Middlemarch é um mistério. Muitos clássicos do século XIX são de conhecimento quase geral entre leitores contumazes, mas o livro de George Eliot — que era uma mulher, nascida Mary Anne Evans — permanece ignorado pela maioria.
Acertando como sempre, Virginia Woolf escreveu que Middlemarch era “um dos poucos romances ingleses escritos para adultos”. Eu diria: “escrito exclusivamente para adultos”. O livro aborda temas muito atuais: o status das mulheres perante à sociedade, a ascensão da classe média e a crítica da moralidade, da religião e do casamento.
Sem exagero, trata-se de um livro estupendamente inteligente, publicado em 1871.
Middlemarch é o nome de uma cidade fictícia do interior da Inglaterra a a ação se passa lá volta de 1830. Como Anna Kariênina, o livro tem enredo múltiplo, centrando-se em dois casais, montando um quadro da vida rural inglesa e uma análise dos relacionamentos humanos em geral, especialmente das relações amorosas e do casamento.
O núcleo são os casais Dorothea e Edward Casaubon, Rosamond e Tertius Lydgate.
Dorothea, mulher excepcionalmente independente, politizada para sua época e de grande sede intelectual, casa-se com Casaubon, homem erudito e quase 30 anos mais velho. Ela o admirava, ele prometia muito, mas se revelou frio e chato. Um desastre.
Por outro lado, Lydgate é um médico entusiasmado, amante da ciência, que casa com a fútil Rosamond, que o faz gastar o que não tem. Outro desastre.
O curioso é o afastamento dos dois casais. algo muito semelhante novamente à Anna Kariênina. Um drama aqui, outro lá.
Mas nada desta apresentação faz sentido se não levarmos em conta as intervenções da narradora, com comentários cheios de ideias, pensamentos revolucionários e a colocação de situações morais muito originais.
Nas suas 800 páginas, há um bom número de personagens e tramas que encontram os temas subliminares, incluindo a situação das mulheres, a natureza do casamento, o idealismo e o interesse pessoal, religião e hipocrisia, reforma política e educação. Esse livro é maravilhoso!
Ah, tem algo que não era uma novidade no romance vitoriano, mas que Eliot professa como ninguém: sua profunda simpatia pelos personagens secundários, pelas pessoas simples, feias e pobres,
Vamos a um pouco mais de Virginia Woolf?
“A luta das heroínas de George Eliot, por conta da suprema coragem do empreendimento a que se dedicavam, termina em tragédia ou num compromisso que é ainda mais melancólico”.
Tudo porque, ainda nas palavras de Woolf, “o fardo e a complexidade da condição feminina não lhes era suficiente. Elas desejavam sair do santuário e colher para si mesmas os estranhos frutos da arte e do conhecimento”.
Temos Middlemarch na Livraria Bamboletras. Sim, a tradução da Martim Claret é boa.
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Em carta a G. H. Lewes (amante de George Eliot), 12 de janeiro de 1848:
Por que você gosta tanto da senhorita Austen? Estou intrigada. O que o induziu a dizer que preferia ter escrito Orgulho e Preconceito ou Tom Jones do que qualquer um dos romances de Walter Scott? Eu não tinha lido Orgulho e Preconceito até ler essa sua frase, e então peguei o livro e estudei. E o que eu encontrei? Um retrato daguerrotipado (de daguerreótipo, antigo aparelho fotográfico inventado por Daguerre 1787-1851, físico e pintor francês) preciso de um rosto comum; um jardim cuidadosamente cercado e altamente cultivado, com bordas próximas e flores delicadas — mas nenhum vislumbre de uma fisionomia vívida e brilhante — sem campo aberto — sem ar fresco — sem colina azul — sem nada bonito. Eu dificilmente gostaria de viver entre suas damas e cavalheiros em suas casas elegantes, mas confinadas. Essas observações provavelmente o irritarão, mas eu correrei o risco.
Agora, eu posso entender a admiração por George Sand. Ela é perspicaz e observadora.
Os sete leitores que acompanham este blog sabem de minha profunda admiração por George Eliot (1819-1880). Basta conferir, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui. Eliot, na verdade, era uma mulher que usava um pseudônimo masculino para que seus trabalhos fossem levados a sério. Na época, outras autoras publicavam trabalhos sob seus verdadeiros nomes, porém Eliot queria escapar dos estereótipos que diziam que mulheres só escreviam romances leves. E realmente seus livros são muito bem escritos e planejados, mas nada leves. Outro fator que pode ter levado Eliot a usar um nome artístico tão distante talvez fosse o desejo de preservar sua vida íntima. Ela viveu por mais de 20 anos com George Henry Lewes, um homem casado com outra mulher. Ah, a sociedade vitoriana…
Tratando de evitar spoilers, conto a história do livro rapidamente. Parece boba, mas estamos longe disso. Eliot é uma sofisticada mestra da narrativa e da observação social e psicológica. Silas Marner, indevidamente acusado de roubo e exilado de uma comunidade religiosa muitos anos antes, é um tecelão amargurado e misantropo que mora em Raveloe, vivendo apenas para o trabalho e para seu pequeno e crescente tesouro de moedas de ouro. Mas quando seu dinheiro é roubado e uma criança órfã entra casualmente em sua casa, Silas tem a chance de transformar sua vida. Seu destino e o de Eppie, a garotinha que ele adota, está ligado a Godfrey Cass, filho de um burguês da vila, que, como Silas, está preso a seu passado. Silas Marner é o livro favorito de George Eliot dentre seus romances. É curto e combina humor, rico simbolismo e faz uma crítica social nada sentimental, mas afetuosa.
(Apenas peço desculpas para discordar de Mary Ann: seu monumental Middlemarch é uma obra-prima, considerado merecidamente pela crítica um dos maiores romances ingleses de todos os tempos. E assino embaixo e por todos os lados desta opinião).
Em resumo, Silas Marner é a história de um avarento solitário redimido gradualmente pela alegria da paternidade.
“O mais maravilhoso para mim é o retorno a Lantern Yard, justamente onde a história começou, no último capítulo numerado do romance. Esse tempo todo a gente sabia que a condenação de Silas tinha sido injusta, e naquele momento descobrimos que (sua fuga e amargura) não serviu a propósito algum, não sobrou ninguém dos que inventaram a história toda”.
Silas Marner é um clássico. Falsamente simples, curto e perfeito. A história hiper romanesca faz com que a gente devore o livro.
Um teto todo seu (A Room of One`s Own, 1929) é um dos mais surpreendentes livros da célebre ficcionista inglesa Virginia Woolf. A primeira surpresa é o fato de não ser ficção; a segunda é a absoluta ousadia no trato do assunto abordado: o feminismo. Mas há mais.
O livro nasceu a partir de duas palestras chamadas “As mulheres e a ficção”, proferidas por Virginia para a plateia essencialmente feminina da Sociedade das Artes, na Londres de outubro de 1928. O texto de Virginia tem a qualidade estupenda de seus livros da época. Mrs. Dalloway (1925), Passeio ao Farol (1927) e Orlando (1928) foram seus predecessores; As Ondas (1931) deu continuidade à série de obras-primas. Encrustado na sequência principal de romances de Virginia, o ensaio Um teto todo seu não decepciona de modo algum. O livro tem cerca de 140 páginas. Não pensem que ela o leu por inteiro em duas noites – algo como 70 páginas por dia – , na verdade o texto foi bastante ampliado para publicação logo após as palestras.
Intermezzo: é notável a sorte de Virginia Woolf no Brasil. Seus tradutores foram extraordinários: Orlando foi traduzido por Cecília Meireles; Mrs. Dalloway, por Mario Quintana; As Ondas e Entre os Atos, por Lya Luft em fase pré-Veja e pré-Yeda; Passeio ao Farol, por Luiza Lobo e Um teto todo seu, recebeu tratamento impecável de Vera Ribeiro. Muita, muita sorte. Fim do intermezzo.
Dotado da mesma prosa alegre e saltitante de Mrs. Dalloway e Orlando, Um teto todo seu trata do feminismo de forma levíssima, mesmo que afirme as coisas mais terríveis sobre a vida da mulher. Alegre, feliz e livre de todo rancor, como na foto abaixo, à esquerda, Virginia Woolf cria algumas imagens fortíssimas que ficaram célebres. A primeira é a da irmã de Shakespeare, Judith. Tão talentosa quanto o irmão, ela teria vivido subjugada por tarefas domésticas e todos os seus esforços para demonstrar seu talento teriam sido esmagados pela família. Então, desesperada, ela foge, apresenta-se num teatro de onde é sem mais nem menos enxotada, para depois prostituir-se e suicidar-se. A outra é da escritora fictícia Mary Carmichael. Ela não é muito boa, sua frase é dura e seu romance, que Virginia finge ler, é mais ou menos chato. Só que lá pelo meio há uma frase: “Chloe gosta de Olivia”. E então, finalmente, naquele livro bem ruinzinho, apareceu a Grande Mudança, pois às vezes mulheres gostam de mulheres, não?
Seu raciocínio, até desembocar na tese do Teto e das 500 libras anuais, é brilhante. Virginia Woolf parte das precursoras da literatura inglesa até chegar na grande explosão do século XIX, com o aparecimento de Jane Austen, das irmãs Brontë, Emily e Charlotte, além da grande George Eliot que, em verdade, chamava-se Mary Ann Evans. Suas obras-primas não nascem de gênios isolados, mas após anos e anos de labuta conjunta. A experiência apresentada por estas escritoras dá forma perfeita ao que veio antes, à tradição. Então, escreve Woolf, Jane Austen deveria ter depositado uma coroa de flores no túmulo de Fanny Burney e George Eliot deveria ter rendido homenagem à resoluta Eliza Carter, a bravíssima escritora que amarrava uma sineta na armação da cama de forma a não dormir muito e poder estudar grego. E todas elas deveriam derramar flores sobre o túmulo de Aphra Behn, que está enterrada – surpresa! – na Abadia de Westminster, pois foi ela quem começou a assegurar a todas o direito de dizerem o que pensam. Trata-se de parafrasear o velho e bom Newton, físico presente em quase todas as opiniões literárias da tradição inglesa que costuma sempre dizer que “Se vemos mais longe, é por estarmos em pé sobre ombros de gigantes”.
Woolf faz questão de deixar claro que, casualmente ou não, as escritoras que foram melhor sucedidas são aquelas que guardaram para si seu justo rancor. Se Austen ressentia-se contra sua sociedade e família – e ressentia-se, basta lê-la com profundidade – , tratou de passar ao largo das longas tardes em que escrevia seus livros na sala sob as constantes interrupções das “coisas que são tarefas de mulher”. (Pois as mulheres do século XIX nasciam e morriam trabalhando para os homens). De George Eliot nunca se ouviu nada, pois ela se fingia de homem… Porém, em Jane Eyre, Charlotte Brontë teve seu pior momento ao escrever claramente um trecho rancoroso, o que não fez Emily, de coração de poeta e maior talento. Ah, as questões seculares! García Márquez e Saramago e todos os que podem aspirar à imortalidade preteriram-nas em suas grandes obras em favor das parábolas.
O livro, escrito nove anos após as mulheres obterem direito de voto na Inglaterra, é uma ampla análise da situação da mulher e de sua relação com o dinheiro. Virginia Woolf insiste em que as mulheres precisam de duas coisas para criarem uma nova literatura: um teto todo seu, ou seja, um quarto que pudesse ser trancado à chave para escrever, e uma renda de aproximadamente 500 libras anuais. Para tanto, a mulher deveria trabalhar (Virginia fazia parte da Liga do Trabalho Feminino) a fim de obter alguma independência.
Sim, as teses estão bem amarradas – por exemplo, Virginia demonstra que todos os bons poetas de sua época são abastados… – , mas o milagre do livro é o que subjaz às teses. É o tremendo talento da autora para fazer nascer seus argumentos e frases num texto vertiginoso, agradável e sem lugar para gritos ou deselegância. É um feminismo dócil? De modo nenhum. É um feminismo culto, fino, esclarecido, isso sim. E duríssimo e de resultados.
Erico Veríssimo dizia que Lygia Fagundes Telles não devia ter tanto talento para a literatura. Era bonita demais para isso. Ela ria, envaidecida.
Convencionou-se dizer que Clarice Lispector era uma bela mulher. Belo telefone, não?
Belíssima era Cecília Meirelles, dona daquele sorriso que tudo parece compreender. Foi tradutora de …
… Virginia Woolf *, que tinha perfil de camafeu, extraordinários livros e sofria enormemente com sua loucura.
Suicida como Virginia, tivemos a bonita brasileira Ana Cristina César. Apesar de sua boa poesia, ela ficaria aos pés de…
… Anna Akhmátova *, cujo grande sofrimento era de causas exteriores. Que poetisa maravilhosa ela era! Dá vontade de aprender russo como quis uma vez …
… Simone de Beauvoir, aqui em linda e arejada foto, demonstrando que tinha a frente, o conteúdo e o verso interessantes.
Tão de esquerda quanto Simone foi a ex-stalinista Doris Lessing, que se tornou a mais irritante das direitistas.
Sempre foi de direita a talentosa belga Marguerite Yourcenar, apesar do costume de fantasiar-se como agente da KGB.
A outra Marguerite, a Duras, gostava de cinema, de amantes orientais e sua obra permanecerá mais do que a das três anteriores.
Conversas mais íntimas tinha Anaïs Nin, que escrevia diários e corria atrás de um homem sensível.
Nome de francesa tinha a severamente inglesa Daphne du Maurier, autora de livros que assustaram minha adolescência, como Rebecca.
Também gostava de assustar a imensa, perfeita e maravilhosa dinamarquesa Karen Blixen *, que publicou suas obras-primas com o nome masculino de Isak Dinesen e que …
… traduzia seus livros para o inglês. Quando envelheceu, ficou “meio anoréxica”, mas mantinha as boas companhias — minha nossa!
Conversando com Karen, à direita, está a caçadora solitária Carson McCullers, …
… tão menos famosa do que Jane Austen *, cujos seis romances são cantados em prosa e verso pelos críticos e é adorada pelo cinema.
Em comum com Karen na utilização de nome um nome masculino, com Austen no espetacular talento, temos a insuperável George Eliot * (Mary Ann Evans).
A também inglesa Muriel Spark faz livros menos intelectuais quanto os de Eliot, mas é sempre fascinante e grudenta. Escreveu pelo menos duas obras-primas modernas.
Tem nome comprido e estranho a grande e bela poetisa portuguesa Sophia de Mello Breyner Andresen, descoberta por mim logo após sua morte.
Com algumas exceções, são todas mulheres bonitas — às outras sobraria a beleza interior… — e as que receberam asterisco logo após seu nome são as minhas Top 5 da literatura feminina mundial.
Houve tempo em que elas eram poucas, houve tempo em que Erico Verissimo dizia com certa ironia à Lygia Fagundes Telles que era bela demais para ser escritora. Este panorama, porém, alterou-se completamente. Um tanto irresponsavelmente, pinçando nomes aqui e ali, temos uma nominata nada desprezível de escritoras mulheres no Brasil. Clarice Lispector, Cecilia Meireles, Maria Alice Barroso, Rachel de Queiroz, Lygia Fagundes Teles, Nélida Piñon, Sonia Coutinho, Ana Cristina César, Hilda Hilst, Adélia Prado, Zelia Gattai, Ana Miranda, Marina Colasanti, Lygia Bojunga Nunes, Maria Adelaide Amaral, Flora Sussekind, Leyla Perrone-Moisés, Cora Coralina, Walnice Nogueira Galvão, Lucia Abreu, Regina Zilbermann, Marilena Chauí, Zulmira Ribeiro Tavares, Patricia Melo, Jane Tutikian, Fernanda Young, Claudia Tajes, Carol Bensimon, Mariana Ianelli.
O fato é que há muito tempo o termo “Literatura de Mulherzinha” tornou-se anacrônico. Apesar da dificuldade para caracterizar os elementos que fazem a literatura feminina ser diversa, os leitores reconhecem sua poética, parecendo pressentir seus elementos próprios: de modo geral, acertaremos dizendo que ela é habitualmente mais sensorial, poética e livre. Não se pode falar em gênero, pois os estilos e as temáticas variam muito. “Não se pode dizer que a literatura feminina seja sempre feita por mulheres, assim como boas narrativas gays podem ser escritas por heterossexuais e boas narrativas carcerárias podem ser escritas por gente que nunca esteve presa. Ao menos não há nada, nenhuma barreira física ou moral, que impeça isso.”, escreveu Nelson de Oliveira. “Da mesma maneira que a literatura policial não é a literatura escrita apenas pelos policiais, a literatura feminina não precisa necessariamente ser a literatura escrita apenas pelas mulheres. É certo que há policiais escrevendo literatura policial, mas também há professores, psicanalistas, filósofos… O mesmo acontece com a literatura feminina da maneira como eu a vejo: há homens e mulheres trabalhando dentro dos limites desse gênero”, completa.
Mas, se hoje Lídia Jorge é acompanhada de muitas outras, tivemos precursoras seminais. E a maior delas foi Virginia Woolf, que escreveu um curioso — e muito feminino — livro fundador.
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Um teto todo seu (A Room of One`s Own, 1929) é um dos mais surpreendentes livros da célebre ficcionista inglesa Virginia Woolf. A primeira surpresa é o fato de não ser ficção; a segunda é a absoluta ousadia no trato do assunto abordado: o feminismo.
O livro nasceu a partir de duas palestras chamadas “As mulheres e a ficção”, proferidas por Virginia para uma plateia essencialmente feminina da Sociedade das Artes, na Londres de outubro de 1928. O texto de Virginia tem a qualidade estupenda de seus livros da época. Mrs. Dalloway (1925), Passeio ao Farol (1927) e Orlando (1928) foram seus predecessores; As Ondas (1931) deu continuidade à série de grande livros. Encrustado na sequência mais importante de romances de Virginia, o ensaio Um teto todo seu não decepciona de modo algum. O livro tem cerca de 140 páginas. Não pensem que ela o leu por inteiro nas duas palestras – algo como 70 páginas por dia; na verdade o texto foi bastante ampliado para publicação logo após as palestras.
Não, não pensei muito. Peguei a escada e procurei, a partir da letra A, os livros de que gosto muito e sobre os quais o mundo silencia. Encontrei vários. A “santa” tarefa de resgate de minhas obras-primas pessoais não me tomou muito tempo e é uma lista arbitrária que só vai de A a M, pois me apavorei com o número de livros sobre a mesa quando retirei da estante as folhas de papel A4 que formam a 19ª obra. Os de M a Z virão depois, sei lá quando. Meu critério é o descritério. Por exemplo, deixei de fora Hamsun, por considerá-lo “famoso demais” e incluí George Eliot. Vá entender. Alguns dos insuficientes textos explicativos que acompanham cada obra foram retirados de orelhas dos livros; outros, de obras sobre literatura; porém a maioria saiu perigosamente de minha cabeça.
1. O Homem Amoroso, de Luiz Antonio Assis Brasil. Mercado Aberto, 1986, 118 p.: O elegante Assis Brasil, ex-violoncelista da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre, sai do sério ao compor de forma irônica e naturalista esta novela que descreve as vivências de um músico erudito gaúcho, durante o “milagre brasileiro” dos anos 70 e seu neo-ufanismo. Para encontrar, só em sebos.
2. Extinção, de Thomas Bernhard. Companhia das Letras, 2000, 476 p.: Bernhard talvez venha a tornar-se inevitavelmente um clássico, se já não o é. É um enorme romancista e dramaturgo austríaco que costuma despejar seu ódio contra a pequena burguesia e os intelectuais de seu país. Destaco a notável descrição de sua família, realizada em duzentas paginas, enquanto o narrador observa uma (apenas uma) foto que retrata, se não me engano, apenas duas ou três pessoas. Livro novo, fácil de achar.
3. Noturno do Chile, de Roberto Bolaño. Companhia das Letras, 2004, 118 p.: O narrador, testemunha do tempo que precede o assalto ao poder pelo general Pinochet e seus sequazes, repassa a sua vida num monólogo febril, reconstruindo dois momentos especiais da vida chilena – antes e depois do golpe. Este narrador, Lacroix, é um religioso ainda aferrado aos dogmas da Igreja, que não dispensa a sua batina surrada, usando-a como se fosse uma bandeira. Fácil de achar, assim como Os Detetives Selvagens.
4. Opiniones de un Payaso, de Heinrich Böll. Barral Editores, 1974, 244 p.: Hans Scheiner é um palhaço de circo que perde todos os seus bens durante o pós-guerra. Trata-se de um ateu muito propenso à melancolia e à monogamia. Mas seus problemas não terminam aí: sua mulher Maria o abandona por outro homem, um católico, com o qual se identifica. Por trás desta catástrofe emocional e material, pode-se ver um homem íntegro, que suporta sua queda com sarcasmo.Um grande livro. À venda na Internet por 16 Euros.
5. Fique Quieta, Por Favor, de Raymond Carver. Rocco, 1988, 240 p.: Grande contista americano homenageado por Robert Altman em Short Cuts . Este livro, assim como a coletânea Short Cuts, também da Rocco, é mais uma prova da boa influência de Tchékhov sobre a literatura atual. Vá ao sebo.
6. A História Maravilhosa de Peter Schlemihl, de Adelbert von Chamisso. Estação Liberdade, 1989, 111 p.: A história curiosíssima do homem que se vê marginalizado e perseguido após vender sua sombra ao Diabo. Até hoje a obra sofre todo o tipo de interpretações, mas o próprio autor nega a alegoria e critica aqueles que preocupam-se em saber o que significa a sombra. Este genial livrinho foi há pouco reeditado.
7. Uma Vida em Segredo, de Autran Dourado. Difel, 1977, 181 p.: Acanhada e deixando-se sempre levar pelas circunstâncias, a prima Biela é boazinha e vive conscientemente uma vida de renúncias. A comparação entre a prima Biela e a Felicité de Un Coeur Simple de Flaubert não obscurece a força da linguagem barroca do Autran Dourado em plena forma de 1964. Milhares de reedições.
8. Middlemarch, de George Eliot. Record, 1998, 877 p.: Desde Shakespeare e Jane Austen, ninguém criara personagens tão inesquecivelmente vivos. É o romance da vida frustrada de Dorothea, que casa-se com o pseudo-intelectual Causabon por um ideal de cultura e tenta desfazer seu casamento e refazer sua vida. O romance é um espetacular panorama das atividades e da moral de uma pequena cidade inglesa de 1830. Canta a tua aldeia e serás universal… George Eliot é o pseudônimo masculino de Mary Ann Evans. Só encontrável em sebos, parece-me.
9. Contos Completos, de Sergio Faraco. L&PM, 1995, 304 p.: Faraco é, disparado, o melhor contista vivo brasileiro e isto não é pouco. O livro foi reeditado no ano passado. Trata-se de um artesão tão econômico quanto rigoroso com as palavras. Sua capacidade de apresentar personagens com um grau de densidade psicológica inversamente proporcional à secura do ambiente, assim como sua maestria na invenção de enredos o tornam obrigatório. Recém relançado.
Pois após este evento, acabei relendo Middlemarch em casa. Digo em casa porque normalmente leio na rua, no transporte coletivo ou quando pego uma fila qualquer. Descobri um erro naquilo que disse no StudioClio. Houve três encontros entre Dorothea Casaubon e Rosamond Lydgate, mas apenas em um há um diálogo mais longo, razão de meu erro. Confesso que fiquei muito triste quando descobri a coisa. Não vou lá corrigir; afinal, isto é um blog, não é formado por teses acadêmicas.
O que me levou a reler as 877 páginas do livro foi sua tremenda qualidade. Na verdade, recomecei muito lentamente, lendo um capítulo a cada dois ou três dias. Depois, o livro voltou a me envolver de tal forma que queria não saber o que já sabia, mas relembrar de cada detalhe. Valeu absurdamente a pena, pois Eliot tem muito a nos ensinar. Apertada e já desconfortável dentro da estrutura clássica do romance do século XIX, a autora expande os limites da forma até onde pode através de análises psicológicas e sociológicas que apontam para um outro gênero mais livre de romance. Eu também tinha esquecido do Epílogo, aqui chamado um tanto ironicamente de Finale. Em vez de deixar os personagens casadinhos e felizes para sempre, Eliot dá-lhes outras histórias, inclusive referindo à morte prematura de Mr. Lydgate e dando um novo casamento à viúva Rosamond. Quem é este novo marido? Também fica uma enorme interrogação a respeito da história do outro casal protagonista. A vida de Dorothea com Will Ladislaw é descrita no Finale com tão poucos detalhes que o livro deve ter irritado ao leitor vitoriano, acostumado a ver tudo abotoadinho ao término da narrativa.
Pois Eliot ameaça aquele leitor não apenas com personagens contraditórios e cheios de tortuosidades como com outras camadas de ficção e experiência. Este romance é, sim, um portento e meus sete leitores deveriam lê-lo…
Mr. Bambridge – Bambridge is a Middlemarch horse dealer. Fred Vincy sinks into his debt; Raffles meets him at a horse-fair and tells him everything about Bulstrode’s past.
Dorothea Brooke – Dorothea is a kind-hearted and honest woman. She longs to find some way to improve the world. She thinks Casaubon is a great intellectual, but after she marries him, she quickly discovers that he is not passionate enough to make her happy. She also learns that she is not as submissive and sacrificing as she had previously thought. She draws plans for comfortable cottages to replace the ramshackle buildings on large estates. She helps Lydgate when he suffers for his connections with Bulstrode. She falls in love with Casaubon’s young cousin, Will Ladislaw. She defies Casaubon’s machinations and marries Will even though it means losing her inheritance as Casaubon’s widow.
Arthur Brooke – Brooke is Dorothea and Celia’s bachelor uncle. He is a bumbling man who can never stick to an opinion, always wanting to please everyone. He hires Will Ladislaw to write for his paper, the Pioneer. He runs for a seat in Parliament on the Reform platform, but he lets his own tenants live in poverty and squalor. The scandal resulting from his hypocrisy prompts him to improve conditions on his own estate, Tipton Grange.
Celia Brooke – Celia is Dorothea’s sister. She marries Sir James Chettam.
Nicholas Bulstrode – Nicholas Bulstrode is a wealthy Middlemarch banker. He is married to Walter Vincy’s sister. Bulstrode professes to be a deeply religious Evangelical Protestant, but he has a dark past: he made his fortune as a pawnbroker selling stolen goods. He married Will Ladislaw’s grandmother after her first husband died. Her daughter had run away years before, and she insisted that Bulstrode find her daughter before she re-married, because she wanted to leave her wealth to her only surviving child. Bulstrode located the daughter and her child, Will Ladislaw, but he kept her existence a secret. He bribed the man he hired to find her, John Raffles, to keep quiet. John Raffles blackmails him with this information. When Raffles becomes ill, Bulstrode cares for him. However, he disobeys Lydgate’s medical advice, and Raffles dies as a result. When the scandal about his past and the circumstances of Raffles’s death become known, Bulstrode leaves Middlemarch in shame. He purchases Stone Court from Joshua Rigg Featherstone.
Harriet Bulstrode – Harriet Bulstrode is Walter Vincy’s sister. She is a kind, honest, religious woman. No one in Middlemarch blames her for her husband’s misdeeds. She resolves to stay with her husband even after she learns of his wrongdoing.
Elinor Cadwallader – Elinor Cadwallader is the wife of the Rector at Tipton Grange, Brooke’s estate. She was born to a good family, but she married down and angered her friends and families. She is a practical woman who is forever trying to play matchmaker to unmarried young people, including Dorothea, Celia, and Sir James.
Humphrey Cadwallader – Humphrey Cadwallader is the Rector at Tipton Grange, Brooke’s estate. Unlike his wife, he doesn’t believe in meddling in other people’s affairs.
Edward Casaubon – Edward Casaubon owns a large estate called Lowick. He is a scholarly clergyman. His lifelong ambition is to write the Key to all Mythologies, but he is insecure and uncertain about his own abilities. He marries Dorothea because he thinks she is completely submissive and worshipful. Her stubborn independence frustrates him, and he mistakenly believes that she is constantly criticizing him. Casaubon is Will Ladislaw’s cousin. His mother’s sister was disowned by her family for running away to marry a man they didn’t like. Her own daughter, Will’s mother, also ran away to marry. Casaubon offers financial support to Will because he feels obligated to make amends for his aunt’s disinheritance. He becomes jealous of Will’s relationship with Dorothea. He includes an addendum in his will stating that Dorothea will lose his wealth and property if she ever marries Will Ladislaw. He dies before finishing his Key.
Sir James Chettam – Sir James Chettam is a baronet. He owns a large estate called Freshitt. He courts Dorothea, but she chooses to marry Casaubon. He later marries her sister. He enacts Dorothea’s cottage plans on his own estate.
Mr. Dagley – Dagley is one of Brooke’s impoverished tenants. His son is caught poaching on Brooke’s lands. He refuses Brooke’s request that he chastise his son.
Camden Farebrother – Camden Farebrother is a Vicar, but he doesn’t consider himself to be a very good clergyman, though many people like his sensible sermons. He becomes fast friends with Lydgate and supports his mother, sister, and aunt on his small income. He must gamble to make ends meet and to pursue his scientific hobbies. He loses in the election for the chaplaincy at the New Hospital. He receives the Lowick parish after Casaubon’s death. Fred Vincy enlists his help in courting Mary Garth. He himself loves Mary, but he does his duty.
Mrs. Farebrother – Mrs. Farebrother is Camden Farebrother’s widowed mother.
Winifred Farebrother – Winifred Farebrother is Camden Farebrother’s unmarried sister.
Peter Featherstone – Peter Featherstone is a wealthy, manipulative old widower. He owns Stone Court. He married twice, but had no legitimate children. His first wife was Caleb Garth’s sister. His second wife was Lucy Vincy’s sister. He hints for years that he plans to leave his entire estate to Fred Vincy, his nephew by marriage. He even writes two separate wills. Mary Garth refuses to burn one of them. He leaves his property to his illegitimate son, Joshua Rigg.
Caleb Garth – Caleb Garth is a poor businessman. He earns his living managing large estates. He co-signs a debt for Fred Vincy. When Fred is unable to pay, Garth’s family suffers. He receives new business, overcomes the loss, and hires Fred Vincy to work for him. He declines to manage Stone Court for Bulstrode after Raffles reveals Bulstrode’s dark past.
Susan Garth – Susan Garth is Caleb Garth’s wife. She is a former schoolteacher.
Mary Garth – Mary Garth is the daughter of Caleb and Susan Garth. She loves Fred, but she refuses to marry him if he becomes a clergyman and fails to find a steady occupation.
Will Ladislaw – Will Ladislaw is the grandson of Casaubon’s disinherited aunt. Bulstrode tries to give him money to atone for hiding his existence from his grandmother. He refuses the money because he knows it came through thievery. He worships Dorothea. He doesn’t care for money and loves everything that is beautiful.
Tertius Lydgate – Tertius Lydgate is the orphan son of a military man. He chose the medical profession at a young age, much to the chagrin of his wealthy, titled relatives. He comes to Middlemarch hoping to test new methods of treatment. He marries Rosamond Vincy, whose expensive habits get him into debt. He takes a loan from Bulstrode and becomes embroiled in Bulstrode’s scandal. Dorothea aids him in his darkest hour. He hopes to find the tissue that is the most basic building block of life.
Sir Godwin Lydgate – Sir Godwin Lydgate is Tertius Lydgate’s uncle.
Captain Lydgate – Captain Lydgate is Tertius Lydgate’s foppish cousin. He takes Rosamond out riding. She suffers a miscarriage as a result of an accident on horseback.
Naumann – Naumann is Ladislaw’s painter friend in Rome. He uses Casaubon as a model for Thomas Aquinas as a ruse to draw a sketch of Dorothea.
Miss Noble – Miss Noble is Mrs. Farebrother’s sister. She steals small items of food to give to the poor. She becomes fond of Will Ladislaw.
Selina Plymdale – Selina Plymdale is a good friend of Harriet Bulstrode. Her son courts Rosamond Vincy, but he is rejected.
Ned Plymdale – Ned Plymdale courts Rosamond, but she refuses him.
John Raffles – John Raffles is an old business partner of Bulstrode. Bulstrode bribed him to keep the existence of the daughter and grandchild of his first wife secret. He comes back to blackmail Bulstrode. He is Joshua Rigg Featherstone’s stepfather. He dies at Stone Court because Bulstrode interferes with Lydgate’s medical treatment.
Joshua Rigg Featherstone – Joshua Rigg Featherstone is Peter Featherstone’s illegitimate son. John Raffles is his stepfather. He inherits Stone Court. He sells it to Bulstrode because he wants to become a moneychanger.
Borthrop Trumbell – Borthrop Trumbell is an auctioneer in Middlemarch.
Walter Tyke – Walter Tyke is an Evangelical Protestant minister. Bulstrode is a supporter of his. He wins the election for the chaplaincy at the New Hospital, beating out Farebrother.
Rosamond Vincy – Rosamond Vincy is the daughter of Walter and Lucy Vincy. She grows up accustomed to an expensive lifestyle. She marries Lydgate because she thinks he is rich and because he has titled relatives. She dreams of leaving Middlemarch and living an exciting, aristocratic lifestyle, but her expensive tastes get Lydgate deeply into debt.
Fred Vincy – Fred Vincy is the oldest son of Walter and Lucy Vincy. His father sends him to college because he wants Fred to become a clergyman, but Fred doesn’t want to work in the Church. He gets himself into debt by gambling. He is accustomed to a lavish lifestyle. He causes financial difficulty for the Garths because he cannot pay the debt on which Caleb Garth co-signed his name. He wants to marry Mary Garth, but she won’t have him unless he finds a steady occupation other than the Church. He hopes to inherit Stone Court from his uncle, Peter Featherstone. These hopes are disappointed, so he works for Caleb Garth.
Walter Vincy – Walter Vincy is a modestly well-off businessman in manufacturing. He is also mayor of Middlemarch. Fred and Rosamond’s expensive tastes infuriate him. He refuses to lend Rosamond and Lydgate money to pay Lydgate’s debt. He is Harriet Bulstrode’s brother.
Lucy Vincy – Lucy Vincy is Walter Vincy’s wife. She is the daughter of an innkeeper, much to Rosamond’s chagrin. She dotes on her son and doesn’t want him to marry Mary Garth. She is the sister of Featherstone’s second wife.
Mr. Wrench – Mr. Wrench is a Middlemarch doctor. He misdiagnoses Fred when Fred catches typhoid fever. Lydgate treats Fred’s illness, and the Vincys fire Mr. Wrench. Mr. Wrench becomes Lydgate’s enemy as a result.
A estreia do Sport Club Literatura do StudioClio foi, acredito, um sucesso. Estavam lá uns 50 malucos, talvez mais, divertindo-se com pessoas que falavam sobre livros. Foi o cúmulo da civilização, com muito bom humor e as Corujas brilhando pelo auditório de caras sorridentes. O primeiro jogo foi duríssimo e acabou com 2666 (Roberto Bolaño) 1 x 0 Liberdade (Jonathan Franzen), sob a arbitagem de Antônio Xerxenesky e Carlos André Moreira. No jogo final, o placar que atrubuí a Orgulho e Preconceito x Middlemarch prevaleceu, apesar da tentativa de Joana Bosak de anular um gol de Jane Austen, escaramuça abortada pela plateia… Eu e Joana não nos conhecíamos, mas acho que nossa palestra conjunta acabou funcionando. Ela muito é bonita e não é mole — tem formação e mestrado em história e doutorado em literatura comparada pela UFRGS, onde já deu aulas nas duas áreas. Tinha tudo para acabar comigo, mas teve pena. Abaixo, minhas anotações para o evento.
Boa noite.
A missão impossível que me pedem é a de realizar uma partida de futebol entre dois dos maiores romances da grande literatura inglesa – Middlemarch e Orgulho e Preconceito. Comparar dois livros que amo é, guardadas as proporções, fazer uma Escolha de Sofia, decidindo qual de meus filhos – tenho dois aos quais amo incondicionalmente – deve ser encaminhado para a câmara de gás. Então, para afastar os critérios meramente afetivos, criei regras próprias. Em primeiro lugar, elegi cinco itens que seriam caros à literatura que ambas as autoras praticam. Em segundo lugar, procurei deixar longe de mim a afirmativa do mestre E. M. Forster, outro britânico, no seu ensaio Aspectos do Romance: “O teste final de um romance será a nossa afeição por ele, como é o teste de nossos amigos e de qualquer outra coisa que não possamos definir”. Também desconsiderei o fato de que, para meu gosto, alguns quesitos têm importância superior a outros. Os quesitos:
0. (Zero, porque aqui as autoras não marcam gols). Notícia biográfica das equipes.
1. Linguagem, foco narrativo
2. Construção de conflitos e estrutura do romance
3. Construção de personagens
4. Relevância sociológica
5. Análise psicológica (relevância ontológica)
O número de quesitos que marcam gols é ímpar por um motivo muito simples: queria evitar o empate.
Começo então por uma notícia biográfica de ambas:
Jane Austen nasceu em 1775 e morreu em 1817. Viveu, portanto, 41 anos. Orgulho e Preconceito foi publicado em pela primeira vez em 1813, quando autora tinha 38 anos. É seu romance mais conhecido e popular. Austen escreveu apenas outros cinco, todos excelentes: Razão e Sensibilidade (1811), Mansfield Park (1814), Emma (1815) e os póstumos A Abadia de Northanger (1818) e Persuasão (1818). Austen nunca casou, sempre morou com os pais. Escrevia seus romances em seu quarto e tinha pudor de quando alguém abria a porta — escondendo imediatamente os cadernos. A vida de Jane Austen é um deserto de grandes acontecimentos. O fato mais próximo a um caso amoroso, foi um breve amor juvenil finalizado por problemas financeiros do pretendente.
Em comparação com a vida de Jane, a existência de George Eliot foi espetacular. Ela nasceu dois anos após a morte de Austen e viveu 20 anos mais, chegando aos 61. Middlemarch foi publicado quando ela tinha 53. George, que na verdade chamava-se Mary Ann Evans, apaixonou-se e fugiu com um homem casado, George Henry Lewes, com o qual viveu por quase vinte e cinco anos, até a morte do amante. Sete meses antes de falecer, George Eliot casou-se com seu primeiro biógrafo, John Walter Cross, vinte anos mais moço. Sua vida parece a de uma mulher moderna. Se Austen escreveu seis romances, Eliot produziu apenas um a mais.
Equivoca-se quem pensar que elas tinham pouco em comum. O jogo, apesar de reunir dois estilos muito pessoais e únicos, é duríssimo.
Então comecemos a peleja pela linguagem e foco narrativo:
Quem leu Orgulho e Preconceito ou outros de seus livros, sabe que Austen é leve e enganadora, a gente pensa que está numa tranquila mesa de chá quando, com a maior graça, ela nos apresenta abismos que, pensando bem, já estavam ali, mas dos quais não pressentíamos a profundidade. Austen não faz comédia, mas nos obriga a gargalhadas; expõe dramas, mas não é trágica; é grave, porém leve; é clássica, apesar de ousada. O romance não deixa transparecer claramente seu esquema por trás de diálogos absolutamente fluentes e de uma narradora de tom zombeteiro. Num espaço rural limitado, as pessoas fazem visitas, vão à bailes, tomam chá, iludem umas às outras, armam situações e divagam sobre suas vidas e planos. O refinado humor da escritora abrange tudo. É o próprio time do Barcelona. Troca passes em diálogos ininterruptos, seduz a todos, inclusive aos adversários, para depois vencê-los.
Enquanto isso George Eliot aposta numa vitória baseada em rigoroso esquema defensivo. Ela tece com obsessiva minúcia os panos de fundo de cada cena e, nesta particularidade, é menos moderna que Austen. Podemos dizer que tem alma de socióloga, o que poderá render-lhe gols mais à frente. É importante dizer que Orgulho e Preconceito tem aproximadamente 300 páginas, enquanto que Middlemarch tem quase 1000. As torcidas presentes hoje ao StudioClio dirão que isso não tem a menor importância, mas este árbitro discorda: tem tudo a ver pelo simples fato de que George Eliot enrola e joga no erro do adversário. Quando menos se espera, a tragédia econômica de Fred Vincy, por exemplo, fica-nos clara com tal riqueza de detalhes financeiros e psicológicos que adquirimos a certeza de que não lhe resta saída, se não houvesse uma boa moça para o salvar.
Porém, como estamos aqui para julgar e não para ficar na arquibancada comendo picolés ou bebendo cerveja sem álcool – pois o Estatuto do Torcedor criminosamente não permite o consumo de álcool nos estádios – decidimos que a linguagem de Jane Austen acaba de fazer um belo gol na impecável defesa de George Eliot, que não contava com uma falha individual. Pois na página 162, a autora, sim, ela mesmo, começa inesperadamente a falar na primeira pessoa do singular, deitando teses e atrapalhando a narrativa. Em contraposição, temos em Austen trechos de virtuosismo quase inalcançável como a cena em que Lydia fala besteiras sem parar, fazendo a atenção do leitor ir embora, para depois descobrimos confortavelmente que fomos acompanhados na fuga por Elizabeth, que também não faz a menor ideia do que Lydia falara. Virginia Woolf: escreveu: “Ali estava uma mulher, por volta de 1800, escrevendo sem ódio, sem amargura, sem medo, sem protestos, sem pregação. Orgulho e Preconceito 1 x 0 Middemarch.
Construção de Conflitos: Como já disse, Jane Austen, de modo hábil, cria conflitos que logo tornam-se abismos. O problema onde Elizabeth Bennet e Fitzwilliam Darcy equilibram-se até o final é muito rico. A forma como Austen coloca ambos em posição de vencer orgulho e preconceito através da rebeldia é digno de várias avalanches da torcida – calma, sou colorado. Também a posição do sarcástico Mr. Bennet como catalisador de conflitos é brilhante e Mrs. Bennet… Bem, Mrs. Bennet nem é catalisadora. Mrs. Bennet é dinamite pura. Podemos considerá-la uma chata, mas apelo à opinião de meu amigo historiador e escritor Luís Augusto Farinatti para defender sua posição no romance. Ela tem uma missão fundamental. Afinal, num regime sucessório onde as mulheres não herdam, é imprescindível ter um filho varão. É ele que vai herdar a propriedade, ajudar o pai a organizar os rendimentos, dotar uma ou mais irmãs para que possam casar e acolher as irremediavelmente rejeitadas. Ou seja, não ter um filho homem era uma catástrofe (imaginem que Mrs. Bennet, por única e exclusiva culpa sua, como se pensava na época, tinha cinco filhas). Então, “colocar” as filhas era uma obsessão. Mrs. Bennet é a maior das chatas, mas só queria resolver o problema que criara. Ou seja, é um tremendo problema que ela tenta resolver de sua maneira atrapalhada, quase vendendo as filhas.
Agora vejamos Middlemarch. George Eliot escrevia dois livros – um dedicado ao caso da grande personagem Dorothea Casaubon, que casa com um homem mais velho em busca de “conhecimento” e “erudição”, e outro ao caso de Rosamond Vincy, que casa com o Dr. Lydgate à espera de uma vida rica que acaba por levar a família à bancarrota – quando decidiu juntá-los em apenas um romance. A encruzilhada que une ambos os livros fica clara no Capítulo XI, página 110 na edição da Record, quando subitamente entra Lydgate e começa um segundo romance com outro set de personagens.
Os conflitos em Middlemarch são tantos que seria longo citá-los um por um , mas é absolutamente notável o fato de que Dorothea e Rosamund – as personagens principais do livro – passem 900 páginas sem trocar uma palavra, coisa que apenas fazem no final. Isso é tão espetacular, cria tamanha expectativa que, bem, o jogo fica empatado em 1 x 1.
Construção de personagens: Comecemos por Austen, já que acho difícil vencê-la neste quesito. Minha amiga e também historiadora e escritora Nikelen Witter uma vez escreveu, fazendo uma descrição de alguns personagens de Orgulho e Preconceito:
Elizabeth é uma das mais fantásticas heroínas que conheço. Ela não é uma mocinha romântica – esse papel é da sua irmã Jane – , sabe ser maliciosa, dura, debochada, tudo isso sem deixar de ter um bom coração. Envergonha-se de sua família, mas ama-os a ponto de defendê-los mesmo com seus imensos defeitos. O que poucos notam é quão revolucionário é este romance para a época e as pessoas para quem foi escrito. Ele é a reivindicação de uma possibilidade de escolha que nem as mulheres, nem os homens, tinham em sua época. Embora publicado no início do século XIX, o romance é de fins do século XVIII e está ancorado numa moral em que a família e as convenções ditam as escolhas e os destinos. Então Austen pega seus dois personagens principais – cheios de dúvidas, incapazes de um comportamento retilíneo – e os faz inteiramente rebeldes para o mundo em que vivem. Elizabeth é uma rebelde nata. Não quer se submeter a um homem apenas para ter um marido. Ela quer alguém que a respeite como o pai o faz (um Édipo bem resolvido, eu diria), e tem o apoio deste – que a considera acima de todas as filhas por ver nela uma mente irmã. E Darcy? Darcy é aparentemente convencional, preso aos costumes e a sua posição. E, então, de repente, Darcy também se rebela (contra si mesmo, como ele afirma) e passa a desejar o que não lhe seria permitido. O romance não é apenas uma aula sobre o convencionalismo inglês, mas também sobre a revolução nos costumes, marca desta virada de século. Os personagens são perfeitos para demonstrar como a família nuclear deixa de ser vista como uma entidade reprodutora de seres humanos com a finalidade de abastecer linhagens, passando a um núcleo formativo de indivíduos. Nisso, as ideias de harmonia e amor conjugal começam a aparecer. Daí o elemento revolucionário do romance e das personagens bem construídas de Austen.
Já em Middlemarch, a única personagem que realmente rivaliza com as de Orgulho e Preconceito é Mr. Casaubon, um intelectual que merece como poucos o epíteto de “pseudo”. Incapaz de dar atenção a nada que não seja a sua obra imortal teológica que ofereceria à eternidade, chamada simplesmente de “A chave de todos os mitos”, é o mais estéril dos seres humanos. Apesar disso, é admirado e respeitado por todos por seu conhecimento e rendimentos. Explico melhor: em Middlemarch, Edward Casaubon passa sua vida numa tentativa inútil de encontrar um quadro abrangente que sirva para explicar toda a mitologia. Ele mostraria que todas as mitologias do mundo são fragmentos de um antigo e corrupto corpus do conhecimento, para o qual só ele tem a chave. Dorothea deslumbra-se com seu brilhantismo e erudição para descobrir, no leito de morte do marido, que todo o plano era absurdo e que ela não pode fazer nada com os fragmentos do livro ao qual se propunha organizar.
Bem, já viram. Orgulho e Preconceito 2 x 1 Middlemarch.
Relevância sociológica: Aqui é o terreno de George Eliot. Middlemarch é um imbatível painel social. O romance nos oferece um completo, compreensível e sutil panorama de uma Inglaterra em transição. É o poder dos velhos proprietários de terra (Mr. Featherstone) passando para os capitães da indústria (Mr. Vincy). É o poderoso símbolo do trem que ameaça cortar as terras de Middlemarch ao meio. Os pobres seguem pobres, claro, e atormentam o coração de Dorothea. Os novos profissionais, personificados pelo médico Lydgate e pelo artista Ladislaw esculhambam a rotina. Além disso, há os negociantes espertalhões, os juizes inconsequentes, os médicos venais defensores de métodos antiquados por interesse, etc. Há muita astúcia, muitas palavras belas e vazias, cujo maior representante é o banqueiro Bulstrode. Porém, na literatura de Eliot, não há maniqueísmo em nenhuma análise. Todos têm méritos e defeitos, ninguém é bom ou mau por completo. Tudo isso é descrito com rigor e precisão, sem cansar o leitor com digressões “eruditas”, como fez, por exemplo, Tolstói no final de Guerra e Paz.
E estamos com o placar de 2 x 2.
Análise psicológica ou relevância ontológica
Virgínia Woolf dizia que Middlemarch fazia com que a maior parte dos outros romances ingleses de seu tempo parecessem destinar-se a um público juvenil. É um romance sério, absolutamente sério, e a psicologia dos personagens é esmiuçada até o último pensamento antes da frase ser pronunciada. Isto nos torna íntimos de todos eles, conhecendo seus raciocínios tortuosos e suas esquisitices. A seu modo, ainda lógico e organizado, Eliot inaugura o fluxo de consciência. Em razão disso é que o gol decisivo é de Jane Austen, pois ela faz o mesmo sem o apoio da miríade de detalhes necessários a George Eliot. Meu placar final é Orgulho e Preconceito 3 x 2 Middlemarch.
Passei o fim de semana pensando no jogo. Como acho que penso e me organizo melhor quanto também escrevo, fiz o jogo completo ontem à tarde. Abaixo, o primeiro tempo, digamos. Nada de entregar a decisão antes da hora, claro. Quem acha que enlouqueci ao promover jogos de futebol entre livros clássicos e nem imagina do que falo, deve informar-se aqui de fatos bastante anormais. Na verdade, são tantos detalhes, tantas emoções, que acho que terei de levar minhas anotações para o estádio.
Boa noite.
A missão impossível que me pedem hoje é a de realizar uma partida de futebol entre dois dos maiores romances da grande literatura inglesa – Middlemarch e Orgulho e Preconceito. Comparar dois livros que amo é, guardadas as proporções, fazer uma Escolha de Sofia, decidindo qual de meus filhos – tenho dois aos quais amo incondicionalmente – deve ser encaminhado para as câmaras de gás de Auschwitz. Então, para afastar de mim os critérios meramente afetivos, criei regras próprias. Em primeiro lugar, elegi cinco itens que seriam caros à literatura que ambas as autoras praticam. Em segundo lugar, procurei deixar longe de mim a afirmativa do mestre E. M. Forster, outro britânico, no seu ensaio Aspectos do Romance: “O teste final de um romance será a nossa afeição por ele, como é o teste de nossos amigos e de qualquer outra coisa que não possamos definir”. Também desconsiderei o fato de que, para meu gosto, alguns quesitos têm importância superior a outros. Os quesitos:
0. (Zero, porque aqui as autoras não marcam gols). Notícia biográfica das equipes
1. Linguagem, foco narrativo
2. Construção de conflitos e estrutura do romance
3. Construção de personagens
4. Relevância sociológica
5. Análise psicológica (relevância ontológica)
O número de quesitos que marcam gols é ímpar por um motivo muito simples: queria evitar o empate. Não suportaria que meu jogo acabasse numa vulgar decisão por pênaltis.
Começo então por uma notícia biográfica de ambas:
Jane Austen nasceu em 1775 e morreu em 1817. Viveu, portanto, 41 anos. Orgulho e Preconceito foi publicado em pela primeira vez em 1813 quando autora tinha 38 anos. É seu romance mais conhecido e popular. Austen escreveu apenas outros cinco, todos excelentes: Razão e Sensibilidade (1811), Mansfield Park (1814), Emma (1815) e os póstumos A Abadia de Northanger (1818) e Persuasão (1818). Austen nunca casou, sempre morou com os pais. Escrevia seus romances no quarto e tinha pudor de quando alguém abria a porta — escondia imediatamente os cadernos. A vida de Jane Austen é um deserto de grandes acontecimentos. O fato mais próximo a um caso amoroso, foi um breve amor juvenil por Thomas Lefroy (parente de uma amiga de Austen), aos 20 anos. Em janeiro do ano seguinte, 1796, escreveu a sua irmã dizendo que tudo havia terminado, pois ele não podia casar por motivos econômicos. Pouco depois, uma tia de Lefroy tentou aproximar Jane do reverendo Samuel Blackall, mas ela não se interessou.
Em comparação com a vida de Austen, a existência de George Eliot foi espetacular. Ela nasceu dois anos após a morte de Austen e viveu 20 anos mais, chegando aos 61. Middlemarch foi publicado quando ela tinha 53. George, que na verdade chamava-se Mary Ann Evans, apaixonou-se e fugiu com um homem casado, George Henry Lewes, com o qual viveu por quase vinte e cinco anos até a morte dele. Sete meses antes de falecer, George Eliot casou-se com seu primeiro biógrafo, John Walter Cross, vinte anos mais moço. Sua vida parece a de uma mulher moderna.
Mas equivoca-se quem pensar que elas tinham pouco em comum. O jogo, apesar de reunir dois estilos muito pessoais e únicos, é duríssimo e estamos sem poder tranquilizar a massa torcedora do StudioClio sobre o resultado e sem poder gritar, como Galvão Bueno o faria, que Eliot ou Austen é o Brasil no Sport Club Literatura.
Então comecemos a peleja pelo pela linguagem e foco narrativo:
Quem leu Orgulho e Preconceito ou outros livro da autora, sabe. Austen é leve e enganadora, a gente pensa que está numa mesa de chá e, com a maior graça, ela nos apresenta abismos que, pensando bem, já estavam ali, mas dos quais não pressentíamos a profundidade. Austen não faz comédia, mas nos obriga a gargalhadas; expõe dramas, mas não é trágica; é grave, porém leve; é clássica, apesar da ousadia. A ação é posta em movimento pela tensão variável entre poucos personagens. O romance não deixa transparecer claramente seu esquema por trás de diálogos absolutamente fluentes e de uma narradora de tom zombeteiro. Num espaço rural limitado, as pessoas fazem visitas, vão a bailes, tomam chá, enganam umas às outras, armam situações e divagam sobre suas vidas e planos. O refinado humor da escritora se manifesta em tudo: ameniza os dramas e diverte-se com os personagens. É o próprio time do Barcelona. Troca passes em diálogos ininterruptos, seduz a todos, inclusive os adversários, para depois matá-los.
Enquanto isso George Eliot aposta numa vitória baseada em rigoroso esquema defensivo. Ela tece com obsessiva minúcia os panos de fundo de cada cena e, nesta particularidade, é menos moderna que Austen. Podemos dizer que tem alma de socióloga, o que poderá render-lhe gols mais à frente. É importante dizer que Orgulho e Preconceito tem aproximadamente 300 páginas, enquanto que Middlemarch tem quase 1000. As torcidas presentes hoje ao StudioClio dirão que isso não tem a menor importância, mas este árbitro discorda: tem tudo a ver pelo simples fato de que George Eliot enrola e joga no erro do adversário. Quando menos se espera, a tragédia econômica de Fred Vincy, por exemplo, fica-nos clara com tal riqueza de detalhes que pensamos que só lhe resta a vergonha total, o suicídio, se não houvesse uma moça para lhe salvar.
Porém, como estamos aqui para julgar e não para ficar na arquibancada comendo picolés ou cerveja sem álcool – pois o Estatuto do Torcedor criminosamente não permite o consumo de álcool nos estádios – decidimos que a linguagem de Jane Austen acaba de fazer um belo gol na impecável defesa de George Eliot, que não contava com uma falha individual. Pois na página 162, a autora, sim, ela mesmo, começa a falar de surpresa na primeira pessoa do singular, deitando teses e atrapalhando a narrativa. Em contraposição, temos em Austen trechos de virtuosismo quase inalcançável como a cena em que a Lydia fala besteiras sem parar, fazendo a atenção do leitor mais volátil ir embora, depois descobrimos confortavelmente que fomos acompanhados na fuga por Elizabeth, que também não faz a menor ideia do que Lydia falara. Orgulho e Preconceito 1 x 0 Middemarch.
Minha mãe sempre disse que há loucos para tudo. E lá vou eu fazer a coarbitragem de um fantástico embate entre dois livros que amo apaixonadamente. Creio que parte da culpa pela presença de Middlemarch na partida é minha. Será um jogo duríssimo, terrível, ao vivo, com fortíssimo e inédito comprometimento do árbitro e na presença de torcedores ilustres…
Middlemarch, de George Eliot, apareceu em vários comentários que Marcos Nunes fez por aqui e em três posts meus — aqui, aqui e aqui. No primeiro deles, deixo-o numa lista de melhores livros de todos os tempos, mas não pensem que considero Orgulho e Preconceito menor e que mereça perder. Por exemplo, acordei hoje de madrugada e fiz mentalmente um jogo. Quando o despertador tocou estava 3 x 2 para o romance de Jane Austen.
Uma afirmativa bastante imbecil é dizer que a vida poderia ser mais simples se a gente não a enchesse de dificuldades extras… Melhor seria apenas ler os bons livros, sem se comprometer demais, certo? Bem, esqueça esta declaração desesperada. Citei Orgulho e Preconceitoaqui (com imensa repercussão para um blog de sete leitores), aqui e aqui. Enquanto isto, releio Middlemarch para ver onde ele seria superior ou inferior a Orgulho e Preconceito, que reli ano passado. Ele já fez uns golzinhos e tomou outros vários. Mas posso garantir que o cérebro de uma pessoa que faz duas escritoras e livros jogarem uma partida de futebol é um… campo de jogo. Meu problema maior é que acho que um dos livros é melhor do que o outro, mas que o outro é mais perfeito que o primeiro. OK, chega. Abaixo o reclame para os embates da próxima terça-feira.
Com Antônio Xerxenesky, Carlos André Moreira, Joana Bosak e Milton Ribeiro Data 21 de junho, terça-feira, 19h30 Valores R$ 5,00 (coreia)
R$ 10,00 (arquibancada)
R$ 15,00 (social)
R$ 20,00 (camarote)
Novamente me pedem para fazer uma lista de meus dez melhores livros. Já fiz várias dessas e acho até que outra(s) por aí no blog. Mas vamos lá, vou escrever a listinha de um jato, em um minuto, e vocês prometem não lê-la, certo?
Dom Quixote, Cervantes.
Moby Dick, Melville.
Doutor Fausto, Thomas Mann.
Uma Confraria de Tolos, John Kennedy Toole.
Grande Sertão: Veredas, Guimarães Rosa.
Entre Heróis e Tumbas, Ernesto Sabato.
Berlim Alexanderplatz, Alfred Döblin.
Ulysses, James Joyce.
Middlemarch, George Eliot.
Os Irmãos Karamázov, Dostoiévski.
Ana Karênina, Tolstói.
A Vida e as Opiniões de Tristram Shandy, Laurence Sterne.
A História Maravilhosa de Peter Schlemihl, Adelbert Von Chamisso.
Cheguei aos 10? Tem 13? Kafka e Machado de Assis fora? E Virginia Woolf? E meu amado Jonathan Swift? Putz. Não, é sem revisão. Deixa assim. Quem quiser que retire três deles.