É tudo verdade

Ontem, passei o dia acompanhando o cerco a Yeda Crusius. Não acredito em impeachment e nem o desejo. A entrada em cena de seu vice — que sempre fez-lhe oposição — como uma espécie de salvador e reserva moral do estado teria consequências desastrosas. Em pouco mais de um ano de governo, Paulo Feijó poderia tornar-se herói e novo candidato preferencial da mídia gaúcha. Melhor deixar assim. É bonito ver a louca espernear. É bonito ver Serra preocupado com uma governadora do PSDB comprovadamente ladra.

Mas encontrei esta coisa entre meus e-mails. Trata-se de uma mui truculenta troca de e-mails entre este blogueiro e um candidato a deputado estadual carioca. É tudo verdade, nada foi alterado. Claro que vocês sabem que eu não sou do TRE gaúcho e nem meu sobrenome é Rabelo. Ah, alterei meu e-mail trocando algumas letrinhas e o nome do candidato fazendo o mesmo. Tudo começou com um spam emitido por ele.

From: cesar penha
To: [email protected]
Sent: Wednesday, September 04, 2002 11:18 AM
Subject: cesar penha

Há mais de 30 anos, desempenho um trabalho em busca da Justiça Social. Como advogado, vendo a sociedade ruir com a total falta de amparo. Empenhei-me em auxiliar aos que clamavam por ajuda. Vereador do Município do Rio de Janeiro – 88/92, fui 2º vice-presidente da Câmara Municipal. Participei de forma atuante, na elaboração da Lei Orgânica do Município. Criei projetos para dependêntes quimicos; Banheiros em praças públicas e orla marítima; Regulamentei a atividade de professor de Educação Física no Município; Doaroes de sangue não pagam inscrição para concurso público municipal; Disponibilizei vale transporte para presidentes de associação de moradores e o mais importante trabalho de minha vida, a “justiça gratuita”. Quero dar continuidade a esse trabalho e conto com seu voto. Para Deputado Estadual Dr. Cesar Penha 12 678

—– Original Message —–
From: [email protected]
To: [email protected]
Sent: Wednesday, September 04, 2002 11:20 AM
Subject: Re: cesar penha

Notei que você tem dificuldades com a língua portuguesa. Quer auxílio? Presto consultoria!

—– Original Message —–
From: [email protected]
To: [email protected]
Sent: Wednesday, September 04, 2002 12:09 PM
Subject: Re: cesar penha

Va se fuder seu merda!!

—– Original Message —–
From: [email protected]
To: [email protected]
Sent: Wednesday, September 04, 2002 1:45 PM
Subject: Re: cesar penha

Amigo.

“Vá” tem acento; e revise seu texto, ele tem 6 erros!

O mesmo para você. Milton.

—– Original Message —–
From: [email protected]
To: [email protected]
Sent: Wednesday, September 04, 2002 1:53 PM
Subject: Fw: cesar penha

Desculpe, tem 7 erros. Encontrei mais um. Você é “doutor” por ter feito um doutorado ou é apenas mais um bacharelzinho do PDT?

Milton Rabelo – TRE Porto Alegre

—– Original Message —–
From: [email protected]
To: [email protected]
Sent: Wednesday, September 04, 2002 4:04 PM
Subject: Re: cesar penha

Desde quando vc eh do TRE ??
Pensa que me assuta ??
Mais uma vez,, Vá se fuder seu MERDA !!! Bacherelzinho é a pqp!!!

Meta seus acentos e aulas no rabo !!

—– Original Message —–
From: [email protected]
To: [email protected]
Sent: Thursday, September 05, 2002 2:22 PM
Subject: RE: cesar penha

Meu caro analfabeto.

Você fez duas perguntas. Vamos a elas.

1. Trabalho na área de sistemas do TRE gaúcho. Isto significa que, se desejar, comerei seu cuzinho carioca.

2. Em sua ponderada resposta, você cometeu três erros: “Assuta” e letra maiúscula após as vírgulas. A propósito, aquelas duas vírgulas consecutivas que você acaba de inventar, significam uma pausa um pouco mais longa?
Se for o caso, sugiro a utilização de um sinal já existente em nossa gramática: o ponto e vírgula (;). E o que é “bacherelzinho”?

Milton Rabelo, sempre a seu dispor para uma aulinha.

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Igreja de São Pelegrino em Caxias do Sul e Antônio Prado

Viajamos durante o fim de semana. Minha mulher tinha algumas reuniões na serra. Eu fiquei vadiando. O exterior da Igreja de São Pelegrino, em Caxias do Sul, é uma verdadeira blasfêmia arquitetônica, uma inconcebível mistura de estilos. A remissão destes pecados inicia na porta, quando nos deparamos com a porta de bronze, obra de Augusto Murer.

O lado de dentro é deslumbrante, com obras de Aldo Locatelli por todos os lados.

Vejam o teto.

Ah, vocês acharam estranho este detalhe?

Pois é, se Michelangelo foi proibido de colocar demônios na Sistina, Locatelli desenhou-os em São Pelegrino. Notável.

Mas há uma coisa absurda. Nos quadros que descrevem a via sacra e que circundam a nave há vidros de proteção. E eles refletem a luz, óbvio. E há muita luz. Então a gente não consegue nenhum quadro por inteiro. Alguns detalhes tem que ser vistos dando uma voltinha para fazer com que os reflexos luminosos se movam. Há malucos que se quase se atiram no chão por uma foto.

E mesmo assim, observem, pegam o reflexo das janelas do outro lado da igreja. O quadro acima é belíssimo. Aquela lata caindo é a lata de tinta do pintor Locatelli, já quase sem forças para finalizar os afrescos de São Pelegrino, em razão do câncer que o mataria aos 47 anos. Algumas pessoas protestam, pois não havia latas na época de Cristo… Céus!

Depois, fomos à Antônio Prado.

Na cidade, há diversas obras tombadas pelo patrimônio histórico. Desconheço a história de Antônio Prado, mas chutaria algo semelhante à Parati. Provavelmente foi mantida do modo como a vemos por ter empobrecido muito.

A única forma de se preservar alguma coisa do passado do Brasil é através do desinteresse. Se há interesse, põe-se tudo abaixo. Voltem às fotos anteriores. Prestem atenção ao tamanho das tábuas. Cada uma tem metros e metros de madeira contínua.

Mesmo que entremeadas de construções modernas, mesmo que os pradenses passeiem na rua com os carros tocando a todo volume uma “música” com a “letra” que transcrevo abaixo: …

Ela já fez plástica,
ela faz ginástica,
ela faz dieta
é gostosa à beça,
ela ficou fantástica,
ela é transgênica,
ela é turbinada,
foi modificada
ela ficou fantástica.

Sobrou alguma coisa para a gente ver. Imagino meus amigos Leônidas Abbio e Daniela Pasetto pequenos, brincando no pátio do Colégio Ulisses Cabral.

Comprando carne num açougue pra lá de temático.

Mas olha, gostei mesmo foi da fantástica, perfeitíssima sopa de capeletti (ou agnolini) que tomamos no Clube União. Comemos maravilhosamente — depois foram servidas milhões de saladas e churrasco impecável. E pasmem, nós pagamos, O CASAL, R$ 28.

Inesquecível.

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Steve Reich: Music for pieces of wood

Se Gavin Bryars é o maior compositor minimalista, Steve Reich é o mais inventivo, surpreendente e matemático. Gosto muito. Com vocês, algumas de suas experiências: a Clapping Music, as Nagoya Marimbas e a Music for pieces of wood em versão “metal”, três estudos para percussão escritos por Reich.

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A privada metafórica e seus efeitos colaterais

Às vezes, uma voz feminina me sussurra ao ouvido: “ Faltam seis jogos para o Inter ser campeão da Copa do Brasil. Acho que vai dessa vez”. Mas logo vem outra voz, agora masculina, e responde: “ E sete para o Grêmio ser campeão da Libertadores”. Se eu pudesse ligar os dois fatos, fazendo um consequência do outro, se pudesse assinar um contrato garantindo as duas vitórias… Acho que não o assinaria.

Pois a Copa do Brasil é o meio, a Libertadores é o fim. A conquista de uma Libertadores é algo que marca e muda um clube e meu coloradismo seria cruelmente atacado com um terceiro título tricolor, enquanto que a Copa do Brasil, pfff… Acho que nem deveria dar vaga direto à Libertadores, mas aquela vaguinha que deve ser confirmada contra um sul-americano fraco. Então, já que rasgamos o contrato, separemos Grêmio e Inter. O Inter ganha a Copa do Brasil e o Grêmio perde a Libertadores. Brilhante! Mas quem fará o Grêmio perdê-la?

Ai, jisuis. Vamos combinar que o San Martín é uma piada. E o próximo adversário do Grêmio está entre Caracas e Cuenca. Vi todos jogarem. São zumbis. Todo o mundo sabe que o Grêmio já está nas semifinais e o que me desespera é que, antes das delas, o São Paulo brigará com o Cruzeiro, o Sport com o Palmeiras, o Boca com o Estudiantes; ou seja, o Grêmio chegará sem cansaço e luta para enfrentar apenas dois times. Como não creio que vá me matar, resta esperar que os melhores vençam.

O entusiasmo do São Paulo me parece o daquele cara que come a Scarlett Johansson e vê que a estagiária gorda e cheia de acne está a fim de “fazer amor”. Além do mais, o time do Morumbi só ganha em Porto Alegre quando traz o Atlético-PR (obrigado, Prestes). Contra o Grêmio, é galinha morta. O Cruzeiro é uma instituição bipolar e, de uma forma que deixaria muitos psiquiatras ruminativos, contratou Kléber, um centroavante com tantos desvios de comportamento que seria o pupilo ideal do Capitão Nascimento. O Boca Juniors tem fama e resultados, mas a formação atual se esforça, corre, berra, bate e sua um rio para parir algo como uma mosca, das pequenas. Sim, estou cagado.

Falam em mudar os cruzamentos. Ah, eu quero, mas não tirem o Cruzeiro do caminho!

A vida do Inter é parecida com a do Grêmio. Enfrenta o Flamengo, depois, se passar, diverte-se com Ponte Preta ou Coritiba – babas dignas de um San Martín da vida — e pega o Vitória do Franciel (dois links) ou o Corínthians do Mano Menezes ou o Fluminense do Fred. Eu prefiro enfrentar o Corínthians. Seria muito mais “temático” ganhar um campeonato deles depois que quase roubamos o Brasileiro de 2005, comprado por eles. Eles se tornariam bi-vices da competição. O Vitória é o time do Carpeggiani, não gostaria de torcer contra ele que foi meu ídolo e o Flu seria também legal, pois seria bi-vice para o Inter. Também seria divertido.

Mas olha, estou preocupado é com quem ganhará do Grêmio. Se apostasse, vocês já sabem, cravaria Cruzeiro. Todo cagado.

P.S. importante: o jornalista Jones Lopes da Silva está escrevendo uma biografia de Escurinho. Quem tiver boas histórias e curiosidades que não as usuais, marque um papo com ele pelo e-mail [email protected]. Falei longamente com ele e o livro sairá bonito e bom.

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Melhor programa cultural para hoje: Cineclubismo nos Anos de Chumbo

Recebi este e-mail:

Olá,

estou organizando uma sessão de cinema na Sala Redenção (UFRGS) no dia 07/05, em que será passado o filme Uma cidade sem passado. A proposta é de que a autora do livro “Cineclubismo – Memória dos anos de chumbo” – Rose Clair Matela – comente, após a sessão, a importância do movimento cineclubista no período da ditadura (não era ditabranda) não só como um espaço de resistência político-cultural, mas também de formação para os sujeitos que dele participaram. Rose Clair paricipou diretamente da organização dos cineclubes no Rio de Janeiro naquela época, viu e viveu de perto a repressão. No dia 08/05, a proposta é de realizar um debate entre ela e Luiz Alberto Cassol – que trabalha com o cineclubismo hoje – para que seja debatida a importância do cineclube naquela época e na atualidade, também como um espaço de resistência político-cultural e de formação para os sujeitos, mas em contextos diferentes. Gostaria de saber se é possível fazer a divulgação no blog quando a data se aproximar. Se puder contribuir de alguma forma, ficamos gratos. Desde já agradeço a atenção.

Att.,
Carla Hirt

Uma Cidade sem Passado (Das Schreckliche Mädchen), de Michael Verhoeven, é um dessas pequenas obras-primas muito pouco vistas. É um filme alemão de 1990. A história: na década de 70, Sonja, uma jovem estudante, inscreve-se num concurso “Minha Cidade Durante o Terceiro Reich“. Porém não são todos que querem colaborar para que ela tenha acesso aos antigos arquivos da cidade. Muita gente entra em pânico e então mais do que nunca Sonja quer descobrir a verdade sobre os que viveram sob o regime da época. Deliciosa mistura de comédia e drama, o filme é baseado em fatos reais. Ganhou vários prêmios e chegou a ser indicado para o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Com inteira justiça. (Adaptado desta página).

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Uma abordagem pessoal ao Abecedário de Pound

Durante a adolescência, apaixonei-me tão perdidamente pela literatura, que tinha certeza de que o único destino possível para mim era o de tornar-me escritor. Era capaz de ler livros diariamente por mais de 6 horas. Na época não confessaria isto nem sob tortura, mas minha dedicação era uma meticulosa preparação para o futuro. Queria abordar o maior número possível de obras e fazia-o de maneira sistemática, a fim de alargar pouco a pouco meus conhecimentos. Minha família preocupava-se discretamente com aquele filho maluco que só queria saber de livros, mas como eu era manso, minha situação não lhes assustava muito. Kafka dizia que, fora da literatura, pouca coisa o interessava; a mim também, naquele tempo. Depois, muita coisa mudou, mas fiquemos em Pound.

Nunca me interessei muito por poesia, dedico-lhe um tempo ínfimo se comparado àquele que dou a prosa. Fiquei feliz quando soube que Dostoiévski, Balzac, Bellow, Thomas Mann e outros eram assim também. Porém, no âmbito daquela minha preparação para o futuro, li um ensaísta-poeta que foi fundamental para meu entendimento de literatura. Ele havia caído em desgraça nos meios universitários dos anos 70. Vivíamos sob ditadura militar, todos os intelectuais respeitados eram de esquerda; mas, apesar disto tudo, eu precisava conhecer Ezra Pound, um dos escritores que deram apoio ao fascismo durante a Segunda Guerra Mundial.

Seu ABC da Literatura (Cultrix, 1973), traduzido por Augusto de Campos e José Paulo Paes, foi adquirido e lido por mim em agosto de 1976. É um pequeno livro, escrito quase em forma de panfleto, onde Pound prova, através de teoria simples e de muitos exemplos, que a poesia é tanto melhor quanto mais significados contiver. O ABC comprova que a melhor poesia é a mais saturada de significados e nos explica sobre a sabedoria da língua alemã, onde dichten (condensar) é o verbo alemão correspondente ao substantivo Dichtung, que significa “poesia”. “Grande literatura é simplesmente linguagem carregada de significado até o máximo grau possível”, escreve Pound. Após curtas explicações teóricas, Pound nos demonstra suas teses com excertos. Estes tomam metade do livro e são a prova cabal de que sua teoria foi criada sobre fatos literários, não sobre fatos imaginados.

Ezra Pound (1885-1972)

Os prosadores também tiraram vantagem da condensação. Alguns, além de utilizarem uma linguagem limpa, quase livre de adjetivações – como Kafka e Borges, por exemplo – se utilizam de situações que falam. Isto é, os personagens são colocados em determinadas situações que auxiliam a narrativa ou a contradizem. Este é mais um elemento a condensar significados, pois acrescenta mais informação àquela que nos chega através dos meios tradicionais: texto e diálogos. Este seria o máximo de condensação em prosa, pois além da linguagem enxuta e multi-significante tomada da poesia, há todo um contexto apoiando a narrativa. Também o cinema, a partir da nouvelle vague, passou a “treinar” o público para este tipo de abordagem, na verdade tão antiga quanto Shakespeare.

Condensar não é tão fácil quanto parece. “A incompetência se revela no uso de palavras demasiadas”, diz Pound. Parece fácil eliminar as excrescências de nossos textos, mas como fazer para que os significados se multipliquem? Pound não nos deixa à deriva e também investiga os modos através dos quais as palavras podem ser carregadas de significado.

Porém, a teoria de Pound tem limites. Se alguém censurasse Dostoiévski, Bernhard ou Stendhal pela incrível profusão de repetições e detalhes que seus livros contêm, poderia ser chamado tranqüilamente de doido. Nestes casos, as minúcias criam o ambiente da ação ou servem para caracterizar o pensamento de alguns personagens. Dostoiévski escreveu no plano de Crime e Castigo: encher a narrativa de detalhes e repetições! O mesmo vale para o ultra-verboso e barroco Saramago. Nestes autores, o excesso trabalha a favor da trama. Que bom que seja assim! Se a boa literatura fosse apenas aquela que melhor adere a cânones pré-definidos, tornar-se-ia uma simples competição entre virtuoses e morreríamos de tédio. É excelente que os bons autores insistam em agir como aquelas cozinheiras talentosas e corajosas que mudam as receitas durante a preparação dos pratos. Agindo assim, acabam por cometer tanto erros lamentáveis como gloriosos acertos.

Ou seja, sei lá. Cada um faz do seu jeito.

COMENTÁRIO EXPOSTO AO MILTON E AOS SEUS LEITORES (por Paulo José Miranda)

Bom, pensei demoradamente antes de escrever este comentário: pensei um minuto. Para mim, um minuto é muito para pensar, quando se trata da minha vida e não de filosofia, de poesia, de literatura ou de arte. Aí, sim, demoro-me a pensar. Julgo que a vida não foi feita pra pensar. Na vida age-se. Talvez por isso tenha vivido em tantas e tão estranhas partes deste mundo. Ao ponto de a minha casa ser a internet. Não é certo encontrarem-me em outro lugar. Por isso agradeço tudo quanto posso ao Senhor Tim Berners-Lee pela sua infinita generosidade, ao inventar ao WEB e não ter registado direitos, isto é, ter feito da WEB um espaço gratuito. Assim, devido a esse senhor, hoje todos me podem encontrar em meu e-mail e sites. De tal modo é assim que, aquando do meu projecto America-is, o senhor e fotógrafo Francisco Huguenin Uhlfelder anunciou os membros envolvidos no projecto e as suas localizações deste modo: A em Munique, B em Itália, C em Nova Iorque, D em Lisboa e E(u) num http://etc. Tudo isto por causa de não pensar mais de um minuto em relação à minha vida, aos acontecimentos da minha vida.

Depois desta explicação acerca do meu minuto, passo ao que verdadeiramente aqui me trouxe: o post do Milton. Não me parece que este post seja melhor do que alguns outros, mas é seguramente pertinente por várias razões: 1) apresenta um cânone poético-literário que se propõe, depois, não a destruir, mas a relativizar; invoca, sem medo, a filiação política de Pound, assumindo que isso nada interfere no seu juízo de gosto, pois se não gosta dos poemas é por razões estéticas, que não impedem de apreciar ao limite o seu ABC; por fim, mas não por último, mostra a angústia de um homem à beira de ser escritor (estamos sempre à beira quando o mundo não nos reconhece). Ninguém é escritor na sua rua, embora possa ser na gaveta. Contrariamente ao Milton, li muito pouco durante a minha infância e durante a minha adolescência. Li, mas li pouco. Nem sequer alguma vez tive alguma vez a ideia exotérica de querer ser escritor. Quis ser músico! Músico como o nosso (meu e do Milton e de muitos outros) muito apreciado Thomas Bernhard. Mais tarde, falhado o objectivo músico (o talento dava pra ser um razoável executante e um pouco menos razoável compositor) quis ser filósofo. Filósofo depois de falhado o projecto de músico, como já tinha acontecido com alguns filósofos. Depois falhei também neste projecto, embora tenha sido um aluno bastante acima da média, o que daria pra ser um professor mediano na faculdade, nunca como os mestres que tive: António C. Caeiro, Mário Jorge Silva Carvalho, Nuno Ferro, Maria Filomena Molder, José Gil. A poesia surgiu nos intervalos da filosofia. Quando acabei filosofia editei um livro de poesia, A Voz Que Nos Trai, que acabou por ser premiado com o Prémio Teixeira de Pascoaes. Por causa de uma mulher comecei ou recomecei ou comecei, não sei, a escrever prosa. Esse primeiro livro Um Prego No Coração acabou por despertar a atenção do melhor poeta português vivo, que me teceu os maiores elogios e que, por causa disso, me levou á publicação de outros livros de prosa. O segundo, Natureza Morta, levou-me a arrebatar o primeiro Prémio José Saramago que, para além do prestígio me concedeu também cerca de 25 mil euros. A partir daqui aceitei que era escritor. Acabei por ser escritor por ter falhado em tudo o que me havia proposto anteriormente. E não foi sem resistência que um dia, ao olhar para o espelho, disse a mim mesmo: “é assim, pá, és escritor, aceita!” E aceitei. Hoje, volvidos 6 ou 7 anos, sei por que sou escritor e não sou poeta, contrariamente ao que alguns amigos julgam. Nós somos qualificados por uma profissão ou um mister quando grande parte do nosso tempo é passado aí. Ora, eu passo quase tempo nenhum na poesia, quase nada, apenas um pouco mais do que passo a pensar na minha vida. Quanto à literatura, passo quase a minha vida toda. Desde que aceitei aquilo que era, escritor, quase não faço mais nada senão pensar, pensar, pensar, pensar. Não penso em escrever. Penso e escrevo. Penso e escrevo. Penso e escrevo. E assim vai.

Em Portugal temos uma expressão antiga que é: De Espanha nem bons ventos, nem bons casamentos. Poderia aplicar a mesma expressão a Pound. Nunca consegui apreciar-lhe os versos, nem a sua inteligência literária. E asseguro que não se trata de preconceito político, pois tal como o Milton também não misturo alhos com bugalhos, embora isto seja uma discussão enorme. Por outro lado, estou bastante longe de ser um intelectual de esquerda. Não há razões políticas a atrapalharem-me o juízo estético, pronto! Serei a última pessoa a pôr em causa o talento poético ou qualquer outro de Pound. Mas não é pra mim. Quanto à sua teoria, é tão ridícula quanto as teorias que orientavam Eça de Queirós quando escrevia os seus romances. As teorias eram ridículas, mas o talento de Eça, não. Eça é um escritor excelente, um escritor que aprecio imenso. Mas não as suas teorias, não aquilo em que literariamente ele acreditava. Provavelmente passa-se o mesmo com Pound, mas eu não sou permeável. Milton expõe sucinta e eficazmente a teoria do senhor Pound, no seu post, mas depois relativiza a sua verdade. O problema, para mim, é que a verdade não é relativizável, se me permitem o neologismo. À primeira leitura, parece que o Milton quer ficar bem com Deus e com o Diabo, com Pound e com Bernhard. Quem já leu Extinção, de Bernhard, sabe que isso não é sequer possível de ser pensado. Nesse livro, a páginas tantas, lá pras trezentas e muitas, pelo menos na minha edição inglesa, ele expõe, através do narrador, a sua teoria literária. Qual a grande diferença? Primeiro porque ela é teoria dentro de um livro de ficção, isto é, não pode ser lida independentemente desse facto. Não se trata de um ensaio, ou sequer de um artigo, trata-se de algo maior: o coração de Bernhard. E o coração do autor é exposto, mostrado em duas linhas: exagero e repetição. Mais: exagero de repetição. Podemos viver uma vida, ou várias, amando Pound e, depois, outras vidas amando Bernhard, mas não podemos amá-los em simultâneo. Peço desculpa a todos, mas não se pode gostar do Grémio e do Inter! Sei, a arte não é futebol. Pois não, pois não, mesmo. É muito mais vital. Jogamos a nossa vida nela. Eu, pelo menos, jogo a minha vida nela. Assim, amar um cânone e desprezar outro é muito mais vital para mim do que amar o Tremendo FC Porto e desprezar o Benfica. Quero que o Benfica perca todos os jogos, apenas isso. Mas quero muito menos ao cânone de Pound: quero que ele se escafede todo; quero que o cânone do senhor Pound não veja sequer a luz do dia; quero que morra (não a sua poesia, mas a sua teoria). Por outro lado, julgo que Milton não está a defender o “convívio” entre teorias irreconciliáveis. Milton está a dizer que não “reconhece” nenhum cânone. E isto, sim, é perigoso. Não há um escritor que seja que não escreva por causa de um cânone, ainda que o modifique, claro. Mas quem é que pode modificar uma receita (para usar o exemplo dado pelo Milton) senão quem sabe cozinhar, quem seguiu, até à modificação da receita, um determinado cânone? Suspeito que só se pode escrever bem contra Deus, contra a ciência, contra a vida, contra si mesmo. E para estarmos contra, temos que estar, erradamente ou não, certos de que há um caminho melhor do que todos os outros. Só assim Bernhard pôde escrever tão bem como escreveu.

Sou leitor assíduo das crónicas do Milton. Algumas são excelsas. Algumas são maçadoras. Mas todas são bem escritas. Se não julgasse assim, não o tinha convidado para fazer parte do Cidades Crónicas. Mas, para ser melhor ainda, aconselho-lhe, se posso, se ele me permite, que se assuma literariamente. Apetece-me dizer-lhe: “Milton, pá, escreve como se tivesses a dizer mal do Grémio!” E dizer mal do Grémio (que eu prefiro ao Inter) não implica não dizer bem. Pois acaba-se por dizer bem nem que seja desses tomatinhos de conserva do Inter. Eu, que nunca quis ser escritor, e que acabei por ser; foi o que restou pra eu ser, estou convicto de que é daqui que vem a força da minha escrita: escrever contra o que não foi a minha vida, isto, contra todos os meus falhanços, escrever contra mim. Eu sou eu mesmo o meu Benfica. Quero ouvir o Milton dizer: “Eu sou eu mesmo o meu Grémio.”

Abraço forte ao Milton e aos seus leitores,
Paulo José Miranda

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Galeria de Horrores: José Serra, Ariano Suassuna e católicos do Paraguai

Este é o ex-Ministro da Saúde (!?) José Serra tranquilizando o país sobre a gripe suína. Este homem é candidato à Presidência da República…

Se a imagem não aparecer, clique aqui para pasmar-se.

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É sabido por poucos que o Secretário de Cultura do Estado Ariano Suassuna é um fascistóide. Mas é. As pessoas insistem em achá-lo engraçadinho fora do estado de Pernambuco. Talvez ele até seja, desde que distante 3000 Km ou mais. Experimente viver com quem MANDA na cultura e pensa que Antonio Carlos Jobim, por exemplo, é um “compositor sem especial importância” e “José de Alencar é mais importante do que Joyce”. Ontem, Fernando Monteiro publicou o post abaixo na Kriterion:

“DIFERENTEMENTE DA MAIORIA”
Fernando Monteiro

Ariano Suassuna concedeu entrevista ao “Personalidade”, programa da TV Câmara. Participaram da entrevista a antropóloga da Universidade Federal de Pernambuco, Aparecida Nogueira, autora de vários textos sobre a obra do escritor paraibano, e os jornalistas Cláudio Ferreira, da TV Câmara, e Amneres Pereira, diretora do Jornal da Câmara. Entre outras “pérolas” recolhidas das respostas do atual secretário Ariano Vilar Suassuna, pincemos esta aqui, de uma franqueza (reconheçamos) que em nada disfarça – realmente – o pensamento “alinhado” que faz sucesso (?) não só entre os conservadores, como-nunca-antes-por-este-país afora:

“Sou um intelectual que, diferentemente da maioria, nunca falei mal das Forças Armadas. Apoiei, durante um tempo muito difícil, generais patriotas como Euler Bentes Monteiro e Antônio Carlos de Andrada Serpa, porque via neles uma preocupação de defender o País. Acho que nós, intelectuais, temos o dever de começar a relembrar que o Brasil precisa muito de uma aproximação nossa com as Forças Armadas e com o clero neste momento em que vivemos.”

Quem quiser conferir o resto, acesse este endereço.

É a ditabranda Versão Armorial.

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Para finalizar, começou no Paraguai a campanha anti-Lugo, o comedor de criancinhas. E a Justiça? Intervém acusando-o de algo ou o cara será incinerado pela imprensa?

É foda.

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Porque hoje é sábado, X

Às vezes a coisa não dá certo. O WordPress ficou irritado com as imagens deste sábado. Deve ser religioso, mas não como o Lugo, nosso hot bispo.

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Atenção, cinéfilos de Porto Alegre!

Hoje vou fazer uma propaganda gratuita do Cinema Guion de Porto Alegre. Um dos melhores negócios que fazemos anualmente eu e minha mulher é a assinatura anual do Guion. Quase todos os melhores filmes passam lá, raramente tenho que enfrentar um shopping com gente cheia de pipocas e com aquele cheiro nauseabundo de manteiga. Por quê? Ora, porque 90% do cinema relevante passa lá.

Deste modo, acabo indo no mínimo uma vez por semana a uma das oito salas do Guion. Entro gratuitamente. Bem, não é bem assim: pago R$ 180,00 e entro em todos os filmes que quero, quantas vezes quiser, por um ano. Façamos alguns cálculos:

Se eu for uma vez por semana pagando ingresso: R$ 12 x 52 = R$ 624,00
Se eu for uma vez a cada 15 dias: R$ 12 x 26 = R$ 312,00

Mas pago R$ 180,00. Querem saber a relação de filmes desta semana, por exemplo?

VALSA COM BASHIR, de Ari Folman
A JANELA, de Carlos Sorín
CHE – O ARGENTINO, de Steven Soderbergh
ENTRE OS MUROS DA ESCOLA, de Laurent Cantet
O CASAMENTO DE RACHEL, de Jonathan Demme
DUVIDA, de John Patrick Shanley
A BELA JUNIE, de Christophe Honoré
O LEITOR, de Stephen Daldry
FOI APENAS UM SONHO, de Sam Mendes
X-MEN ORIGENS: WOLVERIN, de Gavin Hood
ELE NÃO ESTA TÃO A FIM DE VOCÊ, de Ken Kwapis

Excetuando-se Gran Torino e ignorando os dois últimos da lista, todo o restante dos filmes “suportáveis” estão aí. Então deixe de ser burro, tá? Ah, e no AeroGuion o estacionamento é grátis!

Resposta a uma dúvida surgida nos comentários: São R$ 180,00 por pessoa. Obviamente, não há promoção para casais, essas coisas.

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O Leitor, de Bernhard Schlink, e o filme homônimo de Stephen Daldry

O Leitor é um livro alemão até em demasia. Seco com o Rio Grande do Sul destes dias, não há muita coisa desnecessária nele. Há algumas descrições da natureza (querem algo mais alemão?) e o restante são frases que contam a história de forma algo brusca. Como Schlink faz conosco, Hanna também é capaz de asperezas com seu menino. Bem, mas será que todo mundo conhece a história? Ora, vamos resumi-la no parágrafo seguinte.

Michael Berg tem 15 anos no período do pós-guerra na Alemanha. Ele conhece Hanna Schmitz, uma mulher de 36, bela, sexy e autoritária. Eles acabam por estabelecer um ritual diário: primeiro tomam banho, depois ele lê livros em voz alta para ela e finalmente amam-se. Uma marca inapagável na alma de um adolescente. O fim chega de surpresa quando Hanna some. Mas Michael voltará a vê-la poucos anos depois, quando já está na faculdade de direito. Ela se vê envolvida em um processo de acusação contra ex-guardas de campos de concentração nazistas. Ela fora uma delas durante a guerra.

É absolutamente admirável o trabalho de Kate Winslet ao recriar Hanna Schmitz. Toda a Hanna descrita por Schlink está no filme. Winslet é uma atriz de muitíssimos recursos e que realmente gruda no personagem, sem trazê-lo para maneirismos prontos de antemão. Cada gesto descrito por Schlink foi realizado pela atriz e pego por Stephen Daldry. Mas falta ao filme uma cena fundamental, falta ao filme a dúvida que dá a Schlink a gradiosidade que o filme não possui. Daldry ou o produtor fez questão de emburrecer o filme. No capítulo 16 da segunda parte, Berg faz uma visita ao juiz principal. Ora, isso não há no filme! Nesta visita, temos a impressão de descontinuidade narrativa; ou seja, não sabemos se foi mesmo vazia, porém, ao final do capítulo, Berg, que narra o livro, escreve que estava alegre e que poderia seguir vivendo a partir daquilo. É óbvio que ele contou-lhe sobre Hanna, passando a informação que só ele tinha ao juiz.

O que significa? Ora, que o juiz preferiu ignorar o analfabetismo de Hanna e escolheu puni-la como se ela tivesse escrito os relatórios, como queria a platéia. Ele claramente jogou para a torcida, fazendo o que toda justiça faz: julgou para o lado que parecia mais correto à opinião pública, num ridículo exercício de senso comum. Stephen Daldry escolheu a simplicidade. Ao deixar seu filme plano mais plano que podia (ou devia), perdeu uma bela oportunidade de sugerir outras camadas de experiência, de criar mais dúvidas no expectador. Sabemos que a vida é assim, que a realidade nunca se esgota, mas parece haver uma sede de burrice no cinema atual e os diretores tratam de saciá-la.

O final do livro é uma doída e envergonhada reflexão sobre a geração alemã que veio antes de Berg. Eles só pareciam capazes de crimes. E seguiam criminosos ao punir.

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Excesso de temas

Quando comecei meu blog, pensei que o grande desafio seria o de arranjar assuntos para escrever 3 ou 4 vezes por semana. Consequentemente, protegi-me intitulando meu blog com temas bem gerais, dos quais gostasse muito, sem esquecer de um salvador “qualquer coisa” no final. Hoje sei que isto não é problema, pois sofro é de excesso de temas. Aqueles 3 ou 4 partos semanais ameaçam precipitar-se a cada momento que venho dar uma olhada nos e-mails, tenho é que impedir a superfetação (*).

Neste momento, debato-me entre 5 temas: um post dedicado ao livro inédito do Marcos Nunes que já está metade escrito, uma descoberta notável que fiz lendo o livro O Leitor, uma crítica ultraelogiosa ao filme O casamento de Rachel, uma divulgação das assinaturas do Guión Center de Porto Alegre (ideal para publicar no feriado?) e, afinal, a revisão do último capítulo publicado de meu Monólogo Amoroso, que um dia estará finalizado, não? Ah, e hoje escrevi mentalmente uma homenagem àquelas pessoas que me convenceram que ir a restaurantes é uma bobagem, tal a qualidade dos pratos que podem produzir em casa. Talvez devesse chamá-lo de “As Mulheres que me Alimentam”. Há os homens também, mas os deixaria de fora, por enquanto. Afinal, gostei do título.

Resolvi então fazer um protesto que terá de ser medido em escala Richter na rede mundial. Não vou escrever mais nada hoje! Foda-se!

(*) Palavra pouco utilizada, né? Superfetação significa, segundo o Aurélio, “Concepção que ocorre quando, no mesmo útero, já há um feto em desenvolvimento” ou “Coisa que se acrescenta inutilmente a outra; excrescência, redundância”.

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Lugo, o "hot" Bispo

Faz uns cinco anos, uma amiga minha que é muito bonita, foi a um evento político aqui em Porto Alegre. Lá, conheceu Fernando Lugo. Não, não engravidou, mas me contou. O cara tinha todo o jeito da religioso que fez a opção pela pobreza e, de sandálias, disse que seria candidato à presidência do Paraguai. Ela não deu muita bola para os planos do ex-bispo nem para a parte política, prestou mais atenção no sorriso contagiante, na simpatia e nas piadas. Típico. Ano passado, num jantar aqui em casa, voltou a falar no bispo:

— Viram? Meu bispo será presidente do Paraguai, claro. Ele é cheio de charme, um verdadeiro “hot” bispo. Receberia tranquilamente meu voto…

Arrã. Lugo ocupou as manchetes na semana passada. Ele confirmou ter um filho de 10 anos e pululavam mais dois candidatos a filhos seus na mídia. Estes dois logo transformaram-se em seis. Provavelmente irá para o Guiness como o homem que mais fez exames de paternidade. Sua biografia é exemplar: infância pobre, família perseguida por Alfredo Stroessner, noviciado em 1970 (19 anos), padre em 1977 (26 anos), aproximação com a Teologia da Libertação, bispo em 1994 (43 anos), ex-bispo em 2004 (53 anos), presidente do país em 2008 (57 anos). Mesmo antes de tornar-se padre, Lugo sempre confessara a amigos um plano: aos 55 anos, largaria a Igreja para escrever, dar aulas, casar e ter filhos. E, bem, sexo é algo de que ele aparentemente nunca abriu mão.

Eu realmente não gostei do debate que se criou sobre o caso. Todos discutiam a queda de popularidade e o ocultamento da verdade. OK, são fatos políticos, mas podem ser perfeitamente passageiros. Poucos discutiram que, em 2004, o Centro de Estatísticas Religiosas e Investigações Sociais (CERIS) fez uma pesquisa onde 41% dos padres brasileiros admitiram terem tido relações sexuais depois de ordenados. Nem todo mundo consegue ficar só na masturbação, como Ratzinger. E pouquíssimos citaram o fato de Lugo ter-se afastado aos 53 anos, quando o natural é fazer isto lá pelos 75 anos — tal fato não apontaria para uma oposição de consciência?

O celibato é uma regra criada há 1000 anos; é, portanto, posterior ao cristianismo. Porém… O que me surpreende mesmo é que não li em nenhum lugar o motivo principal de sua existência: a Igreja Católica não quer ver padres com famílias e filhos pois eles teriam HERDEIROS e estes seriam incômodos para quem sempre se utilizou do trabalho dos padres, da fé e da liberação do pagamento de impostos para ficar mais rica, ops!, desculpem, para que as obras de suas vidas dedicadas a deus ficassem não para mulheres e filhos e sim para a Santa Igreja Romana.

Acho que a crise de confiança do eleitorado paraguaio em relação a Fernando Lugo poderá ocorrer assim como aconteceu com FHC, que não era bispo mas tem filho fora do casamento. Hoje, poucos falam em FHC como pai de “filho ilegítimo” (expressão horrível e preconceituosa). O Paraguai não é os EUA e alguém poderia espalhar por lá que o celibato é desumano. Alguns padres, inclusive, acabam envolvendo-se com adolescentes de mesmo sexo, lembram…? A Igreja sabe disso e a prova é que relaxou as punições por desvios sexuais aos padres. Elas foram reduzidas no Código de Direito Canônico. Ou seja, defendido o Santo Dinheiro, que grasse a pedofilia!


— Sabias que tens algo em comum com o FHC, papito?
— Si, nuestro nombre es Fernando…

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Concerto Nº 1 para Piano e Orquestra de Brahms (1º Mvto: Maestoso – em 3 partes)

Abaixo, um registro antológico do imenso primeiro movimento do Concerto Nº 1 para Piano e Orquestra de Brahms, com um Arthur Rubinstein velhíssimo e o Concertgebow de Amsterdam, sob a regência de um jovem e já calvo Bernard Haitink. É, na minha opinião, o melhor dos concertos para piano. Melhor ver e ouvir de joelhos o fantasmagórico primeiro tema e seu lírico desenvolvimento. Ainda mais em tão boas mãos.

Ou clique AQUI para ver a primeira parte.

Ou clique AQUI para ver a segunda parte.

Ou clique AQUI para ver a terceira e última parte.

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Na praia, de Ian McEwan

Na praia (On Chesil Beach) é um pequeno romance de Ian McEwan. É, na verdade, uma novela de 128 páginas centrada na noite de núpcias de um casal. A ação passa-se provavelmente em doze horas, talvez menos. A premissa de McEwan é muito interessante: até o início dos anos 60, a Inglaterra ainda era vitoriana em termos de liberdade sexual. Isto significa dizer que não havia nenhuma. Creio que dentre as famílias brasileiras “de bem” daquela época ocorria o mesmo. Minha mãe, nascida na década de 20 do século passado, dizia sempre que meu pai era quem interessava por sexo, que ele lhe dava mais amor do que recebia. Ouvi várias mulheres nascidas até a década de 40 dizendo não entender porque suas filhas gostavam tanto de sexo… Porque para elas era um sacrifício. Mas ai de quem as chamasse de frígidas!

Florence era assim. Cresceu na mais completa ignorância e tinha um nojo infantil só de pensar em beijos de língua, quanto mais em ser penetrada. E Edward era o outro lado do mesmo problema: inteiramente ignorante a respeito do assunto e tão virgem quanto Florence, ele sofria horrivelmente imaginando uma ejaculação precoce na hora H. Sua preparação para o casamento é a de ficar uma semana sem masturbar-se. O inteligente leitor deste blog — com seus pés firmemente colocados no século XXI — já viu todo o sofrimento da noite de núpcias. McEwan, como faz habitualmente, coloca foco microscópico nas motivações e medos de Florence e Edward, mostrando a devastação que faz uma boa falta de diálogo. Quando sai de cima do microscópio, McEwan faz pequenos flashbacks esclarecedores para a formação do contexto em que o casal tenta acomodar-se.

Na praia é uma história triste com algumas cenas engraçadas. É uma história impossível nos dias de hoje, ao menos entre os jovens médios ingleses ou brasileiros. É a narrativa da derrota de dois jovens amantes. Tudo poderia dar certo se houvesse um pouco de diálogo e compreensão. Os dois querem isso, se amam, mas não vencem a incomunicabilidade. Quando conversam, não conseguem fixar-se no sexo e complicam-se falando de dinheiro e vida profissional. Não há caminho de saída.

Mais um grande livro de Ian McEwan, um excelente escritor antiquado.

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Rascunho completa 9 anos apresentando alguma fúria…

Durante um mês, comprem todos os cadernos culturais que falam um pouco de literatura. Separem as páginas literárias das outras. Façam o mesmo com a Bravo, Cult, etc. (Deixem a Continente de fora). De posse de todas estas páginas, joguem tudo no liquidificador. Guardem o bolo de papel resultante. Depois peguem a Rascunho daquele mês e façam o mesmo com ela. De posse dos dois bolos de papel, vá até a balança literária mais próxima e compare seus pesos. Mesmo que a Bravo e outras usem papéis mais pesados, o bolo de papel jornal da Rascunho terá maior peso. Sempre. Façam a experiência.

Pois a Rascunho completou nove anos em seu número 108 (108 / 12 = 9). Sou assinante e recebi a revista ontem. Está esplêndida. Mas vamos a seus pontos mais “anormais”. Não creio ter havido uma combinação entre os articulistas, houve apenas a coincidência de vários se referirem à decadência cultural de nosso querido Brasil, quiçá do mundo.

Já na capa — normalmente laudatória em publicações comuns — há uma paulada: Um Shakespeare manco, fanho e chato – Tradução de Carlos Alberto Nunes mostra como é possível converter um gênio em um autor quase ilegível e aborrecido. Lá dentro, em longo artigo, os três volumes do Teatro Completo de Shakespeare, em tradução de Nunes, são queimados peça por peça. Não, não há fúria aqui.

Mas há aqui, ó. Fernando Monteiro adentra furibundo uma megalivraria e segue um leitor comum qualquer. Ele, o leitor, busca primeiramente os best-sellers coca-cola, depois dá uma olhada nas obras factuais (aquelas que nos fazem revelações sensacionais sobre o assassinato de Kennedy, por exemplo), dirige-se aos livros de auto-ajuda e dá uma passada de olhos na LITERATURA propriamente dita. Passemos a palavra a Fernando:

Não adianta vir pra cima de mim tentando dizer que, ora, tudo é literatura.

Sabemos que não é. Por exemplo: Lya luft sabe, perfeitamente, que o que ela deu para escrever, nos últimos anos, não é literatura de modo algum, e não adianta ela até ameaçar (conforme ameaçou, num programa televisivo de entrevistas) que “se retiraria”, etc., caso os entrevistadores continuassem a chamar de auto-ajuda a auto-ajuda da lavra recente da senhora Luft, com a qual Lya ajuda o editor Sérgio Machado a ajudar a conta bancária própria com os novos títulos da “escritora” gaúcha auto-ajuditícia.

A Rascunho não precisa de minha ajuda (mais ajuda?) nem dos livros de auto-ajuda, mas mesmo assim eu volto à carga: precisamos dar peso — em leitores, em divulgação — a revista de Rogério Pereira. Ela está cheia de bons articulistas (Monteiro, Castello, Ruffato, Eduardo Ferreira, o Rodrigo Gurgel que detonou aquela tradução de Shakespeare), é grande em todos os sentidos, sempre vem com mais de 30 páginas, é séria, não parece existir por obra de editores interessados em aumentar as vendas e… tem NOVE ANOS.

Que chegue aos NOVENTA!

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A um Escritor que Amo

Quando o li pela primeira vez, foi por exigência do colégio. Tinha 14 anos e foi uma revelação. Nunca antes me deparara com nenhuma atividade que me interessasse de verdade. Não queria ser médico ou engenheiro – tinha eu 14 anos de idade… – mas poderia ser aquilo. Escreveria livros! A partir daquele, comecei a procurar outros do mesmo autor e notei como ele frequentemente citava músicas. Ora, meu pai era um homem de muitos discos, então era fácil conhecer as coisas de Beethoven, Mozart, Brahms e Bach de que ele falava. Depois, conheci Herbert Caro, que — amigo de Erico — fez-me uma relação verbal das músicas que ele ouvia repetidamente em casa, enquanto escrevia ou nos intervalos. Sabe-se hoje que Erico Verissimo deixou por escrito a recomendação de que, se quisessem lembrá-lo no futuro, não precisariam fazer grandes homenagens e discursos, bastaria reunir seus amigos e leitores “numa noite, qualquer noite” e tocar um “dos últimos quartetos de Beethoven, algumas sonatas de Mozart e qualquer coisa do velho Bach. E o resto – que diabo! – o resto é silêncio.”

Ontem à noite, fui a um concerto em homenagem aos 100 anos de nascimento de Erico Verissimo – ele nasceu em 17 de dezembro de 1905. Executou-se um quarteto de Mozart, outro de Beethoven e o esplêndido Op. 25 de Brahms. Foram apresentados por membros do Salzburg Chamber Soloists Ensemble. O fundador e regente desta orquestra é um portoalegrense chamado Lavard Skou-Larsen. Lavard é um violinista filho de mãe brasileira e pai dinamarquês e, mesmo morando desde os 4 anos em Viena, conhece a obra de Erico por influência de sua mãe. O concerto foi espetacular, com destaque para a violoncelista – e mulher de Lavard – Adriane Savytzky, para a pianista israelense Revital Hachamoff e para o entusiasmo, tesão e alegria de todos. Não houve discursos. Com fotos de Erico por todo o lado, ouvimos música. A empresa patrocinadora fez das suas apresentando um vídeo institucional, mas sabemos que sem patrocínio não tem concerto. Se todas as homenagens a Erico forem deste porte, teremos um grande final de ano em Porto Alegre.

Erico viajava muito ao exterior e costumava dizer aos que não conheciam Porto Alegre: “Moro numa cidade que tem Orquestra Sinfônica”. Para ele, isto demonstraria inequivocamente nosso tamanho, civilidade e humanismo. Tinha razão. Espero que a Orquestra Sinfônica de Porto Alegre não esqueça dele.

P.S.- Esta pequena crônica foi escrita em abril de 2005. Sim, a Ospa homenageou Erico no concerto do dia 13 de setembro de 2005. O programa não foi um horror, mas também não incluiu nada que o escritor especialmente admirasse: começou com a Abertura da ópera “Fosca” de Carlos Gomes, depois veio o Concerto para Piano e Orquestra em lá menor de Schumann e finalizou com a Sinfonia nº 4 em ré menor, também de Schumann. Poderiam ter lido trechos de seus livros, apresentando as músicas depois, mas como são uns béocios, perderam a oportunidade. Uma pena.

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O caricatural placar da decisão do Campeonato Gaúcho…

… revela o quanto os campeonatos regionais são heterogêneos, anacrônicos e antiquados. Na decisão de 2008, Inter 8 x 1 Juventude; em 2009, Inter 8 x 1 Caxias. Parece piada. Quando o Inter resolve VENCER um time do interior do Rio Grande do Sul no Beira-Rio, o primeiro tempo pode acabar em 7 x 0, fato que não acontecia há 68 anos.

Se estou feliz? Claro que estou, ganhar o Campeonato Gaúcho é melhor do que perdê-lo, mas falando sério, preferia não jogá-lo. Queria um Brasileiro de ponta a ponta do ano, uma Copa do Brasil com todos os clubes — os que vão à Libertadores não têm datas para jogá-la, sem os regionais teriam… –, folgas para os clubes nas datas Fifa, etc. Um Gauchão, ganho ou perdido, é a mesma coisa — nada.

Mesmo assim é engraçado ganhar de um time da Série C. Aqui, a avassaladora goleada:

Já na decisão paulista, o destaque foi o chilique de Diego Souza. Diego dá razão àquele meu amigo português que afirma tratar-se de um imbecil. Explico: Diego foi jogador do Benfica. Acabou corrido de lá. Vejam abaixo as estrepolias de um grande profissional:

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Sensacional

Sempre disse que o negócio era fazer upload, upload, upload… Vejam a YouTube Symphony Orchestra @ Carnegie Hall, vale a pena.

Tem até o Prelúdio das Bachianas Nº 9 lá pelos 43 minutos.

Indicação da Caminhante.

Muito obrigado.

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Enquanto isso, no Morumbi…

Dedicado ao Guga, Serbon e Marcão.

(Não sei quem criou esta maravilha).

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Alguns problemas

Houve problemas no OPS que me impediram de postar — sumiram até comentários que não gostaria de perder! — , mas também algumas atrapalhações pessoais fizeram com que eu me afastasse nas últimas horas. Espero que tudo volte logo ao normal.

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