A dança pataxó dos alemães

A dança pataxó dos alemães

Poucos notaram a dança pataxó que os alemães fizeram em campo.

É que a casa da Alemanha nesta Copa do Mundo foi Santa Cruz Cabrália e lá, no sul da Bahia, os alemães conheceram um pouco dos índios.

“Reunimos os grupos indígenas em um círculo. Acendemos os cachimbos e tocamos os maracás. Aí, em nossa língua, fazemos os nossos pedidos e orações. E os pedidos dessa vez foram para que os alemães vençam”, revelou o cacique. Durante a coletiva, o próprio cacique fez esse pedido a Thomas Müller e a Philipp Lahm. “Primeiro falei que eles exageraram demais contra o Brasil e que 2 x 0 tava bom. Depois, pedi que eles não deixassem a Argentina ganhar”.

Klose celebrou seus 36 anos de vida dançando com os índios, no primeiro contato alemão com a tribo local. De lá para cá, o contato ficou cada vez mais próximo, até a despedida, na última sexta-feira.

Estranho. Eles respeitam os índios.

O aniversário de 36 anos de Klose.
O aniversário de 36 anos de Klose.
Schweinsteiger na festa.
Schweinsteiger e Müller na festa.
A lembrança dos pataxós no Maracanã, em meio à comemoração.
A lembrança dos pataxós no Maracanã, em meio à comemoração.

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A Seleção Brasileira me representa?

A Seleção Brasileira me representa?
Você está feliz de ter como presidente da CBF um tipo como José Maria Marín?

Olha, eu assisti aos jogos e não me vinha nenhuma empatia pelo time. Nenhuma. E isso antes dos fiascos. Eu, que acompanho futebol, não reconheço a biografia recente de vários de nossos jogadores — aliás, alguém sabe por qual clube David Luiz atuou no Brasil? (*) — e, quando jogavam os “brasileiros”, o resultado era péssimo. Mas há mais problemas. O futebol sempre foi corrupto, só que nunca tivemos como presidente da CBF alguém tão identificado com a repressão como José Maria Marin. Trata-se de um arqui-anacronismo ungido ao posto do líder que deveria nos levar à Copa de 2014. É preciso estômago. Mais incomodações? Sim. Existe a lembrança de Ricardo Teixeira e a necessidade empresarial que a Rede Globo tem de nos incutir entusiasmo à fórceps.

Independentemente de algumas boas seleções formadas, a CBF (antes, CBD) sempre foi uma entidade nebulosa, comandada por aproveitadores que se alçaram a um duvidoso profissionalismo a partir do impulso dado por seus clubes. E isso não tem jeito, pois no mundo inteiro é assim, as exceções de praxe à parte. (A Alemanha parece ser uma dessas exceções).

O que é irritante é que — mafiosos ou não — os dirigentes da CBF deveriam ser minimamente competentes para formar um time de qualidade, propiciando a todos eles garantias de embolsos fabulosos ou simples fama. Mas a velha classe dominante brasileira é useira e vezeira em matar, uma após uma, as galinhas de ovos de ouro postas pelo povo brasileiro em seu quintal.

Vejo uma tremenda bagunça no meu Inter, também acho que lá a incompetência grassa, mas permaneço fiel. Tenho dificuldades em fazer o mesmo com a Seleção. Será em função da proximidade? 

Bem, por mais que pense não sei explicar este fenômeno de rejeição à Seleção Brasileira que noto em mim e em muitos amigos. Será por que a geração atual não apenas joga muito menos como é por demais inodora, sem dramas, opiniões ou posturas distintas? Não fiquei feliz com os 7 x 1 da Alemanha, mas também não quis me esconder de vergonha. Acabo por não encontrar motivos para torcer pelo combinado montado pela entidade privada chamada CBF, vulgarmente conhecida como Seleção Brasileira.

(*) No Vitória da Bahia, dos 18 aos 20 anos de idade. Jogou apenas 26 vezes e foi vendido ao Benfica.

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Porque hoje é sábado, uma mensagem vinda da Alemanha (por Heidi Klum)

Porque hoje é sábado, uma mensagem vinda da Alemanha (por Heidi Klum)

Por Francisco Marshall

Recebi esta mensagem para ti, MR, e a transmito, traduzida:
“Querido Milton Ribeiro, cujo nome celebra nosso herói maior, Bach,

Clicando em mim, a imagem fica bem grande, tá?
Clicando em mim, a imagem fica bem grande, tá?

oi, querido.
Duvido que você realmente goste da flauta que vem de seus vizinhos, argentinos.

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Até posso vestir azul, mas é só para poder despir e viver bem meu corpo cheio de fantasia.

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Gosto das praias da América, e de usar bikinis generosos

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mas por solidariedade latino-americana, eu não apoiaria Pinochet, Videla ou Stroessner, menos ainda bravateiros arrogantes que insultam o nosso amado Brasil

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Além disso, estranho que um especialista como tu prefira estes peitos estranhos da argentina, às minhas obras primas.

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Ademais, tenho outros atributos

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Eu também falo castelhano, viu?

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Por estas e outras, e por tudo que te permito sonhar

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É que te peço que analises de modo objetivo

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E aceites meu pedido de reconsideração

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E deixe esses boludos se fuderem sem o seu apoio

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Porque hoje é sábado, porque amanhã vou torcer para a Argentina

Porque hoje é sábado, porque amanhã vou torcer para a Argentina

Creio que o beijo de Pamela David na camiseta da Argentina

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fará com que meus sete leitores

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se agreguem à grande corrente latino-americana

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que varrerá a ameaça germânica de nosso continente.

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A elegância alemã, a gentileza e educação com que nos trataram em campo,

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chegando ao nível da clemência,

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não me enganam.

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Por outro lado, há 5 coisas a considerar ou invejar na decisão de domingo:

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1. o comportamento apaixonado da torcida argentina,

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2. Messi,

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3. a necessária vingança contra nosso algoz,

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A verdadeira face de Jane Austen?

A verdadeira face de Jane Austen?

O Jane Austen Centre mostrou ao mundo nesta semana uma figura de cera da autora criada por uma equipe de especialistas, utilizando técnicas baseados em relatos de testemunhas oculares contemporâneas de Jane.

Será mesmo?

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Jane Austen morreu em 1817
Jane Austen morreu em 1817

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Anna Magdalena Bach, uma das tantas mulheres com um passado sem biografia

Anna Magdalena Bach, uma das tantas mulheres com um passado sem biografia
Dizem que esta era Anna Magdalena...
Dizem que esta era Anna Magdalena…

Publicado no Sul21 em 22 de setembro de 2013

No dia 22 de setembro de 1701, nascia Anna Magdalena Wilcke, futura segunda esposa de Johann Sebastian Bach. Sempre houve grande curiosidade por sua pessoa; afinal, ela foi uma mulher que saiu discretamente da sombra a que eram segregadas as mulheres de seu século. Não apenas deu treze dos vinte filhos do compositor, mas teve participação ativa em sua vida e trabalho num mundo em que a mulher deveria reinar no lar, sem desejos pessoais que visassem qualquer atuação fora da esfera doméstica. Uma esposa exemplar deveria apenas zelar para que seu marido pudesse, este sim, aparecer na vida pública. Cuidar dos filhos, limpar e ficar em casa era o destino que a “natureza” havia determinado à mulher.

Mas Anna Magdalena apareceu um pouco mais do que o normal, saindo sutilmente da esfera doméstica e criando grande curiosidade a seu respeito. Assim como Anne Hathaway — não a bela atriz de O casamento de Rachel, mas a esposa de William Shakespeare, nascida em 1555 — recebeu especulações e romances, Anna Magdalena foi tema de filmes e romances. O mais famoso é Pequena Crônica de Anna Magdalena Bach, romance inteiramente ficcional escrito em 1925 pela inglesa Esther Meynell.

Na verdade, pouco se sabe sobre Anna Magdalena Bach (1701-1760). O que se sabe é que era, provavelmente, muito talentosa, e que, certamente, era muito cativante e trabalhadora. Bach e sua família deram-lhe dois presentes musicais muito famosos. São os chamados Cadernos de Notas de Anna Magdalena Bach. O primeiro data de 1722 e contém somente composições de Johann Sebastian. O segundo é de 1725 e é uma compilação de obras de Bach e de seus filhos e alunos. Além da excelente qualidade musical dos cadernos — fartamente gravados –, o interessante é a possibilidade que nos dão de espreitar o ambiente doméstico da família Bach ou, no mínimo, a música que era ouvida na casa deles. Trata-se de uma coleção de pequenas peças como árias, minuetos, rondós, polonaises, prelúdios, gavotas, etc. Porém, no primeiro livro, também estão quase todas as Suítes Francesas, peças nada fáceis que hoje fazem parte importante do repertório bachiano.

Anna Magdalena nasceu na Saxônia, numa família de músicos. O pai era trompetista e a mãe também era filha de músico. Na época, era comum que os filhos herdassem a profissão dos pais. Não havia um sistema educacional eficiente e as crianças passavam longas horas em aulas de religião. Então, aprendiam a ganhar a vida em casa mesmo. Mas, desde  jovem, Anna trabalhava como cantora e conhecia Bach. Dezessete meses depois de Maria Bárbara, primeira esposa do compositor falecer inesperadamente em 1720, este casou-se com Anna Magdalena. Era o ano de 1721: ele tinha 36 anos; Anna, 20. Bach teve vinte filhos — sete com Maria Bárbara e treze com Anna Magdalena, entre os anos de 1723 e 42.

Christiane Lang-Drewanz como Anna Magdalena Bach no filme "The Chronicle of Anna Magdalena Bach" (1968).
Christiane Lang-Drewanz como Anna Magdalena Bach no filme “The Chronicle of Anna Magdalena Bach” (1968).

Dos treze, sete perderam a partida para a alta mortalidade infantil da época. Dentre os sobreviventes estavam os também compositores Johann Christian Bach e Johann Christoph Friedrich Bach. Parece ter sido um casamento feliz. Além dos trabalhos de toda mulher da época, ela cantava, tocava cravo e transcrevia suas músicas. Na época em que moraram em Leipzig, a casa dos Bach tornou-se um regular local de saraus onde o casal organizava noites em que toda a família cantava e tocava com alunos do compositor e amigos.

Deviam ser saraus muito alegres. Provavelmente havia muita cerveja. Os contratos de Bach com seus empregadores previam não somente salários e condições de trabalho, como outras vitualhas fundamentais: trigo, lenha, cerveja, cevada… Pois Bach também produzia a bebida. Pode-se de dizer que, naquela época, por questões de saúde, era mais seguro beber cerveja do que água, mas as notas examinadas por seus biógrafos indicam que a família Bach consumia toneladas dela. Um relatório de gastos do compositor em 1725 (tinha 40 anos e já estava casado com Anna Magdalena) dá conta de um consumo enorme. Mas esta é outra história.

Johann_Sebastian_Bach_aHá muitas suposições sobre o fato de Anna Magdalena ter auxiliado Bach em várias composições. Diz-se até que a maravilhosa ária que abre as Variações Goldberg seria de autoria de Anna Magdalena, mas provavelmente tudo isso é lenda, pois o caminho de Bach como maior compositor de todos os tempos já vinha sido pavimentado de forma muito consistente antes de Anna. Porém, é indiscutível que ela lhe serviu como copista – há sua caligrafia em quase todas obras do compositor depois do casamento – e de inspiração. E Bach expressou sua gratidão dedicando várias peças para teclado e de câmara a ela.

Mas é claro que tudo vai acabar mal. Infelizmente, as histórias felizes não têm muita graça e raras vezes são lembradas. Bach viveu até 1750. Morreu aos 65 anos. Anna Magdalena sobreviveu-lhe dez anos. Após a morte do marido, houve um desentendimento entre os filhos, que brigaram e se separaram. Anna Magdalena permaneceu com suas duas filhas mais jovens e uma enteada do primeiro casamento de seu marido. Mulheres sozinhas no século XVIII eram sinônimo de caridade ou ruína. Ninguém da família as auxiliou economicamente e Anna Magdalena ficou cada vez mais dependente da caridade dos auxílios do conselho da cidade.

Na época, a herança e os bem materiais eram transmitidos ao filho mais velho ou ao parente mais próximo do sexo masculino. Bach nunca foi um homem rico, mas mesmo que fosse, as mulheres nunca herdariam nada. Assim era a lei na época, criada para que as posses ficassem ligadas ao nome de uma família por várias gerações, e para que não fosse loteada.

O que se sabe do fim de Anna Magdalena, mulher de Johann Sebastian Bach, é que ela morreu em 27 de fevereiro de 1760 e foi enterrada numa cova de indigente, sem identificação, na Johanniskirche de Leipzig (Igreja de São João). E que o local foi destruído por bombardeios aliados durante a Segunda Guerra Mundial.

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Gravura estilizada de Johann Sebastian e Anna Magdalena Bach.

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A Hard Day’s Night completa 50 anos hoje

A Hard Day’s Night completa 50 anos hoje
A capa do disco de vinil. Clique se quiser ampliar.
A capa do original inglês de vinil. A edição brasileira trazia a mesma capa, só que com a cor vermelha substituindo o azul. Clique se quiser ampliar.

A Hard Day’s Night é o terceiro álbum dos Beatles. Seu aguardado lançamento aconteceu na Inglaterra em 10 de julho de 1964, acompanhando o lançamento do filme homônimo de Richard Lester.

O título da canção A Hard Day’s Night tem origem numa expressão criada por Ringo Starr em uma entrevista, daquelas bem bagunçadas. Ele disse ao disc jockey Dave Hull, no começo de 1964: “Tínhamos trabalhado um dia inteiro e mais a noite toda. Quando saímos do estúdio, eu pensava que ainda era dia e disse: “Foi um dia duro… mas olhei em torno e vi que estava escuro, então eu disse: foi a noite de um dia duro”. A Hard Day’s Night.

Correria
Correria

John Lennon escreveu a música em uma noite — desta vez sem trabalhar durante o dia –, e apresentou-a aos outros Beatles na manhã seguinte. A letra do manuscrito original pode ser vista na Biblioteca Britânica, rabiscada em caneta esferográfica nas costas de um cartão de aniversário.

Meus sete leitores devem saber que, apesar de assinarem juntos a maior parte das músicas do grupo, Lennon e McCartney raramente as escreviam juntos. Eles as faziam separadamente e depois discutiam alguma alteração. É simples identificar quem fez o quê. Basta ouvir o cantor principal. John cantava as dele e Paul as suas.

Saltos
Saltos

O filme lançado com o disco foi dirigido por Richard Lester. Dez ENORME sucesso. Mostrava, em preto e branco, a história de uma banda de rock que era perseguida por fãs histéricos. Após perseguições de fãs, entrevistas, e muitas piadas, a banda realiza um show na televisão. O filme mostra um pouco da realidade dos Beatles na época. No Brasil, o disco e o filme foram lançados pelo nome de Os reis do iê, iê, iê (a expressão “iê, iê, iê” deriva de “yeah, yeah, yeah”, presente no refrão da canção She Loves You).

Como se fazia na época, o álbum foi gravado em apenas nove dias não consecutivos, de janeiro a junho de 1964. Entre as sessões, os Beatles cumpriam seus compromissos de shows e da filmagem de A Hard Day`s Night. Durante a filmagem, John Lennon e Paul McCartney escreviam mais e mais canções. A maioria destas ficou fora de A Hard Day`s Night, indo para o seguinte, Beatles for Sale, lançado em 4 de dezembro do mesmo ano.

Descanso
Descanso

A Hard Day`s Night tornou-se seu primeiro álbum do grupo que continha material exclusivamente original, só com canções de Lennon e McCartney, ainda sem a participação de George Harrison como compositor.

Ouvi o disco novamente ontem e reforcei minha impressão. É um álbum bem diferente do que veio antes e do que virá depois. O motivo é simples. É o único disco dominado por canções de John Lennon. Isto o trona muito mais rápido, muito mais rock ‘n’ roll. A típica presença de Paul, muito mais lírico e melodioso, é notada em And I love her e Things we said today. O resto, com exceção de If I fell, são rocks rápidos.

Mais correria
Mais correria

Lennon foi o único compositor da faixa-título, juntamente com I Should Have Known Better, Tell Me Why, Any Time At All, I’ll Cry Instead, When I Get Home e You Can’t Do That. Ele também escreveu a maior parte de If I Fell e I’ll Be Back, e colaborou com McCartney em I’m Happy Just To Dance With You.

As contribuições de McCartney para o álbum foram discretas, porém excelentes: as clássicas baladas And I Love Her e Things We Said Today, bem como Can’t Buy Me Love.

A Hard Day’s Night é um dos três únicos álbuns dos Beatles para não contêm vocais por Ringo Starr. Os outros são Let It Be e Magical Mystery Tour.

O cartaz do filme de Lester
O cartaz do filme de Lester

As faixas de A Hard Day`s Night:

Lado A

A Hard Day’s Night
I Should Have Known Better
If I Fell
I’m Happy Just To Dance With You
And I Love Her
Tell Me Why
Can’t Buy Me Love

Lado B

Any Time At All
I’ll Cry Instead
Things We Said Today
When I Get Home
You Can’t Do That
I’ll Be Back

John Lennon: vocal, guitarra, violão, harmônica, tamborim
Paul McCartney: vocal, baixo, piano, sinos
George Harrison: vocal, guitarra, violão
Ringo Starr: bateria, congas, bongôs, tamborim
George Martin: piano

Produtor: George Martin, óbvio

O disco completo para meus sete leitores-ouvintes:

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As razões para a derrota: CBF, Felipão e uma geração de jogadores nem tão brilhante assim

As razões para a derrota: CBF, Felipão e uma geração de jogadores nem tão brilhante assim

Tudo começou lá em 2010, mais exatamente no dia 23 de julho, quando Muricy Ramalho foi convidado para assumir como técnico da Seleção Brasileira. A CBF avisou todo mundo, anunciou Muricy antes de um acerto que não aconteceu. Muricy preferiu honrar seu contrato com o Fluminense. Em seu lugar, entrou Mano Menezes já com o estigma de ser a segunda opção.

Mano permaneceu dois anos. Parecia estar fora de seu habitat e só colecionou maus resultados. Alguns já falavam o óbvio: a Copa no Brasil coincidiria de modo perverso com uma das piores gerações de jogadores brasileiros. Neste ínterim, em fevereriro de 2012, Ricardo Teixeira renunciou dando lugar a José Maria Marin, um esbirro da ditadura que, em novembro de 2012, fez retornar Felipão. Luiz Felipe Scolari não ganha títulos de importância desde que retornou ao país de sua aventura europeia. A meu ver, comprovou no Palmeiras estar desatualizado em tudo, desde a parte tática até a relação com a imprensa.

Marin e Felipão: o esbirro da ditadura e obsoleto
Marin e Felipão: o esbirro da ditadura e obsoleto

E Felipão retornou com o coordenador técnico Carlos Alberto Parreira, que tinha sido condenado pela imprensa brasileira em 2006 por apenas isso: ele não dava treinamentos. Tal acusação não era vazia, pois os treinos eram televisionados. Lembram dos jogadores caminhando de um lado para outro, uns conversando, outros batendo bola?

Os resultados de Felipão foram melhores que os de Mano, ele ganhou a Copa das Confederações, mas o futebol da Seleção não empolgava ninguém. Havia uma vida nas propagandas — Felipão tornou-se o maior garoto-propaganda do país —  e outra dentro de campo, bem menos brilhante. A administração cabia à anacrônica CBF, com suas várias seleções, técnicos, convocações a toda hora e outras posturas caça-niqueis. A coisa não sabia bem até para quem, como eu, deixara de lado os assuntos deprimentes da CBF.

E chegamos à 2014. A convocação dos jogadores me pareceu uma piada. É estranho que um país do primeiro mundo do futebol vá a uma Copa com Fred e Jô de centroavantes. Por exemplo, em 1970, Zagallo, après João Saldanha, escalava um time sem centroavante. Na época, o único centroavante era o reserva era Dario, um bom centroavante convocado “a pedido” do ditador Emílio Médici e que nunca foi utilizado por Zagallo. Dario, Fred, Jô, etc. eram / são jogadores que nunca foram unanimidades como craques no país. O time teria que ser redesenhado, mas Felipão, desde Jardel, parece não saber jogar sem centroavante.

Na Copa do Mundo, fomos até longe demais. O Chile poderia ter eliminado o Brasil, que conseguiu a vaga nos pênaltis pelo fato de um chileno ter errado seu chute. O nervosismo dos jogadores — patente em suas lágrimas — demonstrava alguma coisa que não era repercutida pelo ufanismo das propagandas e dos locutores de TV.

É claro que os 7 x 1 para a Alemanha foram inesperados. Um primeiro tempo que termina em 5 x 0 é anormal até no Campeonato Gaúcho e nas primeiras fases da Copa do Brasil. É um resultado que só se obtém se o adversário ficar parado, pasmo. Foi o nosso caso. Fomos um grupo mal treinado que não soube o que fazer contra a organizada Alemanha. Mas tudo continuará igual. A partir de abril de 2015, o atual presidente da Federação Paulista de Futebol (FPF), Marco Polo Del Nero — homem que tem o mesmo estilo e ideias de Teixeira e Marin –, será o novo manda-chuva da CBF. E tudo seguirá assim até que uma grande geração de jogadores nasça, entre em campo e vença, não obstante a CBF.

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Latuff invade minha mesa de trabalho

Latuff invade minha mesa de trabalho

Eu gosto de manter as 12 abas de meu Google Chrome organizadinhas… Elas sempre estão na ordem que segue: as 4 primeiras são as do Sul21 (post que está sendo trabalhado, capa, geração da capa, Sul21), depois vêm as dos blogs Milton Ribeiro e PQP Bach, PqpShare, Gmail, Feedly, Facebook, Gmail do PQP Bach e Google Calendar. Posso trabalhar com mais, mas estas 12 primeiras são fixas.

Só que frequentemente aparecia um xarope que, depois de meu horário de saída, esculhambava esta ordem de comprovada eficácia, apagando parte das abas ou todas. Então, coloquei um post-it no meu monitor ameaçando os invasores. Ele dizia: EU MATO QUEM APAGAR (EXCLUIR) AS ABAS DO GOOGLE CHROME!

Ontem, na minha ausência, meu pequeno post-it ganhou um desenho do Latuff. Ficou sensacional.

Abas de Milton Ribeiro

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O sucesso estrondoso dos shows do Monty Python mostra que o humor ainda é feito de inteligência

O sucesso estrondoso dos shows do Monty Python mostra que o humor ainda é feito de inteligência

Por Harold Von Kursk | No Diário do Centro do Mundo | A escolha dos esquetes foi do blogueiro

Nos anos 70, a série Monty Python Flying Circus ofereceu uma visão distorcida e absurda sobre o estado das coisas e rapidamente tornou-se um clássico cult. Os Pythons elaboraram um fluxo de consciência que criou momentos inesquecíveis de êxtase cômico. Qualquer busca rápida no YouTube vai encontrar clipes sublimes de seus melhores esquetes — a Loja de Queijos, o Ministério das Caminhadas Idiotas, a Canção do Lenhador, o Papagaio Morto etc.

Os Pythons são deuses imortais do riso. Eles levaram o humor a um estado de arte da mesma maneira que Jackson Pollock evoluiu do “gotejamento” para o expressionismo abstrato. Monty Python tornou-se um ponto de referência cultural, da mesma forma que iconoclastas como RD Laing, Louis Althusser, Albert Camus, Ali Farka Touré, Nina Simone, Andy Warhol, Pete Seeger. Ainda estão na vanguarda da nossa consciência depois de se separarem. O Monty Python foi originalmente concebido como um ataque frontal completo ao que era então conhecido, naquela era, como o “establishment”.

Como Timothy Leary, o professor de Harvard que se tornou um guru do LSD e aconselhou as pessoas a “se ligar, sintonizar e cair fora”, a gangue Python convidou-nos a olhar para a sociedade moderna como uma espécie de gigantesco hospício onde é difícil explicar por que é que nós fazemos o que fazemos. Tudo com inteligência e sem a vontade primeira de ofender, praga de 99% dos comediantes de hoje, que escondem sua falta de talento atrás do politicamente incorreto.

Este mês, os cinco Pythons restantes – John Cleese, Eric Idle, Terry Jones, Michael Palin e Terry Gilliam – estão se reunindo no palco da O2 Arena, em Londres, realizando seus primeiros shows ao vivo em mais de 40 anos. As cinco apresentações iniciais lotaram. Eles tiveram de marcar mais cinco (15, 16, 18, 19 e 20 de julho). O show do dia 20 será transmitido ao vivo para mais de 400 cinemas.

Os Pythons estão até mesmo invocando o fantasma de Graham Chapman (o rei Arthur de “Em Busca do Santo Graal”) através da holografia e convidaram a atriz Carol Cleveland, veterana do programa de TV, para a briga.

Há algo esplendidamente original sobre a marca Python na comédia. Em vez de tornar-se advogados, banqueiros ou burgueses gordos, o bando formado em Cambridge (Cleese, Chapman e Idle) e Oxford (Jones e Palin) desenvolveu uma filosofia em quadrinhos não ortodoxa e irreverente. Terry Gilliam foi o último a se unir ao grupo, um artista gráfico americano que criou o famoso pé roxo que esmagava as coisas na telinha e cujas imagens pop / psicodélicas acrescentaram uma dimensão extra à série (Gilliam viria a se tornar um diretor de cinema conhecido por “Brasil” e “Medo e Delírio em Las Vegas”).

O “Monty Python Flying Circus” passou na BBC entre 1969 e 1974. Seu humor era era tão surreal para os padrões normalmente sisudos que foi quase um milagre que eles atingissem um público de massa.

Os Pythons estavam à frente de seu tempo e ainda hoje o seu humor ressoa. Ninguém foi capaz de imitar ou capturar seu brilho. O Saturday Night Live chegou mais perto durante os anos dourados com Dan Aykroyd, John Belushi, Gilda Radner, Eddie Murphy e Bill Murray, mas não alçava vôos nas mesmas alturas.

O Monty Python capturou a desumanidade e a indecência da sociedade moderna. Odiavam a burocracia, a intolerância, o conformismo, o conservadorismo, a pompa, e o rolo compressor estéril de uma sociedade ocidental decadente que atropelava os valores humanos em prol do expansionismo corporativo. Em sua incursão no cinema, os Pythons amplificaram suas paródias macabras.

Quem pode esquecer quando o rei Arthur e seus seguidores se aproximam de um castelo para ser insultados, atormentados e perseguidos por guardas franceses arrogantes no filme “Em Busca do Santo Graal”? Pode haver algo mais insano do que a idéia de uma turma de cavaleiros gays desonestos e gigantes que habitam a floresta e que dizem “Ni”?

“A Vida de Brian”, que em seu lançamento foi denunciado por direitistas e teólogos, na verdade apresentou um retrato bastante preciso dos movimentos políticos da época. O filme segue um personagem fictício infeliz chamado Brian, que nasceu ao mesmo tempo em que Jesus e está, inadvertidamente, destinado a ser o messias. Recentemente, o Reverendo Professor Burridge, decano do King’s College de Londres, a quem o papa Francisco deu um prêmio por seus estudos, declarou que “a representação de movimentos messiânicos no filme, na Judeia do século I, ofereceu provavelmente um retrato mais preciso do contexto histórico do que muitos filmes de Hollywood sobre Jesus “.

Quem mais poderia encerrar o filme num clímax em que os revolucionários crucificados cantam e pedem para “sempre olhar para o lado mais alegre da vida?”

O mundo ama o Monty Python, tanto por sua capacidade de desafiar formas ortodoxas de pensar e de se comportar como por sua capacidade inigualável para celebrar as contradições fundamentais da existência. Com precisão cirúrgica, eles continuaram martelando nossos ossos até vermos como boa parte do que aceitamos como normal diariamente é de fato lixo absoluto.

Ao vivo, o Monty Python representa seus números clássicos com ajuda de telões e outros recursos modernos. Cantam e dançam. Está lá até o jogo de futebol de filósofos. A rigor, não há novidade. Mas essa é a sabedoria da trupe. Quem vai aos shows dos Rolling Stones esperando ouvir as canções do novo disco está no lugar errado. “O nosso grande problema agora é que a plateia conhece os scripts muito melhor do que nós”, disse John Cleese. No dia 20, o Monty Python estará definitivamente morto. Enterrado. Terá deixado de existir. Longa vida ao Monty Python.

O Monty Python, hoje
O Monty Python, hoje

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Sobre o goleiro da Holanda ser uma arma secreta, palpites para as semifinais e outros itens

Sobre o goleiro da Holanda ser uma arma secreta, palpites para as semifinais e outros itens

Sobre o goleiro especialista em pênaltis da Holanda, Tim Krul. Anteontem à noite, meu amigo Ricardo Branco aventara (gostaram?) a hipótese de que aquilo fosse apenas uma inteligente medida de ordem psicológica e intimidatória. Do tipo, “temos uma arma secreta”. Para piorar, o tal especialista era um armário. Hoje, sabe-se que o Branco tinha razão. Tratava-se de uma medida brilhante de Louis van Gaal a fim de deixar os jogadores da Costa Rica de cabelos em pé. “Quem é esse cara que entra só para os pênaltis? Deve ser o próprio monstro que pega todos”. A estratégia está na regra e a Holanda ganhou.

O "especialista" Krul...
O “especialista” Krul…

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Já que, nestes dias antes das semifinais, a Argentina tem mais cara de campeã do que o Brasil, meu amigo Jorge Lima sugere um bombardeio preventivo a Buenos Aires. Acho que nossa Marinha — temos mesmo isso?, como eles passam o tempo? — poderia atacar do Prata, destruindo os restaurantes de Puerto Madero. Pura profilaxia.

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Palpites para as semifinais:

Brasil x Alemanha (Belo Horizonte, 8 de julho, às 17h)
–> Passa a ALEMANHA, infelizmente

Argentina x Holanda (São Paulo, 9 de julho, às 17h)
–> Passa a ARGENTINA.

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Pena que não consegui ver o final do jogo no qual Novak Djokovic venceu Wimbledon e ainda retornou ao primeiro lugar no ranking. Vi só os 4 primeiros sets… Também, né, foram mais de 3h30 e eu tinha que ir ao cinema. Já tinha comprado os ingressos e tudo…

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Esse pessoal que fala em Copa comprada ou é ingênuo ou está fora da disputa. Argentina, Alemanha, Brasil e Holanda pagaram suas vagas? Conta outra. E, se quem comprou foi o Brasil, por que não providenciou adversários mais fáceis? Como disse o Sergio Bomfim, imagina a grana pra subornar 31 seleções. Deve ser o dobro do PIB.

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No ano passado, eu e Igor Natusch criamos informalmente o PJS — Partido da Justiça Social. Quem poderia ser contra nós?

Anteontem, Elena Romanov manifestou desejo de criar o PUM — Partido Utópico Moderado. Agora debato-me entre as duas siglas.

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Olha, o nível dessas eleições é de chorar. Nossa Assembleia Legislativa, hoje já não muito brilhante….

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Uma Parábola de Kafka

Uma Parábola de Kafka

Gosto muito de Kafka, porém, anos atrás, não concordava com esta pequena parábola de Kafka. O fato é que não tinha experiência para poder compreendê-la. Hoje, ela literalmente me arrepia em sua verdade.

Diante da Lei faz parte de um dos poucos livros que Kafka publicou em vida: Um Médico Rural – Pequenas Narrativas (Ein Landarzt. Kleine Erzälungen – 1919). A tradução que copio abaixo é a do escritor Modesto Carone, que foi multi-premiado no início dos 90 por suas traduções de quase todo o Kafka. Não lembro se América foi traduzido. As traduções anteriores eram insatisfatórias; tratavam de “melhorar” a estranha pontuação de Kafka e muitas não eram feitas a partir do original, mas do francês. Minha edição é da Brasiliense (1990), mas penso que a Cia. das Letras republicou tudo há uns quinze anos. Lá vai.

diante da lei

Diante da Lei

Diante da lei está um porteiro. Um homem do campo chega a esse porteiro e pede para entrar na lei. Mas o porteiro diz que agora não pode permitir-lhe a entrada. O homem do campo reflete e depois pergunta se então não pode entrar mais tarde.

– É possível – diz o porteiro. – Mas agora não.

Uma vez que a porta da lei continua como sempre aberta e o porteiro se põe de lado o homem se inclina para olhar o interior através da porta. Quando nota isso o porteiro ri e diz:

– Se o atrai tanto, tente entrar apesar da minha proibição. Mas veja bem: eu sou poderoso. E sou apenas o último dos porteiros. De sala para sala porém existem porteiros cada um mais poderoso que o outro. Nem mesmo eu posso suportar a simples visão do terceiro.

O homem do campo não esperava tais dificuldades: a lei deve ser acessível a todos e a qualquer hora, pensa ele; agora, no entanto, ao examinar mais de perto o porteiro, com o seu casaco de pele, o grande nariz pontudo, a longa barba tártara, rala e preta, ele decide que é melhor aguardar até receber a permissão de entrada. O porteiro lhe dá um banquinho e deixa-o sentar-se ao lado da porta. Ali fica sentado anos e anos. Ele faz muitas tentativas para ser admitido e cansa o porteiro com os seus pedidos. Às vezes o porteiro submete o homem a pequenos interrogatórios, pergunta-lhe a respeito de sua terra natal e de muitas outras coisas, mas são perguntas indiferentes, como as que os grandes senhores fazem, e para concluir repete-lhe sempre que ainda não pode deixá-lo entrar. O homem, que havia se equipado com muitas coisas para a viagem, emprega tudo, por mais valioso que seja, para subornar o porteiro. Com efeito, este aceita tudo, mas sempre dizendo:

– Eu só aceito para você não julgar que deixou de fazer alguma coisa.

Durante todos estes anos o homem observa o porteiro quase sem interrupção. Esquece os outros porteiros e este primeiro parece-lhe o único obstáculo para a entrada na lei. Nos primeiros anos amaldiçoa em voz alta e desconsiderada o acaso infeliz; mais tarde, quando envelhece, apenas resmunga consigo mesmo. Torna-se infantil e uma vez que, por estudar o porteiro anos a fio, ficou conhecendo até as pulgas de sua gola de pele, pede a estas que o ajudem a fazê-lo mudar de opinião. Finalmente sua vista enfraquece e ele não sabe se de fato está ficando mais escuro em torno ou se apenas os olhos o enganam. Não obstante reconhece agora no escuro um brilho que irrompe inextinguível da porta da lei. Mas já não tem mais muito tempo de vida. Antes de morrer, todas as experiências daquele tempo convergem na sua cabeça para uma pergunta que até então não havia feito ao porteiro. Faz-lhe um aceno para que se aproxime, pois não pode mais endireitar o corpo enrijecido. O porteiro precisa curvar-se profundamente até ele, já que a diferença de altura mudou muito em detrimento do homem:

– O que é que você ainda quer saber? – pergunta o porteiro. – Você é insaciável.

– Todos aspiram à lei – diz o homem. – Como se explica que em tantos anos ninguém além de mim pediu para entrar?

O porteiro percebe que o homem já está no fim e para ainda alcançar sua audição em declínio ele berra:

– Aqui ninguém mais podia ser admitido, pois esta entrada estava destinada só a você. Agora eu vou embora e fecho-a.

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Ospa nas igrejas ou Nada é o que parece ou Concerto de Gatinhos

Ospa nas igrejas ou Nada é o que parece ou Concerto de Gatinhos
Clarke: revirando-se no túmulo
Clarke: revirando-se no túmulo

Nossa, que chuvarada a de ontem à noite! E que acústica horrível e gritona a da Igreja dos Navegantes! Quando o excelente oboísta Javier Balbinder começou a ensaiar sozinho no palco já deu para concluir que o final da Abertura Egmont soaria como uma manada de elefantes na ponte do Guaíba. E soou mesmo.

Quando o concerto iniciou, os sismógrafos londrinos tremeram, indicando movimentos no solo abaixo da Catedral de St. Paul. É que Jeremiah Clarke revirava-se e dava socos para todo lado dentro de seu túmulo. O concerto começou com Trumpet Voluntary

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Miau!
Miau!

Desde 1940, é sabido que a obra conhecida por Trumpet Voluntary foi escrita por Jeremiah Clarke e não por Henry Purcell, como anunciou o programa da Ospa. Quando a peça foi escrita, Purcell já estava morto havia cinco anos. A peça foi escrita originalmente para cravo e chama-se Prince of Denmark’s March. De 1878 até 1940, a peça foi atribuída a Henry Purcell e chamada de Trumpet Voluntary. Tudo porque, naquele ano do século XIX, um certo William Sparkes publicou um volume chamado Pequenas Peças para o Órgão, Livro VII, No. 1 (Londres, editado por Ashdown & Parry), incluindo erroneamente a peça de Clarke como se fosse de Purcell. Esta versão chamou a atenção de Sir Henry J. Wood, que fez duas transcrições orquestrais do mesma. Aí é que apareceu o trompete e o novo nome. Antigas gravações do início do século XX cimentaram o erro. Mantido o título dado por Wood, a peça tornou-se popular em casamentos reais, mas sabe-se desde 1940 que seu autor é Jeremiah Clarke, não Purcell. Não acho muito legal errar o autor de uma obra.

Volo 1
Estou mortinho!

O pobre Clarke não foi sacaneado somente pela Ospa. Dizem os livros que “uma paixão violenta e sem esperança por uma bela senhora de uma classificação superior a sua levou-o a cometer suicídio”. Antes de se matar, ele ficou na dúvida: enforcamento ou afogamento? Como forma de decidir seu destino, ele jogou uma moeda para o alto, mas esta caiu em pé na lama. Gente, não brinco, falo sério. Em vez de considerar o fato como um sinal de que deveria desistir de seu intento, ele escolheu um terceiro método, matando-se com um tiro na cabeça nos jardins da Catedral de St. Paul, em Londres. Suicidas não têm muita chance com igrejas, mas foi feita uma exceção para Clarke, que foi enterrado na cripta da Catedral.

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Óin!
Óin! Olha o adágio de Albinoni aí, gente!

Por outro lado, com toda a razão, estava escrito no programa da Ospa: Albinoni (Remo Giazzoto) – Adagio.

Albinoni foi um compositor barroco veneziano relativamente obscuro. Então, em 1958, surgiu este “Adagio” que tem sido usado por companhias de balé, patinadores, filmes — lembram de Gallipoli, um filme de 1981 sobre a Primeira Guerra Mundial? — e, com letras, por uma série de vocalistas como Sarah Brightman, por exemplo. Esta peça é, no entanto, uma composição moderna, como salientou o maestro Tiago Flores após regê-la. Conto o caso a seguir.

cacda
Gato mau. Será por causa de Wagner?

Manuscritos de Albinoni, incluindo uma série de partituras que nunca tinha sido publicada, estavam há muitos anos na Alemanha. Mas a biblioteca onde se encontravam foi destruída no bombardeio de Dresden, em fevereiro de 1945. Os papéis de Albinoni foram perdidos no incêndio. Porém, algumas obras do compositor tinham sido antes catalogadas por um musicólogo italiano chamado Remo Giazotto, autor de uma biografia de Albinoni. Em 1958, Giazotto introduziu esta peça como obra de seu biografado. Ele a teria reconstruído a partir de fragmentos de uma sonata.

Mas outros musicólogos tinham realizado as mesmas pesquisas e acharam tudo muito estranho. Denunciaram. Diante disso, como bom italiano enrolão, a história de Giazotto mudou um pouco. Ele passou a dizer que tinha se baseado em alguns fragmentos de uma linha de baixo que estavam num manuscrito de Albinoni. Mais: ele alegou que tinha os fragmentos. E mais: disse que eles tinham sido enviados a ele por questões de segurança, quando a biblioteca em Dresden dispersou muitos de seus tesouros… Um cidadão imaginativo, sem dúvida. É fundamental saber que os direitos autorais da peça têm apenas o nome de Remo Giazotto. E que ele, é claro, jamais mostrou os tais manuscritos.

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Bunitinho!
Soninho.

Abertura Egmont. Aqui não há erro nem má intenção, apenas curiosidades. A música incidental para a peça Egmont, de Goethe, foi composta no final de 1809 para o Court Theater de Viena. A obra de Goethe é de 1786 e refere-se à acontecimentos não contemporâneos dos autores. No século XVI, o conde Egmont, de Flandres, lidera o povo flamengo em sua revolta contra a tirania espanhola. Depois de sua captura e prisão pelos espanhóis, sua amante Clärchen tenta resgatá-lo, mas fracassa em sua tentativa e ela se suicida, ingerindo veneno. Em sua cela, Egmont tem visões da imagem da liberdade e esta é uma mulher que se parece com sua amada. Ela coloca uma coroa de louros em sua cabeça enquanto uma música militar é ouvida. Então Egmont é executado, mas leva consigo a certeza de que a liberdade irá prevalecer.

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Meus
Bunitinho…

Este foi um Concerto de Gatinhos. Lembram aquelas seleções de clássicos dos anos 70 e 80 que tinham gatinhos na capa? Ali, o Aleluia de Handel podia vir antes de Rhapsody in Blue, a qual era seguida da Abertura 1812, por exemplo. Salada semelhante foi-nos servida  na noite de ontem. A Ospa estava cheia de gatinhos, óin… Olha, eu acho que isso não cria público, acredito que este gênero de programa seja válido apenas em séries de concertos para escolas ou como eram os velhos “Concertos para a Juventude”, mas enfim. O apelido “Disco de Gatinhos” ou “Concerto de Gatinhos” é de autoria do Júlio e da D. Cristina lá da King`s Discos, esplêndida loja que ficava na Galeria Chaves. Eles não gostavam muito daquelas seleções…

Não vou avaliar o lado artístico do concerto de ontem. Era quase impossível tocar alguma coisa sem desafinar no meio daquela reverberação. Os membros da orquestra devem ter saído meio surdos de lá.

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O programa:

Com aquela chuva, queriam que não estivesse amassado?
Com aquela chuva, queriam que não estivesse amassado?

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O sonho que tive esta noite: William Shakespeare, meu Ghost Writer

O sonho que tive esta noite: William Shakespeare, meu Ghost Writer

Estava em casa, lendo numa mesa de fórmica branca, daquelas que se faziam anos 60 e 70, quando Shakespeare chegou. Em meu sonho, ele falava um português machadiano. Sentou-se tranquilamente em meu antigo quarto com aquela mesma cara das pinturas, só que um pouco mais corado, e declarou que gostaria que eu começasse uma carreira de poeta. Propôs-se a ser meu ghost writer.

– Aliás – riu-se Shake -, já o sou.

Sorri e disse-lhe que não lia muita poesia e que era incapaz de um verso, mas que concordava com o esquema. (Um belo oportunista ou um homem preocupado em divulgar altíssima cultura? O primeiro, certamente.) Então, ele passou a me ditar os poemas mais sublimes e perfeitos, dos quais não lembro, é claro. Só lembro da profunda emoção que me causaram e da dificuldade que tinha para escrever com o lápis na fórmica, pois as lágrimas me atrapalhavam. Enquanto fungava, ouvia e copiava a maior e mais inédita das obras. Às vezes, perguntava-lhe onde deveria mudar de linha ou onde acabava a estrofe, essas coisas técnicas. Minha caligrafia era belíssima. (Minha letra é horrorosa.)

Depois de muitos sonetos – a mesa de meu sonho era imensa -, meu novo amigo cansou e pediu-me para levá-lo até a porta. Enquanto o acompanhava, ele garantiu que voltaria.

– Voltarei! – falou ele bem alto, para minha alegria.

Não parecia um espectro. Quando voltei, nossa empregada estava de joelhos sobre a mesa, esfregando-a com produtos de limpeza bastante eficientes. (Não vi suas marcas, então não posso indicá-los.) Vi a mesa branca, ainda úmida, e caí em abissal desespero. Acordei apavorado. Não é sempre que se perde um ghost desses.

Shakespeare

Seu rosto era exatamente este, só que, como já disse, mais corado. 

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Praça de Londres, de Lídia Jorge

Praça de Londres, de Lídia Jorge
O volume das Publicações Dom Quixote
O volume das Publicações Dom Quixote

Comecei vários livros nos últimos meses. Terminei poucos. Diagnóstico: baixo nível de concentração e falta de um livro que me fizesse saltar no carrossel novamente. Estava atrás de algo apaixonante, de algo que, uma vez abandonado, deixasse rapidamente saudade. Por vários motivos, este pequeno volume de contos de Lídia Jorge, comprado na livraria Bertrand do Chiado, em Lisboa — segundo o Guiness a livraria mais antiga do mundo, em atividade desde 1732 — fez retornar minha vontade de ler.

Praça de Londres tem como subtítulo “Cinco Contos Situados”, fazendo referência ao fato de cada um dos contos narrar fatos ocorridos em diferentes cidades. Porém, se há esta distinção, a atmosfera de imprecisão e de dúvida está por todo o lugar. Os focos narrativos de Lídia Jorge são os mais originais possíveis. O conto mais longo do livro, Perfume, por exemplo, tem narração longínqua e entrecortada, combinando inteiramente com a sonhadora rarefação proposta pelo texto da autora.

O primeiro conto, Praça de Londres mostra o crescente glissando emocional de uma uma mulher que vê uma cena de rua que não tem nada a ver com sua vida e que lhe provoca ciúme e curiosidade. O diálogo imaginário com a zeladora de um prédio é o ponto alto de uma história inusual.

Rue de Rhône é uma narrativa muito íntima da culpa de uma mulher que compra uma bolsa politicamente incorreta, pois é feita da pele de jacarés da Louisiana. Não há diálogos e a vendedora não entende o triplo constrangimento da compradora.

Branca de Neve é o estupendo relato de um roubo inesperado ou concedido.

Em Viagem para Dois, Lídia Jorge leva ao máximo a originalidade do foco narrativo. É uma curiosa história contada por um homem à mulher que a escreverá mais tarde. Ele lhe conta tudo, dando instruções detalhadas sobre como ela há de fazê-lo. Em estado bruto, estão lá a ideia e algumas possíveis execuções.

Perfume baseia-se no filme Yol, de Yilmaz Guney, a quem é dedicado, tem foco narrativo hesitante — fica entre a criança que vê e a babá meio paranoica. Impossível não se apaixonar por este distante relato do fim de um casamento.

Indico mesmo!

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A novela Meu Pedacinho de Chão deixa estarrecida a família brasileira

A novela Meu Pedacinho de Chão deixa estarrecida a família brasileira

Os telespectadores da — adivinho — maravilhosa novela chamada Meu Pedacinho de Chão (ou seria Meu Pedacinho de Seio?) vêm movimentando as redes sociais nas últimas horas. No capítulo de segunda-feira (30) da novela das seis da Rede Globo, a professora Juliana, interpretada pela atriz Bruna Linzmeyer, abusou do decote e mostrou algo chocante, aquilo que parece ser parte de sua aréola direita.

Os admiradores da Mulata Globeleza ficaram ruborizados, certamente.

pedacinho de areola

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Conferindo meus palpites para as oitavas e projetando as quartas-de-final da Copa

Conferindo meus palpites para as oitavas e projetando as quartas-de-final da Copa
Arjen Robben: acho que seu time é o único que se classificará facilmente, entrando descansado nas semis.
Arjen Robben: acho que seu time é o único que se classificará facilmente, entrando descansado nas semis.

Dos oito jogos das oitavas, acertei sete vencedores. Errei apenas o Brasil, como vocês podem conferir ao final deste post. Vamos dar nossos chutes para as quartas? Diferentemente das oitavas, onde simplesmente escolhi o melhor time, agora entra um pouco do torcedor em campo. Os confrontos são muito equilibrados. Creio que só a Holanda terá vida fácil contra a Costa Rica. O Brasil? Está ainda vivo e, após passar criminosamente pelo Chile, acho que irá até as semi-finais.

França x Alemanha, no Rio de Janeiro (RJ), sexta (4), às 13 horas.
—> Duríssimo, não tenho a menor ideia: passa a França.

Brasil x Colômbia, em Fortaleza (CE), sexta (4), às 17 horas.
—> Passa o Brasil: acho que, apesar do time superior, falta tradição à Colômbia.

Holanda x Costa Rica, em Salvador (BA), sábado (5), às 17 horas.
—> Passa a Holanda fácil.

Argentina x Bélgica, em Brasília (DF),sábado (5), às 13 horas.
—> Passa a Bélgica.

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Os palpites para as oitavas com o “gabarito”.

Brasil x Chile (Belo Horizonte, 28 de junho, às 13h)
—> Passa o Chile. ERRADO.

Colômbia x Uruguai (Rio de Janeiro, 28 de junho, às 17h)
—> Passa a Colômbia. CERTO.

Holanda x México (Fortaleza, 29 de junho, às 13h)
—> Equilibrado, mas passa a Holanda. CERTO.

Costa Rica x Grécia (Recife, 29 de junho, às 17h)
—> Costa Rica, fácil. NADA FÁCIL, MAS CERTO.

França x Nigéria (Brasília, 30 de junho, às 13h)
—> França, infelizmente. CERTO.

Alemanha x Argélia (Porto Alegre, 30 de junho, às 17h)
—> Passa a Alemanha. CERTO.

Argentina x Suíça (São Paulo, 1º de julho, às 13h)
—> Passa a Argentina. CERTO.

Bélgica x EUA (Salvador, 1º de julho, às 17h)
—> Complicado… Passa a Bélgica. CERTO.

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Das conversas com Lídia Jorge na Feira do Livro de Porto Alegre

Das conversas com Lídia Jorge na Feira do Livro de Porto Alegre

Sul21 acompanhou a escritora portuguesa Lídia Jorge na Feira do Livro de Porto Alegre. Ela é uma das principais romancistas portuguesas em atividade e veio à cidade lançar seu livro O Vento Assobiando nas Gruas. Ela nasceu em 1946, no Algarve, em Portugal. Licenciada em Filologia Românica e professora do ensino secundário, ensinou em Angola e Moçambique antes de se fixar em Lisboa. Lídia tem dez romances publicados, além de ensaios, volumes de contos, de literatura infantil e peças de teatro. Sua obra alcança grande êxito junto à critica e ao grande público. Temas rurais, africanos e sobre a solidão da mulher são preocupações centrais na obra de Lídia Jorge. Seus principais romances são O Dia dos Prodígios (1980), Notícia da Cidade Silvestre (1984), A Costa dos Murmúrios (1988), O Vento Assobiando nas Gruas (2002) e A Noite das Mulheres Cantoras (2011). A escritora recebeu o Grande Prêmio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores (2003), o prêmio Correntes d’Escritas (2004), o Prêmio de Literatura da Fundação Günter Grass (2005), na Alemanha, o Prêmio do Público (2005) no Salão de Literatura Europeia, em Cognac, na França, e o Prêmio Jean Monnet da Literatura Europeia. Abaixo, alguns trechos de conversas com Lídia Jorge

A literatura entrou muito cedo na minha vida. Minha família era formada de pessoas pobres que, em princípio, não deveria ter uma pequena biblioteca, mas havia uma pequena biblioteca em minha família. E esta ficou dentro de uma caixa por muitos anos. Quando eu era criança, tive a sorte de encontrar bons livros dentro daquela caixa que foi de um bisavô meu, a quem eu devo tudo e que, apesar de ser um homem pobre, era um homem culto e que deixou esses livros. E eu os lia. Eram livros, sobretudo, de conteúdo romântico. Livros de Júlio Dinis, Camilo Castelo Branco. E eu via que aquelas histórias sempre terminavam de uma forma terrível, porque eram histórias de abandono, de prostituição, de homens que seduziam as mulheres e depois as abandonavam com crianças, filhos que vinham para assassinar os pais, pessoas que morriam dentro de masmorras… Quer dizer, era tudo uma coisa de tal dramatismo… E eu lia para minha família em voz alta, porque eles pediam de noite para eu ler. Eu lia aquelas histórias e depois não dormia, porque pensava que o mundo dos adultos era horrível. Eu não queria crescer; confundia tudo, o plano da realidade com o plano da ficção. Sentia que o mundo era uma traição. E o que fazia em resposta? Começava, para me entreter, a reescrever aquelas histórias, mas ao contrário. Pegava algumas pequenas coisas das histórias e dava finais felizes àquelas figuras. Sobretudo cuidava para que os pais reencontrassem seus filhos. Acho que escrevi dezenas e dezenas de historias de noites de natal, em que aparecia uma pessoa à porta, alguém de barba, uma pessoa disfarçada, um velho que depois tirava a barba e era o pai das crianças. Quer dizer, eu queria no fundo encontrar uma harmonia, eu queria dar pais aos filhos, filhos aos pais, amantes às mulheres… Eu queria, na minha inocência, organizar o mundo. E eu comecei assim. Depois, pela vida afora, eu pensei em diversos finais felizes. Mas nos bons livros poucas vezes há finais com harmonia. Mas nunca deixei de, para além da última página, reclamar uma harmonia para o mundo. Eu faço aquilo que gosto de ler. Gosto que as últimas páginas — mesmo dentro da maior desgraça — me digam que há uma vida para recomeçar de outra forma. Então, eu escrevo com essa intenção. Às vezes tenho um pouco de vergonha de dizer isso, porque essa é uma ideia que está completamente fora de moda. Acho que  por mais malvados que os escritores sejam, a verdade é que todos escrevem para reescrever o mundo, para reclamar uma outra ordem. E eu assumo isso diretamente, mas com um pouco de vergonha.

A identidade portuguesa perpassa todos os meus livros. Eu não faço isso de propósito. Quem teve uma juventude como tiveram as pessoas da minha geração, sob uma ditadura, fica com uma ideia de mudança. E nestes anos, Portugal ganhou imensas coisas e perdeu outras tantas. Perdeu uma coisa que foi a ilusão do império, que era uma coisa estúpida, mas que foi construtora de uma identidade. Pensávamos que éramos imensamente grandes no mundo. Éramos pequeníssimos. É confortador ao pobre pensar-se como grande. Então o que nos foi tirado recentemente foi muito difícil de suportar. Há pouco tempo o Eduardo Lourenço falava que nós sentíamos aquilo que seria a “dor do membro fantasma”. Quer dizer, o membro foi cortado e nós sentíamos a dor no membro. Os portugueses não sabiam se orientar e só conseguimos nos orientar encontrando uma outra identidade na companhia da Europa. Parecia haver uma nova grandeza nisso. E então entramos no continente como os pobres da Europa. Os portugueses, ao contrário do que se diz, são pessoas com grande sentido de dignidade e isso nos machucou muito. Transformamo-nos num local onde os avós eram analfabetos e os netos eram doutores. Ainda hoje muita mãe analfabeta que vê o seu filho ser licenciado. Foi um salto brutal. De repente, caímos num mundo completamente diferente. Houve conflito social, houve conflito familiar, houve conflito de valores, houve conflito religioso, houve conflito de toda natureza. Estamos num tempo extremamente desafiador. Se há alguma coisa que eu possa fazer, é ser testemunha do meu tempo. Eu escrevo sobre o percurso que testemunho. Penso que se eu puder deixar um livro do qual os mais velhos possam dizer: “Olha, foi com esse livro que eu senti o que era a minha vida” e para os novos dizerem: “Olha, esse tempo foi assim”, estarei realizada. O que eu quero, é me tornar uma colunista do meu tempo. Porque é nesse tempo que eu nasci e é isso que eu sei.

Virgílio Ferreira dizia: “O título é a primeira coisa que se escolhe, mas a última que se adota”. E eu acho que essa fórmula é verdadeira. Nós não começamos a escrever um livro sem ter um título. O que sabemos é que ele é provisório, ou pelo menos cremos que ele seja provisório e começamos a pensar: “Uma hora eu vou mudar”. Ora, acontece que quando escrevi a última parte de O Vento Assobiando nas Gruas, sabia que o personagem principal era o condutor da linguagem daqueles homens que estão na casinha das gruas. Hoje, sou perita em gruas. Fui a vários estaleiros, passei dias inteiros conversando com homens que conduziam gruas para saber se o que eu tinha inventado era certo. Porque sabemos muito mais do que julgamos saber. E os escritores normalmente escrevem só com o que sabem e depois vão ver se está correto. E muitas vezes está, quase sempre está. Eu não modifiquei nada no livro após ter andado dentro das fundações da construção civil. O que aconteceu foi que verifiquei que essa é uma profissão extremamente perigosa, que exige um manejo e uma perícia extraordinária para conduzir a grua. E então, a certa hora, esse homem que conduz a grua percebe o que fizeram a ele e ele sente-se tão ofendido que deseja morrer e pensa numa espécie de suicidio. Percebe o vento lá em cima. O que normalmente faria um condutor de gruas? Desceria, mas ele não desce. Fica lá à espera de ser derrubado. E os amigos lá embaixo começam a notar que ele não quer descer, que ele quer acabar com a sua vida. Esta é uma das cenas. Eu escrevi o livro todo o tempo pensando em substituir o título no fim. Meu editor dizia que era mau e eu tinha dúvidas. E então comecei a procurar outras possibilidades, tive várias ideias, mas nada parecia bom. A certa altura, abri uma revista, que na passagem do ano de 1999 para o ano 2000 lançara uma pergunta a vários escritores e artistas de todo o mundo, sobre como seria o futuro. Como seria a mudança de um milênio para outro? E então fui vendo aqueles da minha geração, os que nasceram no mesmo período e pude descobrir que Bernie Guilford, um americano que vive em Paris, tinha respondido de maneira muito interessante. Ele tinha escrito um pequeno poema que se chamava “Carta chinesa a um amigo longínquo”. E o poema dele era sobre gruas. E a ideia era mais ou menos essa: “Gruas que lentamente caminham ao longo de um lago / onde se espalham as nuvens. / Nem amigo, nem pássaro, nem clima, nem amor, / poderá mudar / seja o que for”. Isto é, um homem da minha geração, que nasceu numa cidade bem diferente da minha, escreve uma carta a um amigo longínquo, que vive em Paris, que tem exatamente a mesma ideia. E que diz, de fato, que por mais que eu queira, por mais lucidez que eu tenha, nem pássaro, nem amigo, nem o clima, nem o amor, poderá mudar seja o que for. Há pessoas que passam uma vida inteira escrevendo uma obra pra dizer “não pode ser assim”, mas a gente percebe que as forças todas vão contra aquilo que a gente pensa. Então eu pensei: “Se esse homem pensa isso, por que motivo vou mudar meu título que tem a ver, primeiro com o tema das gruas que estão modificando a terra, às vezes para o bem, às vezes para o mal. E se é um título que me diz tanto a respeito, por que não iria mantê-lo?”. E iniciei uma longa batalha. Primeiro com o editor, depois com os os jornalistas que me disseram: “Que título estranho, que coisa mais esquisita. Lídia escreveu um livro sobre construção civil”.

Costumam me perguntar: “Como você se sente escrevendo como mulher?”. E eu digo sempre que escrevo como mulher, mas que desejo, quando escrevo, ser homem, criança, velho, velha, jovem, adolescente, uma pessoa virtuosa, uma monja, uma prostituta, um ladrão, um homem sério, um homem do século XX, um homem do século XII. E talvez queira ser a porta de uma casa, um objeto, um armário de uma casa que foi do século XVIII. Eu quero ser o armário. Quero ser talvez um cão que passa a correr na rua e que cheira coisas que a gente nem sabe o quê. Eu quero ser um lobo, quero saber como o lobo faz, como ele fareja. Eu quero ser tudo. Até mesmo um animal diferente. Eu quero saber como é ser um animal diferente. Eu acho que é isso que a literatura faz. Nós queremos ser tudo em todas as coisas, nós queremos ver o que há em todos os seres.

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Conferindo as previsões na metade das oitavas

Conferindo as previsões na metade das oitavas
Thiago Silva: infalível, é o melhor jogador do Brasil
Thiago Silva: infalível, é o melhor jogador do Brasil

Acredito que, se o Brasil não jogasse em casa, já teria dito adeus ao Mundial. Torci para o Chile, mas acho difícil que faça o mesmo para a Colômbia. Claro, não faz nenhuma diferença. Meu motivo é simples: não vi a Colômbia jogar, não me liguei a ela. Acho que um time como o do Brasil, que tem como destaques seus excelentes zagueiros, é um time perigoso, mas não o suficiente para chegar a uma final. Se passarmos pelo colombianos, morreremos nas quartas-de-final, contra Alemanha ou França, nosso habitual algoz.

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Conferindo minhas previsões…

Brasil x Chile (Belo Horizonte, 28 de junho, às 13h)
—> Passa o Chile. ERRADO.

Colômbia x Uruguai (Rio de Janeiro, 28 de junho, às 17h)
—> Passa a Colômbia. CERTO.

Holanda x México (Fortaleza, 29 de junho, às 13h)
—> Equilibrado, mas passa a Holanda. CERTO.

Costa Rica x Grécia (Recife, 29 de junho, às 17h)
—> Costa Rica, fácil. NADA FÁCIL, MAS CERTO.

França x Nigéria (Brasília, 30 de junho, às 13h)
—> França, infelizmente. CERTO.

Alemanha x Argélia (Porto Alegre, 30 de junho, às 17h)
—> Passa a Alemanha.

Argentina x Suíça (São Paulo, 1º de julho, às 13h)
—> Passa a Argentina

Bélgica x EUA (Salvador, 1º de julho, às 17h)
—> Complicado… Passa a Bélgica.

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No dia do falso aniversário do LP, a longa polêmica com o CD

No dia do falso aniversário do LP, a longa polêmica com o CD

Publicado em 31 de agosto de 2013 no Sul21

Um bolachão em uso | Foto: Bernardo Jardim Ribeiro / Sul21
Um bolachão em uso | Foto: Bernardo Jardim Ribeiro / Sul21

Por Milton Ribeiro e Nícolas Pasinato

Há poucos anos, o jornalista e escritor Luiz Biajoni escreveu sobre um fato que batizou de “Síndrome da Biblioteca de Babel”, ou seja, a desvalorização de conteúdos que — em velocidade e grande profusão — são veiculados na internet. Seu foco era a música. No século passado, comprava-se música em LPs e eles não eram nada baratos. Os jovens que gostavam de música e que recebiam apenas uma mesada de seus pais tinham que economizar para comprar um vinil por mês e olhe lá. E, se o disco fosse ruim, era uma pequena tragédia, pois tinha-se que aguardar 30 dias pela próxima chance. Errava-se raramente, mas acontecia, e a coleção de discos costumava ser bem ouvida, muito amada e motivo de orgulho.

Hoje, o melômano baixa músicas em tal quantidade e de tal forma que muitas vezes não as relaciona com o CD de origem, ou seja, com o trabalho completo do artista que montou o CD com cuidado e coerência. Ouve-se as canções sem saber de que disco saíram, o que para velhos puristas é uma heresia inconcebível.

Este artigo não é passadista, mas canta algumas qualidades dos LPs, daqueles velhos bolachões de vinil com suas belas capas e brilhantes discos pretos de 30 cm de diâmetro que podem ainda ser encontrados em sebos que, às vezes, cobram fortunas pelas raridades.

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21
Loja de vinis no centro de Porto Alegre | Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Há controvérsias sobre qual teria sido o primeiro LP da história. Os alemães têm sua versão, falsa, de que o vinil surgiu há 62 anos, no dia 31 de agosto de 1951. Na época, era chamado de long-play (LP) e teria sido produzido pela gravadora alemã Deutsche Grammophon, fundada em 1898 e ainda hoje em atividade, sendo a mais antiga do mundo.

Porém, a versão correta é a de que a Columbia Records não apenas desenvolveu como lançou o LP que girava a 33 1/3 rotações por minuto (rpm) e era capaz de armazenar até 30 minutos de áudio de cada lado. O primeiro LP foi The Voice of Frank Sinatra, de 1948.

O que é indiscutível é que a tecnologia do disco de vinil surgiu no final da década de 1940. O vinil é um tipo de plástico, usualmente na cor preta, que pode ser reproduzido através de um toca-discos. O disco possui um longo sulco em forma de espiral que conduz a agulha do toca-discos da borda externa em direção ao centro, em sentido horário. Estes sulcos são microscópicos e fazem a agulha vibrar. Essa vibração é transformada em um sinal elétrico que é amplificado e transformado em som audível.

O vinil é um tipo de plástico muito delicado e qualquer arranhão pode ser ouvido, comprometendo a qualidade sonora. Idealmente, os discos devem permanecer limpos, livres de poeira e guardados na posição vertical — de forma a não ficarem empenados –, dentro de sua capa e de seu envelope ou plástico de proteção. Tudo isto é necessário porque a poeira pode tanto prejudicar o disco quanto a agulha.

Disco com poeira prejudica não apenas o vinil e a gulha como a audição | Foto: Bernardo Jardim Ribeiro / Sul21
Nunca deixe seu disco assim… A poeira prejudica não apenas o vinil e a agulha como a audição | Foto: Bernardo Jardim Ribeiro / Sul21

Voltando à história. Um ano depois, o primeiro vinil de 45 rpm foi produzido pela RCA. Ele tinha 18 cm de diâmetro e reproduzia 3 minutos de áudio de cada lado, ou sejam, trazia o mesmo tempo de música que seus predecessores, os grandes e pesados 78 rpm. Como os 45 rpm eram leves, também eram ideais para aos grandes sucessos populares e os fabricantes de jukeboxes.

Um toca-discos com o 45 rpm do clássico ‘Dreidel’, de Don McLean

O 45 rpm era leve, pequeno, tinha som melhor que os 78 rpm e, assim como os LPs, era flexível, só quebrando por extrema imperícia do dono. Logo, os 45 rpm também receberam versões em 33 1/3, ganhando um pouco mais de tempo de gravação e os novos nomes de compactos simples (com uma canção de cada lado) e duplo (com quatro ao todo).

Em 1958, chegaram os discos estereofônicos, que tinham dois canais em cada sulco, o que tornou necessário duas caixas de som que não reproduziam exatamente o mesmo som, como acontecia com os LPs anteriores, que passaram a ser chamados de mono. Até 1970, o estéreo era geralmente usado apenas para LPs, quando os compactos começaram a aparecer em versões também em estéreo.

No final dos anos 80, os vinis começaram a ser substituídos pelo CDs. Mas nostálgicos costumam cantar as vantagens dos antigos LPs sobre os atuais CDs e mp3.

O Sul21 convidou o engenheiro de áudio Marcos Abreu para traçar paralelos entre as duas tecnologias.

Marcos Abreu
Marcos Abreu: os LPs requerem cuidados, mas mantêm dinamica original | Foto: Facebook

Sul21: Quais são as principais diferenças entre as gravações analógicas e digitais

Abreu: A princípio, tanto a gravação analógica quanto a digital têm limitações ou características próprias. A analógica, a dos LPs, tem a informação completa e a digital tem a informação fragmentada, convertida em bytes e bits, números. O que o pessoal mais sente de diferença entre o analógico e o digital é que hoje as gravações digitais são muito comprimidas para conseguir maior volume, enquanto que os discos analógicos mantém em grande parte a dinâmica original. Com a manutenção desta dinâmica as coisas ficam mais naturais no analógico do que nesse digital que é vendido hoje. Não quer dizer que as gravações digitais sejam ruins. É que são coisas diferentes. O problema é a forma com que o digital está sendo trabalhado. Ele entrou numa guerra de volume e compressão que acabou estragando um som que deveria ser bom.

Sul21: Pode se dizer que o som do vinil é melhor do que o do som do CD?

Abreu: Não. Não posso dizer isso. Posso dizer que algumas gravações em digital têm sonoridade ruim, mas em princípio o CD teria toda a capacidade de ter um bom som. Os excessos acabaram estragando o som do CD.

Sul21: E quais seriam as vantagens do analógico?

Abreu: A principal vantagem do analógico é a dinâmica mais preservada. Só que ele depende muito do equipamento onde é reproduzido, porque o vinil é muito mais dependente da qualidade do equipamento de som do que o CD. Para conseguir uma qualidade boa de um vinil, é necessário um equipamento bem mais sofisticado do que simplesmente um aparelho de CD ou um iPod ou um iPad. O som digital pode ser reproduzido com facilidade, mas para escutar um vinil é necessário um bom toca-discos, uma boa cápsula, uma boa agulha, um bom amplificador. Claro que tendo bom equipamento analógico tu consegues som de excelente qualidade.

Outra diferença do digital para o analógico é o nível de ruído. O digital é muito mais limpo. O analógico sempre vai ter um estalinho, um chiadinho ou um ruído do disco. Afinal, é um processo mecânico de extração de som. O desgaste é outro ponto crítico. O vinil tu escutas 10 vezes e ele começa a ficar mais com mais ruído e o CD tu escutas mil vezes ele vai continuar tocando igual, mas, em compensação, a durabilidade do disco analógico é muito maior. O vinil hoje tem mais de 100 anos o CD tem só 20. Além disso,hoje,  o custo do vinil é bem maior que o do CD.

Glamour
Glamour

Sul21: Vários artistas “cults” gravam seus trabalhos nas duas plataformas. Como é isso?

Abreu: O que está acontecendo é que as pessoas vêm sendo enganadas pelo vinil falso, que é uma gravação digital colocada em vinil. E as pessoas acham que estão escutando o som analógico, mas não estão. Um disco gravado hoje, em digital, é lançado em vinil e as pessoas compram aquilo achando que o som é analógico e não é. É um som digital ‘vinilizado’. As verdadeiras e boas gravações analógicas são as antigas, que são as analógicas desde a origem.

Sul21: O que escolher?

Abreu: O que determina é o gosto de cada um. Há pessoas que vão ouvir o vinil e achar muito melhor. Outro vai ouvir o digital e gostar. Há pessoas que dizem que o digital é pobre, porém limpinho. Porque ele é pobre de som, mas é limpinho, não tem ruído nem chiado.

Sul21: O vinil dá muito trabalho?

Abreu: No vinil, há que cuidar a qualidade da cápsula e da agulha, para que esta não esteja gasta. Ela tem que ser nova. E é fundamental estar sempre passando um paninho no disco. E tem que ter cuidado para não arranhar. Cuidado no manuseio. Ou seja, há fatos mecânicos envolvidos no vinil que no CD ou equipamento digital, não há.

Sul21: O que faz algumas pessoas colecionarem vinis? 

Abreu: O charme. Colocar o vinil e escutá-lo é bem diferente do que pegar um pendrive. Aquilo não tem graça nenhuma. Eu prefiro chegar na minha sala, pegar um disco de vinil e colocar para tocar. Acho que tem um ritual envolvido que o CD, o pendrive e os players digitais não têm. É uma sensação diferente.

Todo o charme do vinil
Todo o charme do vinil

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