite em que Klaus seria especialmente exigido — e com a extraordinária qualidade deles, dá para se ter uma ideia da magnitude do feito. Poucos conseguiriam. É como se ele tivesse saído do banco de reservas, após longa lesão, para virar o jogo. Porra, Klaus, foi demais!

Depois veio Batuque, de Alberto Nepomuceno (1864-1920), espécie de micro-Bolero de Ravel. O cearense Nepomuceno tem o mérito de ter sido um dos precursores do nacionalismo musical, que explodiu mesmo com o talento de Heitor Villa-Lobos

Por falar nele… E veio a melhor peça da noite, o Choros N° 6, de Villa-Lobos. Escrita para orquestra em 1926, a peça só foi estreada no Rio em 1942. É irresistível. Meus sete leitores sabem, tenho o coração duro e o derramamento de mel promovido por Tchaikovsky apenas me agradou parcialmente. Gostei mesmo foi do Choros, espécie de passeio musical — de trem, como Villa gostava de trens! — por bairros e cidades da periferia do Rio de Janeiro. É uma obra de primeira linha, com episódios muito belos, seresteiros, carnavalescos, chorados e contrastantes. O que anotei apressadamente no meu programa? “Klaus de novo, abrindo maravilhosamente os trabalhos. Não esquecer do Calloni (corne-inglês), do Tiago (trompete), o belo sax soprano do Carlos Gontijo e o clarinete do Samuel de Oliveira.”. Porra, Klaus!

Grande concerto.

Ao centro da foto, Elena Romanov, com Klaus logo atrás.
Ao centro da foto, Elena Romanov, com Klaus logo atrás, à direita | Foto: Olga Markelova Medeiros

Programa:
Pyotr Ilyich Tchaikovsky: Concerto para piano nº 1, Op. 23
Alberto Nepomuceno: Batuque
Heitor Villa-Lobos: Choros n° 6

Regente: Carlos Prazeres
Solista: Guigla Katsarava (piano)

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Sobre o goleiro da Holanda ser uma arma secreta, palpites para as semifinais e outros itens

Sobre o goleiro da Holanda ser uma arma secreta, palpites para as semifinais e outros itens

Sobre o goleiro especialista em pênaltis da Holanda, Tim Krul. Anteontem à noite, meu amigo Ricardo Branco aventara (gostaram?) a hipótese de que aquilo fosse apenas uma inteligente medida de ordem psicológica e intimidatória. Do tipo, “temos uma arma secreta”. Para piorar, o tal especialista era um armário. Hoje, sabe-se que o Branco tinha razão. Tratava-se de uma medida brilhante de Louis van Gaal a fim de deixar os jogadores da Costa Rica de cabelos em pé. “Quem é esse cara que entra só para os pênaltis? Deve ser o próprio monstro que pega todos”. A estratégia está na regra e a Holanda ganhou.

O "especialista" Krul...
O “especialista” Krul…

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Já que, nestes dias antes das semifinais, a Argentina tem mais cara de campeã do que o Brasil, meu amigo Jorge Lima sugere um bombardeio preventivo a Buenos Aires. Acho que nossa Marinha — temos mesmo isso?, como eles passam o tempo? — poderia atacar do Prata, destruindo os restaurantes de Puerto Madero. Pura profilaxia.

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Palpites para as semifinais:

Brasil x Alemanha (Belo Horizonte, 8 de julho, às 17h)
–> Passa a ALEMANHA, infelizmente

Argentina x Holanda (São Paulo, 9 de julho, às 17h)
–> Passa a ARGENTINA.

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Pena que não consegui ver o final do jogo no qual Novak Djokovic venceu Wimbledon e ainda retornou ao primeiro lugar no ranking. Vi só os 4 primeiros sets… Também, né, foram mais de 3h30 e eu tinha que ir ao cinema. Já tinha comprado os ingressos e tudo…

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Esse pessoal que fala em Copa comprada ou é ingênuo ou está fora da disputa. Argentina, Alemanha, Brasil e Holanda pagaram suas vagas? Conta outra. E, se quem comprou foi o Brasil, por que não providenciou adversários mais fáceis? Como disse o Sergio Bomfim, imagina a grana pra subornar 31 seleções. Deve ser o dobro do PIB.

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No ano passado, eu e Igor Natusch criamos informalmente o PJS — Partido da Justiça Social. Quem poderia ser contra nós?

Anteontem, Elena Romanov manifestou desejo de criar o PUM — Partido Utópico Moderado. Agora debato-me entre as duas siglas.

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Olha, o nível dessas eleições é de chorar. Nossa Assembleia Legislativa, hoje já não muito brilhante….

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Dia dos Namorados – A Resposta

Dia dos Namorados – A Resposta

Ops! Não é bem uma resposta. Na verdade, ela me escreveu e eu escrevi para ela. Diria que as mensagens foram na mesma direção, quase no mesmo horário neste início de madrugada, em sentidos contrários.

elena miltonQ u e r i d o  Milton!

Meu primeiro “Feliz Dia dos Namorados” para você!

Já sabemos que fazer avaliações, resumir e concluir são alguns dos meus vícios… então.

Parece que não consigo escapar disso nem dando parabéns, desculpa.

Pois para mim também é o primeiro Dia de Namorados em estatuto de namorada no Brasil.

Sempre volto a lembrar como tudo começou. Nós dois, abandonados, traídos, desvalorizados até um ponto impossível, “tristes e descrentes deste mundo”, vivendo um desamor crônico.  E depois, como uma mágica, tudo virou canção e descobrimos “o que é felicidade…”

Eu me sinto muito bem ao seu lado. Em Porto Alegre, Paris, Londres, Lisboa. Tenho certeza que vou me sentir muito bem ao seu lado num lugar qualquer do mapa, não importa a quantidade das atrações culturais e as condições. Só um abraço e já me sinto bem…

Quando a gente se entende tão bem, não existe assunto para se preocupar. E, ao redor, tudo se resolve mais fácil. E os obstáculos desaparecem sem menor esforço. E a gente não se faz questão de planejar tudo, porque o tempo “nosso” tem andamento diferente, de outra dimensão, e as coisas se organizam em outra ordem e se resolvem de outras maneiras.

E, se por alguma razão isso acabar, tenho certeza que só vamos lembrar coisas boas, esquecendo as “coisas bobas”.

Obrigada, meu caro Milton, por ser meu menino doce, meu homem amoroso, meu conselheiro, às vezes até minha baba e sempre meu travesseiro! Te adoro!

Espero que todos os nossos dias sejam felizes.

Porque “somos muito queridos”, lembra?

Beijos e abraços para meu    q u e r i d o !

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Dia dos Namorados

Dia dos Namorados
Foto de Milton Ribeiro (Lisboa, 2014)
Foto de Milton Ribeiro (Lisboa, 2014)

Parabéns para nós que estamos passando nosso primeiro Dia dos Namorados dividindo o mesmo ar, a mesma cama, o mesmo guarda-roupas, quase a mesma comida (a minha tem leite), os mesmos filmes, os mesmos (poucos) livros, os mesmos amigos, o mesmo TRI, as mesmas preocupações, as mesmas pernas e braços, nós que rimos das mesmas coisas, que discordamos sem asperezas e no outro dia acordamos conciliados, que caminhamos perigosamente pelas ruas (ontem podíamos ser encontrados às 20h no meio da Redenção), que não calculamos, que temos sotaques diferentes, que fizemos uma longa viagem (em vários sentidos inclusive o da foto), que já temos memórias, incrível, já temos memórias, nós que sabemos que cada um é um estranho ímpar, mas que nos ajudamos em tudo, que tentamos sempre e a cada dia ser um par, que vemos que tudo ainda pode ser melhor pois ainda estamos melhorando e que combinamos não trocar presentes no Dia dos Namorados, mas que vamos festejar, é claro. Elena, eu sempre estou com desejo de estar perto de ti. E quando não estamos, fico pensando no que estarás fazendo e meio que fico lento porque começo a querer muito te abraçar.

(Hoje, no almoço, ainda lembrei de como chovia naquela quarta-feira em que eu comprava roupas para usar no dia seguinte e ia de novo para aquele hotel. Tu me ligaste na hora mais oportuna para dizer que tinhas máquina de lavar e secadora e que eu não podia ficar todo molhado na rua. Eu fiquei muito sem jeito, mas tinha que aceitar, ainda mais quando tu disseste que eu seria teu convidado. Sim, passamos por muitas coisas. Tudo foi tão aventuresco como se estivéssemos num filme de roteiro muito complexo mas todo fechadinho, tão fechadinho que tudo acontecia na hora certa com o objetivo de pôr fim ao desamor).

O dia é muito nosso, Elena.

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Uma anticrítica do concerto de ontem à noite

Uma anticrítica do concerto de ontem à noite

Não tenho grandes conhecimentos musicais, sou apenas um melômano, um desses caras que pode ouvir o amigo Phil cantar o segundo movimento da quinta de Prokofiev e sair em dueto com ele, como ocorreu ontem à noite. Ou um trio, porque a Elena acabou cantando junto. Cantamos o tema principal e aquele trecho dos 5min06 em diante. Sorte de vocês não terem ouvido. Abaixo, tenho uma versão melhor.

Voltando ao assunto inicial, tenho um bom conhecimento de repertório e um programa mal planejado é uma coisa que me afeta muito. Augusto Maurer deu a explicação técnica de minhas restrições ao programa da última terça-feira (03 de junho), citou fatos que sinto mas que não tenho capacidade para explicar, etc. Então, nesta quarta-feira em que poderia ser mais produtivo, escolho um tema preguiçoso para encher o saco de meus sete leitores.

Pois, de forma enviesada, a programação musical faz parte de minha vida, e talvez isso seja surpreendente para alguns. Tenho ideias de programas de concertos que vocês nem imaginam. Então, vamos comentar algumas coisas. Minha formação como ouvinte teve muito de meu pai, do Dr. Herbert Caro de quem era amigo, além de enormes doses da Rádio da Universidade dos anos 70, 80 e 90. Os méritos da rádio ultrapassavam em muito seus problemas técnicos e foi ali, com o compositor e ex-diretor da emissora Flavio Oliveira e com Rubem Prates, que aprendi que uma programação não era sorteio ou livre-associação. É notável como eles conseguiam ligar inteligentemente cada música à próxima, fosse por seu tema, por sua evolução na história da música ou pela pura sensibilidade desses dois conhecedores, que viam parentescos em coisas aparentemente díspares. Só através do ouvido – há outro jeito? — aprendi como, por exemplo, o estilo de composição de Johann Christian Bach foi receber tratamento de grande música apenas com Mozart e também que havia várias formas de subir na grande árvore da história de música. Explico: pela manhã, a rádio iniciava por um compositor de música antiga ou barroco, depois ia para um clássico, daí para um romântico, e assim por diante, nos mostrando sempre os caminhos e os diálogos que um compositor travava com seu antecessor. Foi a maior das escolas e ali aprendi as muitas derivações que cada compositor passava a seus sucessores e aquilo, após milhares (mesmo!) de dias como ouvinte, tornou natural a leitura das histórias da música que fiz depois. De forma misteriosa, estranha e certamente gloriosa, aqueles dois homens silenciosos já tinham me ensinado tudo, colocando as coisas na ordem certa para que meu ouvido entendesse.

Minha segunda escola foi uma coluna da revista inglesa Gramophone. Assinei-a por anos. Lá havia uma coisa que só no jornalismo inglês: era a sensacional coluna “Who`s Next?”, de título obviamente inspirado no lendário vinil do The Who. Ali, um dos críticos da revista criava uma fantasia. Ouvia um CD qualquer e algo nele — um timbre, um acorde, um tema — o fazia lembrar de outra música, a qual o fazia lembrar de outra, e de outra até o fim da coluna ou dos tempos. Na coluna, o cara ia de Mahler para Gabrieli, de Bach para Charlie Mingus com a maior naturalidade e argumentos. Era uma brincadeira que estava longe da livre-associação da programação da Ospa, era algo que tinha uma poesia. Nossa que saudades da minha coleção de Gramophone! Minha mãe jogou todas as revistas fora no início de sua doença (Alzheimer).

Tenho o costume de caminhar pela rua inventando concertos. Ontem, iniciei um com a Fantasia Wanderer de Schubert, mas não fui adiante. Fiquei preso naquela fuga.

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Carrara brindou-nos com uma versão do Scherzo do Hammerklavier, 30 minutos antes do concerto.
30 minutos antes do concerto, André Carrara (primeiro plano) brindou-nos com uma versão do Scherzo do Hammerklavier. Um belo aquecimento. | Foto: Augusto Maurer

Com restrições — diferentes daquelas do concerto do dia 3 –, gostei do concerto da Ospa de ontem (10), principalmente do Ginastera final e do aquecimento do pianista André Carrara, tocando o Scherzo do Hammerklavier. Mas não estou a fim de escrever a respeito. A discussão da semana passada ficou lá longe com o meu “salário moral” sendo muito bem pago por uma longa série de importantes inboxes dizendo que eu tinha razão em reclamar do erros e da “dramaturgia da noite”. Pediram para eu tocar em frente, só que fiquei temporariamente de saco cheio da blitz dos defensores acríticos da… orquestra? Isto exige um compadrio ao qual não estou disposto. Gosto é de música, de literatura, do meu trabalho, dos meus amigos, filhos e da Elena, gente.

Brigar, fazer cara feia ou voltar o rosto não está entre as minhas prioridades. Mas sei que logo estarei disposto a rir destas coisas. E vou tirar um sarro.

A noite acabou maravilhosamente com zupa kapusta, mais pão, vinho, café e outros que tais, na casa da Astrid Müller e do Augusto. Minha ressaca de hoje e a citada cantoria de ontem é culpa deles. Nada a ver comigo, portanto. Zupa kapusta é uma sopa polonesa de carne de porco, salsicha, chucrute e repolho. Estava FANTÁSTICA!

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Três excelentes filmes no findi

Três excelentes filmes no findi

oloboatrasdaportaO Lobo Atrás da Porta, de Fernando Coimbra. Excelente filme, com um conflito muito bem construído pelo diretor Fernando Coimbra. Dentro de um filme de grande violência psicológica, seu único equívoco foi na escolha de Leandra Leal para um dos papéis principais. Estava sentindo alguma coisa estranha e a Elena Romanov matou a charada. Ela é classuda demais para uma história passada num subúrbio do Rio de Janeiro. Não funciona como amante de um funcionário de empresa de ônibus. Mesmo com roupas de segunda mão, ela parece uma princesa disfarçada. Elena não é alguém que apenas vê objeções, também sugere soluções! Então, indica Cleo Pires ou Débora Secco para o papel. Concordo que Leandra Leal não serve para ser chamada de gata, deusa, diva, pitéu, essas coisas. Insisto nisso só para deixar PERFEITO um filme que já é BONÍSSIMO. Há três cenas antológicas: a do cafezinho xexelento, a da agressão cometida por Bernardo e a da incompreensão do delegado sobre o não envolvimento emocional entre os amantes. Claro que RECOMENDO MUITO.

the-lunchboxThe Lunchbox, de Ritesh Batra. um filme cheio de delicadeza que fala poeticamente sobre a solidão. Merece ser visto e que está lá na Eduardo Hirtz. É raro ver dois filmes tão bons em sequência. Acho que ambos — este e O Lobo Atrás da Porta — vão para lista de melhores de 2014. The Lunchbox recebeu, compreensivelmente, Prêmio do Público no Festival de Cannes de 2013. Uma tele-entrega equivocada coloca em contato uma jovem dona de casa com um desconhecido. Juntos, eles constroem uma relação baseada em bilhetes deixados nas marmitas nas quais as comidas são entregues. Utilizando temperos que misturam comédia e romance, a história tem como coadjuvante o velho, complexo e infalível sistema de entrega de marmitas de Mumbai. São os Dabbawallahs, que permitem que milhões de maridos possam saborear a comida de casa durante o expediente. Certo dia, uma dona de casa infeliz no casamento envia quitutes especiais para o marido. Quando este chega em casa, não comenta nada. No dia seguinte, ela envia um bilhete junto com a refeição e recebe outro, só que do estranho. Então, começam uma inusitada troca de conselhos. Filme encharcado em humanidade.

o-palacio-francesO Palácio Francês, de Bertrand Tavernier, é uma brilhante sátira a essas pessoas cheias de energia e irreflexão que são 80% (75%?) dos políticos. Infelizmente, são essas pessoas, normalmente dotadas de imensa capacidade de trabalho e ignorância, que mandam em todos nós. Sua cultura vem de manuais ou de citações, mudam de opinião a cada momento, apenas tratam da preservação de si mesmos e de seus auxiliares, os quais torturam em busca de mais e mais divulgação. Sim, 80% (75%?) são assim, basta ver a lista de nossos deputados estaduais. Apenas o personagem Maupas pensa — e ri — no filme de Tavernier, que tem um final brilhante (o qual retiro daqui a pedido de Elena). Um excelente filme desagradável, de ritmo alucinante. Recomendo. (E fica a pergunta: existe mesmo democracia?)

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Ospa, Romeu e Julieta e a maravilhosa água do Báltico

Ospa, Romeu e Julieta e a maravilhosa água do Báltico
Renato Bal
Renato Bandel recebe os aplausos do público e do maestro Kiyotaka Teraoka | Foto: Carlos Latuff

Há talento de sobra em torno do Mar Báltico. Deve haver alguma coisa na água que corre dos rios da Polônia, Finlândia, Letônia, Lituânia e Estônia — estes três últimos chamados de Países Bálticos — para o mar, que faz com que nasçam compositores extraordinários na região. Quem contar a história da música erudita do século XX terá que passar por ali. Mais ainda se a história for dedicada ao final do século e ao início do nosso. Não consultei os anos de nascimento de cada um deles, mas quem pode ostentar um time com Witold Lutosławski, Karol Szymanowski, Krzysztof Penderecki, Henryk Górecki, Wojciech Kilar e Bogusław Schaeffer como a Polônia? E, se quiserem mulheres, o país ainda tem a excepcional Grażyna Bacewicz. Claro que o motivo do surgimento de tantos compositores é educacional e cultural, mas não deixa de ser curioso.

Sem citar compositores menores, a Finlândia, país que investe muito em música desde os tempos de Sibelius, hoje tem Kaija Saariaho — outra mulher — e Einojuhani Rautavaara. E a pequena Estônia ataca com o conhecido Arvo Pärt e Helena Tulve. Céus! Mas tergivesamos…

Krzysztof Penderecki (1933) foi um compositor pra lá de vanguardista nos anos 60 e 70 mas depois baixou a guarda, passando a obras de estética mais conservadora, retornando eventualmente ao sistema tonal. Sua música passou a caber no escaninho do classicismo pós-moderno. Ele é um dos poucos compositores vivos que tem plateias no mundo todo.

Longe da complexidade de sua famosa Paixão Segundo São Lucas (1967), o Concerto para Viola e Orquestra tem história ligada à América Latina. O concerto foi encomendado em 1983 pelo governo da Venezuela para marcar o bicentenário do nascimento de Simon Bolívar. Sua primeira performance foi em Caracas, no dia 24 de julho de 1983. Olha, é música de primeira linha. A obra tem pouco em comum com a monumentalidade e as texturas espessas de seus concertos anteriores. Ele fica mais próximo da música de câmara, porém preserva o caráter de um trabalho para virtuose. É muito contrastante (Lento – Vivo – Lento – Vivo) e tem duas belíssimas cadenze precedendo dois scherzi. Mas não é uma obra feliz, é antes pesada, contrapontística e reflexiva.

É óbvio que ela, como ponto alto do programa, deveria ser a última obra da noite. As opiniões dos músicos e estudantes de música na saída do concerto estavam de acordo comigo. O caráter das obras OBRIGAVA a quebra da tradição, colocando-se o concerto para viola no final da função. O violista Renato Bandel foi simplesmente fantástico. Tocou muito no ensaio de segunda-feira e só melhorou no concerto. A sonoridade quente da viola envolveu o velho teatro da tia Eva. Talvez tenha sido o melhor momento da Ospa em 2014. Há que explorar novos repertórios e territórios, gente!

Teraoka avisa que vai começar o Prokofiev | Foto: Milton Ribeiro
Teraoka avisa que vai começar o Prokofiev | Foto: Milton Ribeiro

O mesmo não diria da Suíte Nº 2 de Romeu e Julieta, retirada do balé de Prokofiev. Dado o tema, a música só pode ser romântica e trágica, mas soou meio boboca após a paulada de Penderecki. Só que nenhum Prokofiev é boboca. A orquestra também não rendeu o esperado, com erros aqui e ali, pois trata-se de uma obra falsamente fácil, cheia de repetições e denunciadora de problemas. O público amou, aplaudiu de pé, mas eu devo ser um chato: achei a coisa meia-boca.

No balanço geral, foi um excelente concerto, por Penderecki e porque deu muito assunto. E assunto é fundamental para quem vai assistir qualquer espetáculo.

Ah, Teraoka, volte sempre! Tu também, Bandel!

Ah, se a tia Eva vê isso!
Detalhe do público de ontem antes do concerto. Ah, se a tia Eva vê esses dois pezinhos… (Logo depois, os pés foram recolhidos, com a dona deles escolhendo Penderecki) | Foto: Augusto Maurer

O programa de ontem no Theatro São Pedro:

Krzysztof Penderecki: Concerto para viola e orquestra
Sergei Prokofiev: Romeu e Julieta – Suíte n° 2

Regente: Kiyotaka Teraoka
Solista: Renato Bandel

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Ospa, frio e bons sopros

Ospa, frio e bons sopros
José Milton: cheio de malemolência
José Milton Vieira: jazzy “malemolence” | Foto: Marcos Ever

Por motivo de compromissos pessoais, eu e Elena chegamos atrasados ao concerto, perdendo a primeira obra (Paul Dukas: Fanfarra para preceder La Péri) e o primeiro movimento da segunda (Jan Koetsier: Sinfonia para metais). Sentamos nas cadeiras do Teatro Dante Barone somente quando começou o Larghetto da Sinfonia de Koetsier. A sonoridade era algo mais que uma trombonada, era algo que me fez repensar sobre a irritação — puro preconceito — que possuo contra obras para metais e percussão. Formando um leque no palco do teatro de péssima acústica, o som era tão bom que eu até lembrei daquela versão da Arte da Fuga de Bach para metais, talvez com o Canadian Brass. Tinha esquecido dela… tão boa e compreensiva de Bach. Mas isso foi até chegar a Suíte de Granados, que me irritou por ser um arranjo algo tosco de suas Danças Espanholas. Enfim.

Pô, enfrentáramos o frio para ver só aquilo? Mas havia um intervalo e uma segunda parte para salvar a lavoura.

Uma curiosidade: durante a a obra de Koetsier, as faxineiras da Assembleia Legislativa subiam as escadas do teatro com seus baldes e vassouras com tanta naturalidade que pensei que estivesse na partitura. Era um contraponto interessante à música? Talvez uma forma de denunciar nossa atitude burguesa de fruição do belo em contraposição à vida sofrida do trabalhador. Estavam uniformizadas, de azul, era lindo de ver.

A fanfarra “feminista” de Joan Tower, Fanfarra para a mulher incomum, é bem curtinha como a Fanfarra para o homem comum de Copland, mas cumpridora. A coisa melhorava. Depois tivemos divertido tango Jealousy, de Jacob Gade. Até então as grandes estrelas no palco eram o trompetista Elieser Ribeiro — também, com um sobrenome desses! –, o igualmente trompetista Tiago Linck e o seguríssimo tubista Wilthon Matos, mas quando começou a melhor peça da noite (Motown Metal, de Michael Daugherty) todos viram a realidade. A noite era do trombonista José Milton (também, com um nome desses!) Vieira.

Eu tinha avisado no Facebook que o norte-americano Daugherty era um fenômeno e que valeria a noite. Não deu outra. O passado desse compositor é estranho e eclético. Ele foi músico de jazz e rock. Depois foi para a Europa estudar com Boulez e Ligeti (boas referências, não?). Sua obra mais famosa é a espetacular Metropolis Symphony, escrita em homenagem ao superman. É obra de um piadista que escreve música de primeira linha. Sua Motown Metal é uma belíssima homenagem à gravadora da soul music e da grande música negra americana dos anos 60 e 70, a Motown. O maranhense Miltinho estudou na Julliard School of Music e nos mostrou uma sequência de solos cheios de suingue na noite fria de Porto Alegre. E todo mundo saiu de lá feliz e em paz.

Programa:
Paul Dukas: Fanfarra para preceder La Péri
Jan Koetsier: Sinfonia para metais
Enrique Granados / Arr. Eric Crees: Suíte
— Intervalo —
Joan Tower: Fanfarra para a mulher incomum
Jacob Gade: Jealousy
Michael Daugherty: Motown Metal

Regente: Kristian Steenstrup

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Festa de aniversário da Elena e do Augusto (com fotos)

Festa de aniversário da Elena e do Augusto (com fotos)

No último sábado, tivemos um baita festerê na casa da Astrid e do Augusto. O pretexto eram os aniversários da Elena (19 de maio) e do Augusto (23), ao qual veio se juntar o Valter (22). Vi o anfitrião tirar fotos das comidas, coisa que não fiz. O que fiz foi comê-las, fato que me impediu de voltar à mesa antes das 22h de ontem, domingo. Sim, até Pantagruel tem que dar um tempo.

E céus, como fomos bem recebidos e como a comida estava boa! O que eram aquelas tapas? E o caldo de camarão? E a torta? Pessoalmente, agradeço a generosidade da Astrid e do Augusto. Eles mostraram que receber e cozinhar é um ato de amar os outros, como diz, penso, Mia Couto. Abaixo, algumas fotos das pessoas que participaram da orgia gastronômica. Mas, antes, uma …

Observação importante: Faltaram fotos das duplas de irmãos Pedro e Arthur, Miguel e Enzo. Os dois primeiros são filhos do Augusto com sua ex e a outra dupla é assim: Miguel é filho da Nikelen e do Farinatti, enquanto que o Enzo surgiu da Cláudia e do Dario (rimou!). Porém eles, no meio da festa, declararam-se espontaneamente irmãos de coração. Deste modo, este blog, não obstante a ausência de pais em comum, passa a considerá-los irmãos. Eu tenho grande e especial amizade com os filhos do Augusto, mas acho que já passou o tempo em que eu lhes ensinava sacanagens. Agora são eles que devem me tomar como aluno.

Bernardo entedia as moças  contando coisas sobre a página 23 da Superinteressante.
Bernardo visivelmente entedia as moças. Deve estar contando alguma coisa sobre ciência ou a respeito de um japonês serial killer.
Ah, elas (e ele) viram o fotógrafo legal!
Ah, elas (e ele) viram o fotógrafo legal!
Elena manifesta sua indignação pela falta de comida na festa. Liana já abriu da disputa, literalmente, das tapas.
Elena manifesta sua indignação pela falta de comida na festa. Liana já abriu mão da disputa pelas tapas.
Elena e Liana suportam a cantoria desafinada de Nikelen e Rovena.
Elena e Liana suportam com dificuldades a cantoria desafinada de Nikelen e Rovena. Elas procuraram o tom até o final da festa. São leitoras de Bulgákov, certamente.
Corredor polonês formado por Alexandre Constantino, Philip Gastal Mayer e pelo casal Kitty e Marcelo Piraíno. Renate Kollarz está preocupada em passar rapidamente, claro.
Corredor polonês formado por Alexandre Constantino, Philip Gastal Mayer e pelo casal Kitty e Marcelo Piraíno. Renate Kollarz está preocupada em passar rapidamente sem deixar cair seu prato.
Conheci Ricardo Branco em 1976, o Dario em 1984 e a Cláudia Guglieri ali por 2008 (?)
Constatação chocante: conheço o Branco há 38 anos — e, pasmem, conheci-o na universidade –, o Dario há 30, mas a Cláudia Guglieri veio muito depois. Também pudera, ela é muito mais jovem.
Sintam a elegância dos primos. Com Robson Pereira, Augusto Maurer e Lúcia Serrano.
Sintam a elegância dos primos. Com Robson Pereira, Augusto Maurer e Lúcia Serrano. A echarpe do Robson provocou suspiros.
Mais um casal: Renate Kolarz e Valter.
Mais um casal: Renate e Valter Souza.
Renate dá uma fugidinha com Phil.
Renate dá uma fugidinha com Phil.
Olha só que amor! Kitty e Marcelo posam para nossas câmaras.
Olha só que amor! Kitty — Cristina Bertoni dos Santos — e Marcelo posam para nossa câmera fora de foco.

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Paris, 25 de fevereiro: Museu Rodin (I – parte externa)

Paris, 25 de fevereiro: Museu Rodin (I – parte externa)

Pois no dia seguinte nós fomos finalmente ao Museu Rodin. Compramos aquele Paris Museum Pass, que permite que você entre quantas vezes quiser em quase todos os museus da cidade. Evita filas também.

Falar sobre o Museu Rodin, comentar suas obras — as de Auguste e as de seus agregados, incluindo Camille Claudel — , é complicado, seria um enfileirar de interjeições. Logo na entrada, somos apresentados a O Pensador.

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Aqui, mais de perto, deixando claro que as esculturas de Rodin fazem musculação mesmo quando paradas…

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Mais uns passos e outro clássico: Balzac.

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Outro ângulo para vocês.

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Não anotei o nome de cada escultura — não sei o nome das três seguintes –, mas o passeio pelos jardins é uma sucessão de maravilhas.

xDSC00925Pelo visto, ele apreciava torturar seus modelos. Vejam acima e abaixo.

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E então nós chegamos ao pequeno lago atrás do Museu. E vimos não somente a escultura que há dentro dele, mas também…

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… um menino que andava pelo parque desenhando as esculturas. Eu e Elena o achamos tão belo que merecia uma foto. E lá fomos nós na tentativa de registrá-lo. Ele desenhava a escultura do lago num caderno. Então, pedi para Elena colocar-se próxima a ele e mirei a máquina nela. Porém, quando ele se voltou, resolvi a questão rapidamente. O resultado está abaixo.

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Depois, dando a volta na casa, vimos A Porta do Inferno, o trabalho mais impressionante de Rodin, na minha opinião.

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Segundo a Elena, estes aí são a mesma pessoa. É Adão triplicado. Com o Pensador abaixo. Rodin autoplagiava-se bastante, coisa normal em escultores e compositores eruditos.

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E agora, algumas das centenas de detalhes da porta. Os anjos caídos…

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… vão caindo …

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… de todos os modos.

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A gravidade os chama.

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Abaixo, uma nova foto da porta para vocês relembrarem do todo.

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Depois, uma surpreendente escultura chamada Retrato de Gustav Mahler.

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Ele esculpiu vários artistas, mas ignorava que Mahler estava dentre eles.

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E abaixo, Victor Hugo.

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Incrivelmente, não fotografei Os Burgueses de Calais

No próximo post, vamos para a área interna do Museu.

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Elena

Elena
Elena num daqueles cubículos da Shakespeare and Company
Elena naquele cubículos da Shakespeare and Company onde os caras escreviam

Logo que tudo isso começou, avisamos no Facebook que tínhamos um relacionamento SÉRIO, mas que na verdade não era sério, estava mais para o DIVERTIDO. Ontem, com razão, tu me disseste que estávamos mudando para um relacionamento SIMBIÓTICO…

Eu sou mesmo um sujeito de muita sorte. Descobri bem atrasado — só aos 56 anos, mas descobri e isso é que vale — que a gente pode se apaixonar incondicional e inteiramente por alguém. Quando digo que, descontando uns outros, és meu primeiro amor, brinco apenas parcialmente.

Tu és uma pessoa maravilhosa, mas considerando-se que és uma cética, reformo a frase para: a gente acha maravilhosa a pessoa que combina perfeitamente conosco. E me parabenizo diariamente por ter insistido tanto. Tinha razão, né? Passamos cada vez mais tempo juntos e nunca é chato. Acho admirável a delicadeza, o interesse e o respeito com que tratamos um ao outro. Construção nossa. Posso contar, Elena? Em plena Paris, às vezes saíamos para passear só às 15h porque a companhia um do outro estava empatando com o encanto da cidade lá fora. E ríamos por estarmos fazendo um turismo todo errado e livre.

Curiosamente, é a primeira vez que, nesses quase nove meses, um de nós faz aniversário. Eu até fico sem saber como agir, como te tratar hoje, etc. Mas sei que a solução para nossas inseguranças sempre foram os abraços e pretendo fazer uso deles em qualquer caso… Afinal, eles vêm sempre facilmente.

Feliz aniversário, meu amor.

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Paris, 24 de fevereiro: a visita aos amigos (II)

Paris, 24 de fevereiro: a visita aos amigos (II)

Se há uma coisa ruim em Paris é o metrô. Afirmo-lhes que, além de sujo, trata-se de um insulto aos daltônicos. Não sou nenhum macho-alfa, apenas acho que me oriento um pouco melhor que a Elena, mas lá tinha que deixar tudo para ela, tudo o que conseguia fazer era tatear cegamente no esquema padrão das linhas. Um dia, quando fomos para o Museu d`Orsay, por culpa minha acabamos numa cidadezinha da periferia chamada Juvisy-sur-Orge, a 19 Km de Paris. O esquema do metrô tem cor-de-rosa, violeta, vários tons de verde, lilás, púrpura e outras cores sabidamente inexistentes. Ou seja, era tudo com a Elena. Problema nenhum, mas e se eu estivesse sozinho? Em Londres, Roma, Rio e São Paulo há respeito conosco. Em Paris, não. São 14 linhas em estilo impressionista. Vão se fuder!

Clique na imagem para ver melhor o absurdo
Clique na imagem para ver melhor o absurdo

Então foi a Elena quem me levou até o hotel onde estavam hospedados a Liana e o Alexandre. Levou com competência, porém, quando chegamos na portaria do hotel não havia nenhum Alexandre Constantino nem nenhuma Liana Bozzetto na lista. O porteiro do Hotel Saint-Germain nos olhou com cara de quem estava vendo um casal de comediantes. (Numa cidade daquelas, eles não pensam num casal de assaltantes de hotéis, pensam em babaquice mesmo). Devíamos ser ainda mais engraçados por estarmos sem celular, desconectados do mundo. Perguntamos pelos brasileiros hospedados e o cara deu uma risada deliciosamente inconclusiva, respondendo que o hotel estava cheio de nossos conterrâneos, que a cidade e o mundo estava cheio deles. Olhei a lista de cima a baixo e nada. Vi quem tinha feito check-out naquele dia. Nada de Constantino, nada de Bozzetto. Mas eles tinham que estar ali. No dia anterior eles tinham sumido ali dentro. Foi quando vimos o Alexandre descendo calmamente as escadas. Porra, era ele mesmo. Com a tranquilidade habitual, ele me disse que devia estar registrado com algum de seus inúmeros nomes, pois, como um verdadeiro membro de nossa família imperial, nascera Alexandre Nogueira de Castro Constantino! Ah, voilá, c`est Monsieur Nogueirrá! E subimos com o Nogueirrá.

Nosso objetivo era o bebermos um dos vinhos franceses que compráramos, acompanhado da comida que eles tinham acumulado. (Em verdade vos digo, somos exagerados e gordos, levamos comida também…). E, como eles voltariam para o Brasil no dia seguinte, a ordem era vandalizar. Abaixo, nossa mesa antes de virem as coisas da geladeira.

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E comemos e bebemos e conversamos por horas. Era salmão pra cá, pão pra lá, pasta acolá, camarões alhures, vinho sob a cadeira e água aquecendo na mesa para o chá, tudo ao mesmo tempo. Primeiro falamos de coisas tristes, mas depois, sob a influência de baco…

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… ficamos mais alegres. Contamos sem maldade cada uma das últimas sacanagens que sofrêramos e sobre algumas iniquidades, também falamos sobre assuntos muito sérios e irreversíveis. Mas o vinho… A Elena contou que a escolha do vinho fora por ter sido produzido no mesmo ano em que seu filho nascera (hã?) e eu lembro que contei algumas de minhas histórias loucas. Mas nada pode comparar-se ao cartaz que vimos na estação de metrô onde pegamos o trem de volta. Pô, 20 cm de prazer? Mesmo sendo uns 20 placide, tô fora.

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Paris, 24 de fevereiro: depois do erro, puro turismo (I)

Paris, 24 de fevereiro: depois do erro, puro turismo (I)

Eu não sou uma pessoa tão pouco informada a ponto de ignorar que os museus não ingleses costumam fechar às segundas-feiras. Só que estávamos em meio a uma viagem, estávamos muy contentos e amorosos e não pensamos que estávamos indo para o Museu Rodin numa segunda-feira. Estava pra lá de fermé e ficamos num café ali ao lado, resolvendo para onde ir.

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E voltamos a nossa vida de flâneurs das avenidas, dos parques, das galerias, dos cafés. Mas há flâneurs estúpidos e inteligentes. Nesta dia, escolhemos a primeira opção. Já que Rodin nos sacaneara, nada de museus, nada de livrarias, iríamos abandonar a vida cultural neste 24 de fevereiro.

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E fomos flanando até a Torre Eiffel.

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Tirando fotos.

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Inúmeras fotos.

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Tentei imitar Hitler, mas ele é muito mais discreto do que eu.

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E fomos nos aproximando da Torre.

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Ficando cada vez mais perto.

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Lembro de algumas de nossas piadas — todas impublicáveis e sem relação com a

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construção a nossa frente.

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Quando saímos de lá, depois de várias voltas, descobri uma coisa que jamais imaginaria: a Elena adora carrosséis.

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Ela ficou doida por esse aí. Enquanto nos aproximávamos, vi surgir uma criança felicíssima ao meu lado. Ela não deu voltas nele, mas me obrigou a tirar várias fotos de todos os ângulos possíveis.

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E dá-lhe carrossel.

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Não nego que era bonito.

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E ela não parava de exigir fotos mais e mais perfeitas… Até que subiu na escadaria quando ele parou.

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Saímos de lá com o espírito infantil e começamos a fazer outra série de fotos, agora brincando com a Torre. Claro que tenho várias com a Elena segurando a Torre por baixo, mas essa é clássica demais. Começamos a brincar com o topo da Torre e qual não foi a nossa surpresa quando vimos

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um monte de turistas nos imitando, tentando pegar a Eiffel por cima. Quando chegáramos, a brincadeira era pegar por baixo. Credo, que gente imitona.

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No início, todos faziam assim, ó.

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A seguir, fomos a pé até o Arco de Triunfo, uma construção enorme e sem graça — só a vista lá de cima é que é legal — e que comprova a visita de Napoleão à cidade natal de Elena. Mohilew (ou Mogilev) é a bonita cidade em que minha namorada nasceu. O baixinho levou até lá seu cavalo branco numa visita pouco apreciada pelos bielorrussos.

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Antes de chegarmos a Arco, tínhamos entrado numa loja na Nespresso com a intenção de usarmos o banheiro, mas só conseguimos provar um café, pois o pessoal da loja é tão fino que aparentemente não faz suas necessidades no local. Pedimos o mais forte e garanto que estava excelente, apesar da bexiga cheia. Como não comíamos desde o café do manhã, escolhemos a dedo um local para fazê-lo da forma mais típica. Entramos numa boulangerie cheia de franceses e não nos arrependemos.

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Paris, 23 de fevereiro: com amigos, caminhando loucamente pela cidade (II)

Paris, 23 de fevereiro: com amigos, caminhando loucamente pela cidade (II)

Neste dia, sobre o qual comecei a falar aqui, Elena e eu nós caminhamos muito. Refazendo nosso trajeto a pé no Google Maps, e considerando que este propõe sempre o caminho mais curto — exatamente o que não tomamos –, chegamos a um total de 11,5 Km, ou 2h28 de caminhada. Mas garanto a meus sete leitores, foi muito mais. Depois dos Jardins de Luxemburgo, atravessamos a cidade até o Palais Garnier na Rue Scribe para encontrar nossos amigos Liana Bozzetto e Alexandre Constantino. Causa certa euforia encontrar queridos amigos fora de nosso habitat. Pensamos em parar num café, mas começamos a caminhar, a conversar, a caminhar, a conversar e a caminhar juntos. Atravessamos Champs-Élysées, vimos cartões postais, …

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… e mais cartões postais, …

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… paramos para fotos no meio do caminho, …

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… pedimos para um japinha tirar uma registro nosso na frente do Louvre, …

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… pedimos uma segunda foto para garantir, …

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… atravessamos o Sena e acabamos comendo um salmão genial num bistrô à beira do rio. Então, saímos novamente a pé até o hotel de nossos amigos em Montparnasse. Durante a caminhada, eu e Alexandre íamos léguas à frente das meninas. Conversávamos de forma copiosa fazendo um mix de algumas de nossas experiências. Quem conhece o Alexandre, sabe: ele não é um sujeito de jogar palavras fora; é um cara que pensa antes de falar, que se aprofunda nas coisas, que diz não ler muito, mas que cita autores de diversas áreas e tamanhos. É sempre um prazer conversar com ele.

Há cem metros, as meninas vinham nos seguindo. Liana e Elena contavam experiências uma para outra. Elena disse que sua conversa com ela valeu por várias sessões de terapia. Quando eu e Alexandre parávamos para que elas nos alcançassem, elas pareciam diminuir ainda mais a velocidade. Aquele avanço até Montparnasse era efetivamente meio louco — havia prazer em conversar com o Alexandre e culpa pela nossa velocidade alucinada, havia prazer na conversa entre Liana e Elena e algum desejo de privacidade, o que as tornavam lentas. Mas bastava que eu e Alexandre apontássemos nossos narizes para Montparnasse que a correria voltava. Era como se nossa prosa nos obrigasse àquilo.

Mas finalmente chegamos ao hotel deles. O objetivo era o de simplesmente tomar um chá. Foi tudo tão bom que marcamos um jantar para o dia seguinte. O retorno a nosso Tim Hotel foi feito a pé, passando novamente pelos Jardins de Luxemburgo e pelo Panthéon, sempre ignorado.

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Paris, 23 de fevereiro: Notre Dame, a sopa Pho da nossa desesperança, Os Jardins de Luxemburgo (I)

Paris, 23 de fevereiro: Notre Dame, a sopa Pho da nossa desesperança, Os Jardins de Luxemburgo (I)

Quando descrevi rapidamente o dia 22, esqueci de dizer que Liana Bozzetto e Alexandre Constantino entraram em contato conosco através do Facebook para nos dizer que estavam na cidade. Combinamos de nos encontrar ao final desta tarde (23), quando eles estivessem saindo da Ópera Nacional de Paris (o Palais Garnier da Rua Scribe). Iniciamos nosso dia fazendo uma caminhada até Notre Dame em pleno domingo pela manhã, dia de missa.

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O fotógrafo Milton Ribeiro insiste em não fotografar a torre por inteiro. Abaixo, os cadeados com juras de amor eterno. Acho uma baixaria este símbolo. Não quero ninguém preso a meu lado, quero alguém que queira estar comigo por sua e por minha vontade.

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A fachada principal, …

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detalhes da mesma, …

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e, pronto, entramos!

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Algo de mágico ocorreu lá dentro da Catedral de Notre Dame. Estávamos caminhando dentro dela (ia começar a missa e o silêncio era completo, a não ser pelos passos e as máquinas fotográficas dos turistas que caminhavam pelas laterais da nave enquanto uma fila de padres com seus turíbulos preparava-se para ir até o altar), quando subitamente o órgão atacou acordes dissonantes e apocalípticos, nada harmônicos.

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Era uma peça de Messiaen que dava início à missa e que mais parecia uma acusação aos homens. Foi lindo e assustador. Estávamos ouvindo música moderna num edifício que fora construído entre os anos de 1163 e 1345. A cultura francesa nos proporcionava aquele momento arrepiante, aquela poderosa e inesperada união entre passado e presente.

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Eu e Elena Romanov ficamos dando voltas até o final da peça. Aliás, ficamos ainda depois por ali. Afinal, a coisa podia voltar. Não voltou, mas que maravilha ouvir uma obra daquelas — com aquele poder — em seu habitat. Ah, querem saber o que ouvimos? Soava mais ou menos assim.

Bem, já que o dia lá fora era belíssimo, resolvemos sair de Notre Dame…

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em direção aos Jardins de Luxemburgo. No meio da caminhada pela cidade, além de vermos alguns cartões postais naturais, …

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nos deu uma fome do cão. E foi então que cometemos o maior erro de nossa viagem. Na cidade de melhor culinária do mundo e após passarmos batido ao longo da Rue Mouffetard, veio-nos uma fome urgente, desesperadora. Passamos a procurar alguma porta de restaurante que nos abrigasse, mas os mesmos, na segunda magia do dia, simplesmente insistiam em não aparecer. Passamos ao lado do Pantheon se nem olhar para ele e acabamos entrando num restaurante vietnamita. Sim, vagando no pleno mar da culinária francesa, atracamos numa porra duma ilha vietnamita. E, ali dentro, completamos a tragédia. Pedimos a terrível, implacável, horrorosa e intragável Sopa Pho.

Sopa phoO gosto que a porcaria acima tem é complicado. Sentimo-nos deglutindo comida de astronauta em pleno paraíso. Todas as pessoas são felizes em Paris, à exceção de quem comeu sopa Pho no almoço. Uma água quente é jogada sobre finas fatias de carne. A fantasia é a de que, deste modo, a carne cozinhará. Na verdade, a água fervendo lava a carne, deixando-a clarinha. Em seguida, acrescenta-se manjericão, coentro, broto de feijão e pedaços de limão. Uma iguaria que só pode ser fruída adequadamente se estivermos entre napalms e bombardeios aéreos norte-americanos. Eu olhava para a Elena e ela olhava para mim. Difícil saber a quem culpar. Gosto dela, ela gosta de mim, se não somos jovens, somos um casal jovem, que não vai discutir idiotices. A Elena jogava temperos para todos os lados, tentando melhorar a coisa. Vendo que eu estava derrotado, ela falou que era nutritivo. Rimos sem graça.

Afinal, era uma atitude dantesca aquele negócio de atravessar o mar para comer uma merda daquelas. Saímos de lá loucos por comida de verdade, mas impossibilitados de qualquer coisa, pois estávamos enjoados, com receio de rever a sopa Pho a qualquer momento. Vou parar de escrever porque acho que ainda sobrou um pouco de Pho no meu estômago. Volto a sentir o gosto daquela nojeira.

Mas os Jardins de Luxemburgo estavam ali ao lado.

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Espreitando uma nesga do imenso García Márquez

Espreitando uma nesga do imenso García Márquez

Uma medida bem pessoal que posso ter da grandeza de Gabriel García Márquez é a seguinte.

Minha q u e r i d a e a m a d a Elena Romanov nasceu em Mogilev, na Bielorrússia. Ela morou lá, acho, até por volta de seus 20 anos. Durante a adolescência, ela se apaixonou pela tradução russa de Cem Anos de Solidão de tal forma que não apenas a leu 4 vezes como fez com que seus amigos a lessem. E, hoje “pela manhã”, durante o café tomado após às 14h, ela contava sobre José Arcadio Buendía, o que pensava que o tempo havia parado e que morreu louco, amarrado ao castanheiro da família.

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De Londres para Paris, 22 de fevereiro: Eurostar, Tim Hotel e primeira ida aos vinhos

De Londres para Paris, 22 de fevereiro: Eurostar, Tim Hotel e primeira ida aos vinhos

De manhã, ainda em Londres, pegamos o Eurostar até Paris. Saímos de táxi de nosso querido EasyHotel até a enorme St Pancras Station. No caminho, só para nos atrapalhar, passamos bem na frente da Wallace Collection… Na St Pancras, era nossa última chance de comprar a History Today que a Nikelen nos pedira. Perguntamos por todo lado e nada. A revista simplesmente não existia. Já fizéramos o mesmo no dia anterior, com o mesmo resultado.

A viagem de trem é tranquila e confortável. Pontualíssima, dura aproximadamente 3 horas e tem o preço de pouco menos que 90 libras. Passamos pelo chamado eurotúnel. Ele foi construído no subsolo, 50 metros abaixo do leito do mar do Norte. Inaugurado em maio de 1994, o túnel do Canal da Mancha liga a França e a Inglaterra e tem 51 quilômetros de extensão. Custou seis bilhões de dólares, e é a obra mais cara do mundo paga inteiramente com dinheiro privado. Em Paris, a estação onde o trem chega é a Gare du Nord. De lá, pegamos o terceiro táxi da viagem até o hotel, que ficava bem perto. Tudo calculadinho.

Ficamos no TimHotel da Rue Linné, 5, bem na frente do Jardin des Plantes, onde está localizado o Museu Nacional de História Natural. Num raio de uns 4 Km, andando a pé, tínhamos a Notre Dame, a Shakespeare & Company, o Pantheon, a Rue Mouffetard, os Jardins de Luxemburgo, o Louvre, o Musée d`Orsay, etc. Enfim, se fôssemos alérgicos a metrô, poderíamos ficar sem ele, tal era a perfeita a localização (ver no centro do mapa) do hotel reservado pela Casamundi. Quando chegamos, abri a janela de nosso quarto, peguei o tablet e tirei uma foto digna do filme Amélie Poulain. A luz sobrenatural que saía da fruteira da esquina era de cinema.

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Não consegui repetir o fenômeno quando peguei a máquina fotográfica.

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Virando o corpo para o lado direito, dava para ver o portão do Jardin des Plantes. Sim, estava anoitecendo.

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Fomos explorar a Rue Linné. A primeira coisa que vimos foi que o grande Georges Perec tinha morado por 8 anos na vizinhança.

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Depois de um longo passeio, entramos num Carrefour a fim de comprarmos nosso jantar. Este, o jantar, foi maravilhoso, mesmo com a cruel alergia à proteína de leite da Elena em pleno país dos queijos.

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Em nosso quarto — desta vez de bom tamanho — abrimos um daqueles vinhos premiados que o Farinatti nos indicou.

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Entradas da semana no Facebook: nem tão idiotas quanto poderiam ser

Entradas da semana no Facebook: nem tão idiotas quanto poderiam ser

5 de abril:

Gostava do Wilker.

6 de abril:

O Centro Peruano é um dos lugares mais finos da cidade. Mas, do ponto de vista material, não há nada de especial lá. Não é um lugar que rescenda ao chique gerado pelo dinheiro, de modo algum. Quando digo fino, falo sobre o tratamento que o Dr. Carlos Nevado e sua família dispensa aos clientes, assim como sobre a qualidade do que se come lá. Uma coisa não tem nada a ver com a outra, só que tal impressão fica mais consistente quando se entra num tal “Armazém”, em plena Padre Chagas, e nos chega às narinas um invencível e anti-higiênico fedor.

Ah, nesta semana batemos nosso recorde. Fomos 3 vezes comer cebiche…

 

Dica da semana:

“Antes de sair de casa, revise se está com as chaves. Esquecê-las dentro das calças que você recém tirou não é inteligente e causa problemas.

Pior ainda se o esquecimento ocorrer num domingo à noite e se estiver na companhia de alguém que confia em você”.

Fica a dica.

7 de abril:

Espero que o Luigi não seja pusilânime e confirme o Gre-Nal de domingo para o novo Beira-Rio. Se tem medo de quebra-quebra, retire as cadeiras e aumente o número de seguranças, ora. Ou ele ignora que quebramos lá também?

 

Um dos fenômenos mais interessantes é de que a ignorância não gera dúvidas, mas certezas. Outra coisa interessante é a criatividade do ódio. Há pessoas que, ao odiarem, criam personagens muito diversos do odiado. O odiado é um mutante, ou uma valise na qual cabe toda sorte de más qualidades. Mas seguimos.

 

Um beijo procê, George Orwell:

“Jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer que se publique. Todo o resto é publicidade.”

8 de abril:

Há pessoas que repetem e repetem os mesmos padrões, errando sempre. Mas nem lhes passa pela cabeça de que os errados são eles.

 

Quando

Quando o meu corpo apodrecer e eu for morta
Continuará o jardim, o céu e o mar,
E como hoje igualmente hão-de bailar
As quatro estações à minha porta.
Outros em Abril passarão no pomar
Em que eu tantas vezes passei,
Haverá longos poentes sobre o mar,
Outros amarão as coisas que eu amei.
Será o mesmo brilho a mesma festa,
Será o mesmo jardim à minha porta,
E os cabelos doirados da floresta,
Como se eu não estivesse morta.

Sophia de Mello Breyner Andresen

 

E então eu cheguei em casa às 19h carregando um cansaço maior que eu e Elena me sugeriu dormir por uma hora. E eu sonhei que estava em Londres na casa de Virginia Woolf e que traduzia para o português o Between tha Acts. Eu viajara para que ela me explicasse algumas passagens. Depois dos esclarecimentos, ela me fez um chá e sentamos à mesa. E então eu, com a maior intimidade, perguntei sobre suas crises de depressão. E Virginia olhou para mim, deu um meio sorriso, começou a falar e eu acordei.

Coisa sem graça.

10 de abril:

A gente dorme com uma loira e acorda com outra de cabelos castanho-claros.

Ficou bonito, Elena.

 

Já imaginaram o que deve doer um beijo no coração? Além do mais, é pouco asséptico.

11 de abril:

Acerta o TJD da Federação Gaúcha de Futebol ao rebaixar o Esportivo para a Segunda Divisão em razão das ofensas racistas sofridas pelo árbitro Márcio Chagas em Bento Gonçalves. Racismo não é caso para relativizar e tergiversar, é caso para se extirpar. Por isso, lamento que a votação pela punição tenha tido o resultado apertado de 5 x 3, o que comprova que nossa sociedade não tem lá muita segurança se deve punir tais casos de hedionda boçalidade.

O árbitro Márcio Chagas
O árbitro Márcio Chagas

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Londres, 21 de fevereiro: Cadogan Hall, o passeio final e a saudade antecipada

Londres, 21 de fevereiro: Cadogan Hall, o passeio final e a saudade antecipada

Depois da Tate Modern, fomos caminhar pela cidade em direção à loja da Twinings, que está desde 1706 na Strand. Eu namoro uma bielorrussa e as pessoas deste país não vivem sem chá. Nós tínhamos que comprar muitos chás, sacolas e sacolas, entendem? Abaixo, vemos a Strand, onde a Elena ainda permanecia faminta, lembram? E chega de perguntas. É um recurso de baixo nível.

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Então nós entramos num pequeno restaurante tailandês. A qualidade da comida era fantástica e o preço melhor ainda. Nossa fome ajudava, é claro. Das janelas do pequeno restaurante, víamos uma Igreja Ortodoxa Romena ao lado do prédio mais simpático do mundo. Ele abriga várias publicações. Não perguntei se eles queriam um correspondente no Brasil porque seria muito melhor ser correspondente do Brasil em Londres.

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E então, chegamos à Twinings. Ah, se soubéssemos que aquele chá de gengibre era o que era! Teríamos comprado centenas deles! Compramos tanto chás que ganhamos um monte de brindes. Um destes foi bebido por mim hoje. Eu dizia para a Elena: estamos pegando muita coisa, menos, Elena. Ah, arrependo-me. A loja é pequena. Apenas um longo corredor, mas a enorme variedade de cheiros não deixa ninguém dotado de nariz indiferente.

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Já estava dando aquela tristeza. Afinal, íamos abandonar no dia seguinte um local que tínhamos adorado e onde passamos dias felizes. Avisei a Elena que a Temple Station era ali perto. Nós iríamos pegar o metrô para deixar os chás no hotel antes do concerto da noite. Mas o caráter romântico de minha amiga impediu a bobagem. Ela me perguntou se eu me incomodaria de seguir carregando as duas sacolas de chá e, à minha resposta negativa, propôs um passeio. Três viagens à Londres me deixaram com bom conhecimento da geografia da cidade. Então, dobramos á esquerda e fomos para as margens do Tâmisa a fim de fazer nossa despedida.

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Era um final de tarde. As pessoas caminhavam bem mais apressadas do nós. Muitos saíam do trabalho com calções e camisetas e faziam uma corrida até em casa. (Lá, eles vendem umas mochilas que não apenas envolvem o ombro como são amarradas na barriga. Os caras vestem aquilo, mais calções, tênis e botam pra correr. O número de corredores é alto: a cada minuto, passavam uns 5 por nós).

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Estávamos nostálgicos, refazendo o circuito mais turístico da cidade. A Elena dizia que não queria mais ir para Paris, ríamos.

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Londres deve ser mesmo a melhor cidade do mundo. Tem tudo lá em grande quantidade e a preços acessíveis, basta usar a cabeça. Desde concertos até roupas, desde a comida até o transporte, tudo pode ser barato. Os concertos mantêm cadeiras para quem é apaixonado mas não pode pagar muito; as roupas são muito baratas em lojas como a Primark e assemelhadas; a comida pega-se no super e come-se no quarto com o vinho vendido e garrafas individuais; o transporte pode ser todo feito pelo Underground, ônibus e barcos, basta comprar o passe semanal da Oyster; os bens culturais estão todos à mão. Para melhorar ainda mais, os grandes museus são gratuitos, até a Wallace Collection é gratuita. Não tínhamos visitado todos os lugares que desejávamos e isso nos dava uma leve angústia, apesar do fato de que o que fizéramos fora bem feito.

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Londres, 21 de fevereiro: Tate Modern

Londres, 21 de fevereiro: Tate Modern

Pois era o dia 21 de fevereiro, no dia seguinte pegaríamos o trem para Paris e tínhamos uma série de “atrações turísticas” que simplesmente não víramos. Em parte pelo excesso, em parte por sermos turistas tranquilos, não estávamos muito preocupados. Quando nos dirigimos para a Torre de Londres, item 5 estrelas de qualquer guia de viagens, a Elena quis saber o que havia lá. Fiz-lhe a descrição da maravilhas, depois falei de outras coisas da margem do Tâmisa que não tínhamos visto — Greenwich, Tate Modern e Globe Theater. E ela, que estava indo à Londres pela primeira vez, decidiu sabiamente: Tate Modern!

Mas, antes, contornamos a Torre de Londres e fomos tirar uma foto clássica.

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Depois, entramos pela cidade e caminhamos entre os estudantes dos colégios próximos até a ponte que nos levaria ao Tate Modern (há outro Tate, não esqueçam). Vejam como a ponte da foto de cima ficou pequenina na de baixo.

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E aqui, aproximando um pouco…

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Como sempre, não vamos apenas às coisas mais belas, mas principalmente às mais curiosas. Há uma parte do Tate que mostra os cartazes políticos do século XX. E é claro que não poderia faltar a presença soviética.

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Abaixo, com tradução: “Os carrascos estão torturando a Ucrânia. Morte aos carrascos!”.

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Abaixo, o quarteto de ataque do Dínamo de Moscou. Curiosamente, Marx aparece na ponta-direita dando uma de Garrincha.

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As três dançarinas de Picasso.

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Um quadro que adoro: Marguerite Kelsey, de Meredith Frampton.

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Este recebeu grandes elogios da Elena: Family Jules: NNN (No naked niggahs), de Barkley Hendricks. Ela deve ter razão ao relacionar NNN com KKK. O rapaz negro tem uma cara incrivelmente intelectual, inteligente e desafiadora. O quadro é realmente esplêndido.

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Sabem por que o gato da Elena se chama Vassili? Ora, em homenagem à Vassili Kandinsky. E, com efeito, toda vez que ela corre para um quadro, desviando-se da rota definida para que se veja todos, um a um, é por culpa de Kandinsky. Ele a atrai certamente mais do que eu.

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Visto assim numa foto, não tem muita graça em Something Old Something New, de Monir Shahroudy Farmanfarmaian. Porém, parando em frente ao quadro, você fica dividido em dezenas de pequenos pedaços.

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Na próxima foto, estamos abraçados na frente dos espelhos. Acho que dá para ver.

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