Grandes duplas do cinema – diretores(as) e atores (atrizes)

Grandes duplas do cinema – diretores(as) e atores (atrizes)

Ingmar Bergman e Liv Ullman
Jean-Luc Godard e Anna Karina
Sofia Coppola e Bill Murray
Leos Carax e Denis Lavant
Martin Scorsese e Robert De Niro
Michelangelo Antonioni e Monica Vitti
David Lynch e Kyle MacLachlan
Quentin Tarantino e Uma Thurman
John Cassavetes e Gena Rowlands
Pedro Almodóvar e Penélope Cruz
Bigas Luna e Javier Bardem
Woody Allen e…
Zhang Yimou e Gong Li
Juan José Campanella e Ricardo Darin
Ettore Scola e Nino Manfredi
Bette Davis e William Wyler
Katherine Hepburn e George Cukor
Ingrid Bergman e Alfred Hitchcock
Barbara Stanwick e Frank Capra
Grace Kelly e Alfred Hitchcock
Bette Davis e Michael Curtiz
Maureen O’Hara e John Ford
Olivia de Havilland e Mitchell Leisen
Elizabeth Taylor e George Stevens
Bette Davis e Alfred E. Green
Billy Wilder e Jack Lemmon
François Truffaut e Jean-Pierre Léaud
Fellini e Marcello Mastroianni
Paolo Sorrentino e Toni Servillo
Akira Kurosawa e Toshiro Mifune
Lars Von Trier e Charlotte Gainsbourg
Emir Kusturica e Davor Dujmovic
Monicelli e Mastroianni
Xavier Dolan e Xavier Dolan
Woody Allen e Woody Allen
Werner Herzog e Klaus Kinski
Wong Kar-Wai e Tony Leung
Hal Hartley e Martin Donovan

Melancolia, de Lars von Trier

Vi duas vezes Melancolia, de Lars von Trier. A primeira foi logo na pré-estreia, na primeira sessão do filme em Porto Alegre. Eu não podia deixar de fazer isso. Lars von Trier, Emir Kusturica, Peter Greenaway, Abbas Kiarostami, Roman Polanski e talvez Alexander Sokurov ainda mantêm viva aquela curiosidade que no passado tinha cada lançamento de Bergman, Truffaut, Tarkovski ou Antonioni. Destes, dos modernos, apenas von Trier, Kiarostami e Polanski têm vida comercial em cinema. Os outros estão em DVD e olhe lá.

Ontem, ao sair do cinema, depois de ver o filme pela segunda vez, minha mulher pôs em palavras minha opinião. Ela disse que achara Melancolia mais simples e inferior a Anticristo. Estou de acordo. Mas a produção cinematográfica de nosso tempo é tão lastimável que não me surpreendo com as loas que tecem à Melancolia como obra-prima e candidato a “filme do ano”.

A ação do filme centra-se menos no fim do mundo — o planeta chamado Melancolia aproxima-se da Terra e os cientistas são cétidos sobre se Melancolia vai passar ou bater…  — , mas na relação entre as irmãs Justine (Kirsten Dunst) e Claire (Charlotte Gainsbourg). O início é muito bonito plasticamente — momento em que lembramos da deslumbrante abertura de Anticristo. São dez minutos com a música de Wagner (Tristão e Isolda) que terminam com o maior dos spoilers: o choque entre Melancolia e a Terra. Ou seja, já de saída somos informados do provável final. Quem vê o filme pela segunda vez nota claramente a simbologia da abertura. Justine, vestida de noiva, tenta avançar mas está amarrada pelas pernas. Claire, charfurdando, leva o filho no colo para não se sabe onde, nem ela. Justine constrói com o sobrinho a “proteção” para o fim do mundo. Novamente Justine, de vestido de casamento, é levada pelas águas. Os planetas chocam-se.

Como ocorre com tantos bons filmes (lembrar de voltar a este assunto), Melancolia está dividido em duas partes. Estas têm os nomes das irmãs. Na primeira, Justine casa-se numa cerimônia de opereta. Poucas vezes vi uma depressão ser tão bem caracterizada. Justine não quer casar, não parece interessada, está de saco cheio de tudo, da vida, do chefe, do futuro marido e parece apenas dar importância ao pai brincalhão (John Hurt) e à irmã. Neste trecho do filme há muito que observar. É notável como retorna ali, perfeitamente reconhecível, o cineasta que criou o Dogma 95. A câmera está na mão de alguém nervoso, os cortes ocorrem com frequência e em momentos pouco habituais, as crises são resumidas por von Trier em “apresentação da situação” e “consequência”. Neste modo cinematográfico de mostrar os fatos, as falas nunca são longas. E como rende!

A narrativa aproxima-se do clássico na segunda parte. É quando Claire, que ama a vida, desespera-se. Justine, pelo contrário, parece conformada e ciente de tudo o que ocorrerá. Porém, seu bom senso e inteligência é complementado por desconcertante passividade, a mesma utilizada para entrar na fria de sua festa de casamento. Ela sabe de seu destino. E sabe que nada pode fazer a respeito. Cética, fatalista e paralisada, faz uma adivinhação surpreendente e, transformada em oráculo (Respondendo a meu filho Bernardo: acho que o número de feijões adivinhado apenas quer dizer “eu sei tudo”), revela para a irmã a verdade fatal: “a humanidade é má, a Terra não merece existir, não há deus, nem vida em outro planeta, esqueça”. Quando Claire balbucia uma reclamação sobre o futuro de Leo, seu filho, Justine não responde.

À medida que von Trier envelhece, fica cada vez mais claras suas influências: Tarkovski e Strindberg. Se Anticristo é dedicado a Andrei Tarkovski e é tão próximo a O Espelho (1975), Melancolia parece vir de Solaris (1972). Lá também a ficção científica foi utilizada para cogitar e interrogar o humano e a humanidade. Como nos filmes do russo, o olhar dos personagens para o céu e o para que não entendem reflete um mergulho em suas interioridades. Muitos, como o marido de Claire (Kiefer Sutherland), não suportam conviver com ela. É Tarkovski e não é; trata-se é uma continuidade. Uma vez, com entrevistadores mais inteligentes que os de Cannes, Trier disse algo mais ou menos assim: “Tarkovski é um deus real para mim. Quando eu vi O Espelho, Stalker e Andrei Rublev, mesmo num televisor pequeno, fiquei em êxtase. Se você quiser falar sobre religião, eu te respondo que minha relação religiosa é com Tarkovski. Ele viu o meu primeiro filme e o odiou… Mas eu me sinto muito próximo a ele”. O deus de Trier é punitivo…

Não estou com pressa de terminar hoje. Ontem, publicamos no Sul21 uma entrevista que fiz com o escritor Charles Kiefer e vejam só. Na entrevista também havia uma questão de troca identidade e revelação da verdade do leito de morte da mãe. Quando a mãe de Trier morreu, ela lhe contou que seu pai não era o judeu Trier, mas Fritz Michael Hartmann, de família católica alemã. Vários de seus novos parentes eram renomados músicos, etc. Após quatro encontros nada felizes, o alemão recusou-se seguir mantendo contato com o filho. Isso não explicaria a entrevista de Cannes, quando ele se disse “nazista” e não judeu? E como fazer para não olhar para a melancolia e Melancolia, quando ela aparece como uma enorma esfera pronta a nos aniquilar?

24 Letras por Segundo — Aguardo vocês amanhã (4), no GNC Moinhos

Tive o privilégio de ter sido convidado para integrar o time deste curioso livro. A ideia é simples. Cada um de nós deveria criar um conto dentro do estilo de um diretor de cinema que fosse de nossa preferência. De cara eu escolhi Bergman, mas me pediram para me limitar aos vivos. Optei primeiro por Kusturica, porém rapidamente enviei outro e-mail perguntando se alguém já havia reservado Polanski. Tinha certeza que não o “ganharia”, mas o polaquinho tarado caiu no meu colo.

A história nasceu de um comentário-conto do Marcos Nunes, feito aqui no blog. Usei duas ou três fases dele, as iniciais; depois a coisa torna-se incontrolavelmente outra. Tive preocupação em citar vários filmes de Roman Polanski e isso foi o que me deu mais trabalho, juntar tudo sem quebras, deixando algum estranhamento pelo caminho. O ambiente era para ser o de O Inquilino (1976), filme que vi nos anos 70 e nunca mais… É o meu preferido dentre a filmografia do diretor. Trouxe alguma coisa da notória vida pessoal do cineasta — como não? — mas lembro de ter citado de passagem O Inquilino, O Bebê de Rosemary, Lua de fel, Chinatown, Frantic e Repulsa ao Sexo, além de passar por Sharon Tate e Charles Manson. Relendo hoje o texto, acho que poderia ter enviado ao Rodrigo Rosp a versão ampliada, mas lembro que me deixei seduzir pela alta velocidade da versão mais curta. Enfim.


Abaixo copio o post e as imagens do Samir Machado de Machado (<— VALE MUITO UMA VISITA E ESTE BLOG GENIAL)  a respeito do livro, que ficou muito bonito. Clique nas imagens para ampliá-las.

24 Letras por Segundo
Autores
: vários
Design da capa
: Samir Machado de Machado
Projeto gráfico interno
: Guilherme Smee
Editora
: Não Editora

O novo livro da Não Editora, a ser lançado na primeira semana de agosto, é uma coletânea de dezessete autores (este que aqui escreve incluso) em que cada conto é escrito ao estilo de um cineasta da preferência do autor.

A maior dificuldade encontrada na elaboração do projeto foi encontrar um ponto do qual se pudesse criar algo original a partir de um tema não só batido, como cheio de referências óbvias – pipoca, poltronas de cinema, rolos de filme, claquetes, todos os objetos pertencentes ao imaginário do cinema já foram suficientemente explorados em inúmeras propostas.

A solução encontrada veio quase por acaso: ocorre que, para toda uma geração, a experiência cinéfila se deu menos pela sala de cinema e mais pelo videocassete, para o qual há uma gama de referências pouco exploradas, do universo de uma locadora de VHS – as etiquetas de categoria, os rasgos na capa, os logos de som MONO e advertências de direito autoral, que nos levaram no sentido de fazer uma capa como se fosse uma caixa de VHS.

A idéia acabou explorada também no projeto gráfico do miolo, criado pelo Guilherme Smee: chuviscos, quadros de ajuste de imagem, pedidos para rebobinar a fita, páginas de abertura para cada conto simulando a tela de abertura de um filme ao estilo do diretor trabalho em questão, além de “fichas” reunindo informações do autor e do diretor homenageado que remetem às antigas fichas de video que algumas locadoras colavam no verso das caixinhas.

A Decadência do Cinema e de seus Comentaristas

Building upon each other’s knowledge is exactly what Newton meant when he said he can see further because he stands on the shoulders of giants.

BERTRAND RUSSELL

Tenho absoluta certeza da decadência do cinema. Deveria generalizar e falar em decadência das artes em geral? Bom, hoje meu assunto é cinema ou ao menos pretendo partir dele. E começo dizendo que acredito que a crescente intervenção dos produtores tem efeitos desastrosos nos filmes. Neste domingo, por exemplo, fiquei surpreso ao ver num canal pago a comédia romântica Procura-se um Amor que Goste de Cachorros, filme lá de 2005. Deu-me a impressão de que a personagem vivida por Diane Lane repetia os diálogos que a mesma Diane tivera antes no simpático Sob o Sol da Toscana. Pude assegurar-me do fato ao ligar a TV ontem na HBO e dar de cara com Diane Lane na Toscana: ela usava as mesmas palavras e vivia a mesma situação do filme que vira! Só que, em vez de falar ao advogado, falava à irmã. Algum produtor sentiu no bolso que o filme anterior dera bom lucro e resolveu repetir minuciosamente a fórmula. Diane concordou em ficar mais rica e, em compensação, corre o risco de obter o duvidoso título de “A Namoradinha dos Divorciados da América”. Deve estar preocupadíssima. E assim caminha a humanidade, ao menos a cinematográfica.

Os filmes parecem estar cada vez mais indulgentes para com um público supostamente emburrecido. Como contrapartida, poderia lembrar que, em 1974, fui a um programa duplo no extinto cinema Marabá. Às 14h, vi Gritos e Sussurros e, às 16h, Amarcord. Se não era normal, era uma coisa possível de se fazer na época. Afinal, eram lançamentos.

Uma vez, fui convidado por Fernando Monteiro a fazer listas dos 10 melhores filmes e livros de todos os tempos. Ele publicou suas listas e as minhas na Rascunho. Por e-mail, me provocava mais ou menos assim: “Quero ver quantas obras recentes constarão nelas”. Fiz a lista cinematográfica forçando a entrada de um filme de Peter Greenaway de que gosto muito — Afogando em Números… Mas confesso ter forçado a barra. Mais recentemente, escrevi uma relação de filmes maior e mais bem mais pensada e o fenômeno repetiu-se.

Poderia colocar nela os recentes e excelentes Dogville e Anticristo (Lars von Trier), Os Bons Companheiros (Martin Scorcese), Cidade dos Sonhos (David Lynch), A Vida é um Milagre (Emir Kusturica), As Confissões de Henry Fool (Hal Hartley), O Casamento de Rachel (Jonathan Demme), A Vida dos Outros (Von Donnersmark) ou Os Imperdoáveis (Clint Eastwood)? Até poderia, são belos filmes, mas quais tiraria?

(Um diabo chega por trás para fazer uma massagem em meus ombros e lê o que escrevo. Comenta: Não dramatiza, Milton, estamos numa época em que deixaram de fazer filmes de arte para fazer entretenimento. Antes que eu lhe diga que o cinema de entretenimento sempre existiu e que antes havia espaço para todos, ele vai embora. Se eu lhe respondesse, talvez ela fizesse referências à infantilização do cinema e de alguns adultos. Não vês as filas para Matrix? Não te lembras daquele quarentão que tcompra e sua diariamente seu videogame? Bom, diabo, esta é outra história e, na verdade, a decadência pessoal tem sua poesia e esta, dependendo das circunstâncias e de sua qualidade, pode até ser adorável.)

E, com os maus filmes, apareceu uma geração de críticos adequada a eles. Com mínimas noções de história do cinema, parecem não entender as alusões às vezes existentes nos filmes, sejam as de um ser mais complexo como Theo Angelopoulos, sejam as do pop Quentin Tarantino. E alguns que escrevem na Internet — onde, naturalmente, o amadorismo é mais presente — conseguem mais: conseguem transformar os fatos históricos narrados pelos filmes em ficção. É constrangedor lê-los. Isaac Newton e o roqueiro quase-hooligan-de-mentirinha Noel Gallagher sabiam estar Standing on the Shoulders of Giants, e que, só por isto, viam mais longe. Alguém deveria avisar a estes críticos que eles também estão lá e que deveriam delirar menos em seu suposto brilhantismo e olhar em torno. E um crítico cita o outro e todos juntos… Céus! Lembro de críticos que, ao comentarem um filme baseado numa obra de literatura, sabiam avaliar as alterações feitas por roteiristas nessa espinhosa questão de adaptar uma linguagem para outra. Agora, as críticas são rasteiras, ignorantes.

Eu estou convencido de que houve mesmo uma época (e um lugar) de ouro do cinema, que foi Hollywood na década de 1950, e talvez isso não se volte a repetir, porque se conjugaram várias coisas: o domínio da técnica cinematográfica, uma indústria próspera mas bastante aberta à inovação e a falta de concorrência da TV. Penso que depois disso tornou-se muito mais difícil ver-se filmes simultaneamente muito bons, inovadores e populares, como alguns de Hitchcock ou Nicholas Ray. Os Cahiers du Cinema vieram em auxílio a estes cineastas, porque até então o cinema americano era desprezado pelos intelectuais, e esses jovens (gente como Truffaut ou Rohmer) idolatravam John Ford e outros realizadores de Hollywood. Talvez o último herdeiro espiritual dessa época gloriosa seja Scorsese — o Good Fellas está ao nível dos melhores Nicholas Ray. O que aconteceu nas últimas décadas é que o cinema europeu começou a circular com grande dificuldade, esmagado pelos circuitos de distribuição americanos.

Hoje, não só o cinema se rendeu à linguagem fácil e banal dos filmes de entretenimento. TODA a cultura se transformou em produto de consumo popular. A reflexão cedeu espaço ao evento, tudo é evento. Tudo tem luz, produção, maquiagem até reunião de condomínio acabará tendo roteiro e cenografista. Mas e as idéias? E os ideais, as intenções? Para que fazer pensar se o que importa é faturar? Que discussão vou querer promover se o que quero promover é o sucesso de bilheteria e basta? O cinema sumiu junto com as utopias e quem sabe não está aqui a raiz da decadência? Claro que para toda ação, corresponde uma reação. Por que as Bienais não tratam do tema da arte como espetáculo vazio? Seria uma bela provocação.

Para finalizar este post deixado em aberto, cito Ivan Lessa — que pertence a uma geração anterior à minha — de memória:

Nós íamos ao cinema — definitivamente. Nós víamos filmes — indubitavelmente.

Tema recorrente

Dia desses, estava eu na sala de espera do dentista de minha filha quando vi uma Veja antiga bem do meu lado. Como sou um ser de algumas manias, comecei a folheá-la da maneira mais inteligente e correta, ou seja, de trás para diante. Logo, dei de cara com um artigo de Isabela Boscov — normalmente discordo dela — e, bem, ela estava coberta de razão. Numa crítica ao filme Katyn, de Andrzej Wajda, ela estende seu elogio a toda a geração de cineastas a qual pertence o polonês de 83 anos. É uma bela crítica, tão boa que perguntei à secretária do consultório se podia roubar a revista de quatro meses de idade. Ela deixou.

Neste ínterim, o Marcos Nunes pediu para que eu assistisse o filme Jean Charles. Não entendi bem o motivo, mas ia vê-lo de qualquer maneira. Gostei do filme de Henrique Goldman. Mais: saí do cinema quase entusiasmado. Por quê? Ora, porque vejo cada coisa ruim por aí que é bom saudar um filme com ritmo, atuações dignas e que retrata honestamente seres humanos muito reais.

O que isso tem a ver com a crítica de Boscov? Ora, tudo. Ela, após elogiar o filme de Wajda, entrou em surto fazendo uma longa digressão sobre o que fora o cinema entre os anos 50-70 e o que é hoje. Fellini, Antonioni, Bertolucci, Visconti, Bergman, Kurosawa, Truffaut, Malle, Godard, Kubrick e outros viam o cinema não somente como espetáculo. Eles tinham consciência de que tinham na mão um meio de expressão de apelo sem precedentes e tratavam de utilizá-lo como difusor de ideias — explícitas ou subliminares –, de imagens que não fossem uma derivação da publicidade, como fórum, etc. E eles foram bem sucedidos em sua tentativa de criar uma cultura relevante, tanto que seus filmes — e deveríamos citar também Clint Eastwood, Emir Kusturica, Francis Ford Coppola, Andrei Tarkovski, Hal Hartley, Alexandr Sokurov, Martin Scorcese e Werner Herzog…, misturo conscientemente seus nomes — formam talvez o mais completo referencial do que foi o século XX.

Mas não foi só o cinema que apequenou-se, foi a cultura de forma geral. Kurosawa sabia como fazer, mesmo com atores japoneses, um Trono Manchado de Sangue perfeitamente shakespeariano por ter recebido uma educação clássica ou, no mínimo, por ter estudado cada detalhe da obra original. Hoje, é tudo mais fácil. Não há necessidade de continuidade, de debate e assim vamos ficando cada vez menores.

Jean Charles é muito bom. Faz um relato seguro, honesto e até delicado de uma vida banal interrompida de forma estúpida pela paranóia e medo de um agente da Scotland Yard. Nada demais, mas talvez o máximo a que possamos aspirar nestes dias de decadência consolidada.